Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3896/04.3TBBCL-D.G1
Relator: ESPINHEIRA BALTAR
Descritores: NOTIFICAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/24/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: O envio de carta, pelo tribunal, para a morada indicada e constante dos autos como sendo da parte notificanda, presume-se esta notificada, incumbindo-lhe o ónus de ilidir a presunção.
Decisão Texto Integral: Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães


Na execução Comum pendente em que intervieram como exequente A. e executados B. e C, estes arguiram várias nulidades, nomeadamente, falta de conhecimento de notificação e seu teor; falta de notificação da renúncia ao mandato; falta de nomeação de patrono oficioso, nos termos do artigo 39 n.º 4 do CPC. falta de publicidade da venda, nos termos do artigo 890 do CPC.

Sobre a arguição das nulidades foi prolatado despacho que julgou inexistirem as três primeiras e considerou extemporânea a arguição da quarta, acabando por indeferir o requerimento, não anulando a venda, objectivo pretendido pelos executados.

Inconformados com o decidido, os executados interpuseram recurso de agravo formulando conclusões.

Não houve contra-alegações.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Damos como assente os factos elencados no despacho recorrido, que passamos a transcrever:

Devidamente analisados os autos constata-se que:
1 - Os executados foram citados nos termos e para os efeitos do disposto no art. 812, n.º 6, do CPC, na seguinte morada: Lugar da Estrada, Vila Boa, em Barcelos (cfr. 37 a 45).
2 - Mediante procuração junta ao apenso de oposição à execução em 20.12.2004, os executados constituíram mandatário.
3 - Os executados foram notificados da realização da penhora do prédio na morada indicada supra (cfr. fls. 84 e 85).
4 - Os executados foram notificados nos termos e para os efeitos do disposto no art. 886-A, n.º 1, do CPC, na morada indicada supra (cfr. fls. 115 e 116) e nada vieram dizer.
5 - Por requerimento junto ao apenso "A" (Oposição à Execução) em 18.01.2007, o mandatário constituído pelos executados veio renunciar ao mandato.
6 - Em 25.01.2007, com vista à notificação da renúncia, foram expedidas cartas registadas com aviso de recepção para a morada dos Réus indicada supra, cartas essas que vieram devolvidas com a seguinte menção aposta nos respectivos versos "Não Atendeu".
7 - Face a essa devolução, foi tentada a notificação mediante contacto pessoal, a qual se concretizou em 05.03.2007 (cfr. fls. 65 do apenso A).
8 - Os executados foram notificados da decisão relativa à modalidade da venda, mediante notificação datada de 16.03.2007 (cfr. fls. 132 e 133).
9 - Por despacho de fls. 139, foi designada data para abertura de propostas em carta fechada com vista à venda do prédio penhorado.
10 - Os executados foram notificados da data designada para abertura de propostas (cfr. fls. 151 e 152).
11 - Foi remetido pelo SE para o jornal "A Voz do Minho" (cfr. fls. 147) o pedido de publicitação da venda através de anúncio, sendo que a mesma não chegou a ser efectuada.
12 - Foram afixados editais a publicitar a venda (cfr. fls. 148 e 149).
13 - No dia 24.05.2007 teve lugar a abertura de propostas, no âmbito da qual foi aceite a proposta apresentada por "TSURI - Investimentos Imobiliários, S.A.".
14 - No seguimento do requerimento apresentado pela proponente em 12.06.2007 a fls. 160, foram os executados notificados para se pronunciarem sobre o teor do mesmo (cfr. fls. 164 e 165), mediante cartas remetidas para a morada indicada supra.
15 - O despacho que recaiu sobre o requerimento da "TSURI", foi notificado aos executados (cfr. fls. 175 e 176) mediante cartas remetidas para a morada indicada supra.
16 - Mediante despacho proferido em 10.12.2007 a fls. 210, o prédio foi adjudicado à proponente.
17 - Do despacho de adjudicação foram os executados notificados mediante carta expedida em 11.12.2007 (cfr. fls. 211 e 212), sendo que a carta remetida ao executado veio devolvida com a seguinte menção aposta no seu verso "Não Atendeu".
18 - Em 08.04.2008, os executados dirigiram ao processo um requerimento no qual solicitavam um prazo mais alargado para procederem à desocupação do imóvel adjudicado à "D", requerimento esse que foi alvo do despacho proferido a fls. 228, notificado aos executados mediante carta expedida em 14.04.2008 (cfr. fls. 229 e 230).

Das conclusões do recurso ressaltam as seguintes questões, a saber:

1 – Se os executados foram notificados ou como tal considerados, dos despachos posteriores à notificação para a modalidade da venda.
2 – Se a arguição da nulidade, por falta de publicitação, em jornal, do acto da venda, foi extemporânea.

Iremos conhecer das questões enunciadas.

1- Consta dos pontos de facto da decisão recorrida 9 e 10 que os executados foram notificados da data da abertura de propostas em carta fechada com vista à venda do prédio penhorado. Nos pontos 12 a 17, consta que foram enviadas cartas para a morada dos executados indicada nos autos e que correspondia àquela em que foram citados para a execução.

