Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 4ª SECÇÃO | ||
Relator: | MELO LIMA | ||
Descritores: | NULIDADE DO ACÓRDÃO ERRO DE JULGAMENTO DESPEDIMENTO ILÍCITO EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO | ||
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Data do Acordão: | 11/19/2015 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
Área Temática: | DIREITO DO TRABALHO - CONTRATO DE TRABALHO / CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO / DESPEDIMENTO POR INICIATIVA DO EMPREGADOR / DESPEDIMENTO POR EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA ( NULIDADES ) / RECURSOS. | ||
Doutrina: | - Bernardo Xavier, "O regime dos despedimentos coletivos e as modificações introduzidas pela Lei n.º 32/99 de 18/05", in Estudos do IDT, vol. I, Almedina, p. 409. - Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte II – Situações laborais individuais, Coimbra, 2006, p. 884. - Mário Pinto e Furtado Martins, "Despedimentos coletivos: liberdade de empresa e ação administrativa", in RDES, ano XXXV, n.ºs 1-2-3-4, Jan. - Dez. 1993, pp.38 e ss.. - Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 15.ª edição, pp. 628-629. - Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho, Vol. I, p. 511 e ss.. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC) NA VERSÃO CONFERIDA PELA LEI N.º 41/2013, DE 26 DE JUNHO: - ARTIGOS 615.º, N.º 1, AL. D), 666.º, N.ºS 1 E 2, 674.º, 682.º. CÓDIGO DE PROCESSO DO TRABALHO (CPT): - ARTIGOS 1.º, N.º 2, AL. A), 77.º, N.º 1. CÓDIGO DO TRABALHO DE 2009 (CT): - ARTIGOS 119.º, 290.º, N.º2, 349.º, 359º, N.ºS 1 E 2, 363.º, N.ºS4 E 5, 366.º, 367.º, N.ºS 1 E 2, 368.º, N.ºS 1, 2 E 4, 369.º, 371.º, N.ºS 3 E 4, 370.º, N.ºS 1 E 2, 372.º, 381.º,384.º, 387.º, N.ºS 1, 2 E 3, CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 53.º. | ||
Legislação Comunitária: | DIRETIVA N.º 98/59/CE, DE 20 DE JULHO DE 1998. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL: -N.º 306/2003 DE 25 DE JUNHO. -*- ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: -DE 10.01.2007, PROCESSO N.º 2700/06, DA 4ª SECÇÃO; -DE 01.10.2008, PROCESSO N.º 8/08, DA 4.ª SECÇÃO; -DE 07.07.2009, IN WWW.DGSI.PT . | ||
Jurisprudência Internacional: | | ||
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Sumário : | I – A invocada violação, pelo acórdão recorrido, do disposto no artigo 387.º, n.º 3, do CT, consubstancia a invocação de erro de julgamento e não de uma nulidade própria da decisão, porquanto nesta, ao contrário do erro de julgamento, em que se discorda do teor do conteúdo alcançado na decisão, invocam-se circunstâncias que, legalmente previstas (no caso, no art.º 615.º do CPC) ferem a própria decisão. II – Existe consequencialidade entre os motivos alegados para a extinção do posto de trabalho e a decisão de despedimento se, uma vez demonstrados aqueles, se comprova que por sua causa o trabalhador deixou de poder exercer as funções inerentes à sua categoria profissional por não existir em toda a restante empresa qualquer outro posto de trabalho vago compatível com aquela categoria. III – A aplicação dos critérios que devem presidir à concretização dos postos de trabalho a extinguir, nos termos do art.º 368.º, n.º 2, do CT, pressupõe a existência, na secção ou estrutura equivalente, de uma pluralidade de postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico. IV – Demonstrando-se que a empregadora não dispõe de outros postos de trabalho com funções compatíveis com a categoria do trabalhador despedido, designadamente por estarem ocupados por outros trabalhadores, não só não se coloca a questão da aplicação dos referidos critérios, como se preenche a impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho, a que alude o n.º 1, b) e o n.º 4, ambos do art.º 368.º do CT. | ||
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Decisão Texto Integral: |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO 1. AA intentou no Tribunal do Trabalho de Vila Nova de Gaia a presente ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra BB, S.A., pedindo que seja declarada a ilicitude do seu despedimento, com as legais consequências.
2. A R. apresentou articulado a motivar o despedimento do A. por extinção do posto de trabalho. Pediu que se declare regular e lícita a extinção do posto de trabalho do A. e que este seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 4.562,50 a título de indemnização, em virtude de ter mantido indevidamente na sua posse o veículo e telemóvel que lhe foram atribuídos em função do trabalho durante 75 dias.
3. O A. apresentou articulado com contestação e pedido reconvencional, pedindo que seja declarada a ilicitude do seu despedimento e a entidade empregadora condenada a reintegrá-lo e a pagar-lhe as remunerações vencidas desde o despedimento, incluindo o valor de uso da viatura, da dotação mensal em combustível e do telemóvel, com juros desde a data do vencimento das obrigações. Subsidiariamente, para a eventualidade de o despedimento ser julgado lícito, pediu a condenação da R. a pagar-lhe a indemnização de antiguidade, com juros desde a data do despedimento, e, em qualquer caso, uma indemnização por danos não patrimoniais no montante de 25.000,00 euros, a participação nos lucros de 2008 e 2009, a dotação mensal de combustível a partir de janeiro de 2010, o trabalho suplementar prestado e respetivos descansos compensatórios e o trabalho noturno, tudo com juros desde a data do vencimento das obrigações.
4. A R. apresentou resposta à contestação, sustentando a licitude do despedimento, concluindo pela improcedência da ação e pela sua absolvição dos pedidos formulados pelo A. em reconvenção.
5. Designou-se audiência preliminar, na qual foi admitido o pedido reconvencional, elaborou-se o despacho saneador e elencou-se a matéria de facto assente e controvertida.
6. Realizado julgamento, foi proferida sentença que, julgando a ação parcialmente procedente, declarou ilícito o despedimento do A. e condenou a R. a reintegrar o A. sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, e a pagar-lhe as retribuições que o mesmo deixou de auferir a partir de 11.05.2010, à razão da retribuição base mensal de 3360€ e da quantia mensal de 800€ (correspondente às retribuição em espécie pela utilização do veículo), até ao trânsito em julgado da decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento da dívida, absolvendo a R. no mais peticionado. A mesma sentença julgou improcedente o pedido deduzido pela R. e absolveu o A. do mesmo.
7. Inconformados, A. e R. interpuseram recurso de apelação.
8. O Tribunal da Relação do Porto, conhecendo de ambos os recursos, por acórdão datado de 17 de dezembro de 2014, julgou procedente a apelação da R. e improcedente a apelação do A., tendo absolvido aquela dos pedidos por este formulados.
9. É contra esta decisão que o A. se insurge, mediante recurso de revista, em que alinha as conclusões seguintes:
I) Ilicitude do despedimento 1ª O acórdão recorrido conheceu de questão que não podia julgar e não julgou a matéria submetida a julgamento, enfermando de nulidade e de erro de julgamento por violação do art.° 387°, n° 3, do CT, tendo construído uma tese própria, não refletida na decisão da empregadora, de que o posto de trabalho objeto do despedimento perpetrado pela R. foi o posto de trabalho original do estabelecimento do Porto, o que o A. tinha ocupado como chefe de departamento de após-venda de retalho norte (B...) - o que é, inclusivamente, expressamente rejeitado pela empregadora, que na resposta à reconvenção exclui e nega qualquer ligação do trabalhador com o estabelecimento do Porto (arts 58° e segs. desse articulado); 2ª Só que não foi esse o posto extinto pela empregadora: Na comunicação inicial do procedimento de despedimento a empregadora referiu-se ao posto de trabalho de diretor de polo de ... e ao posto de trabalho de diretor de polo de P..., na qualidade de Diretor de Serviços afeto a esse posto de trabalho (facto 32, alínea P), na decisão «decidiu-se» pela extinção do posto de trabalho de diretor de serviço na «estrutura» de Gaia (na sede), por onde aferiu o despedimento (facto 34) e na resposta à reconvenção esclareceu que excluía e rejeitava qualquer ligação do A. ao estabelecimento do Porto (arts. 58° e segs.); 3ª Objetou o trabalhador que - já não prestava serviço em ..., porque aí prestava serviço cedido à CC, uma empresa do grupo da empregadora, e a cedência terminara, porque o estabelecimento tinha sido transmitido à Rendo (factos 18 a 31), - que também já não prestava serviço em P... desde 2007, também tendo esse estabelecimento sido cedido à DD, estando o posto de trabalho de diretor de polo ocupado por outrem (factos 12, 13,26)], e - que nunca tinha prestado serviço em Gaia (facto 41); 4ª Ou seja, na decisão de despedimento, que é o que conta e deve ser julgado, a empregadora consumou a extinção de um posto de trabalho de diretor, na estrutura da sua sede, em Gaia, que não existia nem era o do trabalhador, porque nunca tinha prestado serviço nesse local, pelo que evidentemente não tem fundamento nem pode manter-se; 5ª Acresce que a recorrida não provou nenhum fundamento económico (art. 359°, n° 2, do CT) para a extinção do posto de trabalho do A. (também por causa da confusão em que se embrenhou na determinação do posto de trabalho a extinguir) nem a adequação e o nexo de causalidade exigíveis; 6ª Na própria alegação - a única de que se pode agora lançar mão, cf. art.º 387°, n.