Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1116/18.2T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MÁRCIA PORTELA
Descritores: COMPRA E VENDA
IMÓVEL COM ÁREA INFERIOR Á MENCIONADA NA ESCRITURA DE COMPRA E VENDA
VENDA DE COISA DEFEITUOSA
QUALIDADES DA COISA VENDIDA
Nº do Documento: RP202005191116/18.2T8PRT.P1
Data do Acordão: 05/19/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A mera divergência de área do imóvel vendido relativamente ao que consta da matriz predial e da Conservatória não se reconduz, sem mais, ao regime da compra e venda de coisas defeituosas.
II - O regime estabelecido nos artigos 913.º e seg. do Código Civil pressupõe a existência de erro por parte do comprador.
III - A omissão da indicação da área do imóvel na escritura de compra e venda impede a redução do preço.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 1116/18.2T8PRT.P1


Acordam no Tribunal da Relação do Porto

1. Relatório
B… e C… intentaram acção declarativa com processo comum contra D…, Ld.ª, pedindo a sua condenação a pagar-lhes a quantia de € 40.000, a título de redução do preço, decorrente do facto de o imóvel que lhe adquiriram possuir uma área total efetiva inferior à área total declarada, quantia essa acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Contestou a R. excepcionando a caducidade do direito dos AA., por decurso do prazo a que alude o artigo 890.º CC, e ainda por impugnação.
Foi proferido despacho saneador, com fixação do valor da acção, do objecto do litígio e dos temas da prova.
Realizou-se audiência de julgamento, tendo sido proferida decisão que, julgando a acção procedente, condenou a R. a pagar aos AA. a quantia de € 40.000 (quarenta mil euros), acrescida de juros legais à taxa de 4% desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento.
Inconformada, apelou a R., apresentando as seguintes conclusões:
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2. Fundamentos de facto
A 1.ª instância considerou provados os seguintes factos:
1. Por escritura pública de 22NOV2016, os B… e C… adquiriram à D…, Ld.ª, a propriedade do prédio urbano composto por casa de rés-do-chão e andar, compreendendo dependência e logradouro, sito na rua …, n.ºs …/…, Porto, descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º 1753 da freguesia … e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo 2522, pelo preço global de € 110.000 (cento e dez mil euros) (artigo 1.º da petição inicial).
2. Os AA. chegaram a esta compra através de um anúncio posto na Internet e tal processo de negociação foi intermediado pela E…, Ld.ª, (artigo 2.º da petição inicial).
3. Em inícios do mês de NOV2016 entregou aos AA. cópia da caderneta e certidão prediais (artigo 3.º da petição inicial).
4. Da aludida escritura pública resulta que tal aquisição foi realizada para habitação própria e permanente (artigo 4.º da petição inicial).
5. Mercê da compra e, atento a necessidade de recuperação do imóvel, os AA. ordenaram um conjunto de diligências tendentes à realização de obras de urbanização do mesmo (artigo 5.º da petição inicial).
6. Porquanto, são um casal jovem, com dois filhos e que compraram o prédio, na expectativa de realizarem obras e de terem um logradouro que possibilitasse espaço para entretenimento com a sua família e amigos (resposta conjunta aos artigos 6.º e 7.º da petição inicial).
7. Sucede, porém, que na sequência das diligências a que se refere o ponto 5) e do levantamento topográfico efetuado em NOV2017, constatou-se que o aludido logradouro dispõe apenas de 162 m² (artigo 8.º da petição inicial).
8. Sendo que, e de acordo com o que consta da respetiva certidão predial e matricial, a área descoberta do imóvel deveria corresponder a 325 m² (artigo 9.º da petição inicial).
9. A área total efetiva corresponde a 286 m², com uma área descoberta de 162 m² e não à área total declarada de 471 m² com uma área descoberta de 325 m² (resposta conjunta e explicativa aos artigos 17.º e 18.º da petição inicial).
10. Soubessem os AA. da divergência a que se referem os pontos 7), 8) e 9) dos factos provados e não teriam contratado nos termos em que contrataram (artigo 10.º da petição inicial).
11. Não obstante, sempre adquiririam o prédio, mas por um preço inferior ao acordado (artigo 12.º da petição inicial).
12. Declararam os AA., na escritura a que se refere o ponto 1) dos factos provados que “reconhecem, na sua plenitude, as condições em que compraram o Imóvel, sendo que além de o aceitar no estado em que está, reconhecem ainda que o preço da presente compra e venda foi negociado tendo em conta esse mesmo estado atual do Imóvel que é do seu conhecimento, reconhecendo pois que a vendedora não tem qualquer responsabilidade pelo mesmo” (artigo 13.º da contestação).
