Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2634/20.8T8AVR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ISABEL FERREIRA
Descritores: DECLARAÇÕES DE PARTE
FACTOS COMPLEMENTARES
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
DECLARAÇÃO RECEPTÍCIA
Nº do Documento: RP202403212634/20.8T8AVR.P1
Data do Acordão: 03/21/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMAÇÃO
Indicações Eventuais: 3. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – Embora as declarações de parte sejam um meio de prova válido, o juiz não tem de as aceitar acriticamente, devendo analisá-las conjugadamente com toda a restante prova produzida.
II – Para que se possam dar como provados factos complementares ou concretizadores – aqueles que são complemento ou concretização dos factos essenciais que integram a causa de pedir ou em que se baseiam as excepções invocadas – é necessário que os factos essenciais de que eles sejam complemento ou concretização tenham ficado provados.
III – A declaração de resolução é uma declaração receptícia, tornando-se eficaz logo que chega à esfera de disponibilidade do destinatário, sendo susceptível de ser conhecida deste, independentemente do conhecimento efectivo.
IV – Tendo a carta respectiva sido enviada para a morada da R. e aí tendo sido entregue, a declaração de resolução torna-se eficaz, sendo irrelevante que tenha sido endereçada como indo “ao cuidado” de um concreto funcionário.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 2634/20.8T8AVR.P1
(Comarca de Aveiro – Juízo Local Cível de Aveiro – Juiz 1)



Relatora: Isabel Rebelo Ferreira
1º Adjunto: Carlos Portela
2ª Adjunta: Isabel Silva



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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:


I “A..., Lda.” intentou, no Juízo Local Cível de Aveiro do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, acção declarativa, com processo comum, contra “B..., S.A.”, pedindo a condenação desta a:
a) reconhecer o incumprimento das suas obrigações contratuais e consequente resolução do contrato celebrado entre as partes;
b) pagar-lhe a quantia de € 29.911,20, acrescida de juros vincendos contados desde a citação da ré e até efectivo e integral pagamento.
Alegou para tal que, no âmbito do procedimento lançado pelo Município de Aveiro para adjudicação do “fornecimento de contentores com controlo de acessos para a deposição de resíduos urbanos indiferenciados, com apoio ao desenvolvimento e gestão do sistema, no âmbito do Projeto Life Payt”, solicitou à R. que lhe apresentasse cotação para 26 contentores com capacidade de 800 litros e sistema de elevação DIN, com logótipo da CMA na parte frontal e logótipo do projecto na parte lateral, e 27 tampas com tambor duplo com estrutura metálica de suporte, tendo esta apresentado proposta com o preço total de € 23.340,00, mais IVA, e com o compromisso de proceder ao fornecimento no prazo de 6 a 8 semanas, na sequência do que a A., no dia 31 de Julho de 2017, formalizou a ordem de encomenda para aquisição de 26 contentores com 660 litros de capacidade e sistema de elevação DIN (sem tampa), rodas com diâmetro de 160 mm, 27 tampas com tômbola de 40 litros de capacidade e suporte metálico com amortecedor, e, no dia 17 de Outubro de 2017, comunicou à R. a adjudicação do projecto pela Câmara Municipal de Aveiro e a necessidade de prosseguir com a nota de encomenda realizada. A R. procedeu à entrega de 13 contentores e 13 tampas apenas no dia 16 de Fevereiro de 2018, sendo os restantes 13 contentores e 14 tampas entregues no dia 4 de Maio de 2018 (o prazo de entrega era no máximo até ao dia 07/12/2017).
Alegou ainda que adjudicou à R. a instalação das estruturas metálicas e respectivos contentores nos diversos pontos da cidade de Aveiro, tendo sido reportados problemas logo após a instalação dos contentores, que foram comunicados à R., a qual se limitou a enviar dois técnicos para a correcção de casos pontuais, que se verificou a existência de novas deficiências nos equipamentos e que havia uma desconformidade entre as tampas instaladas pela R. e as que foram apresentadas por esta como protótipo, tendo a R. feito um levantamento de todos os problemas que se verificavam e assumido o compromisso de, até ao dia 16/08/2018, fazer a reparação das tampas partidas, prazo que veio a informar que não conseguiria cumprir e que apenas no dia 31 de Agosto conseguiria terminar os trabalhos de substituição das tampas. Verificou-se ainda que as tômbolas não tinham capacidade para os 40 litros contratados, tendo a Câmara Municipal de Aveiro imposto um prazo impreterível de resolução de todas as desconformidades até ao dia 04/10/2018, sob pena de resolução contratual com a A.. Porque a R. nunca cumpriu com as obrigações assumidas, designadamente quanto a prazos de fornecimento e qualidade dos produtos fornecidos, e porque a Câmara Municipal de Aveiro recusava que a R. concluísse os serviços em causa, a A., mediante comunicação de 27/08/2018, procedeu à resolução do contrato celebrado com a R. e devolveu todas as tampas por esta fornecidas, pelas quais tinha pago a quantia de € 23.911,20.
Alegou igualmente que, com a sua conduta, a R. pôs em causa o profissionalismo e bom nome da A., tendo a situação gerado descontentamento da população e tensão nas relações do Município com a A. e sido alvo de divulgação nas redes sociais e na comunicação social, afectando a imagem da A..
A R. contestou, impugnando os factos alegados pela A. como fundamento da acção e alegando que a responsabilidade de a solução concebida não ter funcionado não é sua, mas da A., que a carta de 27/08/2018 foi remetida ao cuidado de AA, que nunca dela deu conhecimento à administração da R., pelo que esta só a viu aquando da citação da presente acção, razão por que nunca teve resposta, e que a A. só devolveu as tampas, mas não os suportes metálicos, pelo que não pode reclamar o valor total do fornecimento.
Foi realizada audiência prévia, foi elaborado despacho saneador, fixou-se o objecto do litígio e enunciaram-se os temas da prova.
Procedeu-se seguidamente a julgamento.
Após, foi proferida sentença, na qual se decidiu julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenar a R. “a reconhecer o incumprimento da sua obrigação contratual (de entrega das tampas sem vícios) e consequente resolução parcial do contrato celebrado entre as partes”, e a pagar à A. “a quantia que vier a apurar-se em incidente de liquidação, correspondente ao valor das 27 (vinte e sete) tampas, em montante não superior a 23.911,20€ (vinte e três mil, novecentos e onze euros e vinte cêntimos), IVA incluído”, absolvendo-se a mesma do restante pedido.
De tal sentença veio a R. interpor recurso, tendo, na sequência da respectiva motivação, apresentado as seguintes conclusões, que se transcrevem:
«A) A douta sentença de que se recorre padece de um erro de julgamento, tendo o Juiz a quo apreciado mal a matéria de facto e aplicado mal o direito ao caso concreto.
B) Existem alguns factos, dados por provados, que foram mal apreciados pelo Tribunal e que não se podem deixar de impugnar nos termos do Art. 640.º do C.P.C..
C) A Apelante considera que foram incorrectamente julgados os factos dados por provados constantes dos pontos 51.º, 52.º, 53.º e 62.º.
D) Factos estes que deviam ter sido julgados da forma seguinte:
51.º A autora, por carta registada com aviso de receção data de 27 de agosto de 2018, enviada à ré mas dirigida ao cuidado de AA, procedeu à resolução do contrato celebrado com a ré – cfr. carta e talões de registo e de aviso de receção dos CTT, juntos como documentos n.º 32 e n.º 33 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
52.º A administração da ré não chegou a receber carta mencionada em 51.º, apenas tendo tomado conhecimento da sua existência e teor quando foi citada da presente acção.
53.º A autora contratou outra entidade para corrigir os problemas detetados, contudo o sistema acabou por não ficar operacional no âmbito do Projeto Life Payt, com a utilização de um cartão magnético como seria suposto, limitando-se a tampa a encostar no contentor.
62.º A autora não devolveu os suportes metálicos, nem devolveu os amortecedores e as tômbolas.
E) Nos termos do disposto no Art. 5.º, nº 2, alíneas a) e b) do C.P.C., para além destes factos articulados pelas partes, existem outros, instrumentais e que são complemento ou concretização dos que as partes alegaram e resultaram da instrução da causa, que deveriam ter sido considerados pelo Juiz a quo, e que não o foram.