º 3, do CT ¬o presente processo estava condenado à partida: Como se vê da resposta aos quesitos 1 ° a 14°, factos 44 a 55, trata-se de factos conclusivos, vagos, desgarrados, insuscetíveis de justificar um despedimento com justa causa e a alegada extinção do posto de trabalho; 7ª Não basta uma redução de atividade ou de rendimentos, num certo sector, se tem outras atividades lucrativas: A atividade da empregadora não é só venda de B.../M…, pois que se provou que teve um grande incremento de atividade com a representação e após-venda de outras marcas - alíneas AV) e BJ, factos 42 e 43; 8ª E a recorrida deu lucro, como resulta do seu relatório único e das atas de prestação de contas, até distribuindo lucros aos seus funcionários, como relatou o perito a fls. 1344 e ela comprovou pelos mapas juntos no dia 21.1.20 I I (doe. 5); 9ª A empregadora tinha de provar os motivos de mercado, traduzidos na redução de atividade da empresa provocada pela diminuição previsível da procura de bens (art° 359°, n° 2, do CT), e não o fez: Limitou-se a invocar a perda de mercado na marca B..., cf. facto 49 (quesito 6°), e nada disse quanto às outras marcas e representações e serviços de após-venda, lucrativos, não havendo qualquer modelo ou projeto de reestruturação empresarial, que não foi alegada nem invocada no local próprio, tudo permitindo concluir que o A. apenas foi despedido porque quis pôr termo à cedência na CC, para não passar para a DD, e que foi esse facto que despoletou o seu despedimento, anteriormente não planeado; 10ª Além disso, a empregadora não provou o requisito da impossibilidade de subsistência do contrato de trabalho do A. - cf. a resposta explicativa ao quesito 14°, facto 55, restritiva da alegação da empregadora; 11ª O A. era diretor de serviço e chefiava e dirigia o estabelecimento de ..., cedido à CC, empresa do grupo da empregadora (factos 13 a 18), não tendo querido seguir com o estabelecimento para a DD, na altura em que o estabelecimento foi transmitido a esta empresa, e provocou o seu regresso à R. (factos 19 e 20), o que a R. admitiu (factos 27 e 31); 12ª A R. tinha obrigação de o receber, como exigência de boa fé e nos termos do art. 290°, n° 2, do CT; 13ª A empregadora não planeou esta eventualidade e como não previu ter de receber o A., viu-se obrigada a despedi-lo, ficcionando que estava imputado à estrutura da sede, em Gaia, onde nunca tinha trabalhado, e por aí aferiu o despedimento; 14ª Mas mal, porque se fosse de aferir o despedimento por Gaia (sede), como a empregadora se posicionou, deveria ter ponderado na decisão do despedimento o balanceamento dessa sua estrutura, onde havia postos de conteúdo funcional idêntico e da mesma categoria de diretor (factos 58 a 73), o que não fez, em violação do nº 2 do art. 368° do CT; 15ª E também não fez esse balanceamento relativamente a qualquer outra estrutura, mormente o estabelecimento do Porto, local onde o A. tinha sido contratado (local contratual ¬facto 3) e de onde tinha saído para P... (factos 3 a 6 e 10), expressamente excluindo qualquer possibilidade de ligação a essa estrutura (ut. resposta à reconvenção, arts. 58° e segs.); 16ª A empregadora tinha obrigatoriamente de estabelecer e obedecer a critérios de prioridade e justificar a sua posição quanto a postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico ao de diretor: - Não ofereceu ao A. o posto que atribuiu ao EE na FF (facto 58), ¬ Não justificou a acumulação pelo diretor-geral do anterior posto do EE (facto 59), - Não ofereceu ao trabalhador o posto de diretor que criou para a nova estrutura da HH e que atribuiu ao colega GG (factos 63, 64 e 65), - Nem o posto de trabalho de responsável após-venda do Eng. MM (facto 62), na mesma estrutura nova da HH, - Não ofereceu ao trabalhador o lugar de gestor de produto da M…, que deu ao colega II (facto 71), - Não ofereceu o posto de trabalho de chefe de vendas M… do JJ (facto 60), - Nem justificou a acumulação do anterior posto de trabalho do JJ, pelo KK (factos 60 e 61), - Não ofereceu ao A. o posto de trabalho de coordenador do departamento de peças Porto/Gaia, do LL (facto 66), - Nem justificou as alterações havidas no posto do colega TT (factos 67 e 69), que veio a atribuir a outro colega diretor de serviços, sem esclarecer o critério, - Também não explica porque é que não fez o balanceamento com outras direções e postos de trabalho de chefia de departamento na estrutura de Gaia (factos 72 e 73); 17ª O tribunal recorrido não podia deixar de sindicar se os motivos invocados na decisão eram verdadeiros e se justificavam o despedimento, em termos de adequação e de nexo de causalidade, e de concluir que: a) Relativamente à estrutura de Gaia por que a empregadora aferiu o despedimento do A. (e cuja alegação/fundamentação constante da decisão de despedimento não pode ser agora convolada), a R. não cumpriu o disposto no n° 2 do art.º 368° do CT, e deveria ter cumprido - nessa estrutura havia postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico, a exigir o balanceamento entre eles; b) A recorrida também não respeitou os critérios do n° 2 do art.º 368° do CT, o que é motivo de ilicitude do despedimento – art.º 384°, c), do CT; c) A recorrida não provou que não dispunha de posto de trabalho compatível, nos termos do n.º 4 do art.º 368° do CT; 18ª A empregadora criou pelo menos um posto de trabalho novo - facto 71 -, de gestor da marca M…, que não ofereceu ao A., podendo questionar-se igual postura quanto aos cargos de chefe de vendas M… do JJ (facto 60), de responsável de após-venda da HH na C..., do MM (facto 62), de diretor da C... - HH, do GG (factos 63 a 65), tudo cargos novos, criados pela empregadora, na mesma altura em que se colocou a questão do despedimento, não tendo esta esclarecido nem fundamentado porque motivo não os ofereceu ao trabalhador; 19ª No que respeita ao requisito do n° 4 do art.º 368° do CT, a empregadora tinha obrigação de dar ao trabalhador a possibilidade de se manter ao serviço, mesmo com mudança de funções e redução de vencimento, como alternativa ao despedimento (art.º 119º do CT); 20ª A empregadora tinha portanto a obrigação de oferecer o(s) posto(s) de trabalho novo(s) que criou e até de requalificar o trabalhador, como exigência do princípio da boa fé; 21ª A empregadora tinha obrigação de reintegrar o trabalhador, finda a cedência, nos termos do n° 2 do art.º 290° do CT, que lhe garantia o lugar e a manutenção dos direitos prévios à cedência, e de lhe arranjar uma solução de entre as alternativas que havia, nomeadamente as que referiu nas conclusões anteriores, não tendo alegado nem fundamentado o incumprimento dessa sua obrigação, com que o A. contava, pois que a R. o recebeu de novo e tanto mais que não o informou de que não contava com ele, como devia ter feito, se estivesse de boa fé, em termos de lhe permitir decidir se se mantinha ou não ao serviço do estabelecimento onde estava e que passou para a DD e de conservar o emprego, o que tudo constitui uma violação da garantia legal e um abuso de posição, por parte da empregadora, que a lei não consente; 22ª A R. não provou o requisito da impossibilidade de subsistência do contrato de trabalho do A. nem observou o procedimento exigível, tendo pelo contrário o trabalhador provado que havia alternativa e que esta devia ter-lhe sido colocada; 23ª Os motivos do despedimento ficam a dever-se a conduta culposa do empregador [art.º 368°, n.º 1, a), do CT], como aliás se deve presumir, não existindo motivos económicas nem de mercado para a extinção do posto de trabalho; 24ª A empregadora não provou o requisito da inaplicabilidade do regime do despedimento coletivo [art.º 368°, n.º 1, d), do CT], tendo o acórdão recorrido feito uma interpretação do art.º 359°, n° 1, do CT, contrária à Diretiva 98/59/CE; 25ª Em suma: O despedimento do A. é ilícito por todas as razões constantes das conclusões anteriores, tendo o acórdão recorrido violado as normas jurídicas nelas citadas;
II) Horas suplementares 26ª O acórdão aditou aos factos provados a matéria da alínea T) dos factos assentes, que a 1 ª instância excluíra, e desconsiderou a matéria da alínea BH) por ter entendido que estava abrangida no quesito 37° e que a resposta dada a incluía; 27ª Este raciocínio do acórdão não colhe e a resposta ao quesito 37° não podia incluir uma matéria que não foi objeto de discussão; 28ª Assim, das duas, uma: Ou entendia - como nós entendemos - que devia ser considerado provado que não obstante o período semanal de trabalho contratado ao A. ser de 39 horas, ele cumpria um horário de 40 horas semanais, ou seja, 1 hora suplementar por semana, e condenava a R. condenada no trabalho suplementar e descanso compensatório concomitante, ou mandava repetir o julgamento para ser julgada essa matéria; 29ª Em relação ao facto 93, teria de se apurar em que dias e horas é que participou nos eventos, em liquidação de sentença (art.º 609°, n° 2, do NCPC), para esclarecer se foi prestado trabalho suplementar e noturno, não podendo decidir que tal não sucedeu, desde logo, na falta de melhor esclarecimento da situação;
III) Dotação de combustível 30ª A empregadora deve a dotação dos factos 79,80 e 81 até ao final do contrato (10.5.2010), porque se manteve a serviço (a situação de inatividade, com apresentação ao trabalho, até final do contrato foi ilegal, como a própria sentença de 1" instância concluiu), e, por força da ilicitude do despedimento, com a reposição do contrato, também desde o dia seguinte ao do despedimento (artºs. 258° e 389°, n° 1, a), do CT);
IV) Distribuição de lucros 31ª O trabalhador tem direito à distribuição de lucros dos anos de 2008 e 2009 - factos 86 e 87, que a R. não lhe pagou em discriminação face a outros colegas - facto 88, por ser seu trabalhador, a tal não obstando o facto de estar cedido a outra empresa do grupo (artºs. 258° e 389°, n.º 1, a), do CT), uma vez que tal cedência ocorreu por interesse presumido da empregadora e portanto o trabalhador colaborou no esforço coletivo da empregadora;
V) Telemóvel 32ª O trabalhador tem direito ao valor de telemóvel (facto 91) nas remunerações de tramitação, por ser presumida retribuição (art.° 258°, n° 3 e 389°, n° 1, a), do CT);
VI) Pedido subsidiário - indemnização 33ª O acórdão desconsiderou em absoluto o pedido de restituição da indemnização de antiguidade, com juros, que o A. formulou subsidiariamente, no caso de o despedimento ser julgado lícito, cometeu a nulidade que se apontou e que constitui também erro de julgamento”.