13. O imóvel em questão fora adquirido previamente pela R. “no exercício da sua atividade, com o propósito exclusivo de permitir o reembolso da operação de crédito garantida pelo identificado prédio, contraída junto do F…, S.A.” (artigo 14.º da contestação).
14. Declararam ainda os AA., na referida escritura, ser do seu conhecimento “que a construção do Imóvel não foi efetuada pela D…/F…, S.A., nem sequer a seu pedido” (artigo 15.º da contestação).
15. Ficando igualmente consignado em tal instrumento que “o aludido imóvel não sofreu obras de alteração ou de ampliação” (artigo 16.º da contestação).
16. A presente ação foi proposta em 16JAN2018 (artigo 40.º da contestação).
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Factos não provados:
Não se provou que os AA. viviam em casa dos pais da AA. com os seus dois filhos (artigo 11.º da petição inicial) e que o imóvel foi entregue aos AA. no dia da celebração da escritura pública, ou seja, 22NOV2016 (artigo 39.º da contestação);
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Todos os restantes factos descritos nos articulados, bem como os aventados na instrução da causa, distintos dos considerados provados – discriminados entre os “factos provados” ou considerados na “motivação” (aqui quanto aos instrumentais) –, resultaram não provados.

3. Do mérito do recurso
O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações (artigo 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1 CPC), salvo questões do conhecimento oficioso não transitadas (artigos 608.º, n.º 2, in fine, e 635.º, n.º 5, CPC), consubstancia-se na seguintes questões:

— nulidade da sentença por omissão de pronúncia;
— impugnação da matéria de facto;
— caducidade;
— análise da pretensão dos apelados.

3.1. Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia

Arguiu a apelante a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), CPC, por não ter apreciado a questão da caducidade suscitada pela apelante na sua contestação.
Este artigo, nos termos do qual a sentença é nula, designadamente, quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, tem de ser equacionado com o artigo 608.º, n.º 2, CPC, 1ª parte, CPC, que impõe que o juiz resolva todas as questões que as partes tenham posto à sua apreciação exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

Por «questões» entende-se «os pedidos deduzidos, toda as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cumpre [ao juiz] conhecer (art.660-2)» (Lebre de Freitas, Montalvão Machado, e Rui Pinto, Código de Processo Civil
Anotado, Coimbra Editora, vol. II, 2ª edição, pg. 704).

Apreciando:
Não assiste razão à apelante, porquanto o Tribunal recorrido preferiu despacho datado de 05.11.2019, nos termos seguintes:
Tendo sido invocada nulidade, pela Ré recorrente, cumpre, antes de mais, tomar posição a esse respeito (cfr. o artigo 617º, nº 1 do Código de Processo Civil):
Assiste razão à Ré, mas em parte, conforme se passa a expor:
Por lapso decorrente do uso de processador de texto, pelo qual nos penitenciamos, não ficou a constar do texto (definitivo) da sentença proferida um parágrafo onde se apreciou e decidiu a questão da caducidade, que a Ré havia invocado em sede de contestação.
Aliás, logo no próprio relatório da sentença se fez menção à caducidade invocada.
Assim e suprindo a nulidade invocada pela Ré recorrente, deverá passar a constar da sentença proferida, logo a seguir ao último parágrafo de folhas 233, o trecho que se segue:
“Finalmente, no que toca à caducidade do direito dos Autores, por decurso do prazo a que alude o artigo 890º do Código Civil, invocada pela Ré, dir-se-á o seguinte:
A Ré, em defesa da sua tese, convoca o regime do artigo 890º do Código Civil, o qual, com a epígrafe “Caducidade do direito à diferença de preço”, reza da seguinte forma:
O direito ao recebimento da diferença de preço caduca dentro de seis meses ou um ano após a entrega da coisa, consoante esta for móvel ou imóvel; mas, se a diferença só se tornar exigível em momento posterior à entrega, o prazo contar-se-á a partir desse momento”.
Ora, a mera conjugação dos pontos 7) [“Sucede, porém, que na sequência das diligências a que se refere o ponto 5) e do levantamento topográfico efetuado em NOV20178, constatou-se que o aludido logradouro dispõe apenas de 162 m2”] e 16) dos factos provados [“A presente ação foi proposta em 16JAN2018”] permite a conclusão de que os Autores não deixaram passar o prazo em causa, pelo que, sem necessidade de mais considerandos, não assiste razão à Ré, pelo que não se verificou a caducidade invocada pela Ré.”.
Este despacho foi notificado às partes, que não se pronunciaram.