F) Efectivamente, porque pertinentes à boa decisão da causa, deveriam ter sido considerados e dados por provados os seguintes factos:
• A autora, perante a amostra enviada pela ré, não testou a capacidade da tômbola, apenas verificou se a mesma funcionava devidamente e era possível colocar e fazer funcionar o dispositivo de hardware.
• Para o sistema, no âmbito do Projeto Life Payt, funcionar, as tampas tinham de estar pareadas com os respetivos contentores, caso contrário, ficando trocadas, já não fechavam no trinco;
• Os trabalhadores das empresas que faziam a recolha dos resíduos tiraram os contentores que se encontravam por debaixo das tampas respetivas, sendo que, quando regressavam dos camiões após despejarem o lixo, trocavam-nos de lugar, já não os colocando por baixo das tampas onde estavam pareados, o que fazia com que estas não ficassem fechadas no trinco;
G) Em termos de prova testemunhal, constante do processo, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, temos diversos depoimentos prestados em audiência – prestados pela parte e por todas as testemunhas – que se encontram gravados e registados, cujos excertos se transcreveram e para os quais se remete.
H) Em termos de prova documental, constante do processo, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, temos o seguinte documento: Doc.33 junto à PI.
I) O Tribunal a quo não fez uma apreciação crítica e conjugada de toda a prova produzida nos autos;
J) Para além das falhas ao nível do julgamento da matéria de facto, atrás citadas, a douta sentença enferma consequentemente de falhas ao nível da aplicação do direito, recorrendo a construções jurídicas com as quais não se pode concordar.
K) Os equipamentos fornecidos pela Apelante não tinham defeitos.
L) A Apelante não agiu com culpa e não incumpriu o contrato a que se vinculou.
M) A Apelada não tinha fundamentos para resolver o contrato celebrado com a Apelante.
N) Assim, ao decidir como decidiu, a douta sentença violou o disposto nos Arts. 224.º, nº 1, 289.º, 290.º, 292.º, 350.º, nº 2, 406.º, nº 1, 436.º, nº 1, 562.º a 564.º, 566.º, 762.º, nº 1, 798.º, 799.º, 801.º, nº 2, 808.º, 1221.º a 1223.º, todos do Código Civil.

Porém V. Exas., com serenidade, dando provimento ao presente recurso, revogando a douta sentença e absolvendo a Ré do pedido, farão a costumada
JUSTIÇA!».
A A. apresentou contra-alegações, defendendo que deve ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II - Considerando que o objecto do recurso, sem prejuízo de eventuais questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas suas conclusões (cfr. arts. 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do C.P.C.), são as seguintes as questões a tratar:
a) apurar da alteração da matéria de facto conforme propugnado pela recorrente;
b) averiguar, com base na pretendida alteração da matéria de facto ou independentemente dela, se a recorrente deve ser absolvida do pedido.
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Vejamos a primeira questão.
O recurso pode ter como objecto a impugnação da decisão sobre a matéria de facto e a reapreciação da prova gravada (cfr. art. 638º, nº 7, e 640º do C.P.C.).
Neste caso, o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição (nº 1 do art. 640º):
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
No que respeita à alínea b) do nº 1, e de acordo com o previsto na alínea a) do nº 2 da mesma norma, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Uma vez que a impugnação da decisão de facto não se destina a que o tribunal de recurso reaprecie global e genericamente a prova valorada em primeira instância, a lei impõe ao recorrente um especial ónus de alegação, no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação.
No caso concreto, verifica-se que a recorrente deu cumprimento às referidas exigências, especificando os concretos factos que põe em causa e indicando as razões da sua discordância, nomeadamente por referência aos meios de prova que, em seu entender, sustentam a solução que propugna.
Apreciemos então as alterações à matéria de facto pretendidas pela recorrente.
São os seguintes os factos dados como provados na sentença recorrida (transcrição):
«1.º A autora tem por objeto social a realização de projetos de IDI (investigação, desenvolvimento e inovação) nas áreas das telecomunicações e territórios inteligentes, tecnologias de informação, informática, domótica, automação, robótica e sistemas de segurança; prestação de serviços de consultoria e desenvolvimento de software e hardware, tecnologias de informação, informática, telecomunicações e telemática; realização de atividades de processamento de dados, domiciliação de informação e atividades relacionadas; prestação de serviços de consultoria e formação nas áreas do desenvolvimento e dos serviços às empresas, nomeadamente de apoio ao empreendedorismo, de apoio ao negócio, à gestão, à qualidade/certificação, ao desenvolvimento e à gestão de processos e ao desenvolvimento de projetos; prestação de serviços de consultoria e formação em atividades de investigação, desenvolvimento e inovação tecnológica; prestação de serviços de apoio ao financiamento público e privado de projetos; realização de projetos de qualificação, capacitação e desenvolvimento, apoio ao negócio e internacionalização; comercialização, aluguer e reparação de equipamento informático e de telecomunicações; consultoria, promoção e gestão de comunicação, informação e imagem, marketing de produtos e serviços, organização de congressos e conferências, publicidade e serviços; edição de livros e publicações, produção e comercialização de conteúdos de Internet, produção e distribuição de programas de rádio e televisão; compra e venda de imóveis, promoção imobiliária e arrendamento de imóveis; consultoria imobiliária; gestão e arrendamento de imóveis; gestão imobiliária de ativos imobiliários; gestão de participações sociais; avaliações, peritagens, projetos de arquitetura e engenharia; prestação de serviços de contabilidade, consultorias, assessoria fiscal, estudos económicos – cfr. certidão permanente junta como documento n.º 1 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
2.º A ré tem como objeto social o fabrico e comércio por grosso e a retalho de transformados de plástico e estruturas metálicas destinadas à implementação de soluções ambientais, fornecimento e instalação de componentes eletrónicas para soluções ambientais e relacionadas; transporte, distribuição, movimentação e instalação de transformados de plástico e estruturas metálicas destinadas à implementação de soluções ambientais; valorização de resíduos não metálicos; montagem de equipamentos, movimentação de cargas e serviços mecânicos – cfr. certidão permanente junta como documento n.º 1 com a contestação, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
3.º Em 2017, o Município de Aveiro lançou o procedimento por ajuste direto n.º 118/17 para adjudicação do “fornecimento de contentores com controlo de acessos para a deposição de resíduos urbanos indiferenciados, com o apoio ao desenvolvimento e gestão do sistema, no âmbito do Projeto Life Payt” – cfr. contrato de fornecimento de contentores junto como documento n.º 8 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
4.º A autora pretendia apresentar proposta no âmbito do referido procedimento, mas não estava qualificada (por se encontrar fora do seu objeto e área de atuação) para proceder ao fornecimento dos contentores e das tampas correspondentes.
5.º Na sequência do pedido de cotação efetuado pela autora, a ré remeteu-lhe a sua proposta para o fornecimento de 26 contentores, pelo preço de 3.900,00€ (à razão de 150,00€ cada um), e de 27 tampas (e respetivo suporte metálico com amortecedor e tômbola 40 litros), pelo preço de 19.440,00€ (à razão de 720,00€ cada uma), num total de 23.340,00€, acrescido de IVA à taxa legal em vigor – cfr. proposta n.º ...67/PT, junta como documento n.º 3 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
6.º Nos termos da proposta apresentada, a ré assumia o prazo de entrega de 6 a 8 semanas – cfr. mesmo documento.
7.º A autora e a ré acordaram que o pagamento seria efetuado da seguinte forma: 30% com a encomenda do equipamento e 70% através de cheque pré-datado a 30 dias na data de entrega do equipamento.
