Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2083/07.3TTLSB.L1-4
Relator: MARIA JOSÉ COSTA PINTO
Descritores: RESPONSABILIDADE
FUNDO DE ACIDENTES DE TRABALHO
DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/28/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: I – O sinistrado não pode renunciar aos créditos emergentes do acidente de trabalho, carecendo de qualquer eficácia uma declaração nesse sentido, mas pode emitir uma declaração de quitação relativamente a tais créditos, na medida em que a quitação pressupõe o cumprimento da prestação debitória.
II – A circunstância de os sócios da sociedade empregadora – nos quais se inclui o sinistrado de acidente de trabalho sofrido ao serviço da mesma – declararem na escritura de dissolução da sociedade que esta “não tem activo nem passivo”, não implica por si só o reconhecimento por parte do sinistrado de que a sua empregadora não lhe deve qualquer quantia por força daquele acidente.
III – Impedem a fixação de tal sentido interpretativo as circunstâncias de, por um lado, não estar ainda definido no momento da escritura, nem judicial, nem extra-judicialmente, que à sociedade cabia uma parcela de responsabilidade pelo ressarcimento do referido acidente de trabalho e, por outro, de a sociedade empregadora considerar, à data, que nada devia ao sinistrado por ter toda a sua responsabilidade emergente de acidente de trabalho transferida para uma companhia de seguros.
(Elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:
П

1. Relatório
1.1. Nos presentes autos de processo especial emergente de acidente de trabalho, é autor o sinistrado AA e são réus:
· BB - Companhia de Seguros, S.A.,
· AA e CC, ambos na qualidade de sócios da sociedade empregadora do sinistrado, DD – Sociedade de Construção Civil, Lda. (a qual foi entretanto dissolvida e liquidada) e
· Fundo de Acidentes de Trabalho (FAT).
Na tentativa de conciliação a que alude o art. 108.º do Código do Processo de Trabalho, realizada em 2008.02.07, o sinistrado, a seguradora e o empregador DD – Sociedade de Construção Civil, Lda aceitaram a existência e caracterização do acidente dos autos como acidente de trabalho, as lesões sofridas pelo sinistrado bem como o nexo de causalidade entre estas e o acidente. O acordo não foi logrado por o sinistrado não aceitar a avaliação da sua incapacidade pelo perito médico que interveio na fase conciliatória, considerando estar afectado de incapacidade superior, por a seguradora aceitar o acordo proposto pelo MP, mas apenas com referência a uma retribuição anual de € 6.743,80 e por o empregador não aceitar qualquer responsabilidade, por entender que o contrato de seguro que celebrou com a ré/seguradora cobria a totalidade da retribuição anual auferida pelo autor/sinistrado que era de € 8.211,20, não aceitando igualmente a avaliação da incapacidade feita pelo referido perito médico.
O sinistrado deu início à fase contenciosa do processo em 2008.07.10, demandando a BB - Companhia de Seguros, S.A. e a DD – Sociedade de Construção Civil, Lda.
Alegou na sua petição inicial, em síntese: que sofreu um acidente de trabalho em 2006.09.04, em consequência do qual sofreu lesões que lhe determinaram incapacidades temporárias, bem como a incapacidade permanente parcial atribuída pelo perito médico que interveio na fase conciliatória, a qual agora aceita, e que à data do acidente auferia uma retribuição de € 8.211,20.
Terminou pedindo a condenação das RR, a pagar-lhe o capital de remição da pensão decorrente da incapacidade de que é portador, na proporção das respectivas responsabilidades, e bem assim que a R. empregadora seja condenada a pagar-lhe a quantia correspondente às diferenças de indemnizações por incapacidades temporárias.
A R. seguradora apresentou a contestação de fls. 76 e ss., na qual reiterou a posição assumida na tentativa de conciliação.
Apurando-se que a R DD-Sociedade de Construção Civil, Lda. foi dissolvida e liquidada por deliberação da sua Assembleia Geral de 2008.06.30, foi CC –, nos termos previstos no art. 162º e 163°, n°s 1 e 2 do Código das Sociedades Comerciais, assumindo estes a posição processual da R. empregadora. No mesmo despacho foi determinado o prosseguimento da acção contra o Fundo de Acidentes de Trabalho, “prevendo a eventualidade de na sentença final, se vir a entender que a empregadora é responsável pelas prestações decorrentes de acidente de trabalho sofrido pelo sinistrado e que os sócios nada receberam na sequência da partilha dos bens daquela (arts. 39° da Lei n° 100/97, de 13/09, e 1°, no 1, a) do D.L. 142/99 de 30/04, e 27°, al. a) do CPT)” – vide o despacho de fls. 174.
