Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
238/09.5TYLSB.L1-7
Relator: DINA MONTEIRO
Descritores: MARCAS
IMITAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/31/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I. Podemos caracterizar a expressão “mini” como um afixo que vem antes da raiz e/ou de um morfema não autónomo usado na derivação de palavras ou para flexioná-las em número, género, tempo, caso, etc. (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, Tomos I e XV, Lisboa, 2003) e que, no presente caso, se destina a designar um determinado tamanho de um produto, no caso, de uma cerveja.
II. O prefixo Mini, utilizado individualmente, não tem qualquer carácter distintivo que possa ser susceptível de apropriação e aquisição pelo uso, permitindo o seu registo como marca, antes se assumindo como um prefixo do domínio público – artigo 223.º, n.º 1, alínea d) do Código da Propriedade Industrial.
III. A expressão “MINI” não distingue a cerveja da Apelante, tornando-a sugestiva e única, uma vez que é um termo comum a outros produtos criados por outras empresas do ramo da cerveja, como é o caso da Apelada, também ela com a cerveja comercializada como Super-Bock Mini.
IV. O termo “MINI”, acompanhado de qualquer outro vocábulo, sempre poderá ser usado por todos os comerciantes, individualizando os respectivos produtos, sem que, individualmente, possa ser apropriado por quaisquer deles, assim se garantindo uma sã manutenção das regras de concorrência.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: APELANTE: A.., SA
APELADA: B…, SA

Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I. RELATÓRIO
A.…, SA, veio, ao abrigo do disposto nos artigos 39° e segs. do Código da Propriedade Industrial, interpor recurso do despacho do Senhor Director de Marcas e Patentes do I.N.P.I. que indeferiu o registo da marca nacional n° ... “MINI”.

Para o efeito, alegou que os pressupostos que fundamentaram a recusa (marca sem eficácia distintiva nos termos do artigo 223°, n° 1, al. d) do Código da Propriedade Industrial) não se verificam por a marca em causa ser caracterizada pela expressão "MINI", expressão que é associada à recorrente e à cerveja por si comercializada em tamanho pequena, ou seja, é associada à Sagres mini por si comercializada há 37 anos. Assim, entende que o uso da expressão "mini" corresponde à designação da sua cerveja "Sagres" contida numa garrafa de tamanho mais pequeno.

Acrescentou ainda que a expressão 'Mini" por si só não designa qualquer produto, sendo um vocábulo sugestivo da ideia de pequenez, embora no que ao comércio de cervejas respeita, referencia uma concreta marca, a marca Sagres. Entende, assim, tratar-se de uma referência que suscita uma distinção de um produto concreto.

Por último alegou que o grau de popularidade da "Mini” a levou a registar em 2007 a marca "Sagres Mini", ano em que a recorrente investiu seriamente no relançamento da sua "Mini", detendo a sua marca mais de 80% de quota.

Notificada a parte contrária, respondeu pugnando pela manutenção do despacho recorrido alegando que “mini” é um prefixo usual no mercado para assinalar pequeno. Os prefixos são do domínio público pela que a expressão “mini” não pode ser apropriada pela recorrente. Acrescentou ainda que “Mini”, pelo seu significado, refere apenas o tamanho do produto, sendo certo que o público quando pede uma cerveja “mini” pede uma cerveja pequena e não uma concreta marca de cerveja.

Por último, referiu que há várias marcas que contêm o prefixo “mini” e que dar o monopólio sobre tal expressão a alguém seria dar-lhe uma vantagem comercial injustificada.

Após apreciação foi proferida decisão que julgou o recurso improcedente, mantendo a decisão que indeferiu o pedido de registo da marca nacional n.º ... “MINI”, negando protecção jurídica à referida marca.

Inconformada com o assim decido, a recorrente interpôs recurso de Apelação no âmbito do qual formulou as seguintes conclusões:

1. O despacho recorrido ao recusar o registo da marca nacional n° ..., MINI, destinada a assinalar produtos da classe 32.ª — Cervejas, é nos seus precisos termos ilegal;

2. A ilegalidade de tal despacho deve-se a uma deficiente e incorrecta qualificação da marca MINI como desprovida de carácter distintivo ou distintividade, por um errado acolhimento dos fundamentos da reclamação apresentada, nos quais a marca MINI é qualificada como um termo genérico e usual, e como tal não registável porque incursa nas disposições das alíneas c) e d) do art. 223°, todos do CPI.