8.º A autora, no dia 31 de julho de 2017, formalizou junto da ré a ordem de encomenda para aquisição dos seguintes bens:
- 26 contentores com 660 litros de capacidade e sistema de elevação DIN (sem tampa);
- rodas com diâmetro de 160 mm;
- 27 tampas com tômbola de 40 litros de capacidade e suporte metálico com amortecedor;
- termo de impressão na frente do contentor com o brasão da Câmara Municipal de Aveiro;
- termo de impressão lateral com logótipo do Programa LIFE e identificação do projeto (...09) – cfr. ordem de encomenda junta como documento n.º 5 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
9.º No dia 17 de outubro de 2017, a autora foi notificada da decisão de adjudicação do procedimento por ajuste direto aludido em 3.º - cfr. mensagem de correio eletrónico junta como documento n.º 6 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
10.º Nesse mesmo dia, a autora comunicou à ré a notificação da decisão de adjudicação e confirmou que poderia dar continuidade à ordem de encomenda feita no dia 31 de julho – cfr. mensagem de correio eletrónico junta como documento n.º 7 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
11.º No dia 17 de novembro de 2017, a autora e o Município de Aveiro formalizaram o “contrato de fornecimento de contentores com controlo de acessos para a deposição de resíduos urbanos indiferenciados, com o apoio ao desenvolvimento e gestão do sistema, no âmbito do Projeto Life Payt” – cfr. contrato junto como documento n.º 8 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
12.º Nos termos desse contrato, foi estipulado que os equipamentos deviam ser entregues e instalados no prazo de 12 semanas após a outorga do contrato – cfr. mesmo documento.
13.º No dia 24 de novembro de 2017, a autora procedeu à transferência para a ré do valor de 8.612,46€, correspondente a 30% do preço acordado – cfr. fatura e comprovativo de transferência bancária juntos, respetivamente, como documentos n.os 9 e 10 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
14.º Em 29 de novembro de 2017, a autora enviou à ré e-mail com o seguinte teor:
«Não se esqueça, pf, de verificar os prazos de entrega do material.
Preciso de coordenar internamente os V/ prazos com o prazo de entrega de todo o equipamento à CMA.» - cfr. documento n.º 11 junto com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
15.º No dia 15 de janeiro de 2018, a autora enviou à ré e-mail, nos seguintes termos:
«Conforme a nossa conversa telefónica, precisava de saber qual é o ponto de situação da encomenda referente ao projeto LIFE PAYT da Câmara Municipal de Aveiro.
Além disso, aproveito para enviar-lhe os ficheiros disponibilizados pela CMA para a serigrafia do Brasão da Cidade nos contentores a serem fornecidos.
Relativamente à posição do Brasão no contentor, este deverá encontrar-se na parte frontal e centrado.
O acrónimo do projeto "...09" também deverá ser identificado no contentor na parte lateral direita (para quem se encontra de frente para o contentor), no canto superior esquerdo.» - - cfr. documento n.º 12 junto com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
16.º No dia 29 de janeiro de 2018, a ré informou a autora do seguinte:
«Tivemos uma anomalia na produção das tampas, a boca não veio com as medidas corretas para a instalação da tômbola, tivemos de devolver ao fabricante para efetuar o novo corte na tampa, infelizmente todo este processo atrasou a entrega do material.
Temos a informação do fornecedor que as tampas ficam prontas esta semana, iremos dar início às entregas na próxima semana.
Lamento este atraso e apelo à sua compreensão.» - cfr. documento n.º 13 junto com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
17.º A 31 de janeiro de 2018, a autora comunicou à Câmara Municipal de Aveiro, além do mais, que:
«1) Devido a uma anomalia identificada no corte das tampas, o nosso fornecedor viu-se obrigado a devolver o material para sua correção.
2) Por causa desta anomalia, o prazo de entrega da encomenda poderá realizar-se após as 12 semanas acordadas contratualmente. (…)
Estou, junto do nosso fornecedor, a coordenar esforços de forma a garantir a entrega da encomenda dentro do prazo estipulado e acordado.
Assim que tiver uma data concreta, entrarei em contacto consigo para dar-lhe conhecimento da mesma.
Pedimos desculpa por este inconveniente e, desde já, agradecemos a vossa compreensão.» - cfr. documento n.º 14 junto com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
18.º A ré informou que não conseguiria proceder à entrega dos 26 contentores e das 27 tampas de uma só vez, mas que conseguiria entregar 13 contentores e 13 tampas.
19.º No dia 2 de fevereiro de 2018, a ré confirmou junto da autora que entregaria o primeiro conjunto de 13 contentores, tampas e estruturas metálicas no início da semana seguinte e que as restantes 14 tampas seriam entregues após duas semanas da entrega das 13 iniciais.
20.º No dia 16 de fevereiro de 2018, a ré entregou à autora 13 contentores e 13 tampas.
21.º No dia 16 de março de 2018, a autora pagou à ré a importância de 13.911,30€ - cfr. fatura e comprovativo de transferência bancária juntos, respetivamente, como documentos n.os 15 e 16 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
22.º No dia 13 de abril de 2018, a ré voltou a dirigir comunicação à autora, nos termos que seguem:
«Venho por este meio informar que surgiu um grave problema na pintura das tampas, foi necessário retirar a tinta já aplicada e agora novamente aplicar a tinta correta.
Infelizmente estamos completamente dependentes deste fornecedor, e quando o informei que o material estava pronto, fui induzido em erro por parte do meu colega que se estava a referir a outro material, posto isto apresente as minhas sinceras desculpas no sucedido. (…)
Segunda feira farei um ponto de situação do prazo de entrega do material que está previsto para dia 23 ou 24 de abril.
Obrigado pela sua compreensão.» - cfr. documento n.º 17 junto com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
23.º No dia 4 de maio de 2018, a ré forneceu o equipamento em falta (13 contentores e 14 tampas).
24.º No dia 9 de maio de 2018, a autora pagou à ré o valor de 6.860,94€ - cfr. faturas e comprovativo de transferência bancária juntos como documentos n.os 18 a 20 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
25.º No dia 30 de abril de 2018, a autora adjudicou à ré a instalação das estruturas metálicas e respetivos contentores nos diversos pontos da cidade escolhidos pelo Município de Aveiro.
26.º A referida instalação foi feita pela ré no dia 18 de maio de 2018.
27.º No dia 22 de maio de 2018, foram reportados os seguintes problemas com os equipamentos fornecidos pela ré:
- os trincos nos contentores eram todos diferentes e feitos para estar pareados;
- aquando da instalação, tal não fora tido em conta e, por isso, havia vários contentores que ficaram abertos (com a eletrónica exposta);
- mesmo que os caixotes fossem colocados com as tampas pareadas, havia zonas com mais do que um contentor lado a lado, pelo que no processo de recolha poderia haver troca entre estes;
- aquando da instalação caíram peças dos mecanismos das tômbolas;
- as tampas foram riscadas no processo de transporte e instalação das mesmas – cfr. e-mail junto como documento n.º 21 junto com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
28.º No dia 23 de maio de 2018, a autora reencaminhou estas reclamações à ré – cfr. mesmo documento.
29.º No dia 23 de maio de 2018, o Município de Aveiro relatou à autora as seguintes anomalias:
- na Rua ...: três contentores estavam com as tampas ao alto, não sendo possível baixá-las porque não encaixavam no contentor;
- na Praceta ...: um contentor encontrava-se com a tômbola trancada e outro com a tômbola solta;
- na Rua ...: dois contentores estavam com as tampas mal encaixadas no caixote e com o suporte metálico danificado;
- na Praceta ...: os suportes metálicos do contentor encontravam-se mal aparafusados ao chão;
- na Rua ...: não foi instalado um contentor e o que foi instalado encontrava-se com a tampa ao alto, a tômbola estava trancada e o suporte metálico só tinha dois parafusos a fixar ao chão em vez de quatro;
- na Rua ...: a tômbola não rodava;
- na Rua ...: um contentor encontrava-se com a tômbola trancada e outro com o hidráulico mal aplicado e o suporte metálico mal aparafusado;
- na Rua ... (junto à Avenida ...): a tômbola estava solta e o suporte metálico mal aparafusado;
- na Rua ... (junto à Rua ...): um contentor estava sem autocolante, com a tômbola solta e a tampa torta;
- na Rua ...: um contentor encontrava-se com a tômbola trancada e outro com a tampa ao alto, verificando-se ainda que um dos contentores tinha sido instalado fora dos parafusos fixados no chão, estando o suporte metálico colocado somente em dois parafusos – cfr. e-mail junto como documento n.º 22 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
30.º Na mesma data, a autora reportou estas anomalias à ré – cfr. mesmo documento.