Saber se esta apreciação é ou não correcta nos termos em que a causa foi equacionada e decidida é matéria que diz respeito ao mérito do recurso.
Inexiste, pois, nulidade da sentença.
3.2. Da impugnação da matéria de facto
Pretende a apelante que os pontos 6 e 7 da matéria de facto provada sejam considerados não provados, e provados os artigos 23.º, 39.º, 69.º e 70.º da contestação.
É o seguinte o teor dos pontos da matéria de facto provada impugnados:

6. Porquanto, são um casal jovem, com dois filhos e que compraram o prédio, na expectativa de realizarem obras e de terem um logradouro que possibilitasse espaço para entretenimento com a sua família e amigos.
7. Sucede, porém, que na sequência das diligências a que se refere o ponto 5) e do levantamento topográfico efetuado em NOV2017, constatou-se que o aludido logradouro dispõe apenas de 162 m².
E os artigos da contestação cuja factualidade a apelante pretende que passe a constar da matéria de facto provada têm a seguinte redacção:
23.º- Ora, os AA. compraram um imóvel que visitaram, conheceram e examinaram, que se mostrava devidamente delimitado e murado tendo, em consequência, firmado a sua vontade de contratar pelas características visíveis do imóvel e outras que tenham levado em consideração tais como a respectiva localização e acessibilidades.
39.º - Ora, os AA. adquiriram o imóvel em 22.11.2016, que na mesma data lhes foi entregue, e desde então se encontram na respectiva posse.
69.º - O erro sobre a área do prédio adquirido pelos AA. não configura um erro essencial, porquanto sem ele, e conforme admitem os AA. sempre teriam celebrado o mesmo negócio mas com outras condições, no caso, de preço.
70.º - Ainda que tal elemento tivesse sido essencial para os AA., o que se não aceita, a verdade é que esta putativa essencialidade era desconhecida da R. que não tinha obrigação de a conhecer.
Foi a seguinte a fundamentação do Tribunal recorrido:
Quanto aos pontos 5), 6) e 7):
O Tribunal considerou favoravelmente o depoimento da testemunha G…, legal representante da sociedade E…, que se dedica à construção de imóveis. Confirmou que os Autores contrataram a E… no segundo semestre de 2016; articulados com H…, arquiteto igualmente contratado pelos Autores, a E… leva a cabo estudos com vista à realização de obras de adaptação do imóvel, no estado em que se encontra, para a finalidade pretendida pelos Autores; a E… submeteu à Câmara Municipal … pedido de licença de obra de edificação, junto aos autos a folhas 42 e seguintes; em finais de 2017 a E… procede a um levantamento topográfico, constatando-se pela primeira vez a discrepância de áreas, sendo ainda certo que nesta altura a Câmara Municipal … devolveu, pela razão apontada, o pedido de licenciamento; das conversas que manteve em seguida com os Autores, concluiu que, mesmo com uma área inferior, ainda assim adquiririam o imóvel, mas por um preço inferior, corroborando assim a realidade retratada nos pontos 10) e 12).
Depoimento coerente e convincente.
Apreciando:
Nenhuma das testemunhas inquiridas se referiu à matéria constante do ponto 6 da matéria de facto provada.
Pelo contrário, as testemunhas supra referidas esclareceram que a ideia dos compradores era fazer uma clínica no rés-do-chão e um apartamento T3 no 1.º andar.
Por essa razão, o ponto 6 da matéria de facto provada transita para o elenco dos factos não provados.
Relativamente ao ponto 7 da matéria de facto provada, a apelante questiona a data do levantamento topográfico.
Embora o Arquiteto H… tenha inicialmente afirmado que efectuou o levantamento topográfico em finais de 2017, instado pelo Ilustre Mandatário da apelante sobre essa afirmação declarou que tinha essa ideia mas poderia não estar certo.
Esta dúvida impede que se considere provada a data do levantamento topográfico.
Por essa razão o ponto 7 da matéria de facto provada passa a ter a seguinte redacção:
Na sequência das diligências a que se refere o ponto 5) e do levantamento topográfico efetuado constatou-se que o aludido logradouro dispõe apenas de 162 m².
Os artigos 23.º, 69.º e 70.º da contestação destinam-se a afastar a ideia de que os apelados estivessem em erro acerca das características do imóvel, e do seu desconhecimento da eventual essencialidade da área para os apelados .
Ora, os apelados não estruturaram a sua pretensão em torno de um erro na formação da vontade, mas simplesmente em função da diferença entre a área real do imóvel e a área constante da matriz predial e da Conservatória do Registo Predial.
Por essa razão trata-se de matéria irrelevante.