Conclui o recorrente no sentido de ser dado provimento ao recurso e de “…o despedimento ser considerado ilícito, com as consequências legais peticionadas, repristinando-se a sentença de 1.ª instância no que respeita aos segmentos decisórios Ia), Ib) e Ic) – 1.º parágrafo, e a R. ser também condenada no pagamento das horas suplementares, da dotação do combustível, da participação nos lucros e do valor do telemóvel, como peticionou, ou sendo o despedimento considerado lícito a recorrida ser condenada a restituir ao A. a indemnização de antiguidade, com juros (…)”.
10. No requerimento de interposição do recurso (fls. 2027), o recorrente arguiu a nulidade do acórdão recorrido por: «a) pronúncia sobre questão que não podia tomar conhecimento e não conhecimento de questão que devia conhecer, nomeadamente conheceu de fundamentos do despedimento não constantes da decisão de despedimento e não conheceu da motivação constante dessa decisão (…) (não conheceu da fundamentação da decisão do despedimento, do posto de trabalho dito extinto de diretor de serviços na estrutura de Gaia, e criou uma tese própria não constante da decisão, de extinção de um posto de trabalho de chefe de departamento de após-venda na estrutura/estabelecimento do Porto – art.º 387º, n.º 3, do CT); b) falta de pronúncia sobre o pedido subsidiário de condenação no pagamento/restituição da indemnização de antiguidade, formulado na reconvenção».
11. A R. apresentou contra-alegações reportadas ao recurso de revista apresentado pelo A., pugnando pela improcedência do recurso e defendendo a confirmação do julgado. Alinhou as conclusões seguintes: «1.Não existe qualquer nulidade do acórdão. O Tribunal não estava limitado apenas aos fundamentos constantes da decisão de despedimento, podendo ponderar todos os elementos que resultaram da matéria provada. E isto porque o processo laboral privilegia o princípio da verdade material - ao contrário do que se passa no processo civil, que tem como pedra de toque o princípio do dispositivo - o que se traduz numa "maior autonomia" conferida ao julgador para decidir. 2.Foi, aliás, o próprio Autor quem, no final da audiência de julgamento, requereu que fossem acrescentados à base instrutória os factos que levaram a que o Tribunal decidisse como decidiu - factos esses que o próprio Autor, nesse seu requerimento, disse expressamente serem relevantes para a decisão da causa. Como tal, não pode o Autor vir agora invocar uma nulidade com base numa circunstância a que ele próprio deu origem. Ao fazê-lo está o Autor a incorrer num verdadeiro venire contra factum proprium, atentando contra as regras de boa-fé 3.Se a Ré, "na decisão, «decidiu-se» pela extinção do posto de trabalho de diretor de serviço na «estrutura» de Gaia (na sede)", foi porque o próprio Trabalhador "invocou a sua qualidade de trabalhador do quadro da sede da BB, (. .. ) e que ( .. .) apresentar-se-ia ao trabalho na sede da BB, a partir de Janeiro de 2010" (ponto 20 dos factos provados) - sede essa que, àquela data, se situava em Vila Nova de Gaia. O Autor, com essa tomada de posição, criou uma expectativa junto da Ré de que era, de facto, esse o seu entendimento face à sua situação jurídica: o Autor era "trabalhador do quadro da sede da BB» (palavras suas) e era aí que deveria ser reintegrado. 4.Como tal, não pode, agora, depois de lançar a confusão, vir o Autor - perante uma solução jurídica que lhe é desfavorável mas que é absolutamente coerente com os factos provados nos autos - exigir que essa solução jurídica se cinja apenas à fundamentação da decisão de despedimento, na tentativa de assim lograr uma decisão mais consentânea com os seus interesses (ainda que afastada da verdade material patente nos autos). Ao fazê-lo, está o Autor mais uma vez a incorrer num abuso de direito sob a forma de venire contra factum proprium, atentando assim contra o princípio da boa-fé e a tutela da confiança. 5.O fundamento económico para a extinção do posto de trabalho do A., foram considerados integralmente provados pelo Tribunal (factos 44 a 55), estando a convicção do Tribunal devidamente fundamentada na acta de julgamento de 11-11-2013, que respondeu à base instrutória. 6.Sendo certo que se provou que a empregadora não vende só B.../M… e que teve um incremento de actividade com a aquisição de representações de outras marcas (factos 42 e 43), isso, por si só, não é suficiente para se concluir que as perdas invocadas pela Ré terão eventualmente sido compensadas pelo dito "incremento de actividade" nessas áreas secundárias. Competia ao Autor demonstrar essa circunstância - coisa que não fez. 7.O facto de a Ré ter "dado lucro" nada tem de significativo - sendo certo que a lei não impõe que as empresas cheguem a estado de pré-falência para poderem recorrer à redução de efectivos via extinção de posto de trabalho ou despedimento colectivo. Esses institutos destinam-se precisamente a evitar que a situação atinja esses níveis calamitosos. 8.É falso que "não houve qualquer reestruturação empresarial', tendo o próprio Tribunal dito, na acta de julgamento de 11-11-2013, que "ficou claro a imposição à Ré da alienação dos estabelecimentos referenciados no Quesito 5° como condição de renovação dos contratos de concessão das marcas e a necessidade da redução de pessoal e reestruturação da empresa (com a unificação de unidades de valas) para fazer face ao decréscimo da produtividade e aos resultados apresentados, fruto da crise económico-financeira instalada e que afetou em particular o setor automóvel. " 9.É falso que "a empregadora não planeou esta eventualidade. E como não previu ter de receber o A. viu-se obrigado a despedi-lo, fosse de que forma fosse". A Ré começou por lhe oferecer um posto de trabalho compatível com a categoria e funções do A. em Angola, tendo o mesmo sido recusado pelo A. (39 e 40 dos factos provados) e, mesmo depois disso, as partes andaram envolvidas em negociações no sentido de encontrar um desfecho passível de conciliar os interesses de ambas (ie, a revogação por acordo), tendo o A. recusado todas as propostas por considerá-las insuficientes (22 e 23 dos factos provados retratam pelo menos uma dessas negociações). 10.É falso que "a empregadora não provou o requisito a impossibilidade de subsistência do contrato de trabalho do A. " Como bem decidiu o acórdão recorrido, "a reintegração do autor teria necessariamente que ocorrer em posto de trabalho compatível com a categoria de director que ocupava, pelo que não é exigível à ré que o reintegrasse em posto inferior (. . .) e, além disso, não seria exigível que a ré mantivesse o autor com a categoria, salários e demais regalias inerentes a director, quando as funções que passaria a ocupar seriam as de mero chefe de departamento." (cfr. 50 e 60 parágrafos de fls. 2012 e pago 87). 11.Não é verdade que "os motivos do despedimento ficam a dever-se à conduta culposa do empregador (... ) que não deu cumprimento à obrigação de receber o A. nos termos do n.º 2 do art.° 290° do CT'. Essa obrigação (como outras que oneram a entidade patronal) não é absoluta, perpétua e inderrogável. Cede perante a verificação de circunstâncias objectivas (independentemente de culpa e passíveis de pôr em risco a própria sobrevivência da empresa) que justificam o recurso à extinção do posto de trabalho. No caso sub judice, essas circunstâncias verificaram-se - tal como reconhece o acórdão recorrido. 12.Mas mesmo assim, a Ré usou de toda a boa-fé para com o Autor ¬sendo absolutamente falso que não o tenha informado "de que caso não aceitasse a transmissão do estabelecimento da CC para a DD ficaria sem trabalho e perderia o emprego". Aliás, após ter tentado um acordo de revogação com o Autor, que este recusou (facto 22 e 23), a Ré ofereceu-lhe um posto de trabalho compatível com a sua categoria e funções, em Angola - que este também recusou (39 e 40 dos factos provados). 13.O n.º 4 do art. 368º do CT não tem de ser interpretado em consonância com o art. 119º do CT (que admite a mudança para categoria inferior) pois isso ditaria que a Ré, para além de ter de colocar à disposição do A. TODOS os postos de trabalho da empresa - incluindo mecânico, vendedor ou porteiro, visto que é inegável que o A. conseguiria desempenhar essas funções - ainda teria de envolver a ACT nesse processo, de modo a fiscalizar a validade de eventual acordo. O recurso à mudança para categoria inferior será sempre uma faculdade da Ré - e nunca uma imposição do trabalhador. 14.A Ré não tinha de oferecer ao A. nenhum dos postos de trabalho referidos nos factos 58 a 73. Na compatibilidade da categoria profissional do A. com outros postos de trabalho apenas será de ponderar a globalidade das tarefas desempenhadas pelo A. - e não o fracionamento dessas tarefas. 15.Não havia lugar ao despedimento coletivo. A aplicação desse instituto "pressupõe a cessação de contratos de trabalho promovida pelo empregador e operada simultânea ou sucessivamente no período de 3 meses" (1.ª parte do artigo 359º n.º 1 do Cod. Trabalho). No conceito de "cessação de contratos de trabalho" não cabem as revogações por acordo das partes. 16.Ainda que se entendesse de modo diferente e se contabilizassem as revogações por acordo operadas nesse período de 3 meses, sempre haveria que considerar que a "cessação do contrato de trabalho" do Autor, in casu, ocorreu efectivamente a 9.5.2010 (facto 34). Pelo que se considerarmos o período de 3 meses que rodeou essa data constatamos que nesse período houve apenas DUAS cessações de contrato: OO - fls. 1298 e PP - fls. 1523. 17.O Autor pretende que seja tomado como referência todo o período em que decorreu o processo em causa - a começar no dia 26.1.2010 (facto 32 - comunicação da intenção), passando pelo envio da decisão em 19.2.2010 e pela data em que ela produziu os seus efeitos a 9.5.2010 (facto 34) - o que implicaria que se contabilizasse um período de 9 meses em vez dos 3 fixados na lei. Essa interpretação subverte por completo a letra da lei, pelo que não pode, por isso, ser admitida. 