31.º No dia 5 de junho de 2018, o Município de Aveiro reportou à autora as seguintes anomalias:
- na Rua ... e na Rua ...: as dobradiças das tampas encontravam-se partidas, o que não permitia fechá-las após a recolha dos resíduos;
- na Rua ... (junto ao laboratório de análises clínicas e ecoponto): o piso mostrava-se irregular no local onde estavam os contentores, o que dificultava acertar com a posição do balde e da tampa após a recolha dos resíduos, para fechar o contentor;
- na Rua ... (frente à farmácia): os pivots laterais de cada um dos contentores tocavam-se entre si, o que dificultava acertar com a posição do balde e da tampa após a recolha dos resíduos, para fechar o contentor – cfr. e-mail junto como documento n.º 23 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
32.º A autora reportou imediatamente à ré tais problemas, sublinhando a necessidade de uma resposta «com a maior brevidade» - cfr. mesmo documento.
33.º No dia 11 de junho de 2018, o Município de Aveiro comunicou à autora as anomalias detetadas na mesma data, solicitando urgência na sua resolução, sendo elas:
- na Rua ...: duas tômbolas encontravam-se avariadas;
- na Rua ...: a tampa não fechava e o piso encontrava-se irregular;
- na Rua ...: a tômbola não abria;
- na Praceta ...: a tômbola não abria e os hidráulicos da tampa encontravam-se soltos;
- na Rua ...: a tampa encontrava-se partida e não fechava;
- na Rua ...: a tampa encontrava-se partida e não fechava e os parafusos estavam soltos na base;
- na Rua ... e na Rua ...: as tômbolas não abriam;
- na Rua ... (frente ao n.º 27): a tômbola não abria e o piso encontrava-se irregular;
- na Rua ... (frente à farmácia): a tampa não fechava – cfr. e-mail junto como documento n.º 24 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
34.º No dia 20 de junho de 2018, a ré enviou dois técnicos para correção de anomalias na Urbanização ....
35.º No dia 21 de junho de 2018, o Município de Aveiro deu conta de novas anomalias nos equipamentos, nomeadamente a existência de duas tampas partidas junto à amarração ao suporte metálico, num contentor da Rua ... e noutro da Rua ... – cfr. e-mail junto como documento n.º 25 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
36.º As tampas fornecidas são compostas de fibra de vidro.
37.º Em face de todas as reclamações apresentadas e desconformidades até aí detetadas, no dia 9 de julho de 2018 foi realizada reunião entre a autora, a ré e o Município de Aveiro, da qual resultou que a ré, no decurso dessa semana, iria fazer um levantamento de todos os problemas que se verificavam e indicar as diligências a desenvolver para a sua correção.
38.º Nesse mesmo dia, o Município de Aveiro comunicou à autora as seguintes anomalias:
- na Rua ...: um dos contentores não abria a tômbola;
- na Avenida ...: a luz junto ao leitor de cartões de acesso encontrava-se metida para dentro;
- na Rua ...: um dos contentores tinha a tômbola avariada, não rodando as duas peças em conjunto;
- na Rua ...: em dois contentores a tômbola não abria e num deles a tampa não fechava;
- na Praceta ...: num contentor a tômbola não abria e noutro a tômbola tinha-se soltado por completo e descolado o produto de cor branca;
- na Rua ... e na Rua ...: os contentores cujas tampas haviam sido removidas para substituição a 20 de junho de 2018 continuavam sem tampa;
- na Rua ...: um dos contentores tinha a tômbola avariada, não rodando as duas peças em conjunto;
- na Rua ...: a tampa de um dos contentores não fechava e a tômbola não abria – cfr. e-mail junto como documento n.º 26 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
39.º Foi ainda comunicado que, em muitos locais, a tampa do contentor não fechava bem, porquanto, mesmo conseguindo fechar-se a tampa no trinco, as duas extremidades estavam tortas, não encaixavam bem e, por isso, pareciam empenadas – cfr. mesmo documento.
40.º Pelo que, em pelo menos dois locais, a tampa, por estar a ser forçada, já estava a partir junto à tômbola – cfr. mesmo documento.
41.º A autora comunicou esses problemas à ré no mesmo dia e fez um resumo de todas as anomalias que foram sendo reportadas – cfr. mesmo documento.
42.º No dia 11 de julho de 2018, a ré respondeu a tal comunicação, informando que:
«Na próxima 6f iremos efetuar uma volta a todos os contentores e fazer um relatório de intervenções nos equipamentos que justifiquem tais intervenções.» - cfr. mesmo documento.
43.º No mesmo dia 11 de julho de 2018, a ré informou o seguinte:
«Peço desculpa, mas por um impedimento de última hora, iremos efetuar esse levantamento na próxima 2F. Lamento imenso mas não temos mesmo alternativa.
O Relatório segue logo no dia seguinte.
Estaremos no local pelas 9h da manha do próximo dia 16.» - cfr. mesmo documento.
44.º Imediatamente, a autora comunicou tal alteração de planos ao Município de Aveiro, que, através do seu vereador, respondeu do seguinte modo:
«Impossível é os munícipes esperarem mais uma semana!
O que ficou comprometido foi “estudarem” novamente esta semana, e digo novamente porque dia 20 de junho aquando a vinda dos técnicos da B..., S.A. já era para fazerem este levantamento!
O contrato que assinamos diz que no prazo de 48h a empresa tem que dar resposta, e já estávamos a dar uma semana.
Ficamos a aguardar o relatório e as propostas para solucionar de vez estes problemas para esta segunda-feira (dia 16 de julho 2018).
O nosso técnico estará disponível para vos acompanhar esta semana.» - cfr. e-mail junto como documento n.º 27 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
45.º O que a autora imediatamente comunicou à ré - cfr. e-mail junto como documento n.º 28 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
46.º No dia 18 de julho de 2018, a ré procedeu ao envio do relatório pela mesma elaborado em consequência da inspeção realizada no dia 16 de julho.
47.º No dia 16 de agosto de 2018, a ré informou a autora de que, «derivado a alguns constrangimentos de férias e do atraso na correção das tampas (…), apenas conseguimos entrar em obra para finalizar os trabalhos do dia 29/30, ficando o compromisso que fica finalizado tudo até o dia 31 de agosto» - cfr. e-mail junto como documento n.º 30 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
48.º Informação que a autora comunicou ao Município de Aveiro no dia seguinte – cfr. mesmo documento.
49.º Por ofício datado de 24 de agosto de 2018, a Câmara Municipal de Aveiro informou a autora de que as tômbolas não tinham capacidade para 40 litros, mas somente para 24,2 litros, o que havia provocado «uma reação negativa da população, já que a maioria dos sacos domésticos utilizados são de 30L litros de capacidade» - cfr. documento n.º 31 junto com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
50.º E impôs um prazo impreterível de resolução de todas as desconformidades detetadas até o dia 4 de outubro de 2018, sob pena de «rescisão do contrato» celebrado com a autora – cfr. mesmo documento.
51.º A autora, por carta registada com aviso de receção datada de 27 de agosto de 2018, procedeu à resolução do contrato celebrado com a ré - cfr. carta junta como documento n.º 32 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
52.º A ré recebeu essa comunicação no dia seguinte – cfr. aviso de receção junto como documento n.º 33 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
53.º A autora contratou outra entidade para corrigir os problemas detetados.
54.º No dia 18 de outubro de 2018, a autora procedeu à devolução à ré de todas as tampas por si fornecidas.
*
55.º A ré desenvolve soluções tecnológicas na área da gestão de resíduos.
56.º A ré procedeu à montagem dos componentes mecânicos, nomeadamente das tômbolas nas tampas, e à preparação/pré-montagem dos postes de suporte às tampas.
57.º O fornecimento do software e a montagem do hardware e do software nas tômbolas eram da responsabilidade da autora e dos seus parceiros.
58.º Aquando da montagem dos postes de suporte às tampas no terreno, a ré alertou para o desnivelamento do pavimento e para o pavimento em mau estado na base dos contentores.
59.º A ré disponibilizou-se para identificar e colaborar na solução das anomalias, enviando duas vezes ao local os seus técnicos, para analisarem os problemas transmitidos.
60.º Uma das causas das anomalias detetadas foi a irregularidade do pavimento.