Citados os chamados, apenas o FAT veio a contestar, sustentando que os sócios da empregadora devem ser responsabilizados pelo pagamento das prestações decorrentes do presente acidente, em substituição da sociedade extinta e que o sócio sinistrado ao declarar que a empresa não tem qualquer passivo, necessariamente reconhece que já não lhe deve qualquer quantia, nomeadamente a emergente do acidente de trabalho em causa, pelo que a 2.ª R. já nada deve ao sinistrado e que, a não ser assim, foram prestadas falsas declarações aquando da dissolução da R., devendo o liquidatário responder nos termos do artigo 158.º do CSC e não devendo o FAT assumir a responsabilidade pela reparação.
Foi proferido despacho saneador, com selecção dos factos assentes e controvertidos, e o FAT deduziu reclamação, que foi parcialmente atendida.
Realizado o julgamento e decidida a matéria de facto sem reclamação (fls. 253 e ss.), foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo:
“Por todo o exposto, e em consequência, decide este Tribunal:
A- Fixar as incapacidades de que o autor/sinistrado AA esteve afectado em consequência do acidente de trabalho dos autos (ocorrido em 04/09/2006) em:
− Incapacidade Temporária Absoluta (ITA) desde 05/09/2006 até 11/05/2007;
− Incapacidade Temporária Parcial (ITP) de 20% desde 12/05/2007 até
17/05/2007;
− Incapacidade Permanente Parcial (IPP) de 6,9% desde 17/05/2007 (data da alta).
B- Condenar a ré/seguradora Companhia de Seguros BB, S.A. a pagar ao autor/sinistrado:
1- O capital de remição de uma pensão de € 325,73 (trezentos e vinte e cinco Euros, e setenta e três cêntimos), com início em 18/05/2007;
2- Juros de mora sobre a quantia referida em 1-, contados à taxa legal de 4% ao ano e correspondentes taxas legais subsequentemente em vigor, desde a data ali referida até integral pagamento;
3- A quantia de € 8 (oito Euros), a título de reembolso de despesas com
transportes.
C- Condenar o Fundo de Acidentes de Trabalho a pagar ao autor/sinistrado as seguintes quantias:
1- € 713,98 (setecentos e treze Euros e noventa e oito cêntimos), a título de indemnizações por incapacidades temporárias;
2- O capital de remição de uma pensão de € 70,88 (setenta Euros e oitenta e oito cêntimos), com início em 18/05/2007.
D- Absolver os réus AA e CC de todos os pedidos.»

1.2. O FAT, inconformado, interpôs recurso desta decisão, tendo arguido a nulidade da sentença por omissão de pronúncia nos termos do artigo 668.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil, no requerimento de interposição de recurso.
Formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões:
(...)
1.3. O A., ainda patrocinado pelo Ministério Público, respondeu pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida. Concluiu do seguinte modo:
(…)
1.4. O recurso foi admitido por despacho de fls. 296, no qual o Mmo Juiz a quo se pronunciou no sentido de que se não verifica a invocada nulidade e acrescentou que, caso assim se não entenda, bastará atentar na natureza indisponível dos direitos do sinistrado para concluir que a argumentação do FAT carece de fundamento.
1.5. O A. constituiu mandatário (vide a procuração de fls. 302), cessando o patrocínio do Ministério Público.
1.6. Subido o recurso a este Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta teve vista dos autos.
Colhidos os “vistos” e realizada a Conferência, cumpre decidir.
*
2. Objecto do recurso
Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente – artigo 684.º, n.º 3 do Código de Processo Civil aplicável “ex vi” do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho – duas questões se colocam à apreciação deste tribunal:
1.ª – a da invocada omissão de pronúncia;
2.ª – a de saber se o FAT deve ser responsabilizado pelo pagamento das prestações devidas pelo empregador ao sinistrado AA.
*
3. Fundamentação de facto
Os factos materiais relevantes para a decisão da causa foram fixados pela sentença recorrida nos seguintes termos:
«[...]
1- A DD – Sociedade de Construção Civil, Lda (adiante designada “Empregadora”) dedicava-se à actividade de construção, reparação, e demolição de edifícios.
2- No dia 04/09/2006, cerca das 14h00m o autor, AA (adiante designado “autor”) trabalhava [como] sob as ordens, orientação e autoridade da empregadora, como carpinteiro, e mediante contrapartida em dinheiro.
3- Na ocasião referida em 1- o autor encontrava-se a exercer as funções ali referidas, numa obra a cargo da empregadora, em ....
4- Na ocasião e local referidos em 2- e 3-, quando trabalhava com um tubo de ventilação de ar, o autor caiu de um andaime para o chão.
5- Em consequência da queda referida em 4-, e o autor sofreu as lesões físicas documentadas a fls. 22-23, nomeadamente traumatismo do ombro direito e coluna lombar, com fractura do corpo de L2.