18.Por outro lado, o trabalhador OO nunca poderia ser contabilizado no número de "cessações de contratos de trabalho" dado que aquela ocorrência não "se fundamentou em encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente ou redução de pessoal determinada por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos" - tal como exige a 2a parte do artigo 359º n.º 1 do Cod. Trabalho. De facto, a fls. 1298, pode ver-se que esse trabalhador pertencia ao estabelecimento de Vila Nova de Gaia (sede) - que não foi alienado. Além disso, no acordo subscrito pelas partes, não foram avançados quaisquer motivos que o fundamentassem, dado que não foi emitida declaração para acesso ao subsídio de desemprego (O trabalhador reformou-se). 19. De qualquer modo, a Directiva 98/58/CE (que equipara a despedimentos os acordos revogatórios) não pode ser aplicada verticalmente pois apesar de as Directivas Comunitárias vincularem os Estados destinatários, não podem ser invocadas nas relações entre particulares. Como tal, a solução será "o recurso ao princípio da interpretação (….) limitado na inadmissibilidade de uma interpretação contra legem do direito nacional' - conforme foi dito pelo acórdão recorrido (cfr. 30 parágrafo fls. 1990, pag-65). 20. Ora, há diversos argumentos interpretativos que obstam a que os acordos revogatórios sejam equiparados a despedimentos: Bernardo Lobo Xavier faz notar que, "na prática nacional, a redução de efectivos (através daquilo que designa por "distrate compensado) realiza-se deste modo porque as empresas - sobretudo as mais importantes ¬consideram um labéu a evitar o recurso ao processo de despedimento colectivo, visto que este normalmente está associado a carências económicas de vária sorte e porque esse processo envolve uma grande desestabilização (, .). Isto corresponde a interesses legítimos das empresas nas quais esteja em curso uma política de diminuição de efectivos." Pelo que "não nos parece que no nosso sistema a revogação possa ser considerada como despedimento para efeitos do número mínimo a que se refere o art. ( ... )" ("O Despedimento Colectivo no dimensionamento da empresa", Verbo, pago 387) 21.Outro argumento é dado pelo acórdão recorrido, que chama a atenção para o facto de, "recorrendo-se a uma interpretação sistemática da norma, em conjugação com o disposto no art. 10° do regime jurídico da atribuição do subsídio de desemprego, (...) haverá que distinguir as situações em que a cessação por acordo seja parte de um processo para recuperar ou viabilizar a empresa e aquelas que sejam fundamento para despedimento colectivo ou de extinção de posto de trabalho." - cfr. último paragrafo fls. 1990, pag 65 e seg. 22. O mesmo acórdão confere ainda um outro argumento: "importa ainda não ignorar que o despedimento por extinção do posto de trabalho trata-se duma forma de extinção da relação laboral que havia sido introduzida no nosso ordenamento jurídico pelo DL n.º 64-A/89 de 27/2, como forma de não pressionar a empresa a recorrer ao despedimento colectivo. Assim, e seguindo a doutrina do acórdão [do] Supremo Tribunal de 29 de Maio de 2013, poder-se-á afirmar que esta modalidade de despedimento se perfila como uma variante individual do despedimento colectivo, já que a sua motivação económica é essencialmente coincidente, achando-se a única diferença no número de trabalhadores abrangidos por uma e outra medidas, sendo a própria lei que confere ao despedimento colectivo feição subsidiária relativamente ao despedimento por extinção do posto de trabalho" - cfr. 2° paragrafo fls. 1991, pag 66. 23."Pelos frutos se conhece a árvore": se em resultado de um exercício de retórica, a interpretação que se faz de um preceito jurídico se afasta dos valores que esse preceito originalmente pretendia salvaguardar, então é porque a interpretação feita está errada e a ratio daquele preceito foi subvertida (cfr. art 9° do Cód. Civil). 24.Não é verdade "... que a resposta ao quesito 37° não podia incluir uma matéria que não foi objecto de discussão". Era o Autor quem tinha o ónus de provar os factos que invocava - pelo que, por maioria de razão, cabia-lhe a ele suscitar a discussão dessa matéria. Se não o fez "é evidente" que sofre as consequências dessa omissão - nomeadamente, considerando-se não provado que a sua participação em eventos da ré tenha ocorrido fora do horário normal de trabalho, ou à noite, ou fins-de- semana. 25.No que ao pedido subsidiário diz respeito (restituição da indemnização de antiguidade), o âmbito objectivo dos recursos é definido pelas conclusões do recorrente (artigos 635°, n.º 4, e 639°, n.º 1, do CPC, por remissão do art. 87°, n.º 1, do CPT). Ora, nas conclusões das alegações de recurso de apelação do Autor a questão do pedido subsidiário não foi sequer aflorada - pelo que não tinha o acórdão porque tomar posição quanto a essa matéria. 26.Acresce, além do mais, que a devolução da compensação decorre ex lege, da interpretação a contrario do n.º 5 do art. 366° CT ex vi 372° CT - sob pena de, se a entidade patronal não o fizer, estar a incorrer num enriquecimento sem causa. Como tal, só se compreende que o Autor levante esta questão de modo a munir-se de mais um pretexto para suscitar a nulidade do acórdão recorrido - o que, mais uma vez, constitui abuso de direito.»
12. O Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de fls. 2119-2121, julgou improcedente a nulidade arguida sob a alínea a) e sanou a omissão de pronúncia apontada pelo recorrente sob a alínea b), corrigindo o acórdão recorrido, acrescentando-lhe: “Condena-se a recorrente a pagar ao recorrido a indemnização por antiguidade referida no facto 36 (€ 84.606,62), acrescida de juros desde a data de trânsito da decisão (art. 814º, n.º 2, do Código Civil).”
13. Neste Supremo Tribunal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta concluiu pela improcedência da revista e pela manutenção da decisão recorrida.
14. A este parecer apenas o A., ora recorrente, ofereceu resposta, mantendo a posição sustentada na revista.
II. QUESTÕES A DECIDIR
Atentas as conclusões da revista e atendendo a que se mostra sanada a nulidade do acórdão recorrido invocada pelo A., ora recorrente, sob a alínea b) do requerimento de interposição de recurso (falta de pronúncia sobre o pedido subsidiário de condenação no pagamento/restituição da indemnização de antiguidade), cumpre conhecer das seguintes questões no caso vertente: III. FUNDAMENTAÇÃO
A - DE FACTO
Os factos materiais fixados pelas instâncias foram os seguintes:
B - DE DIREITO
A - Enquadramento normativo, adjetivo e substantivo
Atenta a data da propositura da ação – 11 de maio de 2010 - e considerando que o acórdão recorrido foi proferido em 17 de dezembro de 2014, à presente revista é aplicável o regime processual previsto no Código de Processo Civil (CPC) na versão conferida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, ex vi art.º 1.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho (CPT).
B - Da nulidade do acórdão recorrido
Cumprindo o disposto no art.º 77.º, n.º 1, do CPT, o recorrente arguiu a nulidade do acórdão recorrido no requerimento de interposição do recurso, por: «a) pronúncia sobre questão de que não podia tomar conhecimento e não conhecimento de questão que devia conhecer, nomeadamente conheceu de fundamentos do despedimento não constantes da decisão de despedimento e não conheceu da motivação constante dessa decisão (…) (não conheceu da fundamentação da decisão do despedimento, do posto de trabalho dito extinto de diretor de serviços na estrutura de Gaia, e criou uma tese própria não constante da decisão, de extinção de um posto de trabalho de chefe de departamento de após-venda na estrutura/estabelecimento do Porto – art.º 387º, n.º 3, do CT); b) falta de pronúncia sobre o pedido subsidiário de condenação no pagamento/restituição da indemnização de antiguidade, formulado na reconvenção».
O Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de fls. 2119-2121, sanou a omissão de pronúncia apontada pelo recorrente sob a citada alínea b), pelo que apenas subsiste para apreciação a nulidade invocada sob a alínea a), julgada improcedente pelo tribunal recorrido.
No essencial, e conforme decorre da conclusão n.º 1, o recorrente sustenta que o acórdão recorrido é nulo por ter conhecido de questão que não podia julgar e por não ter julgado matéria submetida a julgamento, violando o disposto no art.º 387.º, n.º 3, do Código do Trabalho. Defende que o Tribunal da Relação construiu uma «…tese própria, não refletida na decisão da empregadora, de que o posto de trabalho objeto do despedimento perpetrado pela R. foi o posto de trabalho original do estabelecimento do Porto, que o A. tinha ocupado como chefe de departamento de após venda de retalho norte (B...) – o que é expressamente rejeitado pela empregadora, que na resposta à contestação exclui e nega qualquer ligação do trabalhador com o estabelecimento do Porto (arts. 58.º e segs. desse articulado.» Continua o recorrente dizendo que «…não foi esse o posto de trabalho extinto pela empregadora…» na medida em que «…na comunicação inicial do procedimento de despedimento a empregadora referiu-se ao posto de trabalho de diretor de polo de ... e ao posto de trabalho de diretor de polo de P..., na qualidade de Diretor de Serviços, afeto a esse posto de trabalho (facto 32, alínea P), na decisão «decidiu-se» pela extinção do posto de trabalho de diretor de serviço na «estrutura» de Gaia (na sede), por onde aferiu o despedimento (facto 34) e na resposta à reconvenção esclareceu que excluía e rejeitava qualquer ligação do A. ao estabelecimento do Porto (arts. 58° e segs.).»