Finalmente, o artigo 39.º da contestação, reporta-se à data da entrega do imóvel, matéria que quedou não provada.
Sem razão, porém.
As testemunhas I… e J…, funcionários do Banco, referiram que, quando as chaves não são entregues antes, são-no no momento da escritura, o que, aliás, corresponde à normalidade das coisas. A primeira testemunha, que interveio na escritura, referiu não ter existido contrato-promessa, que a venda foi feita sem recurso a empréstimo.
Assim, adita-se ao elenco dos factos provados o seguinte facto, que transita dos factos não provados:
O imóvel foi entregue aos apelados em 22 de Novembro de 2016.
3.3. Da caducidade

Embora a apreciação da caducidade normalmente preceda o conhecimento de mérito, no caso vertente a norma aplicável depende do enquadramento legal da questão trazida aos autos: se se entender que se trata de compra e venda de coisa defeituosa, a norma aplicável é a do artigo 917.ºCC; se se entender que se trata de venda de coisa sujeita a medição, a norma que reclama aplicação é a do artigo 890.º CC.
Assim, a questão da caducidade apenas poderá ser apreciada depois de definido o regime legal aplicável.

3.4. Da pretensão da apelante
Os AA., ora apelados, pediram, ao abrigo do disposto no artigo 888.º CC, que lhes fosse reconhecido o direito à redução do preço pago pela aquisição do imóvel à apelante e, em consequência, a restituição proporcional do preço, no montante de € 40.000,00, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento.
O fundamento invocado foi a discrepância entre a área do imóvel resultante de levantamento topográfico que efectuaram na sequência da aquisição, e a que constava na Conservatória do Registo Predial e na matriz predial.
E que se soubessem da realidade fáctica do terreno sempre contratariam mas por um preço inferior ao acordado.
O Tribunal recorrido discorreu assim:
“Os factos provados mostram que os Autores, casal jovem e com dois filhos, compraram o prédio na expectativa de realizarem obras e de terem um logradouro que possibilitasse espaço para entretenimento com a sua família e amigos e que mercê da compra e, atento a necessidade de recuperação do imóvel, ordenaram um conjunto de diligências tendentes à realização de obras de urbanização do mesmo, vindo a constatar que a área total efetiva corresponde a 286 m2, com uma área descoberta de 162 m2 (logradouro) e não à área total declarada de 471 m2 com uma área descoberta de 325 m2 [pontos 5) a 9) dos factos provados].
Mais resultou provado que soubessem os Autores da divergência de áreas e não teriam contratado nos termos em que contrataram, isto é, sempre adquiririam o prédio, mas por um preço inferior ao acordado [pontos 10) e 11) dos factos provados].
Esta concreta situação fáctica revela que a redução da área do logradouro suposta pelos Autores no momento da compra retira aptidões ao imóvel que se repercutem não só no seu valor comercial, mas também nas potencialidades para proporcionar bem-estar e qualidade de vida aos Autores.
Como é bom de ver, um imóvel urbano com um logradouro de 162 m2 tem uma qualidade funcional distinta daquele com um logradouro de 325 m2. As condições funcionais da mesma habitação não são idênticas. A redução de área não é meramente quantitativa, assumindo também uma dimensão qualitativa.
Nesta perspetiva, a perda de qualidades do bem vendido, consubstanciada na perda de utilidades que o adquirente dela espera, cai na previsão do artigo 913º, nº 1 do Código Civil.
Estando em causa um vício que desvaloriza o bem vendido, como decorre dos factos provados e revelando estes que os Autores não teriam adquirido o imóvel pelo valor acordado (€ 110.000) se soubessem da discrepância de áreas [pontos 10) e 11) dos factos provados], a consequência será a redução do preço pago na medida da desvalorização verificada e demonstrada, nos termos do disposto no artigo 911º, conjugado com artigo 884º, nºs 1 e 2, ambos do Código Civil.
Não se coloca a hipótese, do ponto de vista dos Autores, da não aquisição do bem com a área real do logradouro (162 m2), pois não alegaram sequer tal facticidade, mas apenas que, conhecendo esta área, não o teriam comprado pelo preço que pagaram [pontos 10) e 11) dos factos provados).
Resta ainda dizer que o erro dos Autores quanto à área do logradouro não lhes é imputável, em face do que constava nos documentos emitidos por entidades oficiais – área total de 471 m2 com uma área descoberta de 325 m2 [pontos 5) a 9) dos factos provados].
Ora, como já se disse, constatou-se, posteriormente, que uma e outra, na realidade, são bem distintas, no caso concreto, para menos, ou seja, para uma área inferior.
Trata-se, por conseguinte, de erro relevante para efeitos de redução do preço negociado e pago, por excessivo.