3. No exame oficial não se atendeu à especificidade do sinal/marca submetida a registo, a qual é de tipo sugestivo, nem à circunstâncias factuais que concorrem e legitimam o respectivo registo.

4. No exame subjacente ao despacho recorrido e no qual o mesmo se fundamenta, não foi atendido o facto de a marca MINI já cumprir, no mercado, com eficácia a função distintiva relativamente aos produtos das Recorrente, há trinta e sete anos ininterruptamente.

5. A marca nacional n° ..., não é desprovida de carácter distintivo ou de eficácia distintiva, uma vez que há trinta e sete anos que referencia no mercado cervejas SAGRES numa garrafa de menor capacidade que a comum, sendo usada sem equívoco pelos consumidores para recondução da origem desses produtos à ora Recorrente.

6. A vulgarização ou usualidade erradamente imputada à marca registanda MINI, mais não é do que uma exponencial notoriedade como sinal distintivo/marca, de produtos específicos e bem individualizados no mercado, as cervejas SAGRES MINI da Recorrente.
7. O exame subjacente ao despacho recorrido revela com evidência uma deficiente compreensão e aplicação dos conceitos de sinal genérico, descritivo, usual, e sugestivo, o que determinou uma ilegal subsunção e enquadramento da marca nacional n° ... às normas das alíneas c) e d) do art. 223°, e uma necessariamente ilegal aplicação da norma do art. 237° n° 4, do CPI.

8. O despacho recorrido é ainda ilegal por, ao aderir à alegação da reclamação, determinar ainda a recusa do registo da marca nacional com fundamento em putativa concorrência desleal, pois uma tal situação não é possível e na realidade não se verifica, porquanto a marca MINI cumpre competentemente a função distintiva no mercado, promovendo sem suscitar equívoco uma eficaz distinção dos produtos e uma correcta recondução dos mesmos à respectiva proveniência ou origem empresarial que os fabrica e comercializa

9. O despacho recorrido é ainda ilegal, por não ter sido considerado e valorado no exame em que o mesmo se sustenta, a evolução no uso da marca MINI, e ainda o facto de esta já fazer parte da caracterização de uma outra anterior — SAGRES MINI - pertencente à Requerente; da qual se autonomizou de facto e cumprir com autonomia a função distintiva, podendo igualmente em tais circunstâncias ser registada nos termos da norma do art. 223° n° 2 do CPI.

Conclui, assim, pela revogação da despacho recorrido e pela sua substituição por outro que conceda o registo da marca nacional n° 434. 017, MINI, em nome da Recorrente.

A Apelada apresentou contra-alegações em que conclui no sentido da sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. FACTOS PROVADOS

1. Por despacho de 12 de Dezembro de 2008, o Sr. Director de Marcas e Patentes do I.N.P.I., por subdelegação de competências, indeferiu o pedido de registo da marca nacional n° ... – “MINE", pedido pela aqui recorrente em 16 de Junho de 2008.

2. A referida marca foi pedida para assinalar na classe 32ª: "cervejas".

3. A marca é composta pela expressão "MINI”, impressa em letra maiúscula de imprensa, sem reivindicação de cores.

4. A recorrente e titular da marca nacional n°..., pedida em 7 de Março de 2006 e concedida por despacho de 28 de Fevereiro de 2007, destinada a assinalar produtos da classe 32.ª

5. Tal marca tem a seguinte configuração:

SAGRES
mini

6. Encontra-se à venda no mercado português a cerveja comercializada pela B…, SA, "Super-bock – mini”.



III. FUNDMAENTAÇÃO

Conforme a questão foi muito bem colocada pelo senhor Juiz de 1.ª Instância, o que importa definir neste recurso é tão só saber se a marca recorrida, constituída pela expressão “mini,” pode ser objecto de registo ou se não o pode ser, por constituir apenas uma designação usual, conforme foi o entendimento seguido pelo Tribunal de 1.ª Instância.

Apesar dos argumentos sustentados nas alegações apresentadas pela Apelante, no sentido de a expressão “MINI” constituir já, desde há trinta e sete anos e ininterruptamente, o que chama ser um sinal distintivo do seu produto SAGRES MINI - marca nacional de que a Apelante é titular desde 28 de Fevereiro de 2007, e que tem o n.º ... - e de que tal termo é sugestivo e inconfundível para os respectivos consumidores que solicitam esta cerveja em garrafa mais pequena, entendemos que não lhe assiste razão.