Em conferência, o Tribunal da Relação lavrou acórdão a conhecer das suscitadas nulidades, tendo, neste âmbito, exarado o seguinte: «O tribunal deve centrar a sua análise na decisão de despedimento por extinção do posto de trabalho tendo em consideração os termos em que a mesma foi proferida e verificar se o posto de trabalho que ali se diz estar extinto, o está efetivamente. A análise ulterior da verificação da existência de posto de trabalho compatível já não tem este espartilho, até porque muito do averiguado a propósito resulta de alegação do trabalhador, devendo o tribunal ponderar todos os factos apurados para concluir pela verificação deste requisito do despedimento por extinção do posto de trabalho. Ou seja, para aferir da licitude do despedimento é necessário, entre o mais, que seja praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho, o que significa que é necessário que o empregador não disponha de outro posto de trabalho compatível com a categorial profissional do trabalhador (artigo 368º, n.º 1, al. b) e n.º 4 do Código do Trabalho). Ora, para fazer tal subsunção/enquadramento jurídico tinha o tribunal forçosamente que apreciar, como apreciou, se na estrutura da empregadora existia um posto de trabalho disponível e compatível com a categoria do trabalhador: foi o que sucedeu, tendo-se o tribunal movido no thema decidendum, de saber se o despedimento foi ou não lícito, face aos requisitos exigidos para o mesmo, maxime o supra indicado. Assim, não se verifica aqui a arguida nulidade.» [Fls.2120]
Analisando: Nos termos do artigo 615º, n.º 1, al. d), do CPC (norma aplicável à 2ª Instância como decorre do art.º 666º, n.º 1 do mesmo diploma legal), é nula a sentença quando: «O juiz deixe de pronunciar-‑se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento». O vício a que se reporta este normativo traduz-se no incumprimento, por parte do juiz, do dever prescrito no n.º 2 do artigo 660º, do mesmo código, que estabelece o seguinte: «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras». No caso vertente, não há, em nosso entender, nem omissão, nem excesso de pronúncia, na medida em que o Tribunal da Relação apreciou todas as questões que lhe foram postas, inclusivamente a agora suscitada pelo recorrente e que se prende com a extinção do posto de trabalho que fundamentou o seu despedimento e respetivos requisitos legais, sem exceder os limites do thema decidendum, acabando por concluir pela respetiva licitude. É certo que seguiu um entendimento distinto do defendido pelas partes ao concluir que o posto de trabalho original do A. se situava no estabelecimento do Porto. No entanto, apesar de não aderir às considerações das partes no que diz respeito àquele que seria, afinal, o posto de trabalho original do A., certo é que o Tribunal da Relação não deixou de apreciar o núcleo essencial da questão relativa ao despedimento por extinção do posto de trabalho do A., analisando a verificação dos respetivos requisitos, tomando posição sobre o respetivo mérito e acabando por concluir pela sua licitude. Se o fez incorretamente, como alega o recorrente, então encontramo-nos perante um erro de julgamento e não perante situação geradora de nulidade. E tanto assim é que para sustentar a nulidade do acórdão o recorrente invoca que o Tribunal da Relação violou o disposto no artigo 387.º, n.º 3, do CT, segundo o qual «[n]a ação de apreciação judicial do despedimento, o empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes de decisão de despedimento comunicada ao trabalhador.» Ora, este tipo de impugnação consubstancia justamente a invocação de erro de julgamento e não de uma nulidade própria da decisão, porquanto nesta, ao contrário do erro de julgamento, em que se discorda do teor do conteúdo alcançado na decisão, invocam-se circunstâncias que, legalmente previstas (no caso, no art.º 615.º do CPC) ferem a própria decisão, o que, no caso, não sucede. Deste modo, não se verificam no caso em apreço qualquer dos vícios legalmente estabelecidos suscetíveis de invalidar a decisão recorrida, designadamente o previsto na alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, sendo certo que aquilo que o recorrente pretende, ao invocar a violação do artigo 387.º, n.º 3, do CT, é, na verdade, a reapreciação do mérito do acórdão recorrido (o que se fará infra). Improcede, assim, a nulidade invocada pelo recorrente, do acórdão recorrido.
C - Do erro de julgamento por violação do disposto no art.º 387.º, n.º 3, do CT
Defende o recorrente que o acórdão recorrido enferma de erro de julgamento por violação do art.º 387.º, n.º 3, do CT, ao concluir que o posto de trabalho objeto do despedimento perpetrado pela R. foi o posto de trabalho original do estabelecimento do Porto que o A. tinha ocupado como chefe de departamento de após-venda de retalho norte (B...). No entanto, se atentamente analisado, não pode afirmar-se que o acórdão recorrido tivesse violado o mencionado normativo, nos termos do qual «[n]a ação de apreciação judicial do despedimento, o empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes de decisão de despedimento comunicada ao trabalhador.» Dizer: Lida a decisão de despedimento constante de fls. 137 e seguintes, constata-se que a R. empregadora consumou a extinção do posto de trabalho de “diretor de polo” a que corresponde a categoria profissional de “diretor de serviço” afeto ao A. O acórdão recorrido, por seu turno, não considerou nem concluiu coisa diversa. Com efeito, a propósito desta questão, e depois de analisar a matéria de facto provada, o acórdão sub judicio expendeu esta fundamentação: (…) (…)
Uma leitura atenta do trecho acabado de transcrever demonstra, sem margem para equívoco, que o Tribunal da Relação teve presente que o posto de trabalho extinto foi o de “diretor de serviços” (ou “diretor de polo”) ao qual o A. se encontrava ultimamente afeto, tendo sido justamente esse o posto de trabalho objeto da comunicação final de despedimento, conforme resulta de fls. 137 e seguintes. É certo que, após proceder à análise dos factos provados, o Tribunal da Relação concluiu que, atenta a natureza temporária da permanência do A. nos estabelecimentos de P... e ..., o posto de trabalho de origem do A. continuava a ser o de chefe de departamento de após-venda do retalho norte (B...) no estabelecimento do Porto na Rua .... Simultaneamente, no entanto, reconheceu que o A. havia sido promovido de chefe de departamento para diretor e que o seu regresso ao estabelecimento do Porto não era viável, uma vez que ali não tinha a R. posto de trabalho compatível para o integrar, facto que se provou. Ou seja, ao contrário do que alega o recorrente, em momento algum o Tribunal da Relação considerou que o posto de trabalho objeto do despedimento promovido pela R. tivesse sido o posto de trabalho que o A. tinha ocupado no estabelecimento do Porto como chefe de departamento de após-venda de retalho norte, antes tendo tido bem presente que o posto de trabalho extinto foi o de “diretor de serviços” afeto ao A., o mesmo que foi objeto da decisão de despedimento. Improcede, assim, a invocada violação do disposto no art.º 387º, n.º 3, do CT.
D - Da (i)licitude do despedimento do A.
Está demonstrado nos autos que a R. procedeu ao despedimento do A. com fundamento na extinção do seu posto de trabalho. Importa aferir se o fez licitamente. O despedimento é uma declaração de vontade do empregador, dirigida ao trabalhador, destinada a fazer cessar o contrato de trabalho para o futuro. Tecnicamente o despedimento é uma declaração vinculada – porque condicionada à verificação de determinados motivos que a lei considera como justificativos da cessação da relação laboral –, constitutiva – porquanto o ato de vontade do empregador tem efeitos por si mesmo, sendo, consequentemente, uma forma de cessação de exercício extrajudicial – e recipienda – pois só é eficaz depois de ter sido recebida pelo seu destinatário (cfr. Pedro Romano Martinez, in “Direito do Trabalho”, Vol. I, págs. 511 e ss.). Para haver despedimento é exigível que ocorra uma manifestação de vontade por parte da entidade patronal de pôr termo à relação de trabalho. Tal manifestação poderá ser expressa ou tácita, mas deverá ser exteriorizada em condições de não suscitar dúvida plausível sobre o seu exato significado. Impõe-se, em suma, que a entidade patronal - por escrito, verbalmente ou até por mera atitude – anuncie ao trabalhador, de modo inequívoco, a vontade de extinguir a relação laboral. Na abordagem a uma cessação do contrato de trabalho operada pelo empregador há que ter sempre presente o princípio constitucional da segurança no emprego estabelecido no art.º 53.º da Constituição da República Portuguesa, cujo conteúdo se consubstancia na proibição de despedimentos arbitrários (despedimentos sem justa causa, ou por motivos políticos ou ideológicos). Tal princípio constitucional assegura uma ampla tutela aos trabalhadores em matéria de estabilidade do vínculo laboral, sendo de imposição direta às entidades públicas e privadas, por integrar a categoria dos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores com sujeição ao regime do art.º 18.º da Constituição da República Portuguesa. Devem ser, pois, reduzidas à regra do mínimo, as restrições ao conteúdo do princípio da segurança no emprego. Uma das restrições ao princípio da segurança no emprego é o despedimento por causas objetivas, ou seja, causas justificadas em que, não sendo imputáveis a culpa do trabalhador ou do empregador, existe uma inviabilidade na manutenção da relação laboral, uma impossibilidade prática da subsistência do contrato. Por força do mencionado princípio constitucional, embora a lei admita causas de despedimento objetivas, o legislador teve necessidade de impor alguma rigidez no procedimento para essa forma de cessação da relação laboral e nos requisitos substanciais da sua fundamentação. A cessação do contrato por extinção do posto de trabalho insere-se no conceito de justa causa objetiva de despedimento. Como se refere no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 306/2003 de 25 de Junho, que apreciou a constitucionalidade de algumas normas do Código do Trabalho de 2003, entre as garantias a observar no caso de despedimento por causas objetivas “… estão a de determinação das causas (com suficiente concretização dos conceitos da lei), da controlabilidade das situações de impossibilidade objetiva, e do asseguramento ao trabalhador de uma indemnização”. A jurisprudência tem-se pronunciado no sentido das exigências de concretização dos factos que podem conduzir ao despedimento por causas objetivas e de modo a que esses factos conduzam, necessariamente, à impossibilidade prática daquele (ou daqueles) contrato (s) de trabalho. É que se da análise dos factos concretos que são invocados para o despedimento por causas objetivas, não se concluir que é um determinado posto de trabalho que deve ser extinto (e não outro), os motivos invocados não podem ser tidos em conta para fundamentar um despedimento por causas objetivas por não constituírem “justa causa” em relação ao contrato de trabalho atingido. A entender-se a desnecessidade da correspondência estrita entre os motivos invocados para a cessação do contrato de trabalho por justa causa objetiva e o contrato de trabalho abrangido, violar-se-ia frontalmente o princípio constitucional da segurança no emprego, por permitir despedimentos arbitrários. Feita esta breve alusão ao princípio constitucional, vejamos agora o que estabelece a legislação ordinária em relação do despedimento por extinção do posto de trabalho. Dispõe o art.º 367º, n.º 1 do Contrato de Trabalho que «[c]onsidera-se despedimento por extinção do posto de trabalho a cessação de contrato de trabalho promovida pelo empregador e fundamentada nessa extinção, quando essa seja devida a motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos relativos à empresa». A explicitação destes motivos é operada pelo art.º 359º, n.º 2, por força do n.º 2, do art.º 367º, considerando nomeadamente: Neste âmbito, importará salientar o dever do tribunal proceder quer ao controlo da veracidade dos motivos invocados para o despedimento, quer à verificação sobre se existe nexo de causalidade entre os motivos invocados pelo empregador e o despedimento, por forma a poder concluir, segundo juízos de razoabilidade, se tais motivos eram adequados a justificar a decisão de redução de pessoal.