No que toca agora a definir o valor a pagar pela Ré, julgamos ser possível estabelecer uma proporção direta e imediata entre a área do prédio e o preço pago, por forma a que se subtraia ao preço pago o valor equivalente à área em falta, da seguinte forma:
Assim, sendo de € 233,54 (duzentos e trinta e três euros e cinquenta e quatro cêntimos) o valor por metro quadrado, atento o preço pago, o valor da redução [471 m2 - 286 m2 = 185 m2] eve estabelecer-se em € 43.204,54 a quantia que a Ré deve restituir aos Autores – vide, neste preciso sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16JAN2014, acessível em www.dgsi.pt com o nº 296/09.2TBVRL.P2.S1 e cuja argumentação seguimos aqui de perto, por versar situação idêntica à dos autos.
No fundo, trata-se de uma redução do negócio, acompanhada necessariamente de uma redução proporcional do preço estipulado.
Uma vez que os Autores fixaram o pedido da causa em € 40.000 e em face da limitação a que alude o artigo 609º, nº 1 do Código de Processo Civil, será essa a medida da condenação da Ré, julgando-se assim procedente a ação.
Esta discrepância de áreas poderá ser questionada pela Ré, em sede própria, que não esta, contra quem adquiriu o imóvel que depois veio a vender aos Autores, acautelando assim os seus interesses”.
Insurge-se a apelante contra este enquadramento, por os apelados não terem alegado que a divergência da quantidade (diferença da área) impeça a cabal realização do fim a que se destina o imóvel, nem que o desvalorize.
Afirma que regime do artigo 911.º CC é um afloramento do regime do erro-vício na formação da vontade, o qual se traduz numa representação inexacta ou na ignorância de uma qualquer circunstância de facto ou direito que foi determinante na decisão de efectuar o negócio. Se estivesse esclarecido dessa circunstância de facto — se tivesse exacto conhecimento da realidade — o declarante não teria realizado qualquer negócio ou não teria realizado o negócio nos termos em que o celebrou.
E que o erro sobre a área do prédio não configura um erro essencial, porquanto sem ele, e conforme admitem os apelados, teriam celebrado o mesmo negócio mas com outro preço.
Acrescenta que, ainda que tal elemento fosse essencial para os apelados, o que não concede, essa alegada essencialidade era-lhe desconhecida, não tendo obrigação de a conhecer.
Apreciando:
O regime da compra e venda de coisas defeituosas consta dos artigos 913.º e ss. CC., e constitui a Secção VI do Capítulo I (Da compra e venda) do Título II (Dos contratos em especial) do Livro II (Direito das Obrigações).
É o seguinte o teor do artigo 913.º CC, sob a epígrafe Remissão:
1. Se a coisa vendida sofrer de vício que a desvalorize ou impeça a realização do fim a que é destinada, ou não tiver as qualidades asseguradas pelo vendedor ou necessárias para a realização daquele fim, observar-se-á, com as devidas adaptações, o prescrito na secção precedente, em tudo quanto não seja modificado pelas disposições dos artigos seguintes.
2. Quando do contrato não resulte o fim a que a coisa vendida se destina, atender-se-á à função normal das coisas da mesma categoria.
(…)

Por seu turno, o artigo 911.º CC, epigrafado Redução do preço, aplicável ex vi artigo 913.º do mesmo diploma, dispõe:
1. Se as circunstâncias mostrarem que, sem erro ou dolo, o comprador teria igualmente adquirido os bens, mas por preço inferior, apenas lhe caberá o direito à redução do preço, em harmonia com a desvalorização resultante dos ónus ou limitações, além da indemnização que no caso competir.
2. São aplicáveis à redução do preço os preceitos anteriores, com as necessárias adaptações.
A questão que se coloca é a de saber se, em alguma medida, a área do imóvel pode ser considerada como qualidade da coisa vendida para efeitos do artigo 913.º CC.
A questão não é pacífica na jurisprudência: o acórdão da Relação do Porto, de 13 de Fevereiro de 2006, Fonseca Ramos, CJ, 2006, I, 185, respondeu afirmativamente; em sentido contrário, o acórdão do STJ, de 21.06.2007, Salvador da Costa, www.dgsi.ptjstj, proc. n.º 07B1815.
