Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
5523/13.9TBBRG.G1
Relator: ANTÓNIO FIGUEIREDO DE ALMEIDA
Descritores: EXECUÇÃO
EXTINÇÃO
COMPETÊNCIA
AGENTE DE EXECUÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/15/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1) Há lugar à extinção da execução logo que se efetue o depósito da quantia liquidada, nos termos do artigo 847º, depois de efetuada a liquidação e os pagamentos, pelo agente de execução, nos termos do Regulamento das Custas Processuais, tanto no caso do artigo 848º como quando se mostre satisfeita pelo pagamento coercivo a obrigação exequenda, nos casos referidos no nº 3 do artigo 748º, no nº 2 do artigo 750º, no nº 6 do artigo 799º e no nº 4 do artigo 855º, por inutilidade superveniente da lide, no caso referido na alínea b) do nº 4 do artigo 779º, no caso referido no nº 4 do artigo 794º ou quando ocorra outra causa de extinção da execução;
2) A competência para declarar extinta a execução está residualmente atribuída ao agente de execução;
3) No entanto, nas hipóteses previstas nas alíneas c) e d) do artigo 723.º nº 1 do NCPC, tal competência é do juiz.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
I. RELATÓRIO
A) M… veio intentar contra M… execução comum, autuada em 15/08/2013, onde pede que sejam penhorados bens suficientes para pagamento da quantia exequenda, juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal comercial, taxas de justiça, custas processuais, honorários e despesas do agente de execução e honorários da mandatária da exequente.
No decurso da execução foi proferido o despacho de fls. 15 onde se determinou a notificação da senhora solicitadora de execução para dar cumprimento ao disposto no artigo 779º nº 4 alínea a) e b) do Código de Processo Civil e se declarou extinta a execução, despacho este que foi complementado com o despacho de fls. 16 que referiu que o despacho que foi proferido deve manter-se porquanto o único bem que foi penhorado foi uma parte do vencimento da executada e o disposto no artigo 779º nº 4 do CPC não implica o levantamento de qualquer penhora.
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B) Inconformada com aquela decisão, veio a exequente M… interpor recurso, o qual foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos, com efeito devolutivo (fls. 56).
Nas alegações de recurso da apelante são formuladas as seguintes conclusões:
I. Por despacho proferido em 31/10/2013, foi declarada extinta a presente execução com fundamento no artigo 779º nº 4 alínea a) e b) do CPC.
II. Salvo melhor entendimento, a recorrente entende que o tribunal “a quo” lavrou em erro, não fazendo uma adequada aplicação do direito.
Senão vejamos,
III. Compulsados os autos, constata-se que, no dia 04/09/2013, a Exª Sra. Agente de Execução notificou a exequente do resultado das consultas às bases de dados e ao registo informático de execuções.
IV. Das consultas efetuadas, resultou a existência de um imóvel e de um veículo inscritos a favor da executada.
V. E ainda que a executada é trabalhadora por conta de outrem, exercendo a sua atividade na empresa “B…, SA”.
VI. Na sequência de tal notificação, em 05/09/2013 a exequente requereu a penhora de saldos bancários e do vencimento da executada.
VII. Em 25/09/2013 a Exª Sra. Agente de Execução notificou a entidade patronal para proceder à penhora do vencimento auferido pela aqui executada.
VIII. Da informação prestada pela entidade patronal resulta que a executada já se encontra a efetuar os descontos à ordem de outro processo executivo, sendo que só a partir de Setembro de 2014 é que eventualmente poderão ser efetuados descontos no vencimento da executada à ordem dos presentes autos.
IX. Face à análise dos autos resulta que, na data em que foi proferido o despacho de extinção da execução, estavam em curso diligências de penhora, nomeadamente a penhora de saldos bancários.
X. Aguardando ainda a exequente o resultado da penhora de saldos bancários.
XI. Tendo em conta que o vencimento da executada se mostra onerado com penhora anterior e face à eventual inexistência de penhora de saldos bancários, ainda, assistiria à exequente a faculdade de reforçar ou substituir a penhora através da penhora do imóvel ou do veículo automóvel identificados – cfr. artigo 751º nº 4 alínea b) e c) do CPC.