61.º A autora estava obrigada para com o Município de Aveiro a fornecer «tambor duplo com capacidade até 40L» – cfr. caderno de encargos junto como documento n.º 13 com a contestação, cujo teor dou por integralmente reproduzido.
62.º A autora não devolveu os suportes metálicos.».
Tendo sido dados como não provados os seguintes factos:
«a) A autora, através de chamadas telefónicas, começou a pressionar a ré, quase diariamente, para proceder à entrega dos equipamentos.
b) A autora remeteu a mensagem de correio eletrónico datada de 15 de janeiro de 2018, em face da ausência de qualquer resposta concreta e compromisso assumido quanto ao prazo de entrega por parte da ré.
c) A ré não respondeu às reclamações apresentadas em 29.º e 31.º.
d) A autora reforçou sempre junto da ré a urgência na resolução das anomalias.
e) A fibra de vidro é um material sem resistência, sem maleabilidade e que parte facilmente, não aguentando a pressão do suporte metálico nem dos amortecedores.
f) Muitas das fragilidades e avarias dos contentores estão relacionadas com a fragilidade do material da tampa.
g) O protótipo que a ré disponibilizara para demonstração era de plástico.
h) Na reunião referida em 37.º, em face do desagrado manifestado pelo Município de Aveiro, a ré comprometeu-se a envidar esforços urgentes para resolver os problemas.
i) Após reunião realizada no dia 20 de julho de 2018, na presença de representantes camarários, ficou acordado que a ré, até ao dia 16 de agosto de 2018, faria a reparação/substituição das tampas partidas.
j) A ré enviou o e-mail referido em 47.º após diversas solicitações da autora no sentido de aquela informar do cumprimento dos prazos acordados.
k) O Município de Aveiro informou a autora que não confiava na ré, pelo que deveria encontrar outro fornecedor, por forma a poder concluir de forma satisfatória o contrato de fornecimento consigo celebrado.
l) Os contentores fornecidos pela ré já haviam dado problemas junto da “Lipor”, num projeto antecedente.
m) O que fez com que a “Lipor” tivesse devolvido todos os contentores, uma vez que os mesmos não correspondiam às especificações acordadas.
n) A ré, com a sua conduta, pôs em causa o profissionalismo e bom nome/imagem da autora, que é atualmente uma empresa de referência na sua vertente de atuação.
o) A autora trabalha com as mais variadas entidades públicas e privadas, bem como com outros países que a contactam para conceber projetos e assessorar na área em causa.
p) O “Projeto Life Payt” teve ampla cobertura dos meios de comunicação locais e nacionais e havia enorme expectativa no mesmo pelo facto de ser pioneiro.
q) Os sucessivos incumprimentos contratuais da ré geraram descontentamento e reclamações na população em geral.
r) Tais incumprimentos e o descontentamento da população geraram tensão nas relações estabelecidas entre o Município de Aveiro e a autora.
s) E foram alvo de divulgação ampla nas redes sociais e comunicação social, sobretudo local, afetando a imagem da autora.
*

t) A ré desenvolve soluções tecnológicas desde o ano de 2000.
u) A empresa que procedeu à montagem do hardware e do software desmontou as tômbolas das tampas e provocou a troca de equipamentos entre si.
v) Essa empresa efetuou cortes nas tampas, que provocaram a sua fragilidade.
w) Uma das causas das anomalias detetadas foi a desmontagem pela autora dos componentes pré-montados pela ré.
x) Não era possível garantir a afinação das tampas com as fechaduras dos contentores, para que as tampas não permanecessem abertas na via pública, devido aos danos já causados nas mesmas.
y) As tampas ficavam abertas porque a autora não seguiu a ordem/sequência de montagem dos mecanismos de hardware, trocando conjuntos que não ficaram “pareados”.
z) A autora apenas forneceu à ré todas as informações que lhe permitiam dar início ao processo de fabrico, em janeiro de 2018.
aa) Após a ré entregar as tampas, a autora demorou 12 semanas para instalar a solução tecnológica.
ab) O facto relatado em 21 de junho ocorreu por o piso estar irregular e não ter sido afinado convenientemente pela autora ou pelos cantoneiros que procedem às recolhas, que bateram várias vezes com as tampas para elas fecharem.».
Pretende a recorrente que:
1) Seja alterada a redacção do ponto 51º da matéria de facto provada [A autora, por carta registada com aviso de receção datada de 27 de agosto de 2018, procedeu à resolução do contrato celebrado com a ré - cfr. carta junta como documento n.º 32 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.], de modo a nele incluir que a carta foi enviada à R., mas dirigida ao cuidado de AA, em conformidade com o que consta do talão de registo e do aviso de recepção juntos como doc. 33 da petição inicial.
O facto em questão foi efectivamente alegado pela R. no art. 77º da contestação e resulta da simples análise dos documentos acabados de referir, nos quais consta, no local reservado à identificação do destinatário “A/C AA – B..., S.A. – Rua (…) ...”.
Deve, pois, ser alterada a redacção deste ponto da matéria de facto, em conformidade, mas sem necessidade de qualquer alusão aos documentos referidos, os quais constituem unicamente meios de prova, não havendo qualquer necessidade de reproduzir o seu teor na matéria de facto, até porque o seu conteúdo relevante fica a constar da redacção do ponto em causa (ao contrário do que sucede com a própria carta, cuja alusão tem a virtualidade de remeter para todo o seu conteúdo e integrá-lo na matéria de facto, o qual é relevante para a apreciação dos termos da comunicação da resolução).
Assim, a redacção do ponto 51º da matéria de facto provada passa a ser:
“A autora, por carta registada com aviso de receção datada de 27 de agosto de 2018, remetida à ré, ao cuidado de AA, procedeu à resolução do contrato celebrado com a ré - cfr. carta junta como documento n.º 32 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.”.
2) Seja alterada a redacção do ponto 52º da matéria de facto provada [A ré recebeu essa comunicação no dia seguinte – cfr. aviso de receção junto como documento n.º 33 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.], para que passe a ser “A administração da ré não chegou a receber carta mencionada em 51.º, apenas tendo tomado conhecimento da sua existência e teor quando foi citada da presente acção.”
Para o efeito, invoca os depoimentos das testemunhas ouvidas, AA e BB, e as declarações de parte do legal representante da R., CC.
Na motivação constante da sentença recorrida explica-se, quanto ao facto em causa (embora se refiram os pontos 50º e 51º, verifica-se que se trata de manifesto lapso de escrita, pois essa parte da motivação refere-se aos pontos 51º e 52º, existindo ainda lapso na indicação do apelido da testemunha BB, que é BB e não DD), que:
Relativamente aos factos que fazem os pontos 50.º e 51.º, o tribunal considerou a missiva e o aviso de receção juntos, respetivamente, como documentos n.ªs 32 e 33 com a petição inicial, em conjugação com o depoimento de AA, que, recorde-se, foi funcionário da ré, e que referiu que a EE (nome que consta no aviso de receção como tendo sido a pessoa que rececionou a carta) era a funcionária da C... (“empresa-mãe da ré”), que tinha como funções, além do mais, atender os telefonemas e rececionar as cartas. Também a testemunha BB e o legal representante da ré admitiram que EE era funcionária da C.... É certo que a carta se mostra remetida ao cuidado de AA, mas também é indicada a firma da ré, pelo que se depreende, pelas regras normais da experiência e do normal acontecer, que a referida funcionária fez chegar a carta à ré.”.
Ora, vista a referida prova (o que já decorria desde logo dos próprios excertos indicados pelas partes), verifica-se que está correcta esta apreciação do ponto 52º da matéria de facto, resultando que a carta foi recebida na morada da sede da R. (embora referida a existência de uma mudança de instalações, a mesma ainda não tinha sido formalizada), tendo o aviso de recepção sido assinado pela pessoa que estava encarregada de aí receber a correspondência (não sendo funcionária da R., era funcionária de outra empresa do grupo) e fazer chegar a mesma às respectivas sociedades (segundo o que foi dito havia pelo menos esta outra sociedade no local).
Aliás, em bom rigor, a R. não põe em causa o facto dado como provado no ponto 52º, antes pretende acrescentar que, apesar disso, a carta não chegou à administração da R., que só dela teve conhecimento aquando da citação para a acção.