Para responder à questão que colocamos — se a área do imóvel pode ser considerada como qualidade da coisa vendida para efeitos do artigo 913.º CC — socorremo-nos de Antunes Varela, Revista de Legislação e de Jurisprudência, Ano 119.º, pg. 344, em anotação a um acórdão do STJ, de 01 de Fevereiro de 1983, BMJ 324/552, em que estava em causa um contrato-promessa de compra e venda que tinha por objecto um lote de terreno com projecto aprovado pela Câmara Municipal para um prédio com a frente de 16 metros, lote esse que media 15,75m:
“….a nossa inclinação, em face da lei portuguesa, é no sentido de não considerar, em princípio, incluídas no conceito legal de qualidades da coisa vendida os fatores externos traduzidos no número, peso ou medição da coisa.
Os primeiros elementos que a doutrina e a jurisprudência alemãs integram geralmente no conceito (legal) de qualidades da coisa são as propriedades naturais ou intrínsecas da substância de que a coisa é formada (como a solidez, a flexibilidade, a dureza, a secura, a ductibilidade, a permeabilidade, a resistência ao frio e ao calor, a elasticidade, a leveza, etc.), bem como o estado ou situação em que a coisa se encontra (não usada ou em primeira mão; já usada ou em segunda mão; com muito ou pouco uso; desgastada ou não desgastada; nova ou antiga) ou a sua aptidão para determinado fim.
Outros elementos que a riquíssima jurisprudência alemã e italiana têm englobado no núcleo das qualidades da coisa dizem já respeito, não à constituição intrínseca da coisa, mas ao seu relacionamento com o meio exterior ou ambiente como certos fatores de valorização dela (casa de praia, casa na serra, casa junto ao lago, casa junto à estação do metro ou da estação de camionagem, etc.)”.
Na página seguinte acrescenta o mesmo autor:
Além disso, verifica-se que a lei civil portuguesa, ao regular discriminada e sucessivamente os diversos tipos de vicissitudes que podem ocorrer no quadro paradigmático da compra e venda, tratou separadamente das deficiências relativas à contagem, pesagem ou medição das coisas vendidas (arts. 887.º e segs.) e da falta das qualidades (asseguradas ou essenciais) da coisa … sinal de que não identificou o número, peso ou medição da coisa vendida com as qualidades da coisa alienada.
Este entendimento, que se nos afigura corresponder ao regime legal, foi acolhido no supra citado acórdão do STJ, proc. n.º 07B1815, onde se afirma:
Assim, no que concerne ao contrato de compra e venda de coisas, a lei regulou em separado as anomalias relativas à medida das coisas e os vícios das mesmas e o seu défice de qualidades, o que revela intenção de diferenciação de regimes.
Nessa conformidade, os vícios a que a lei se reporta são defeitos intrínsecos das coisas, e a falta de qualidades exprime a ausência de requisitos ou elementos intrínsecos, integrantes da sua essência ou substância, e não os elementos meramente extrínsecos, ou seja, os meramente acessórios ou incidentais
E o referido lote de terreno não está afectado nas suas propriedades naturais nem revela falta da qualidade que é própria da sua finalidade objectiva, ou seja, a construção ou edificação.
A sua área, que é o que está aqui em causa, sendo um elemento delimitador necessário à própria individualização, com reflexo no âmbito da extensão da edificação comportável, não é susceptível, pela sua natureza, de ser qualificada como qualidade intrínseca da realidade que envolve.
O conceito de qualidade a que alude o normativo do nº 1 do artigo 913º do Código Civil é, por isso, insusceptível de englobar o elemento extrínseco do terreno em que se traduz a sua dimensão ou área.
Em consequência, não pode manter-se, nesta parte, o enquadramento jurídico empreendido pelas instâncias, ou seja, de qualificar a causa de pedir no âmbito do regime do contrato de compra e venda de coisas defeituosas e de afastar o regime do erro invocado pelos recorridos.
Pelo exposto, não acompanhamos o enquadramento legal feito pela 1.ª instância, por entender que a mera divergência de área do imóvel vendido relativamente ao que consta da matriz predial e da Conservatória, sem mais, não ser passível de recondução ao regime da compra e venda de coisas defeituosas.
Como se lê no ponto 2 do sumário do acórdão do STJ, de 04.11.2011, Salazar Casanova, CJ STJ, 2011, II, 47, como está em causa uma divergência de ordem quantitativa, não são atendíveis factores de cariz qualitativo, que não forma considerados aquando da estipulação do preço do negócio.
Ainda que se entendesse ser aplicável o regime estabelecido nos artigos 913.º e ss. CC, não estariam verificados os respectivos pressupostos, como sustenta a apelante.
Desde logo, por que este regime pressupõe a existência de erro por parte do comprador.