XII. Atuando assim em conformidade com o princípio da proporcionalidade da penhora e as regras da ordem da realização da penhora – cfr. artigo 751º do CPC.
XIII. Pelo que não se vislumbra fundamento para aplicação do disposto no artigo 779º nº 4 do CPC.
XIV. Tanto mais que a executada ainda não tinha sido citada para os termos da presente execução.
XV. Não tendo por isso decorrido o prazo para a oposição à execução e/ou à penhora.
XVI. Ademais, a Exª Sra. Agente de Execução ainda não tinha assegurado o pagamento das quantias que lhe são devidas a título de honorários e despesas.
XVII. Não havendo, por todo o exposto, fundamento para a extinção da execução, por não se encontrarem reunidos os pressupostos para a aplicação do disposto no artigo 779º nº 4 do CPC.
XVIII. A extinção da execução, como decidido, privará a exequente de obter a satisfação do seu crédito, finalidade primordial da ação executiva, quando existem outros bens suscetíveis de penhora.
XIX. O que acarretará prejuízos graves na esfera jurídica da exequente.
XX. Primeiro, porque os bens que integram o património da executada poderão ser dissipados.
XXI. Segundo, porque não é certo que em Setembro de 2014, a executada continue a trabalhar para aquela entidade patronal ou até mesmo para outra.
XXII. Por fim, entendemos, salvo melhor entendimento, que a competência para proceder à extinção da execução não é do Tribunal “a quo”, mas sim do Agente de Execução, conforme resulta das disposições conjugadas dos artigos 779º nº 4 e 849º nº 3, ambos do CPC.
XXIII. O tribunal “a quo” ao ter declarado a extinção da instância, o despacho recorrido violou o disposto nos artigos 751º nºs 1, 2, 3, alínea b) e c), 4, alínea b) e c), artigo 779º nº 4 e artigo 849º nº 3, ambos do CPC.
Termina entendendo dever ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se o despacho recorrido, substituindo-o por outro que ordene o prosseguimento da execução.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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C) Foram colhidos os vistos legais.
D) As questões a decidir neste recurso são as de saber:
1) Quando há lugar à extinção da execução;
2) A quem compete declarar a extinção da execução;
3) Se deverá manter-se a decisão que declarou a extinção da execução.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
A) Os factos a atender são os que constam do relatório que antecede.
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B) O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente, não podendo o tribunal conhecer de outras questões, que não tenham sido suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras (artigos 608º nº 2, 635º nº 2 e 3 e 639º nº 1 e 2, todos do Novo Código de Processo Civil - NCPC).
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C) A apelante discorda do despacho que julgou extinta a execução, por entender que não se encontram reunidos os pressupostos para a aplicação do disposto no artigo 779º nº 4 do NCPC, entendendo que a extinção da execução, como decidido, privará a exequente de obter a satisfação do seu crédito, finalidade primordial da ação executiva, quando existem outros bens suscetíveis de penhora.
Vejamos.
1) O artigo 849º do NCPC diz-nos quando há lugar à extinção da execução, referindo que tal ocorre nas seguintes situações:
a) Logo que se efetue o depósito da quantia liquidada, nos termos do artigo 847º;
b) Depois de efetuada a liquidação e os pagamentos, pelo agente de execução, nos termos do Regulamento das Custas Processuais, tanto no caso do artigo anterior como quando se mostre satisfeita pelo pagamento coercivo a obrigação exequenda;
c) Nos casos referidos no nº 3 do artigo 748º, no nº 2 do artigo 750º, no nº 6 do artigo 799º e no nº 4 do artigo 855º, por inutilidade superveniente da lide;
d) No caso referido na alínea b) do nº 4 do artigo 779º;
e) No caso referido no nº 4 do artigo 794º;
f) Quando ocorra outra causa de extinção da execução.
É em face destas situações que se poderá declarar extinta a execução.
Apuradas as situações que determinem a extinção da execução, importa saber a quem compete declarar a extinção da execução, se ao agente de execução ou, antes ao juiz.