Ora, quanto a este facto, a testemunha AA não se recordava de ter recebido ou não esta carta e a testemunha BB não tinha qualquer conhecimento da mesma, pelo que dos seus depoimentos não se pode retirar que a carta não chegou à direcção. Apenas o representante legal da R. o afirmou nas suas declarações de parte. Mas não existe qualquer corroboração por parte de outra prova objectiva daquilo que afirma.
Aliás, causa estranheza que a questão da resolução não fosse conhecida da administração da R., tendo em conta o contexto, referido em julgamento, em que veio a ocorrer a devolução das tampas em Outubro de 2018 (ponto 54º). O sucedido inculca a ideia de que teria que ser sabido que a A. estava a colocar um fim no contrato, não sendo normal que a devolução das tampas “surgisse do nada”.
Cabe aqui referir que, como é jurisprudência corrente, as declarações de parte “são um meio de prova válido, estando sujeitos, tal como a prova testemunhal, à livre convicção do julgador, tudo se reconduzindo à avaliação e ponderação que haja de ser feita, sem prejuízo porém dessa avaliação dever ser feita com as necessárias cautela, exigência e rigor e conjugada com a existência, ou não, de outros eventuais meios de prova” (Ac. da R.P. de 22/02/2021, publicado na Internet, em www.dgsi.pt, com o nº de processo 1303/16.8T8PNF.P1).
Ou seja, “as declarações de parte podem ser valoradas em sentido favorável à parte, desde que haja uma convicção segura quanto à sua correspondência com a realidade, a qual deve ser formada numa ponderação global de todos os meios de prova que incidam sobre essa matéria, desde que sejam suficientes, precisos, coerentes e seguros, fazendo-se uma valoração conjunta em termos lógicos e de acordo com as regras da experiência. (…)
Essa certeza subjectiva, com alto grau de probabilidade, há-de resultar da conjugação de todos os meios de prova produzidos sobre um mesmo facto, ponderando-se a coerência que exista num determinado sentido e aferindo-se esse resultado convergente em termos de razoabilidade e lógica. Se pelo contrário, existir insuficiência, contradição ou incoerência entre os meios de prova produzidos, ou mesmo se o sentido da prova produzida se apresentar como irrazoável ou ilógico, então haverá uma dúvida séria e incontornável quanto à probabilidade dos factos em causa serem certos, obstando a que se considere o facto provado” (Ac. da R.P. de 24/10/2022, publicado no mesmo sítio da Internet com o nº de processo 675/19.7Y7PRT.P1).
Em suma, quanto a este ponto da matéria de facto, não resulta que deva considerar-se provado que a administração da R. não tomou conhecimento da carta e que tal só sucedeu com a contestação.
3) Seja alterada a redacção do ponto 53º da matéria de facto provada [A autora contratou outra entidade para corrigir os problemas detetados.], de modo a nele incluir que “contudo o sistema acabou por não ficar operacional no âmbito do Projeto Life Payt, com a utilização de um cartão magnético como seria suposto, limitando-se a tampa a encostar no contentor”.
O facto dado como provado no ponto 53º foi alegado pela A. no art. 96º da petição inicial e não foi impugnado pela R. na contestação, nem se encontra em contradição com qualquer facto alegado neste articulado, estando, por conseguinte, assente por acordo das partes nos articulados. Aliás, na contestação a R. nada aduz quanto a este facto, designadamente não alega a factualidade que agora pretende acrescentar ao referido ponto. Ou seja, o facto que se pretende incluir no ponto 53º não foi alegado nos articulados.
De acordo com o princípio do dispositivo, que vigora em processo civil, e que se encontra plasmado, nomeadamente, no art. 5º do C.P.C., apenas podem ser tidos em conta os factos essenciais alegados pelas partes (os que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas), com excepção unicamente dos factos instrumentais que resultem da instrução da causa, dos factos notórios e dos conhecidos pelo juiz por virtude do exercício de funções, e dos factos que sejam complemento ou concretização dos factos alegados pelas partes e que resultem da instrução da causa (neste caso, desde que as partes sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar).
Conforme se diz no Ac. da R.P. de 13/06/2023, publicado em www.dgsi.pt, com o nº de proc. 7695/21.0T8PRT.P1, «confere-se, pois, ao juiz, a possibilidade de investigar, mesmo oficiosamente, e de considerar na decisão, desde logo os factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa. E “factos instrumentais são os que interessam indiretamente à solução do pleito, por servirem para demonstrar a verdade ou falsidade dos factos pertinentes; não pertencem à norma fundamentadora do direito e são-lhe, em si, indiferentes, servindo apenas para, da sua existência, se concluir pela existência dos próprios factos fundamentadores do direito ou da exceção”.
Num outro plano se apresentam os chamados “factos complementares” – os que sejam complemento ou concretização dos factos essenciais que integram a causa de pedir ou em que se baseiam as exceções invocadas –, também eles passíveis de ser considerados pelo juiz, quando resultem da instrução da causa, mas desde que sobre eles tenham tido as partes a possibilidade de se pronunciar.
Como se deixou bem notado no acórdão da RC de 7.11.2017, “para que se possam dar como provados os factos complementares ou concretizadores é necessário que os factos essenciais de que eles sejam complemento ou concretização tenham ficado provados, não sendo de admitir que não sendo provados esses factos essenciais da causa de pedir, se julgue a acção procedente com base nos ditos complementares ou concretizadores mas que afinal substituam os da causa de pedir que não se tenham provado”. O que se deixou dito quanto à causa de pedir vale, naturalmente, para as exceções invocadas pelo réu.»
No caso, o facto em questão, para além de não ter sido alegado por qualquer das partes, nomeadamente pela R., em qualquer articulado, e não constituir facto notório ou de conhecimento oficioso (como é manifesto), não é facto instrumental, pois não serve para comprovar qualquer dos factos essenciais da acção alegados, e também não complementa ou concretiza qualquer facto alegado, nomeadamente o que ficou a constar do ponto 53º, posto que dizer que o sistema acabou por não ficar operacional nos termos em que seria suposto não complementa ou concretiza o facto de ter sido contratada outra entidade para corrigir, antes constitui uma espécie de oposição a este facto, pois o que pretende significar é que, afinal, os problemas detectados não foram corrigidos, antes foram solucionados de uma forma diferente, já que o sistema de tômbola com cartões continua a não funcionar como seria suposto (cfr. motivação do recurso, a propósito da alteração ao ponto 53º).
Tal facto complementaria a factualidade de que o sistema de cartões pura e simplesmente não funciona, seja com os materiais fornecidos pela R., seja com outros materiais, sendo o problema do próprio sistema “life payt” (cujos hardware e software, como consta do ponto 57º da matéria de facto, eram da responsabilidade da A. e dos seus parceiros) e não da R.. Sucede, porém, que estes factos não constam da matéria de facto provada e nem sequer foram alegados pela R., pelo que, em conformidade com o que se analisou supra, não podem ser considerados pelo tribunal, nem ser inseridos na matéria de facto, como não o pode ser o facto complementar que a R. pretendia acrescentar ao ponto 53º, sendo desnecessário, assim, averiguar se o mesmo resultou ou não da prova produzida - a integração na factualidade provada da sentença deste facto consistiria numa violação do princípio do dispositivo previsto no art. 5º do Código de Processo Civil.
4) Seja alterada a redacção do ponto 62º da matéria de facto provada [A autora não devolveu os suportes metálicos.], de modo a nele incluir que “nem devolveu os amortecedores e as tômbolas”.
O facto dado como provado no ponto 62º foi alegado pela R. no art. 79º da contestação, para daí concluir que “mais uma razão para não poder reclamar o valor total do fornecimento”. Já não foi alegado que a A. não devolveu os amortecedores e as tômbolas.
Vale aqui o que já se aludiu a propósito da terceira alteração pretendida pela R., sendo neste caso os factos em questão factos essenciais, posto que, do ponto de vista da alegação da R., se trataria de factos impeditivos do direito da A. a receber a totalidade da quantia reclamada. O que significa que, não tendo sido alegados, não podem ser considerados pelo tribunal, nos mesmos termos aludidos quanto ao facto anterior.