Como destaca Miguel Teixeira de Sousa, O Cumprimento Defeituoso e a Compra e Venda de Coisas Defeituosas, AB VNO AD OMNES, 75 Anos da Coimbra Editora, pg. 567 e ss, o erro no regime da compra e venda de coisas defeituosas suscita dificuldades várias, havendo quem defenda que o erro sobre as qualidades da coisa não se reporta à fase da formação do contrato (erro em sentido técnico), mas sim à fase da execução do contrato, o que nos remete para o cumprimento defeituoso.
Menezes Leitão, Caveat Venditor? A Directiva 1999/44/CE, do Conselho e do Parlamento Europeu, sobre a venda de bens de consumo e garantias associadas, e suas implicações no regime jurídico da compra e venda, in Estudos em Homenagem ao Professor Galvão Telles, Almedina, vol. I, pg. 267-268, reconhecendo não ser a melhor solução de jure condendo, defende que a solução consagrada de jure condito exige um erro em sentido técnico.
Com efeito, a remissão do artigo 913.º CC para a secção anterior em tudo quanto não for contrariado nesta secção, inclui os artigos 905.º e 911.º CC, sendo a este último que a sentença recorrida fez apelo para decidir a questão posta pelos apelados.
De acordo com o artigo 905.º CC (Anulabilidade por erro ou dolo), Se o direito transmitido estiver sujeito a alguns ónus ou limitações que excedam os limites normais inerentes aos direitos da mesma categoria, o contrato é anulável por erro ou dolo, desde que no caso se verifiquem os requisitos legais da anulabilidade. (sublinhado nosso).
Também o artigo 911.º CC, ex vi artigo 913.º CC, alude ao erro: 1. Se as circunstâncias mostrarem que, sem erro ou dolo, o comprador teria igualmente adquirido os bens, mas por preço inferior, apenas lhe caberá o direito à redução do preço, em harmonia com a desvalorização resultante dos ónus ou limitações, além da indemnização que no caso competir.
Segundo Menezes Leitão, op. cit., pg. 266,
….uma vez que o comprador tomou a decisão de adquirir aquela coisa em concreto, a existência de defeitos na coisa só pode consistir numa situação de erro por parte do comprador (simples ou qualificado por dolo), pelo que, por força da remissão do art. 913.º para o art. 905.º, haverá que aplicar o regime da anulação dos negócios jurídicos (o que exige a demonstração da essencialidade do erro na formação da vontade negocial).
Ora, no caso dos autos não foi alegada qualquer situação de erro: os apelados pretenderam adquirir aquele prédio que lhes foi apresentado, com a delimitação física que apresentava à data da celebração do contrato, sem qualquer alusão a medidas ou referência a projectos para o local.
Do mesmo modo, nada foi alegado quanto à impossibilidade de utilizar o prédio para o fim que fora adquirido (fosse o lazer familiar, fosse a construção), nem que a (hipotética) essencialidade da área fosse do conhecimento da apelante, ou que esta não a devesse ignorar (artigo 247.º CC, in fine).
A inexistência de erro sempre impediria a aplicação do regime consagrado no artigo 913.º CC.
Refira-se que a sentença recorrida faz afirmações que não se acomodam à matéria de facto provada.
Assim, não se pode falar em “redução da área do logradouro suposta pelos Autores no momento da compra retira aptidões ao imóvel que se repercutem não só no seu valor comercial, mas também nas potencialidades para proporcionar bem-estar e qualidade de vida aos Autores”.
Com efeito, a área física do logradouro manteve-se a mesma, o que se alterou foi a sua expressão numérica — o logradouro não sofreu qualquer amputação de terreno.
Trata-se de uma situação completamente diversa da versada no acórdão n.º 296/09.2TBVRL.P2.S1 em que a sentença recorrida declaradamente se inspirou.
Ali tratava-se de uma situação de verdadeiro erro, por que foi vendido um prédio com um logradouro de 1.000 m², quando se veio a apurar que 537 m² pertenciam a um prédio de terceira pessoa (venda parcial de coisa alheia). O logradouro ficou efectivamente reduzido a menos de metade.
Situação semelhante foi objecto do acórdão do STJ, de 14.07.2016, Fernanda Isabel Pereira, www.dgsi.ptjstj, proc. n.º 1047/12.0TVPRT.P1.S1: fora vendido um prédio com um logradouro com 280 m², quando uma parcela com a área de 180 m²pertencia ao Município … (venda parcial de coisa alheia), ficando reduzido a pouco mais de um terço.
O caso dos autos seria idêntico a estes se tivesse sido adquirido um logradouro com a área de 325 m² e se verificasse que, desse terreno, 163 m²(cerca de metade) pertenciam a terceiro.
No entanto, o que se verifica é uma mera desconformidade entre a área constante da matriz predial e da certidão da Conservatória do Registo Predial e a área resultante do levantamento topográfico — o prédio manteve-se fisicamente inalterado; o que se alterou foi apenas a expressão numérica da sua área.