A este propósito importa ter em conta que por força do disposto no nº 1 do artigo 723º do NCPC, se estabelece que sem prejuízo de outras intervenções que a lei especificamente lhe atribui, compete ao juiz:
a) Proferir despacho liminar, quando deva ter lugar;
b) Julgar a oposição à execução e à penhora, bem como verificar e graduar os créditos, no prazo máximo de três meses contados da oposição ou reclamação;
c) Julgar, sem possibilidade de recurso, as reclamações de atos e impugnações de decisões do agente de execução, no prazo de 10 dias;
d) Decidir outras questões suscitadas pelo agente de execução, pelas partes ou por terceiros intervenientes, no prazo de cinco dias.
Por sua vez, a competência do agente de execução é residual, dado que lhe compete efetuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz, incluindo, nomeadamente, citações, notificações, publicações, consultas de bases de dados, penhoras e seus registos, liquidações e pagamentos e, mesmo após a extinção da instância, o agente de execução deve assegurar a realização dos atos emergentes do processo que careçam da sua intervenção (cfr. artigo 719º nº 1 e 2 NCPC).
Assim sendo, não obstante, não esteja expressamente prevista a competência para declarar extinta a execução, tal competência está residualmente atribuída ao agente de execução, por força do disposto no artigo 719º nº 1 do NCPC, uma vez que tal competência, não está atribuída à secretaria, nem é da competência originária do juiz, não obstante competir a este julgar, sem possibilidade de recurso, as reclamações de atos e impugnações de decisões do agente de execução, no prazo de 10 dias, como se viu.
De resto, tal conclusão sempre resultaria do disposto no artigo 849º nº 3 do NCPC onde se refere que a extinção da execução é comunicada por via eletrónica ao tribunal, comunicação essa que tem o significado óbvio de não ser o tribunal (juiz) a declarar extinta a execução.
Há, no entanto, pelo menos, duas situações em que tal poder está na disponibilidade do juiz e que são as que resultam do julgamento, por este, nos termos do artigo 723º nº 1 alínea c) do NCPC, das reclamações de atos e impugnações de decisões de agentes de execução em que se suscitem questões sobre a apreciação da extinção da execução e, também, nas situações em que seja suscitada perante o juiz, pelo agente de execução, pelas partes ou por terceiros intervenientes, a questão da extinção da execução, nos termos do disposto no artigo 723º nº 1 alínea d) do NCPC.
Importa, então, apreciar a ultima questão suscitada que tem a ver com a avaliação de saber se deverá manter-se a decisão que declarou a extinção da execução.
Do acabado de expor já resulta que tal decisão não se poderá manter, tendo em conta que a competência para a declaração da extinção da execução compete ao agente de execução e não ao juiz, sendo certo que não se verifica nenhum das situações acima apontadas que poderiam legitimar tal intervenção judicial, pelo que a decisão recorrida não se poderá manter e, assim, se revoga, devendo o processo executivo prosseguir os seus termos.
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D) Em conclusão:
1) Há lugar à extinção da execução logo que se efetue o depósito da quantia liquidada, nos termos do artigo 847º, depois de efetuada a liquidação e os pagamentos, pelo agente de execução, nos termos do Regulamento das Custas Processuais, tanto no caso do artigo 848º como quando se mostre satisfeita pelo pagamento coercivo a obrigação exequenda, nos casos referidos no nº 3 do artigo 748º, no nº 2 do artigo 750º, no nº 6 do artigo 799º e no nº 4 do artigo 855º, por inutilidade superveniente da lide, no caso referido na alínea b) do nº 4 do artigo 779º, no caso referido no nº 4 do artigo 794º ou quando ocorra outra causa de extinção da execução;
2) A competência para declarar extinta a execução está residualmente atribuída ao agente de execução;
3) No entanto, nas hipóteses previstas nas alíneas c) e d) do artigo 723.º nº 1 do NCPC, tal competência é do juiz.
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III. DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em conceder provimento à apelação e revogar a douta decisão recorrida, determinando-se que a execução prossiga os seus termos.
Sem custas.
Notifique.
Guimarães, 15/05/2014
Figueiredo de Almeida
Ana Cristina Duarte
Fernando Freitas