6- Em consequência dos factos descritos em 4- e 5-, e das sequelas decorrentes das lesões referidas em 5- o autor ficou afectado de:
− “Incapacidade Temporária Absoluta”, desde 05/09/2006 a 11/05/2007;
− “Incapacidade Temporária Parcial” de 20%, desde 12/05/2007 até 17/05/2007;
− “Incapacidade Permanente Parcial” desde 17/05/2007 (data da alta).
7- A empregadora e a ré BB- Companhia de Seguros, S.A. (adiante designada “ré/seguradora”), celebraram entre si um acordo escrito, que vigorou pelo menos a partir desde 07/09/2000, titulado pela apólice ....
8- Nos termos do acordo escrito mencionado em 7-, a Empregadora transferiu para a ré/seguradora o risco da ocorrência de “acidentes de trabalho” sofridos por trabalhadores ao seu serviço, até determinado limite.
9- A ré/seguradora entregou ao autor a quantia global de € 3.280,84, a título de “indemnizações por incapacidades temporárias”.
10- Do registo comercial da empregadora constam as seguintes inscrições:
“Insc. 3 AP. 31/20080104 15:59:29 UTC – ALTERAÇÕES AO CONTRATO DE SOCIEDADE
SÓCIOS E QUOTAS:
QUOTA : 3.500,00 Euros
TITULAR: AA
QUOTA: 1.500,00 Euros
TITULAR: CC
(…)
Insc. 4 AP. 13/20080707 12:01:32 UTC – DISSOLUÇÃO E ENCERRAMENTO DA LIQUIDAÇÃO
Data da aprovação das contas: 2008-06-30
(…)
Nome do depositário: AA
(…)
Insc. 5 OF. 20080708 – CANCELAMENTO DA MATRÍCULA
(…)”
11- A inscrição de dissolução da empregadora, mencionada em 10- foi instruída com cópia da “ACTA nº. 10”, que se acha a fls. 158-159, datada de 30/06/2008, e onde consta nomeadamente, que aquela sociedade “já não exerce qualquer actividade, e não tem activo nem passivo, tendo o respectivo património sido absorvido na actividade desenvolvida”.
12- À data referida em 2-, o autor auferia:
− € 507,00 mensais, a título de “vencimento”;
− Montantes iguais ao referido em a), a título de “subsídio de férias” e de “subsídio de Natal”;
− € 101,20 por cada dia mês de trabalho efectivamente prestado, a título de “subsídio de alimentação” …
− … perfazendo um total anual de € 8.211,20 [(€ 507 x 14) + (€ 101,20 x 11)]
13- À data referida em 2- o acordo referido em 7- garantia, relativamente ao autor, uma remuneração anual de € 6.743,80 (€ 481,70 x 14).
[...]».
Estes os factos a atender para resolver as questões postas no recurso uma vez que no caso sub judice não foi impugnada a matéria de facto e não ocorre qualquer das situações que autorizam o Tribunal da Relação a alterá-la oficiosamente ou a determinar a sua ampliação (cfr. o artigo 712.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 87.º, n.º 1 do Código de Processo do Trabalho).
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4. Fundamentação de direito
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4.1. As questões a analisar nos presentes autos deverão sê-lo à luz do regime jurídico dos acidentes de trabalho constante da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, uma vez que o acidente sub judice ocorreu em 4 de Setembro de 2006, no âmbito da sua vigência.
Ao caso é igualmente aplicável a regulamentação da Lei dos Acidentes do Trabalho de 1997, inserida no Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril.
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4.2. O recorrente arguiu a nulidade da sentença no requerimento de interposição de recurso, anunciando sinteticamente que procedia a tal arguição nos termos do preceituado no artigo 668.º, n.º 1, alínea d) por falta de pronúncia do Mmo. Juiz sobre questões que devia apreciar.
No início da sua alegação explicita as razões por que considera verificar-se aquela nulidade, enunciando conclusões especificamente respeitantes a tal matéria.
Por força do estatuído no art. 77.º do Código de Processo de Trabalho, a arguição de nulidades da sentença deve ser feita expressa e separadamente no requerimento de interposição do recurso, sob pena de delas se não conhecer. Este normativo pressupõe que o anúncio da arguição e a corresponde motivação das nulidades devem constar do requerimento de interposição do recurso que é dirigido ao órgão judicial “a quo”, permitindo ao juiz recorrido aperceber-se, de forma mais rápida e clara, da censura produzida e possibilitando-lhe o eventual suprimento das nulidades invocadas.
No requerimento de interposição de recurso o recorrente limita-se a arguir genericamente a nulidade da sentença com indicação do preceito em que entende dever a mesma subsumir-se, sem que indique, mesmo resumidamente, as razões de tal arguição.