Mas, no caso, abstraindo do ponto de vista da R., e considerando o que consta da sentença recorrida, até é de concluir que se trata de factualidade que não tem qualquer relevo para a decisão, na medida em que, como ali se diz, na fundamentação de direito, “apenas as tampas fornecidas pela ré motivaram a resolução do contrato, razão pela qual a autora procedeu à sua devolução e não dos restantes equipamentos. Na verdade, a autora operou a resolução parcial do negócio e é tanto assim que, na presente ação, não pretende a devolução de todo o preço pago à ré, mas apenas do correspondente ao valor das tampas”.
Portanto, estando em causa apenas a devolução e o valor das tampas, nada há que apurar quanto à devolução dos restantes equipamentos, designadamente os amortecedores e as tômbolas.
5) Sejam inseridos na matéria de facto os seguintes factos, que a recorrente intitula de “instrumentais e que são complemento ou concretização dos que as partes alegaram”:
a) A autora, perante a amostra enviada pela ré, não testou a capacidade da tômbola, apenas verificou se a mesma funcionava devidamente e era possível colocar e fazer funcionar o dispositivo de hardware;
b) Para o sistema, no âmbito do Projeto Life Payt, funcionar, as tampas tinham de estar pareadas com os respetivos contentores, caso contrário, ficando trocadas, já não fechavam no trinco; e
c) Os trabalhadores das empresas que faziam a recolha dos resíduos tiraram os contentores que se encontravam por debaixo das tampas respetivas, sendo que, quando regressavam dos camiões após despejarem o lixo, trocavam-nos de lugar, já não os colocando por baixo das tampas onde estavam pareados, o que fazia com que estas não ficassem fechadas no trinco.
Assinale-se, antes de mais, que a R. assume, desde logo, que se trata de factos que não foram alegados.
Porém, mistura factos instrumentais com factos complementares ou concretizadores, identificando-os como se fossem a mesma coisa.
A serem factos instrumentais, a R. não indica que factos essenciais ou complementares com eles visa comprovar.
E a serem factos complementares ou concretizadores, verifica-se também que a R. não explica de que factos essenciais alegados são estes concretização ou complemento.
Sendo certo que, se atentarmos no que a R. alega na sua motivação de recurso, até parece que os considera como factos essenciais, posto que alega que se trata de factos “muito relevantes para a boa decisão da causa” e, na parte em que alude ao direito aplicável, invoca que não existiu culpa da sua parte, pois “não tem culpa que a Autora não tenha testado a capacidade da tômbola”, “nem tem culpa que os Cantoneiros que procederam à recolha do lixo trocassem os contentores com as tampas quando regressavam dos camiões”, “nem tão pouco que não lhes tivesse sido dada formação como proceder”.
Vejamos então.
No que concerne ao facto da alínea a), o mesmo não é essencial, nem concretizador, nem instrumental, é irrelevante, uma vez que está definitivamente provado (essa matéria não foi impugnada no presente recurso pela R.) que foi contratada a aquisição de 27 tampas com tômbola de 40 litros (ponto 8º) e que as tômbolas fornecidas tinham capacidade de apenas 24,20 litros (ponto 49º), o que torna despiciendo para a economia da presente acção saber se a A. testou ou não a capacidade da tômbola quando recebeu a amostra.
Quanto aos factos das alíneas b) e c), o que fundamentalmente está em causa é saber se as tampas tinham de estar pareadas com os respectivos contentores e se os problemas de funcionamento se deviam à troca das mesmas.
A R. apenas aludiu à questão de as tampas ficarem pareadas no art. 55º da contestação, tendo alegado que “o problema das tampas ficarem abertas se deveu ao facto de a A... não ter seguido a ordem/sequência de montagem dos mecanismos de hardware, pelo que trocaram conjuntos por forma a não ficarem “pareadas””.
Pode inferir-se desta alegação, embora tal não seja dito expressamente, que para as tampas fecharem teriam de estar pareadas. E nesse caso, seria de considerar aqueles factos como complementares deste que foi alegado no art. 55º da contestação.
Sucede, porém, que este facto não resultou provado, constando da alínea y) dos factos não provados. Logo, não há facto provado que possa ser complementado com estes que a R. agora pretende incluir.
Ademais, da matéria de facto provada, na parte não impugnada no presente recurso (e que, portanto, está definitivamente assente), decorre que a circunstância de as tampas terem de estar pareadas não era uma característica do sistema, tendo sido considerado um problema, e que, ainda que assim fosse, tal não foi tido em conta aquando da instalação (veja-se o ponto 27º: No dia 22 de maio de 2018, foram reportados os seguintes problemas com os equipamentos fornecidos pela ré: - os trincos nos contentores eram todos diferentes e feitos para estar pareados; - aquando da instalação, tal não fora tido em conta e, por isso, havia vários contentores que ficaram abertos (com a eletrónica exposta); - mesmo que os caixotes fossem colocados com as tampas pareadas, havia zonas com mais do que um contentor lado a lado, pelo que no processo de recolha poderia haver troca entre estes …)
Portanto, há que concluir que os factos em questão, que poderiam integrar a categoria dos factos complementares, no caso concreto não complementam qualquer facto que tenha sido alegado e conste da matéria de facto provada e, para além do mais, até são contraditórios com factos que estão definitivamente provados.
Anote-se ainda que, quanto ao facto da alínea c), o mesmo não tem qualquer relação com o que consta alegado no art. 61º da contestação, que aludia a uma específica conduta dos cantoneiros relacionada com a situação ocorrida no dia 21 de Junho de 2018, além de que tal facto resultou não provado (alínea ab) dos factos não provados).
Não há, pois, que acrescentar a factualidade invocada pela recorrente à matéria de facto.
É, assim, de concluir que, com excepção da alteração ao ponto 51º dos factos provados, nos termos supra referidos, não merece provimento a impugnação da matéria de facto.
*

Passemos à segunda questão.
Tendo em conta o resultado do tratamento da questão anterior, a factualidade a ter em conta para apreciação da pretensão da recorrente é a que consta dos factos dados como provados na sentença recorrida e já transcritos, com a alteração do ponto 51º, cuja redacção passa a ser a seguinte:
“A autora, por carta registada com aviso de receção datada de 27 de agosto de 2018, remetida à ré, ao cuidado de AA, procedeu à resolução do contrato celebrado com a ré - cfr. carta junta como documento n.º 32 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.”.
Cabe assim apreciar se não houve incumprimento e/ou culpa por parte da R. e se a resolução do contrato não chegou ao destinatário.
Na sentença recorrida considerou-se que “A autora logrou demonstrar que a obra padecia dos defeitos melhor descritos nos pontos 27.º, 29.º, 31.º, 33.º, 35.º, 38.º a 40.º e 49.º, sendo que tais defeitos excluíam a aptidão para o uso ordinário a que eram destinados os contentores e, em especial para o que aqui nos interessa, as respetivas tampas, ou seja, os defeitos de que padeciam as tampas impossibilitavam, na maioria das vezes, que o lixo pudesse ser depositado nos contentores e, consequentemente, a implementação do “Projeto Life Payt”, que visava o controlo de acessos para a deposição de resíduos urbanos indiferenciados (cfr. ponto 11.º).”.
E efectivamente assim sucede, se tivermos presente a factualidade constante dos referidos pontos da matéria de facto (que, anote-se, nem sequer foram impugnados pela R.), e considerando que o sistema de recolha de lixo que se pretendia implementar pressupunha um sistema de controlo de acessos a funcionar em conformidade.
Ou seja, tendo em conta o sistema que se pretendia colocar em funcionamento, as anomalias detectadas excluíam a aptidão dos contentores para o uso a que se destinavam como se considerou na sentença recorrida.
Estando provada a existência de defeitos na obra, atento o disposto no art. 799º do Código Civil, como, aliás, se referiu na sentença recorrida, incumbia à R. a prova de que os mesmos não procediam de culpa sua.
Com efeito, atento o disposto nesta norma, em sede de responsabilidade contratual, como é a que está em causa nos autos, provada a existência de defeitos (prova que incumbe ao credor, nos termos da regra geral do art. 342º, nº 1, do Código Civil), o credor beneficia da presunção de que tal facto se deve a culpa do devedor, cabendo a este ilidir a referida presunção, mediante a prova de que os defeitos não decorrem de culpa sua.