Nessa conformidade, aplica-se o regime constante dos artigos 887.º e ss. CC, recordando-se que os apelados invocaram como fundamento da sua pretensão o artigo 888.º CC.
É o seguinte o regime legal:
SECÇÃO III
Venda de coisas sujeitas a contagem, pesagem ou medição
Artigo 887.º
(Coisas determinadas. Preço fixado por unidade)
Na venda de coisas determinadas, com preço fixado à razão de tanto por unidade, é devido o preço proporcional ao número, peso ou medida real das coisas vendidas, sem embargo de no contrato se declarar quantidade diferente.
Artigo 888.º
(Coisas determinadas. Preço não fixado por unidade)
1. Se na venda de coisas determinadas o preço não for estabelecido à razão de tanto por unidade, o comprador deve o preço declarado, mesmo que no contrato se indique o número, peso ou medida das coisas vendidas e a indicação não corresponda à realidade.
2. Se, porém, a quantidade efectiva diferir da declarada em mais de um vigésimo desta, o preço sofrerá redução ou aumento proporcional.
(…)
Em primeiro lugar, importa determinar os contornos do acordo negocial subjacente à transacção em causa nos autos, ou seja, se tratou de uma compra e venda ad mesuram, ou, pelo contrário, uma compra e venda ad corpus.
Sem margem para qualquer discussão, estamos perante uma venda ad corpus: os apelados pretenderam adquirir aquele prédio que lhes foi apresentado, com a delimitação física que tinha à data da celebração do contrato, sem qualquer alusão a medidas, tendo o preço sido fixado de forma unitária, e não por referência a unidades de medida (“tanto por m²”).
O artigo 888.º, n.º 1, CC, estabelece, para estes casos, que o comprador deve o preço declarado, mesmo que no contrato se indique o número, peso ou medida das coisas vendidas e a indicação não corresponda à realidade.
Contrariamente ao que sucede na venda de coisa genérica, tratando-se de coisa específica a indicação da quantidade não é necessária para a identificação do objecto do contrato, bastando a individualização da coisa.
No entanto podem as partes indicar quantidades no contrato, e frequentemente o fazem na compra e venda de imóveis, o que implicará uma operação de medição, donde poderá resultar uma discrepância, com eventuais consequências a nível do preço (cfr. Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Almedina, vol. III, 5.ª edição, pg. 75-6).
Enquanto na venda ad mesuram a regra é a redução (ou aumento) proporcional do preço — artigo 887.º CC— , na venda ad corpus a redução (ou aumento) é excepcional: apenas é devida se a diferença entre a medida efectiva diferir da declarada em mais de 5% (1/20). — artigo 888.º, n.º 2, CC.
A diferença apurada nos autos é superior a 5%. Daqui não resulta, porém, que assista aos apelados o direito à redução do preço.
Na verdade, o funcionamento do regime estabelecido no artigo 888.º CC pressupõe que da escritura pública conste a área do terreno: “Se, porém, a quantidade efectiva diferir da declarada em mais de um vigésimo…”
O que não sucede no caso dos autos.
Neste sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Coimbra Editora, vol. II, 3.ª edição, pg. 185; acórdão do STJ, de 26.04.2007, Gil Roque, www.dgsi.prjstj, proc. n.º 07B968; acórdão da Relação de Lisboa, de 29.03.2011, Luís Lameiras, www.dgsi.ptjtrl, proc. n.º 975/08.1TBCLD.L1-7.
É certo que o acórdão da Relação do Porto, de 20.04.2010, Eduardo Pires, CJ, 2010, tomo II, 198, considerou que o contrato indica a área por referência aos documentos que instruíram a escritura pública.
No entanto, afigura-se que a lei pressupõe uma declaração expressa, pois apenas esta permite inferir que a quantidade — área — foi relevante para a formação da vontade e justifica a redução do preço.
Recorde-se que estamos perante um negócio formal, cuja interpretação obedece ao disposto no artigo 238.º, n.º 1, CC: Nos negócios formais não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso.
Assim, a omissão da indicação da área do imóvel na escritura de compra e venda impede a redução do preço.
Nesta conformidade, procede a apelação.
A procedência da apelação prejudica o conhecimento da caducidade.

4. Decisão
Termos em que, julgando a apelação procedente, revoga-se a decisão recorrida, julgando improcedente o pedido formulado pelos apelados.
Custas pelos apelados (artigo 527.º, n.º 2, CPC).

Porto, 19 de Maio de 2020
Márcia Portela
José Igreja Matos
Rui Moreira