Tem, contudo, a jurisprudência admitido que aquela exigência se mostrará cumprida, no caso de o requerimento e a alegação constituírem peça única, com a exposição dos motivos determinantes das nulidades feita na alegação, imediatamente a seguir ao requerimento stricto sensu, de forma perfeitamente clara e autónoma – vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2007.10.31, Recurso n.º 1442/07, de 2008.03.12, Recurso n.º 3527/07, sumariados in www.stj.pt, em consonância com o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 304/05, de 8 de Junho de 2005, in Diário da República, II Série, n.º 150, de 5 de Agosto de 2005 (também em www.tribunalconstitucional.pt), que julgou inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade a norma constante do art. 77.º do CPT/99 “na interpretação segundo a qual o tribunal superior não pode conhecer das nulidades da sentença que o recorrente invocou numa peça única, contendo a declaração de interposição de recurso com referência a que se apresenta a arguição de nulidades da sentença e alegações e, expressa e separadamente, a concretização das nulidades e as alegações, apenas porque o recorrente inseriu tal concretização após o endereço do tribunal superior”.
É o que sucede no caso sub judice, uma vez que o recorrente dedica a primeira parte da alegação à substanciação das razões por que considera verificar-se a nulidade, enunciando conclusões a ela especificamente respeitantes, razão pela qual se irá tomar conhecimento da arguição.
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4.3. Invoca o recorrente que a decisão recorrida está ferida de nulidade, nos termos da alínea d), do n.º 1, do artigo 668º do Código de Processo Civil, pois o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a questão por si suscitada na contestação de estar o sinistrado (sócio da empregadora) ressarcido dos danos emergentes do acidente uma vez que na acta em que foi decidida a dissolução os sócios declararam não ter a sociedade activo nem passivo.
Compulsando a contestação de fls. 193 e ss., verifica-se que nela o FAT invoca a responsabilidade dos sócios do empregador pelas consequências do sinistro, apesar da dissolução e liquidação nos termos do artigo 162.º do CSC e, além disso, alega que, ao terem os sócios declarado não haver activo nem passivo a liquidar, e sendo um dos sócios o próprio sinistrado, este reconheceu então que a sociedade não lhe deve qualquer quantia emergente do acidente de trabalho dos autos e, a não ser assim, foram prestadas falsas declarações e o liquidatário deve responder pelo passivo nos termos do artigo 158.º do CSC.
A nulidade por omissão de pronúncia, a que se refere o artigo 668.º, n.º 1, alínea d), 1.ª parte, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho, consiste no incumprimento do dever que ao juiz incumbe de, na sentença, resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, bem como aquelas cujo conhecimento oficioso lhe seja imposto por lei (artigo 660.º, n.º 2 do mesmo CPC).
Analisada a sentença, verifica-se que a Mmo. Julgador a quo abordou na mesma a questão da responsabilidade dos sócios da sociedade liquidada, concluindo que a mesma se não verifica em face do que prescrevem os artigos 146.º, 162.º, n.º 1 e 163.º, n.º 1 do CSC e por se não ter feito prova de que na partilha receberam bens desta (conforme a resposta ao quesito 4.º da base instrutória).
Mas não enfrentou concretamente a questão do reconhecimento pelo sinistrado de que a sociedade não lhe deve qualquer quantia e da responsabilidade dos liquidatários nos termos do artigo 158.º do CSC, sendo evidente a falta de pronúncia sobre estas questões suscitadas pelo recorrente na sua contestação, o que implica, ao abrigo dos artigos 77.º, n.º 1, do Código de Processo de Trabalho, 666.º, n.º 2 e 668.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil a nulidade da sentença recorrida, nessa parte.
É assim de considerar verificada a arguida nulidade, procedendo a 1.ª questão suscitada no recurso (conclusões 1.ª a 3.ª).
*
4.4. Consequentemente cabe a este tribunal, nos termos do artigo 715.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, conhecer das questões que deixaram de ser conhecidas pelo tribunal recorrido, uma vez que os autos fornecem para tanto todos os elementos necessários.
Afigura-se-nos desnecessário ouvir de novo as partes, nos termos previstos no n.º 3 daquele artigo 715.º, dado que a omitida apreciação se reporta, precisamente, à segunda questão colocada no recurso, que é discutida nas conclusões 4.ª a 10.ª da apelação e nas contra-alegações do A. As partes tiveram, pois, ampla oportunidade de sobre tal matéria se pronunciarem, pelo que a decisão a proferir nunca constituirá decisão-surpresa, sendo a consequência natural do conhecimento cabal do objecto do recurso.
Passamos, assim, a enfrentar a segunda questão enunciada.
*
4.5. No âmbito do regime jurídico dos acidente de trabalho aplicável ao acidente sub judice, o art. 39º da Lei nº 100/97 de 13 de Setembro prevê a criação de uma entidade com autonomia administrativa e financeira destinada a assumir e suportar o “pagamento das pensões por incapacidade permanente ou morte e das indemnizações por incapacidade temporária” estabelecidas nos termos daquela lei “que não possam ser pagas pela entidade responsável por motivo de incapacidade económica objectivamente caracterizada em processo judicial de falência ou processo equivalente, ou processo de recuperação de empresa ou por motivo de ausência, desaparecimento ou impossibilidade de identificação”.