No que especificamente respeita ao despedimento por extinção do posto de trabalho, o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 01.10.2008 (Recurso n.º 8/08, da 4.ª Secção) perfilhou o entendimento de que, na apreciação da verificação do motivo justificativo da cessação do contrato, as decisões técnico-económicas ou gestionárias a montante da extinção do posto de trabalho estão cobertas pela liberdade de iniciativa dos órgãos dirigentes da empresa. ([1]) Também a doutrina sublinha estas especificidades do controlo judicial dos fundamentos do despedimento coletivo e por extinção do posto de trabalho.
Assim, Bernardo Xavier (no seu estudo "O regime dos despedimentos coletivos e as modificações introduzidas pela Lei n.º 32/99 de 18/05", in Estudos do IDT, vol. I, Almedina, p. 409), reconhecendo que cabe ao juiz controlar a fundamentação da decisão patronal, sustenta que não lhe cabe substituir-se à entidade empregadora, transformar-se em gestor, e impor-lhe a decisão que ele próprio juiz tomaria se estivesse na posição empresarial, seguindo os seus critérios pessoais. Há uma ampla margem de decisão que deve ser consentida ao empresário que decide, assume os riscos e suporta os encargos da sua empresa, desde que se não conclua, de acordo com um juízo de equidade, pela falta de presença de uma motivação clara e, portanto sustentável. Segundo este autor, "apenas nos casos de gestão inteiramente inadmissível ou grosseiramente errónea " poderão ser postos em causa os critérios de gestão observados (como ocorre nas situações de discricionariedade técnica nos tribunais administrativos, que só agem quando denotam erro manifesto de apreciação).
Também Mário Pinto e Furtado Martins (no seu estudo "Despedimentos coletivos: liberdade de empresa e ação administrativa", in RDES, ano XXXV, n.ºs 1-2-3-4, Jan. - Dez. 1993, pp.38 e ss.) sustentam que o juiz deve apenas, em princípio, assegurar-se "da existência dos motivos alegados e da relação entre estes e o despedimento, por forma a evitar a realização de despedimentos patentemente arbitrários ou fundados em motivos manifestamente falsos ou inconsistentes. Mas já não lhe caberá substituir-se ao empresário e determinar a improcedência do despedimento porque, p. ex., entende que existem outras soluções alternativas". Maria do Rosário Palma Ramalho afirma, igualmente, a propósito do despedimento por extinção do posto de trabalho, que não são sindicáveis os critérios da decisão que levaram à extinção do posto de trabalho (in “Direito do Trabalho”, Parte II – Situações laborais individuais, Coimbra, 2006, p. 884). Finalmente, também Monteiro Fernandes (in Direito do Trabalho, 15ª edição, p. 628-629) afirma que: “O “momento” decisivo, sob o ponto de vista do regime do despedimento – isto é, da sua motivação relevante – parece localizar-se, não no feixe de ponderações técnico-económicas ou gestionárias a que alude o art. 397.º/2 (e que são cobertas pela liberdade de iniciativa do titular da empresa), mas a jusante daquele, no facto da extinção do posto de trabalho, produto de uma decisão do empregador, e nesse outro facto que é a constatação da inexistência de função alternativa para o trabalhador que o ocupava – constatação essa também suportada, em certa medida, pelo critério organizacional do empregador. Está-se, pois, perante uma forma de despedimento que culmina numa cadeia de decisões do empregador situadas em diferentes níveis mas casualmente interligadas: esquematicamente, uma decisão gestionária inicial, uma decisão organizativa intermédia (a extinção do posto de trabalho) e uma decisão “contratual” terminal (a do despedimento).” Mais adiante, prossegue o mesmo Autor: «a apreciação da justa causa reveste-se aqui de importantes particularidades. Ela incidirá [...] no nexo sequencial estabelecido entre a extinção do posto de trabalho e a decisão de extinguir o contrato, tendo de permeio o insucesso de diligências tendentes à recolocação do trabalhador. É em relação a esse nexo e a cada um dos seus elementos que deve fazer-se a verificação dos requisitos fundamentais do artigo 368º/1, em especial a da impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho (…).» Em suma, não deve o julgador, na apreciação dos factos, desrespeitar os critérios de gestão da empresa (na medida em que sejam razoáveis e consequentes), não lhe competindo substituir-se ao empregador e vir a concluir pela improcedência do despedimento, por entender que deveriam ter sido outras as medidas a tomar perante os motivos económicos invocados. Tal não ilide, todavia, o dever, acima apontado, que incumbe ao tribunal relativamente quer ao controlo da veracidade dos motivos invocados para o despedimento, quer à verificação quanto à existência de nexo de causalidade entre os motivos invocados pelo empregador e o despedimento, de modo a que se possa concluir, segundo juízos de razoabilidade, que tais motivos são adequados a justificar a decisão de redução de pessoal.
Já sobre os direitos do trabalhador cujo contrato cesse por extinção do posto de trabalho, remete-se para as regras do despedimento coletivo, dispondo o art.º 372º que «[a]o trabalhador despedido por extinção do posto de trabalho, aplica-se disposto no n.º 4, do artigo 363º e nos artigos 364º a 366º.» Nestes normativos prevê-se, designadamente, e no que ora releva, que o trabalhador tem direito: Para além disso, o despedimento por extinção do posto de trabalho está ainda sujeito a um determinado procedimento que vem regulado nos arts. 369º a 371º. Tal procedimento começa com uma comunicação escrita do empregador à estrutura representativa dos trabalhadores, havendo-a, e ao trabalhador visado da necessidade de extinguir o posto de trabalho, com indicação dos motivos justificativos, e da necessidade de despedir o trabalhador afeto ao posto de trabalho a extinguir e a sua categoria profissional (art.º 369º); em caso de oposição ao despedimento, qualquer deles pode emitir parecer fundamentado no prazo de 10 dias do qual constem as respetivas razões e solicitar a intervenção do serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral (art.º 370º). Decorridos cinco dias sobre o termo do prazo fixado nos nºs 1 e 2 do art.º 370º, em caso de cessação do contrato de trabalho, o empregador profere, por escrito, decisão fundamentada de que constem os elementos referidos nas alíneas do n.º 3 do artigo 371º e designadamente: «a) o motivo de extinção do posto de trabalho; b) a confirmação dos requisitos previstos no n.º 1 do artigo 368.º, com menção, sendo caso disso, da recusa de alternativa proposta ao trabalhador; c) prova da aplicação do critério de prioridades, caso se tenha verificado oposição a esta; d) montante, forma, momento e lugar do pagamento da compensação e dos créditos vencidos e dos exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho; e) data da cessação do contrato», devendo a decisão ser comunicada «por cópia ou transcrição, ao trabalhador, às entidades referidas no n.º 1 do artigo 369.º e, bem assim, ao serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral (…)» (art.º 371º, n.º 3). Relativamente à ilicitude do despedimento, o art.º 381º prevê como “princípio geral” que qualquer tipo de despedimento é ilícito: b) Se o motivo justificativo do despedimento for declarado improcedente; c) Se não for precedido do respetivo procedimento; Mas o art.º 384º estipula que o despedimento por extinção de posto de trabalho é ainda ilícito, sempre que o empregador: «a) Não cumprir os requisitos do n.º 1 do artigo 368.º; c) Não tiver feito as comunicações previstas no artigo 369.º; Nos casos em que ocorre cessação do contrato de trabalho por iniciativa do empregador por alegada extinção do posto de trabalho, incumbe ao trabalhador alegar e provar a relação laboral e o despedimento, enquanto que recai sobre a entidade empregadora o ónus de alegar e provar os factos justificativos do despedimento e que se consideram suscetíveis de determinar a impossibilidade da subsistência da relação de trabalho (Ac. STJ de 07.07.2009 in www.dgsi.pt). Importa, ainda, referir que a ilicitude do despedimento só pode ser declarada por tribunal judicial em ação intentada pelo trabalhador e que na ação de impugnação do despedimento, «o empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador» (artigo 387.º n.ºs 1 e 3). Daí que, para efeito de apreciação dos fundamentos da alegada extinção do posto de trabalho, o tribunal se atenha aos factos que foram invocados no procedimento como motivadores da extinção do posto de trabalho. *** Feito o enquadramento do regime jurídico respeitante ao despedimento por extinção do posto de trabalho, passemos agora à análise das questões que, a este propósito, foram suscitadas nesta revista.
O recorrente sustenta a ilicitude do seu despedimento com base nos seguintes argumentos:
Analisemos separadamente cada um deles.
2.1. Em relação ao primeiro argumento invocado pelo recorrente - na decisão de despedimento a empregadora consumou a extinção de um posto de trabalho de diretor na estrutura da sua sede, em Gaia, que não existia nem era o do trabalhador porque nunca tinha prestado serviço nesse local - é manifesta a sua improcedência. Com efeito, analisando a comunicação que, ao abrigo do art.º 369.º, n.º 1, do CT/2009, a R. dirigiu ao A. em 26.01.2010 (facto n.º 32), bem como a decisão final de fls. 137 e ss, remetida ao trabalhador em 19.02.2010 (facto n.º 34), é manifesto que dali não resulta que a R. tenha promovido qualquer extinção do posto de trabalho na estrutura de Gaia. Nem tal faria sentido, na medida em que as partes sempre estiveram de acordo que o A. nunca exerceu funções em Gaia (facto n.º 41, correspondente à alínea AO) da matéria assente). Na verdade, é notório que a menção à estrutura de Gaia apenas surge na decisão de despedimento (e não também na comunicação inicial – cfr. fls. 129 a 131) pelo facto de a R. ter entendido que o trabalhador com a resposta apresentada no dia 8 de fevereiro de 2010 (facto n.º 33) havia exigido a sua reintegração neste local (cfr. penúltimo parágrafo da 2.ª página da decisão do despedimento – fls. 8 dos autos), pelo que analisou a hipótese de o aí colocar, considerando a “estrutura de Gaia” uma “estrutura equivalente” para efeitos do disposto no artigo 368.º, nº 2 do CT, embora tivesse acabado por concluir pela inexistência, neste local, de posto de trabalho adequado às funções inerentes à categoria profissional de “diretor de serviço”. Carece, assim, de fundamento factual a alegação do recorrente de que a empregadora consumou, na decisão de despedimento, a extinção de um posto de trabalho de diretor na estrutura da sua sede, em Gaia.