O tribunal recorrido, em face do envio das respectivas cartas, concluiu que os executados foram devidamente notificados dos despachos ao abrigo do disposto no artigo 254 n.º 1 e n.º4 e 255 n.º 1 do CPC. Os executados discordam da ilação retirada dos factos, argumentando que não basta a prova do envio das cartas para se concretizar a notificação. É necessário que os executados tenham conhecimento real do conteúdo das cartas. Só assim é que podem reagir aos actos de que tiveram conhecimento.

O legislador contentou-se apenas com a prova de que foi enviada a correspondência para a morada da citação, ou outra que as partes tenham escolhido para serem notificadas. Incumbirá às partes elidirem a presunção de que não foram notificadas, que se traduz na prova de que a carta não entrou na sua esfera jurídica, isto é, não chegou a ser apresentada pelo carteiro. Porque, no caso de estar ausente, a carta deve ser enviada ao remetente e junta ao processo e considerar-se-á a parte notificada até prova em contrário. Isto é o que resulta da conjugação dos disposto no artigo 254 n.º 1 e 4 com o artigo 255 n.º 1 do CPC. Neste caso, as partes que não tiverem constituído mandatário deverão ser notificadas nos mesmos termos que o são os mandatários judiciais.

Dos autos não resulta que os executados tivessem feito a prova do contrário, isto é, tenham elidido a presunção de que foram notificados, porque não provaram que as cartas não foram enviadas para a morada indicada nos autos, nem entraram na sua esfera jurídica.

Pelo contrário, ficou provado que as cartas foram enviadas para a morada indicada nos autos como sendo a morada da citação, e em que uma delas, foi devolvida com a menção aposta no verso de que “ não atendeu”.

Em face de tudo isto, temos de concluir, como o fez o tribunal recorrido, que os executados foram notificados de todos os despachos elencados nos pontos 12 a 18.

2 – O tribunal recorrido reconheceu a prática da nulidade por falta de publicitação da venda do prédio por anúncio no jornal “ A Voz do Minho”. Porém, julgou extemporânea a sua arguição, porque depois da sua concretização, os executados foram notificados de vários despachos respeitantes a actos posteriores e que lhes bastava a mera consulta do processo para constatarem a ausência dos anúncios.

Os executados insurgem-se contra a interpretação do artigo 205 n.º 1 do CPC. como o fez o tribunal recorrido. Alegam que, no caso das partes não terem constituído mandatário, o tribunal terá de ser mais rigoroso quanto à diligência e conhecimento das nulidades.

O certo é que o normativo em questão não distingue. E, no caso em apreço, a falta de mandatário deve-se pura e simplesmente ao comportamento desinteressado dos executados. Em face disto, terão de arcar com as consequências inerentes à falta de apoio técnico. Serão tratados, pelo legislador, como se dominassem as regras jurídicas inerentes ao desenrolar do processo. O julgador apenas terá de constatar se, perante as notificações posteriores ao facto originário da nulidade, pode concluir que a parte tomou conhecimento dela ou poderia conhecê-la, agindo com a diligência devida.

Dos autos resulta que os executados se desinteressaram do desenrolar do processo. Tiveram conhecimento da data da abertura das propostas de venda e dos actos posteriores, incluindo a adjudicação da propriedade. Só se preocuparam no dia em que foram confrontados com a entrega do prédio livre de pessoas e bens. Nessa altura tentaram dilatar o prazo com um requerimento que juntaram aos autos a 8 de Abril de 2008 que foi indeferido. E só a 8 de Janeiro de 2009 é que constituíram mandatário judicial, como resulta da procuração junta aos autos, a fls. 295. E é com a intervenção do mandatário judicial, cerca de um ano depois de terem requerido ao juiz a prorrogação do prazo para abrir mão do imóvel, que suscitam as várias nulidades, incluindo a da falta de anúncios no jornal da data da venda. O certo é que todo este lapso de tempo revela o tal desinteresse pelo desenrolar do processo. Pois, foi-lhes indiferente a venda judicial e, inclusive, o seu preço, uma vez que a sua preocupação inicial foi a dilatação do prazo de entrega e não a falta de concorrentes à venda.

O andamento do processo não se compadece com esta falta de interesse manifestada pelos executados. Pois, se alguma irregularidade acontecer ao longo do processo, será sanada pelo decurso do prazo, se não for arguida a respectiva nulidade no prazo que o legislador considerou razoável, a contar do conhecimento dela ou da possibilidade de a conhecer, se tivesse agido com a diligência devida. E esta diligência não poderá ser superior só porque os executados não tinham mandatário judicial constituído.Tiveram oportunidade de o constituir e não se interessaram. Assumiram todos os riscos inerentes ao desenrolar dum processo. O que não podem, agora, exigir um tratamento diferenciado, sob pena de se premiar o desinteresse.

Em face de tudo isto, julgamos que os executados se tivessem maior diligência no decorrer do processo, teriam conhecido da nulidade invocada em data muito anterior, pelo que é extemporânea a sua arguição no ano de 2009.

Decisão

Pelo exposto acordam os juízes da Relação em negar provimento ao agravo, mantendo a decisão recorrida.

Custas a cargo dos agravantes.

Guimarães,