Com efeito, antes de mais cumpre referir que estamos perante um prefixo e que, como tal, é insusceptível de apropriação por qualquer consumidor. Aliás, neste sentido podemos verificar, tal como é pertinentemente apontado pela Apelada, a existência de diversas palavras compostas por este mesmo prefixo como sendo o Mini Mercado, a Mini Saia, o Mini Teste, Mini Golf, etc., que se assume, assim, como um prefixo genérico e usual, quer no comércio, quer na linguagem quotidiana.

Pretender que um prefixo passe a assinalar uma marca é desconhecer o seu significado gramatical. Como podemos verificar pela simples consulta de um dicionário da língua portuguesa, na parte respeitante à gramática, podemos caracterizar a expressão “mini” como um afixo que vem antes da raiz e/ou de um morfema não autónomo usado na derivação de palavras ou para flexioná-las em número, género, tempo, caso, etc. (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, Tomos I e XV, Lisboa, 2003) e que, no presente caso, se destina a designar um determinado tamanho de um produto, no caso, de uma cerveja.

Essa designação relativa ao tamanho não é, porém, contrariamente ao afirmado pela Apelante, uma designação apenas identificativa do seu produto, no caso, a Sagres Mini. Qualquer cidadão que se dirija a um estabelecimento comercial poderá pedir uma Mini e o empregado respectivo poderá fornecer-lhe uma garrafa pequena de uma cerveja que tanto poderá pertencer à Sagres, no caso, uma Sagres Mini, como fornecer-lhe uma cerveja pertencente à sua concorrente comercial, ora Apelada, entregando-lhe uma Super-Bock Mini, no caso de o cliente não a ter previamente identificado a cerveja pretendida.

Trata-se de um facto notório como foi afirmado na sentença em apreciação e que é facilmente comprovável por qualquer cidadão comum (consumidor médio de diligência normal, critério que é utilizado pacificamente na jurisprudência), e que a Apelante, certamente, já pode comprovar no seu dia a dia.

Resumindo, o prefixo Mini, utilizado individualmente, não tem qualquer carácter distintivo que possa ser susceptível de apropriação e aquisição pelo uso, permitindo o seu registo como marca, antes se assumindo como um prefixo do domínio público – artigo 223.º, n.º 1, alínea d) do Código da Propriedade Industrial.

Por outro lado, pretender que a expressão MINI” é sugestiva e “criada” pela própria publicidade erigida à volta da Sagres Mini, na qual a Apelante afirma que muito investiu, é esquecer o que já acima deixamos expresso relativamente à natureza do termo “MINI”, enquanto prefixo e que nada tem que ver com as expressões que se autonomizam, criando marcas sugestivas e que, como tal, são distintivas de um determinado produto.

A expressão “MINI” não distingue a cerveja da Apelante, tornando-a sugestiva e única, uma vez que é um termo comum a outros produtos criados por outras empresas do ramo da cerveja, como é o caso da Apelada, também ela com a cerveja comercializada como Super-Bock Mini.

Estamos perante um fenómeno em que, paralelamente à defesa do produto de cada empresa, que ganha fundamento na própria existência das normas distintivas das marcas que são defendidas pelo Código da Propriedade Industrial – entre elas, o artigo 222.º, n.º 1, do Código da Propriedade Industrial -, temos também de acautelar a liberdade do uso de expressões que podem ser utilizadas por todos os agentes do mercado e que podem compor uma determinada marca, tornando-a diferenciada de uma outra.

Ou seja, o termo “MINI”, acompanhado de qualquer outro vocábulo, sempre poderá ser usado por todos os comerciantes, individualizando os respectivos produtos, sem que, individualmente, possa ser apropriado por quaisquer deles, assim se garantindo uma sã manutenção das regras de concorrência.

Deve, assim, quer o despacho de recusa do registo da marca nacional n.º ..., proferida pelo Senhor Director da Direcção de Marcas e Patentes (Instituto Nacional da Propriedade Industrial), quer a sentença proferida pelo senhor Juiz do Tribunal de 1.ª Instância, que conformou aquela decisão, ser objecto de manutenção.

IV. DECISÃO
Face ao exposto, julga-se improcedente a Apelação, mantendo-se a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância.
Custas pela Apelante.

Lisboa, 31 de Janeiro de 2012

Dina Maria Monteiro
Luís Espírito Santo
José Gouveia Barros