Por outro lado, nos termos do preceituado no artigo 1º, n.º 1, al. a), do Decreto-Lei n.º 142/99 de 30 de Abril, diploma que criou o Fundo de Acidentes de Trabalho (F.A.T.) anunciado naquela lei, constitui competência desta entidade:
Garantir o pagamento das prestações que forem devidas por acidentes de trabalho sempre que, por motivo de incapacidade económica objectivamente caracterizada em processo judicial de falência ou processo equivalente, ou processo de recuperação de empresa, ou por motivo de ausência, desaparecimento ou impossibilidade de identificação, não possam ser pagas pela entidade responsável.”
Confrontada com a situação da dissolução e posterior liquidação da sociedade empregadora “DD – Sociedade de Construção Civil, Lda.” (factos n.ºs 10. e 11.), a sentença recorrida analisou a questão da eventual responsabilidade pessoal dos sócios pelo pagamento das anteriores dívidas da sociedade, concluindo que a mesma se não verifica.
E, para sustentar a responsabilidade do Fundo de Acidentes de Trabalho, discorreu nos seguintes termos (excluem-se as notas de rodapé):
«[…]
4 – DA RESPONSABILIDADE DO FUNDO DE ACIDENTES DE TRABALHO
Estabelece o art. 39º, nº 1 da LAT que “A garantia do pagamento das prestações por incapacidade permanente ou morte, e das indemnizações por incapacidade temporária estabelecidas nos termos da presente lei que não possam ser pagas pela entidade responsável por motivo de incapacidade económica objectivada em processo judicial de falência ou processo equivalente, ou processo de recuperação de empresa, ou por motivo de ausência, desaparecimento, ou impossibilidade de identificação, serão assumidas e suportadas por fundo dotado de autonomia a criar
por lei, no âmbito dos acidentes de trabalho, nos termos a regular”.
Desta disposição legal decorre claramente que sempre que ocorra o desaparecimento da entidade empregadora, pode o fundo ali identificado – e que é o Fundo de Acidentes de Trabalho11 - ser accionado nos termos da referida disposição legal. Nestes casos, não tem a insuficiência económica da entidade empregadora que ser comprovada por processo de insolvência.
No caso que nos ocupa, verifica-se que os sócios da DD, Lda procederam à sua dissolução, e posteriormente levaram a cabo a inscrição no registo comercial do encerramento da dissolução.
Como já referimos, nos termos do disposto no art. 160º, nº 2 do Código das Sociedades Comerciais, o registo do encerramento da liquidação subsequente a dissolução de uma sociedade comercial tem por efeito a extinção da mesma. O conceito de “desaparecimento” que consta do art. 39º da LAT, acima transcrito abrange seguramente todas as situações de extinção de sociedades comerciais.
Assim sendo, conclui-se que no caso em apreço se verifica a situação prevista no art. 39º da LAT, pelo que deve o FAT pagar as prestações pecuniárias da responsabilidade da empregadora, e que adiante serão objecto de cálculo.
Não obstante, o FAT não responde pelo pagamento de juros de mora devidos pela entidade empregadora (art. 2º, nº 6 do citado DL 143/99, alterado pelo DL 187/2007).
Pagando as quantias ao autor/sinistrado as quantias que competia à empregadora suportar, ficará o FAT sub-rogado nos correspondentes direitos e privilégios creditórios (art. 5º-B, nº 1 do mesmo diploma).
[…]»
Não está em causa no recurso a questão de saber se a situação da extinção da pessoa colectiva se mostra compreendida na hipótese do “desaparecimento” da entidade responsável, tal como o mesmo foi enunciado nos artigos 39.º da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro e 1.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 142/99 (questão que não é pacífica na jurisprudência).
A sentença recorrida configurou a dissolução e posterior liquidação da pessoa colectiva – a sociedade empregadora “DD, Lda.” – como um efectivo desaparecimento e o recorrente não o questionou no recurso, pelo que incumbe acatar tal entendimento decisório (cfr. o artigo 684.º, n.º 4 do Código de Processo Civil).
As questões colocadas pelo recorrente FAT para sustentar que não deve assumir a responsabilidade pela reparação situam-se num outro plano.
*
4.6. Em primeiro lugar, sustenta que o empregador nada deve ao sinistrado – o que logicamente determinaria que nenhuma responsabilidade poderia assumir o FAT – e ancora esta afirmação na circunstância de o sinistrado ter declarado na escritura de dissolução da sociedade que esta não tem qualquer passivo, pelo que necessariamente reconhece que já não lhe deve qualquer quantia, nomeadamente a emergente do acidente de trabalho em causa.