No caso, e como bem se analisou também na sentença recorrida, a R. não logrou efectuar essa prova: “Sucede que a ré não logrou ilidir a presunção iuris tantum constante do artigo 799.º, n.º 1, do Código Civil [cfr. alíneas u) a y)], considerando-se, desta forma, que os defeitos de que padeciam os já referidos equipamentos são imputáveis à ré. Com efeito e apesar de ter ficado provado que uma das causas das anomalias detetadas foi a irregularidade do pavimento e tal também ser aludido nas diversas reclamações apresentadas pelo Município de Aveiro junto da autora, resulta dessas mesmas reclamações que nem todas as anomalias (ou até a maior parte delas) não estava relacionada com esse desnivelamento”.
E o presente recurso não obteve sucesso na alteração dessa situação, como decorre do resultado do tratamento da questão anterior.
Depois de tentativas de resolução dos problemas detectados, que se revelaram infrutíferas, conforme descrito na sentença recorrida, a A. decidiu resolver o contrato, direito que lhe assistia no caso, por verificação dos pressupostos de “perda de interesse na prestação em consequência da mora”, como se concluiu, correctamente, naquela decisão (tudo em termos não colocados em causa no recurso).
A A. procedeu à resolução do contrato que celebrou com a R. por intermédio de carta registada, com aviso de recepção, datada de 27 de Agosto de 2018.
Conforme decorre da alteração ao ponto 51º da matéria de facto operada no presente recurso, está ainda provado que esta carta foi remetida à ré, ao cuidado de AA.
Porém, não ficou provado (como se analisou na anterior questão) que a administração da R. não tomou conhecimento da carta e que tal só sucedeu com a contestação.
A declaração de resolução é uma declaração receptícia, como decorre da conjugação dos arts. 436º, nº 1, e 224º do Código Civil, como igualmente se disse na sentença recorrida.
Nos termos do art. 224º do Código Civil:
1. A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada.
2. É também considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida.
3. A declaração recebida pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não poder ser conhecida é ineficaz.
Como bem se explica no Ac. do S.T.J. de 16/12/2021, publicado em www.dgsi.pt, com o nº de proc. 4679/19.1T8CBR-C.C1.S1:
«a) a declaração negocial com um destinatário (receptícia ou recepienda) ganha eficácia se chegar à sua esfera de disponibilidade material ou de acção (recepção) ou se chegar ao seu conhecimento, verificando-se logo na primeira circunstância que ocorrer com prioridade cronológica, uma vez que, chegada ao “local” de poder do declaratário-destinatário (caixa do correio postal, caixa de um dispositivo automático de recepção de chamadas telefónicas ou fax, caixa digital do correio electrónico) ou entregue a pessoa com competência para a recepção (representantes, trabalhadores, auxiliares, etc.), é irrelevante que não a venha a conhecer efectivamente, assim como é irrelevante que não chegue ao seu poder se a conheceu efectivamente em momento anterior (art. 224º, 1, 1ª parte);
b) a chegada à esfera de disponibilidade material ou de acção integra a cognoscibilidade (possibilidade ou susceptibilidade de conhecimento) da declaração pelo destinatário, independentemente do conhecimento efectivo, esfera essa aferida de acordo com as circunstâncias normais que envolvem o destinatário – “em conformidade com os seus usos pessoais ou os usos do tráfico (v. g., apartado, local de negócios, casa)” assim como com “as concepções reinantes do tráfico jurídico para os negócios em causa” – e correndo contra si os riscos que, de forma previsível e antecipada, impossibilitam (sibi imputet) que a cognoscibilidade se converta em conhecimento efectivo – como “uma enfermidade, uma ausência transitória de casa ou do estabelecimento” –, desde que, como é óbvio, essa esfera esteja sob o controlo do destinatário;
c) ao declarante incumbe o ónus de alegação e prova da expedição (ou “notificação”) da declaração e de a expedição ser feita para o destino a que corresponde a esfera de acção e recepção do destinatário-declaratário (antecipadamente conhecido e/ou acordado) e, se for o caso, o conhecimento efectivo; incumbe ao declaratário-destinatário a contraprova da falta de concretização da expedição (isto é, a recepção) no destino ou, se for o caso, do conhecimento efectivo (ou ainda a impossibilidade de conhecimento nos termos do art. 224º, 3);
d) a declaração negocial receptícia é ainda eficaz se a recepção na sua esfera de disponibilidade – ou recepção tardia – foi obstada por culpa exclusiva (acção ou por omissão) do declaratário-destinatário («só por culpa», diz a lei), em referência (seja para a não recepção definitiva como seja para a recepção tardia) ao momento e ao lugar em que deveria ter sido recebida não fosse o comportamento culposo, equivalendo esse momento e esse lugar ao momento e ao lugar de uma consumação efectiva da entrega («oportunamente recebida», diz a lei)» - sublinhados nossos.
No caso concreto, a carta foi enviada para a morada da R., e aí foi entregue, sendo irrelevante para o caso que tenha sido endereçada como indo “ao cuidado” de um concreto funcionário – com efeito, a carta chegou à esfera de disponibilidade da R., ao seu “local de poder”, sendo susceptível de ser conhecida pelos seus representantes legais, independentemente do conhecimento efectivo (e anote-se que, no caso, não se provou que esse conhecimento efectivo não tenha existido), e sendo certo que apenas a prova da falta desse conhecimento sem culpa da R. poderia obstar à eficácia da declaração.
Verifica-se, assim, que a prova de que a carta foi endereçada “ao cuidado de AA” em nada altera o que nessa parte foi decidido pelo tribunal recorrido, tendo a declaração de resolução produzido os seus efeitos.
Acerca das consequências desta resolução, concordamos com o que consta da sentença recorrida:
«Na falta de disposição especial, a resolução é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico (artigo 433.º do Código de Processo Civil).
Os artigos 289.º e 290.º do Código Civil fixam os termos em que as prestações recebidas devem ser restituídas, prescrevendo o primeiro normativo, no seu n.º 1, que tanto a declaração de nulidade como a anulação do negócio têm efeito retroativo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.
No caso dos autos, verifica-se que apenas as tampas fornecidas pela ré motivaram a resolução do contrato, razão pela qual a autora procedeu à sua devolução e não dos restantes equipamentos. Na verdade, a autora operou a resolução parcial do negócio e é tanto assim que, na presente ação, não pretende a devolução de todo o preço pago à ré, mas apenas do correspondente ao valor das tampas.
A este propósito, o artigo 292.º do Código Civil consagra, como regra, a redução dos negócios jurídicos, dispondo que a nulidade ou anulação parcial não determina a invalidade de todo o negócio.
Na situação dos autos, a obrigação da ré de fornecer as tampas (e respetivas tômbolas) isentas de vícios é cindível das demais obrigações – de fornecer os restantes equipamentos e de instalar as estruturas metálicas e respetivos contentores nos diversos pontos da cidade de Aveiro. Por isso, deve admitir-se a redução do negócio, limitando os efeitos da resolução aos equipamentos que apresentavam defeito: as tampas.»
Perante o exposto, conclui-se que não merece, assim, acolhimento a pretensão da recorrente no sentido da improcedência total da acção.
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Em face do resultado do tratamento das questões analisadas, é de concluir, com excepção da alteração do ponto 51º da matéria de facto, pela não obtenção de provimento do recurso interposto pela R. e pela consequente confirmação da decisão recorrida.
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III - Por tudo o exposto, acorda-se em:
a) alterar a decisão proferida quanto à matéria de facto, nos seguintes termos:
1. alterar a redacção do ponto 51º do elenco dos factos provados, que passa a ser: “A autora, por carta registada com aviso de receção datada de 27 de agosto de 2018, remetida à ré, ao cuidado de AA, procedeu à resolução do contrato celebrado com a ré - cfr. carta junta como documento n.º 32 com a petição inicial, cujo teor dou por integralmente reproduzido.”;
b) no mais, negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
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Custas da apelação pela recorrente (art. 527º, nºs 1 e 2, do C.P.C.).
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Notifique.
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Sumário (da exclusiva responsabilidade da relatora - art. 663º, nº 7, do C.P.C.):
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datado e assinado electronicamente

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Porto 21/3/2024.
Isabel Ferreira
Carlos Portela
Isabel Silva