2.2. Passemos, agora, à análise do segundo argumento invocado pelo recorrente para justificar a ilicitude do seu despedimento - a empregadora não provou nenhum fundamento económico para a extinção do posto de trabalho do A. nem a adequação e o nexo de causalidade exigíveis, e não cumpriu os requisitos de despedimento por extinção do posto de trabalho, mais concretamente os previstos nas alíneas a), b) e d), do art.º 368.º, tendo violado o disposto nos n.ºs 2 e 4, do CT Fazendo um enquadramento sumário daquilo que se apurou em relação aos termos em que o A se encontrava a prestar serviço na R., podemos afirmar que o A. iniciou as funções para Ré em 09.11.1988, como chefe de secção no estabelecimento sito no Porto (factos n.ºs 2 e 3), tendo em outubro de 1989 passado a ser qualificado como chefe de departamento do após-venda do retalho norte (B...) continuando a trabalhar no mesmo local (facto n.º 8), mais concretamente nas instalações sitas na Rua ..., que ainda hoje continua em operação (facto n.º 6). A partir de 2000, o A. passou a chefiar o novo estabelecimento que abriu em P... (B... e M…), tendo sido, a partir de 01.04.2004, promovido a diretor de serviços (facto n.º 12), assim se mantendo até agosto de 2007 (facto n.º 11), altura em que passou a chefiar o estabelecimento de ..., explorado pela CC, empresa detida a 100% pela BB (facto n.º 14). O A. passou, assim, a ser o responsável pelo estabelecimento ..., o que envolvia a direção e chefia das vendas da B... e da M… e do após-vendas destas marcas e da T... (facto n.º 15). Do ora exposto resulta que a colocação do A. em P..., com a anuência do mesmo, durante cerca de 7 anos e onde foi promovido ao cargo de diretor de serviços (factos n.º 10 e 12), constitui uma transferência do local de trabalho de acordo com o disposto nos artigos 315º e 316º do CT de 2003 (diploma vigente à data). Já a sua transferência para o estabelecimento de ... explorado pela CC, empresa pertencente à R., consubstancia uma cedência do trabalhador, nos termos definidos nos artigos 322.º e seguintes do mesmo CT de 2003, na medida em que o A. manteve-se como trabalhador do quadro da R. (facto n.º 17). É certo que se tratou de uma cedência verbal (facto n.º 16), não tendo sido observada a forma escrita exigida pelo disposto no artigo 325º, nº 1 do CT de 2003. No entanto, tendo o A. aceitado chefiar o aludido estabelecimento, aí tendo permanecido por mais de dois anos, é incontornável a conclusão de que o trabalhador aceitou a validade da cedência, sendo certo que também se mostram preenchidos todos os requisitos exigidos pelo disposto nos artigos 323º e 324º do CT de 2003. Sucede que os estabelecimentos de ... (onde o A. ainda exercia funções em 02.12.2009 – facto n.º 18) e de P... (onde o A. havia exercido funções em período imediatamente anterior) foram alienados pela Ré a um terceiro, a DD, com efeitos a partir de 31.12.2012, tendo o A. se oposto à transmissão do seu contrato de trabalho para a referida empresa (facto n.º 20). Tal circunstancialismo teve origem no facto de, em 2005, a R. ter perdido a qualidade de importador das marcas B.../M… o que, aliado à quebra generalizada da venda de automóveis ocorrida em 2009 e que se cifrou em cerca de 25%, fez com que a R. tivesse de proceder à alienação de cinco estabelecimentos (3 da própria empresa – P..., Coimbra e Setúbal – e dois da empresa CC - Famalicão e ... – que a BB detinha em 100%) como condição para a renovação dos contratos de concessão para as marcas B.../M…, o que significou uma perda de quota de mercado (B...) de cerca de 13% (factos n.ºs 44 a 49). Com a alienação do estabelecimento de ..., no final do ano de 2009, terminou naturalmente a situação de “cedência” em que o A. se encontrava, pelo que o mesmo necessariamente teria que regressar ao serviço do cedente (da Ré), mantendo os direitos que tinha antes da cedência de acordo com o disposto no artigo 290º, nº 2 do CT/2009, então já em vigor. Antes de se encontrar cedido ao estabelecimento de ..., o A. era, conforme já mencionámos, o diretor do estabelecimento de P... (facto n.º 12), estabelecimento este que, como vimos, foi também alienado à mesma entidade que adquiriu o de ..., pelo que naturalmente ficou impossibilitada a sua reintegração do A. em P.... Certo é, no entanto, que a ida do A. para o estabelecimento de P... sempre se teria por temporária, não sendo este o seu posto de trabalho original. Foi este o entendimento seguido pelo Tribunal da Relação e, como se entende, com razão. Com efeito, provou-se que por carta de 30.11.2009, entregue ao A. no dia 2.12.2009, a R. comunicou-lhe a transmissão do estabelecimento de P..., para a DD, com efeitos a 31.12.2009, mantendo-lhe a antiguidade, a categoria e retribuições que auferia (facto n.º 19). O A. respondeu à referida carta em 11/12/2009, nos termos constantes de fls. 133, referindo não se considerar trabalhador do estabelecimento de P... por se encontrar a prestar serviço desde setembro de 2007 nas instalações de ..., invocando a sua qualidade de trabalhador do quadro da sede da BB e declarando nunca ter aceitado qualquer mudança definitiva do local do trabalho e não aceitar a transmissão do seu contrato de trabalho para a DD (facto n.º 20). Ora, da referida carta datada de 11.12.2009 resulta claramente que o A. considerava a sua transferência, primeiro para P... e depois para ..., como temporária, entendimento que a R. manifestamente aceitou ao assumir ter incorrido em equívoco aquando da comunicação que lhe fez por carta de 30.11.2009. Terminando a cedência do A. em ... e mostrando-se inviabilizado o seu regresso a P..., era necessário ponderar a reintegração do A. num posto de trabalho compatível com a sua categoria e funções de diretor de serviços. No entanto, provou-se que o único posto de trabalho compatível com a categoria e funções do A. existia apenas em Angola, o que aquele recusou, não existindo em toda a restante empresa qualquer outro posto de trabalho vago compatível com a categoria de diretor de serviço (factos n.ºs 39, 40 e 55). Tudo ponderado, não podemos deixar de concluir que os fundamentos invocados pela R. para a extinção do posto de trabalho do A. – redução da atividade provocada pela redução das vendas de automóveis e reestruturação da organização da empresa devida à alienação de cinco estabelecimentos - ficaram demonstrados e motivaram a extinção do posto de trabalho do A. na medida em que, por força da venda dos estabelecimentos de P... e ..., o A. deixou de ali poder exercer as funções de diretor de serviços, não existindo em toda a restante empresa qualquer outro posto de trabalho vago compatível com aquela categoria a não ser em Angola, opção que o A. recusou. Existe, assim, consequencialidade entre os motivos alegados para a extinção do posto de trabalho e a decisão de despedimento, tendo-se igualmente demonstrado que a manutenção da relação de trabalho entre as partes se tornou praticamente impossível na medida em que, extinto o mencionado posto de trabalho de diretor de serviços, a R. não dispunha de outro que fosse compatível com essa categoria profissional. * Demonstrados que ficaram os motivos indicados para fundamentar o despedimento do A., certo é que não se apurou – nem tal decorre dos factos provados - que os mesmos fossem devidos a conduta culposa da R, pelo que se verifica o requisito a que alude a al. a), n.º 1, do art.º 368.º, do CT. * Outrossim, no que diz respeito aos critérios que devem presidir à concretização dos postos de trabalho a extinguir, nos termos do art.º 368.º, n.º 2, do CT, a sua aplicação pressupõe a existência, na secção ou estrutura equivalente, de uma pluralidade de postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico. Na situação dos autos, não se demonstrou que existissem na estrutura da R. outros postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico ao posto de trabalho do A. para a concretização do posto de trabalho a extinguir, nem tal vem alegado. Isto é, o recorrente não alegou nem demonstrou que existisse outro posto de trabalho de conteúdo funcional idêntico ao seu que devesse ter sido extinto ao invés do seu, por aplicação dos critérios previstos nas alíneas do n.º 2, do art.º 368.º, do CT. Na verdade, o posto de trabalho extinto foi o posto de trabalho de diretor de serviços afeto ao A. na sequência, como vimos, da alienação dos estabelecimentos onde aquele havia desempenhado aquelas funções e da inexistência de outro posto compatível com a sua categoria noutra estrutura ou sede da empresa. Deste modo, assente que ficou que a R. não dispunha de outros postos de trabalho com funções compatíveis com a categoria do A. (com exceção do posto em Angola, mas que o A. recusou) e sendo certo que aqueles que o A. invoca como sendo compatíveis com o seu posto de trabalho, não estavam disponíveis, estando ocupados por outros trabalhadores, não só não se coloca a questão da aplicação dos falados critérios, como se preenche a impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho, a que alude o n.º 1, b) e o n.º 4, ambos do art.º 368.º do CT. * Defende também o recorrente que a R. não provou o requisito da inaplicabilidade do despedimento coletivo, requisito legal para o despedimento por extinção do posto de trabalho, tendo o acórdão recorrido feito errada aplicação da diretiva 98/59/CE. A este propósito, pode ler-se o seguinte no acórdão recorrido:
Concordamos inteiramente com o decidido a este respeito pelo Tribunal da Relação. A diretiva 98/59/CE do Conselho de 20 de julho de 1998 regula o despedimento coletivo e o seu artigo 1º define como despedimento coletivo, os despedimentos efetuados por um empregador, por um ou vários motivos não inerentes à pessoa dos trabalhadores, quando o número de despedimentos abranger segundo a escolha efetuada pelos estados membros: i) ou no período de 30 dias: no mínimo 10 trabalhadores, nos estabelecimentos que empreguem habitualmente mais de 20 e menos de 100; no mínimo 10% do número de trabalhadores, nos estabelecimentos que empreguem habitualmente no mínimo 100 trabalhadores e menos de 300 trabalhadores, no mínimo 30 trabalhadores, nos estabelecimentos que empreguem habitualmente no mínimo 300 trabalhadores; no mínimo 30 trabalhadores, nos estabelecimentos que empreguem habitualmente no mínimo 300; ii) ou, num período de 90 dias, no mínimo 20 trabalhadores, qualquer que seja o número de trabalhadores habitualmente empregados nos estabelecimentos em questão. Refere ainda a diretiva que para o cálculo dos despedimentos supra citados, são equiparadas a despedimentos as cessações do contrato de trabalho por iniciativa do empregador por um ou vários motivos não inerentes à pessoa dos trabalhadores desde que o número de despedimentos seja, pelo menos, de cinco. Do exposto decorre que para o enquadramento do despedimento coletivo não importa para a diretiva a forma ou modalidade que assume a cessação do contrato; o que importa é a cessação propriamente dita e que a rutura do contrato tenha ocorrido por iniciativa do empregador por motivos não inerentes à pessoa dos trabalhadores. No caso em apreço, apurou-se que entre finais do ano de 2009 e do primeiro semestre de 2010, a R. procedeu a uma redução substancial de quadros dos seus serviços, determinante de várias rescisões amigáveis de contratos de trabalho, mais de 10 (facto n.º 51). Também se provou que a Ré no ano de 2009 veio a proceder a uma redução da sua estrutura, passando de 594 trabalhadores em 2008 para 592 em 2009 e 537 em 2010 (facto n.º 54). Ora, não ficou demonstrado – nem tal foi, aliás, alegado pelo recorrente – que as aludidas rescisões por mútuo acordo tivessem sido precedidas de processos de despedimento já iniciados ou até mesmo anunciados. Acresce que as rescisões por mútuo acordo de contratos de trabalho, ocorridas no seio da R. - designadamente as que resultam da livre iniciativa das partes - não podem enquadrar-se no conceito de despedimento. Em primeiro lugar, porque a cessação do contrato de trabalho por acordo das partes vem expressamente prevista no Código do Trabalho (art.º 349.º) (não se confundindo com a cessação do contrato de trabalho por despedimento coletivo, definida no art.º 359.º); e em segundo lugar porque aquela modalidade de cessação da relação laboral não tem necessariamente de resultar da iniciativa do empregador. Não se considera, pois, que o acórdão recorrido tivesse feito uma interpretação do art.º 359°, n° 1, do CT, contrária à Diretiva 98/59/CE. Deste modo, e tendo presente que não foram abrangidos quaisquer outros trabalhadores no presente processo de extinção de posto de trabalho (facto n.º 56), somos a concluir que, no caso concreto, não se apurou ser aplicável o despedimento coletivo, verificando-se, assim, também preenchido o requisito a que alude o art.º 368.º, n.º 1, al. d), do CT. * Improcede também, assim, o segundo argumento invocado pelo recorrente para justificar a ilicitude do seu despedimento.
2.3. Finalmente, em relação ao terceiro fundamento invocado - a empregadora tinha obrigação de o receber e de lhe dar a possibilidade de se manter ao serviço, mesmo com mudança de funções e redução de vencimento, como alternativa ao despedimento, nos termos do art.º 119º do CT – é também manifesta a falta de razão que assiste ao recorrente e, consequentemente, a sua improcedência. Explicitando: Nos termos do mencionado normativo, «a mudança de um trabalhador para categoria inferior àquela para que se encontra contratado, nos termos do mencionado preceito legal, só pode ter lugar mediante acordo, com fundamento em necessidade da empresa ou do trabalhador, devendo ser autorizada pelo serviço com competência inspectiva do ministério responsável pela área laboral no caso de determinar diminuição da retribuição». (sublinhado nosso) Ora, no caso em apreço, não se demonstrou existir acordo entre as partes no sentido de o A. assumir uma mudança de funções com redução de vencimento, como alternativa ao despedimento. E tão pouco se demonstrou, aliás, que o A. tivesse apresentado uma tal proposta à R. e que esta a tivesse desconsiderado, sendo certo que, ao invés do que parece ser o entendimento do recorrente, sobre a R. não recaía a obrigação de, por força da extinção do posto de trabalho do A., integrá-lo em posto de trabalho inferior.
E - Do direito do A. às quantias peticionadas a título de horas suplementares, dotação de combustível, distribuição de lucros e telemóvel
1. Horas suplementares
No que diz respeito às horas suplementares, decorre das conclusões n.ºs 26º a 29º que a discordância do recorrente se prende com o raciocínio seguido pelo Tribunal da Relação na apreciação e na fixação dos factos materiais da causa. Conforme resulta do disposto no art.º 674.º, n.º 3, do CPC, «o erro da apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova». Por seu turno, decorre do art.º 682.º, do CPC que «aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o Supremo Tribunal de Justiça aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado» (n.º 1), pelo que «a decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo o caso excecional previsto no n.º 3 do artigo 674.º.» Da conjugação dos citados normativos resulta que este Supremo Tribunal de Justiça não pode (re)apreciar a matéria de facto objeto da impugnação da matéria de facto submetida ao Tribunal da Relação, estando-lhe subtraída a apreciação de meios de prova sem valor tabelado. Assim sendo, não podem as conclusões de recurso n.ºs 26º a 29º ser objeto de apreciação.
2. Dotação de combustível
Em relação ao pedido relativo à dotação de combustível, defende o recorrente na conclusão n.º 30 que a R. « (…) deve a dotação dos factos 79,80 e 81 até ao final do contrato (10.5.2010), porque se manteve a serviço (a situação de inatividade, com apresentação ao trabalho, até final do contrato foi ilegal, como a própria sentença de 1" instância concluiu), e, por força da ilicitude do despedimento, com a reposição do contrato, também desde o dia seguinte ao do despedimento (artºs. 258° e 389°, n° 1, a), do CT).» Sobre este particular aspeto, lê-se no acórdão recorrido: Improcede, portanto, neste ponto, a apelação (…)”. Concordamos inteiramente com o entendimento adotado pelo Tribunal da Relação. Na verdade, a propósito da distribuição de lucros, provaram-se os seguintes factos com relevo para a decisão a proferir:
Em relação ao pedido relativo à distribuição de lucros, defende o recorrente na conclusão n.º 31 que «(…) tem direito à distribuição de lucros dos anos de 2008 e 2009 - factos 86 e 87, que a R. não lhe pagou em discriminação face a outros colegas - facto 88, por ser seu trabalhador, a tal não obstando o facto de estar cedido a outra empresa do grupo (artºs. 258° e 389°, n.º 1, a), do CT), uma vez que tal cedência ocorreu por interesse presumido da empregadora e portanto o trabalhador colaborou no esforço coletivo da empregadora.» A este propósito, o acórdão recorrido expendeu a seguinte fundamentação: A respeito da participação de lucros, provaram-se os seguintes factos com relevo para a decisão a proferir: - O A. recebia anualmente uma verba que a R. lhe pagava de parte da distribuição de lucros pelos seus trabalhadores (facto n.º 86); - A R. não pagou ao A. a distribuição dos lucros de 2008 e de 2009 (facto n.º 87); - Outros diretores de serviços afetos a outros estabelecimentos da Ré (Coimbra, Faro, Parque das Nações, Cascais, P..., d.c.gaia, sede) receberam, nos anos de 2008 e 2009, valores relativos à participação nos lucros da Ré, com o esclarecimento que a respetiva atribuição aos trabalhadores dependia da existência de lucros e do resultado da avaliação feita ao trabalhador (facto n.º 88); - Na empresa CC – cujo estabelecimento de ... era dirigido pelo trabalhador desde Setembro de 2007 – entre 2007 e 2009, não foram atribuídas “qualquer tipo de gratificações, em virtude de (nos exercícios de 2007 e 2008) não terem sido apurados resultados positivos” (facto n.º 89). Decorre da factualidade apurada que, embora constituísse uma verba anual que o A. recebia (facto n.º 86), a participação de lucros dependia da verificação de determinados requisitos, designadamente dos seguintes: da existência de lucros e do resultado da avaliação feita ao trabalhador (facto n.º 88). Sucede que ficou demonstrado que entre 2007 e 2009, não houve no estabelecimento de ... resultados que permitissem a atribuição de lucros (factos 89 e 90). Acresce que a distribuição de lucros ao trabalhador dependia ainda de uma decisão a ser tomada pela entidade patronal o que, no caso, também não ocorreu. Atento o apurado, não é, pois, possível concluir que o recorrente tivesse adquirido o direito à atribuição da distribuição de lucros nos anos de 2008 e 2009 dado que os pressupostos que regiam a sua atribuição não se verificaram.
4. Telemóvel
Finalmente, com respeito ao pedido relativo ao telemóvel, o recorrente concluiu nos seguintes termos sob o ponto n.º 32: «O trabalhador tem direito ao valor de telemóvel (facto 91), nas remunerações de tramitação, por ser presumida retribuição.» A propósito desta questão, o Tribunal da Relação considerou o seguinte: Assim, improcede mais esta pretensão do autor». Partilhamos integralmente do entendimento sufragado no acórdão recorrido a cujos fundamentos aderimos acrescentando apenas um outro justificativo da improcedência deste pedido. É que, como já mencionámos supra a propósito da dotação de combustível, o direito à atribuição das retribuições intercalares ou de tramitação depende da existência de um despedimento ilícito, pressuposto que, como vimos, não se verifica no caso concreto.
IV DELIBERAÇÃO
Lisboa, 19 de Novembro de 2015
Melo Lima (Relator)
Mário Belo Morgado
Ana Luisa Geraldes _______________________ |