Resulta dos factos provados que, efectivamente, após o acidente dos autos (verificado em Setembro de 2006), o sinistrado veio a tornar-se sócio da sociedade de construção civil empregadora em Janeiro de 2008 e que, em Junho de 2008, foi deliberada a dissolução e liquidação da sociedade declarando os sócios, nos quais se inclui o sinistrado, que a sociedade não tinha activo nem passivo.
Deve começar por se dizer que a declaração em causa nunca poderia configurar uma renúncia do sinistrado aos créditos emergentes do acidente de trabalho que sofreu em 4 de Setembro de 2006. Como bem é sublinhado no despacho que se pronunciou pela inverificação da nulidade assacada à sentença (vide fls. 296), careceria de qualquer eficácia uma declaração no sentido de o sinistrado renunciar aos direitos emergentes do acidente de trabalho de que fosse titular perante a sua empregadora, por força do que estabelecem os artigos 34.°, n.° 2 e 35.° da Lei n° 100/97, de 13 de Setembro.
De todo o modo, sempre pode perspectivar-se a alegação do recorrente de que o sinistrado reconheceu não lhe dever o empregador qualquer quantia na óptica de que a mesma equivaleria a uma declaração de quitação relativamente aos créditos emergentes do acidente sub judice, nada obstando, em abstracto, a que a mesma se verifique, na medida em que pressupõe o cumprimento da prestação debitória (cfr. o artigo 787.º do Código Civil).
A tese que o recorrente pretende fazer valer no recurso de que, com a declaração dos sócios da sociedade de que esta não tem passivo, o sinistrado “reconhece” que a sociedade nada lhe devia, resulta da interpretação que o mesmo faz de tal declaração, da mesma retirando a conclusão de que o sinistrado se encontrava já ressarcido pelo seu empregador dos danos emergentes do acidente.
Não podemos concordar com esta perspectiva.
Senão vejamos.
Nos termos do preceituado no art. 236.º, n.º 1, do CC, “[a] declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele”.
Acolhe este preceito a denominada doutrina objectivista da “impressão do destinatário”: a declaração deve valer com o sentido que um destinatário razoável, colocado na posição concreta do real declaratário, lhe atribuiria; mas, de acordo com o n.º 2, do mesmo preceito legal, sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é esta que prevalece, ainda que haja divergência entre ela e a declarada.
Como sublinham os Professores Pires de Lima e Antunes Varela, “[a] normalidade do declaratário, que a lei toma como padrão, exprime-se não só na capacidade para entender o texto ou conteúdo da declaração, mas também na diligência para recolher todos os elementos que, coadjuvando a declaração, auxiliem a descoberta da vontade real do declarante” – in Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra, 3.ª edição, p. 223.
Ou, no dizer do Professor Mota Pinto, “[r]eleva o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do destinatário, isto é, em face daquilo que o concreto destinatário da declaração conhecia e daquilo até onde ele podia conhecer” – in Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra, 3.ª edição, pp. 447-448.
Tenha-se também presente que nos termos do disposto no art. 238.º, n.º 1, do CC, a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso.
Tendo por horizonte estes critérios interpretativos, entendemos que, no circunstancialismo do caso concreto, nunca poderia conferir-se à declaração dos sócios da sociedade de que esta não tem passivo o alcance que o recorrente pretende dar-lhe.
Na verdade, para além de naquele momento não estar ainda definido – nem judicial, nem extra-judicialmente – que à sociedade cabia uma parcela de responsabilidade pelo ressarcimento do acidente de trabalho em análise nestes autos, há que ter presente que a sociedade empregadora considerava, então, que nada devia ao sinistrado por ter toda a sua responsabilidade emergente de acidente de trabalho transferida para a R. Companhia de Seguros.
Foi essa a posição que emitiu na tentativa de conciliação realizada em 7 Fevereiro de 2008 no âmbito dos presentes autos, aí referindo expressamente que “não aceita responsabilizar-se pelo acidente uma vez que considera que estava totalmente transferido para a companhia de seguros o salário base de auferido pelo sinistrado de € 507,00 x 14, acrescido de € 101,20 x 11 de subsídio de alimentação. O que perfaz o montante global anual de 8.211,20. Assim, entende que é à companhia de seguros a quem cabe a responsabilização global pelo acidente de trabalho” (vide fls. 49-52) e que reiterou em requerimentos avulsos ulteriormente efectuados, juntando documentos que na sua perspectiva o comprovavam (vide fls. 126 e ss.).
Pelo que, em coerência, declararam os sócios na escritura de dissolução celebrada em 30 de Junho desse mesmo ano de 2008 que a sociedade não tinha passivo.
E o sinistrado, na qualidade de sócio da sociedade, entendia também certamente que, quanto a este aspecto do acidente (e nenhum outro cabe aqui analisar), a sociedade não tinha passivo.
Sendo, por isso, claramente excessivo atribuir àquela sua declaração, na qualidade de sócio, o alcance de esta equivaler ao reconhecimento de que o mesmo, na qualidade de sinistrado, se encontrava ressarcido pela sociedade dos danos emergentes do acidente.
E cabe lembrar que o recorrente FAT conhece necessariamente a tramitação deste processo e a posição que nele a sociedade empregadora foi assumindo, pelo que, perspectivando-o como um declaratário normal com capacidade para entender o conteúdo da declaração e diligente na apreciação de todos os elementos que, coadjuvando a declaração, auxiliem a descoberta da vontade real do declarante, nunca poderia considerar equivaler a declaração em causa ao reconhecimento de que a R. já nada lhe deve a título de reparação dos danos do acidente, como alega na contestação e reitera no recurso.
A esta conclusão não obsta a circunstância de o sinistrado vir a demandar ulteriormente a seguradora e a sociedade empregadora quando em Julho de 2008 despolotou a fase contenciosa do presente processo especial, na medida em que, perante a posição assumida pela seguradora na tentativa de conciliação e a possibilidade de o contrato de seguro não cobrir a totalidade da remuneração auferida, se impunha ao Digno Magistrado do Ministério Público que o patrocinava a demanda conjunta, na petição inicial apresentada ao abrigo do artigo 119.º do Código de Processo do Trabalho, de ambas as entidades que poderiam ser responsabilizadas pelas consequências do acidente. A não o fazer, e perante o dissídio que resultava da tentativa de conciliação quanto ao âmbito da transferência da responsabilidade, sempre o juiz determinaria mais tarde a intervenção da sociedade empregadora nos termos previstos no artigo 127.º do mesmo diploma, sem que tal signifique, obviamente, o reconhecimento inequívoco da responsabilidade desta.
Em suma, nem os elementos interpretativos disponíveis confortam a posição do recorrente de que o sinistrado reconheceu na escritura encontrar-se ressarcido pela sociedade dos danos emergentes do acidente, nem tal específico sentido interpretativo tem o mínimo de correspondência no texto do documento constante de fls. 158-159 (parcialmente transcrito no ponto 11. da matéria de facto), ainda que imperfeitamente expresso.
Improcede, nesta parte, o recurso.
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4.7. Sustenta ainda o recorrente que, a não se considerar que o sinistrado reconheceu não lhe dever a sociedade empregadora qualquer quantia com a declaração de que a empresa não tem passivo, tal favorece a fraude, permitindo que as entidades responsáveis sacudam as respectivas responsabilidades bastando que os sócios deliberem a dissolução.
Também aqui lhe não assiste razão.
Se a responsabilidade da sociedade dissolvida e liquidada se atém sempre ao seu património, não deixa de estar igualmente prevista a responsabilidade dos liquidatários para com os credores sociais, prevendo a lei expressamente as hipóteses em que sejam prestadas falsas declarações aquando da dissolução das sociedades, fazendo nesses casos recair sobre os liquidatários o encargo de responder perante os credores sociais.
É o que resulta do disposto nos artigos 146.º e ss. do CSC, dos quais destacamos os seguintes preceitos relativos à liquidação da sociedade:
Artigo 154.º
Liquidação do passivo social
1 - Os liquidatários devem pagar todas as dívidas da sociedade para as quais seja suficiente o activo social.
2 - No caso de se verificarem as circunstâncias previstas no artigo 841.º do Código Civil, devem os liquidatários proceder à consignação em depósito do objecto da prestação; esta consignação não pode ser revogada pela sociedade, salvo provando que a dívida se extinguiu por outro facto.
3 - Relativamente às dívidas litigiosas, os liquidatários devem acautelar os eventuais direitos do credor por meio de caução, prestada nos termos do Código de Processo Civil.

Artigo 158.º
Responsabilidade dos liquidatários para com os credores sociais
1 - Os liquidatários que, com culpa, nos documentos apresentados à assembleia para os efeitos do artigo anterior indicarem falsamente que os direitos de todos os credores da sociedade estão satisfeitos ou acautelados, nos termos desta lei, são pessoalmente responsáveis, se a partilha se efectivar, para com os credores cujos direitos não tenham sido satisfeitos ou acautelados.
2 - Os liquidatários cuja responsabilidade tenha sido efectivada, nos termos do número anterior, gozam de direito de regresso contra os antigos sócios, salvo se tiverem agido com dolo.

Artigo 163.º
Passivo superveniente
1 - Encerrada a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha, sem prejuízo do disposto quanto a sócios de responsabilidade ilimitada.
2 - As acções necessárias para os fins referidos no número anterior podem ser propostas contra a generalidade dos sócios, na pessoa dos liquidatários, que são considerados representantes legais daqueles para este efeito, incluindo a citação; qualquer dos sócios pode intervir como assistente; sem prejuízo das excepções previstas no artigo 341.º do Código de Processo Civil, a sentença proferida relativamente à generalidade dos sócios constitui caso julgado em relação a cada um deles.
3 - O antigo sócio que satisfizer alguma dívida, por força do disposto no n.º 1, tem direito de regresso contra os outros, de maneira a ser respeitada a proporção de cada um nos lucros e nas perdas.
4 - Os liquidatários darão conhecimento da acção a todos os antigos sócios, pela forma mais rápida que lhes for possível, e podem exigir destes adequada provisão para encargos judiciais.
5 - Os liquidatários não podem escusar-se a funções atribuídas neste artigo, sendo essas funções exercidas, quando tenham falecido, pelos últimos gerentes ou administradores ou, no caso de falecimento destes, pelos sócios, por ordem decrescente da sua participação no capital da sociedade.
Assim, mostra-se expressamente prevista a hipótese de os liquidatários, com culpa, indicarem falsamente à assembleia que os direitos de todos os credores da sociedade estão satisfeitos ou acautelados, responsabilizando-os a lei pessoalmente para com os credores cujos direitos não tenham sido satisfeitos ou acautelados. O que responde directamente às apreensões sobre a hipótese de fraude enunciadas pelo recorrente.
Deve acrescentar-se que, no caso em análise, nada indicia que se verifique a culpa dos sócios liquidatários pressuposta no artigo 158.º do CSC.
Na medida em que, na perspectiva do empregador – expressa na tentativa de conciliação e, noutros momentos do processo, em requerimentos avulsos – havia transferido para a seguradora a responsabilidade civil emergente de acidente de trabalho quanto ao sinistrado relativamente a todo o salário auferido por este, não restaria para si qualquer responsabilidade pela reparação de tal acidente. E é absolutamente compreensível e coerente com esta posição que os seus sócios liquidatários, igualmente, considerassem não ter a sociedade qualquer passivo no que diz respeito à referida reparação do acidente sub judice, nada emergindo dos autos que indicie a sua culpa.
Acresce que, ainda que assim não fosse, sempre se teria de concluir pela inaplicabilidade do art. 158º já que, por força deste normativo, o liquidatário é responsável pessoalmente para com os credores sociais:
- se indicar falsamente, nos documentos apresentados à assembleia que os direitos de todos os credores estão satisfeitos ou acautelados, nos termos da lei;
- se, para tanto, agir com culpa; e
- se a partilha se efectivar, isto é, se tiver havido entrega de bens aos sócios.
Não estando provado, no caso em apreço, também este último requisito jamais poderia lograr aplicação o invocado preceito – vide sublinhando este aspecto o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Junho de 2008, Processo n.º 08B1184, in www.dgsi.pt.
Nada justifica, pois, a responsabilização dos liquidatários nos termos do artigo 158.º do CSC, como defende o ora recorrente.
Finalmente, cabe sublinhar que na presente acção os sócios da sociedade empregadora assumiram a qualidade de réus, sendo chamados, enquanto sócios, em substituição de sociedade extinta, nos termos do art. 162.º do CSC e que foi produzida prova no sentido de se aferir se na partilha de bens da sociedade receberam bens desta – a fim de os responsabilizar na medida do recebido – prova que não foi feita como se infere da resposta negativa ao art. 4º da base instrutória.
Pelo que também não poderiam sequer tais sócios ser responsabilizados nos termos dos artigos 162.º e 163.º do CSC, não merecendo qualquer censura a douta sentença recorrida quando conclui pela absolvição dos sócios da DD, Lda de todos os pedidos e pela consequente responsabilização do ora recorrente FAT pelo pagamento das prestações que competia à referida sociedade suportar nos termos previstos no artigo 39.º da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro de 1997 e 1.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 143/99.
Sempre sem prejuízo, no caso de satisfação pelo FAT das prestações devidas, da sub-rogação do Fundo em todos os direitos dos pensionistas para reembolso das prestações que tenha pago, seja nos termos gerais do regime da sub-rogação legal, constante dos artigos 592.º a 594.º, do Código Civil, seja de acordo com a expressa previsão constante do artigo 5.º-A, do DL n.º 142/99, na alteração que lhe foi introduzida pelo DL n.º 185/2007, de 10 de Maio – vide o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Julho de 2011, Recurso n.º 282/05.1TTVIS.C1.S1, in www.dgsi.pt.
Soçobra, totalmente, o recurso.
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4.8. Apesar de vencido no recurso que interpôs, o FAT encontra-se isento de custas (artigo 29º, nº 1, alínea a) do CCJ), pelo que não há lugar a custas.
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4. Decisão
Em face do exposto, decide-se julgar improcedente a apelação, confirmando integralmente a douta sentença da 1.ª instância.
Sem custas.
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Lisboa, 28 de Março de 2012

Maria José Costa Pinto
Seara Paixão
Ferreira Marques
Decisão Texto Integral: