Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | LÍGIA TROVÃO | ||
Descritores: | CRIME DE ABUSO DE CONFIANÇA CONTRA A SEGURANÇA SOCIAL PENA SUSPENSA CONDIÇÃO DE PAGAMENTO ACÓRDÃO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA | ||
Nº do Documento: | RP2024032031/22.0T9VFR.P1 | ||
Data do Acordão: | 03/20/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL / CONFERÊNCIA | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
Indicações Eventuais: | 1ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
Sumário: | I – O art. 14º do RGIT é lei especial relativamente às normas dos arts. 51º a 54º do Cód. Penal, que prevê uma especial e única modalidade de suspensão da execução da pena de prisão para os crimes fiscais (artºs 1º, 3 e 10 RGIT) II – O RGIT recusou a possibilidade de a pena suspensa ser «singela» - isto é, sem condições / deveres / injunções / obrigações / proibições / regras de conduta e prescreveu no art 14º nº 1 do RGIT que a pena de substituição «Suspensão da Execução da Pena de Prisão» fosse «… sempre condicionada ao pagamento, em prazo a fixar até ao limite de cinco anos subsequentes à condenação, da prestação tributária e acréscimos legais, dos montantes dos benefícios indevidamente obtidos …» III - O AUJ do STJ nº 8/2012 de 12 de setembro de 2012 publicado no D.R. 1ª Série, nº 206, de 24/10/2012, veio dar um contributo para a interpretação do disposto no art. 14º do RGIT nas situações em que o tribunal, em face da opção entre a alternativa punitiva da pena de multa ou da pena de prisão, se decidiu pela aplicação da pena de prisão (e, restando-lhe ainda decidir sobre a sua modalidade) equacionar a aplicação da pena substitutiva da suspensão da execução da pena de prisão, para o que deverá dispor das informações sobre as condições pessoais, económicas e financeiras do condenado (mas não com o objetivo de apurar se ele tem, ou não, capacidade económica para pagar as quantias que ficaram por entregar ao Estado, seu titular, e legais acréscimos). IV - O AUJ do STJ nº 8/2012 de 12 de setembro de 2012, ao estabelecer a necessidade do «juízo de prognose de razoabilidade acerca da satisfação dessa condição legal por parte do condenado, tendo em conta a sua concreta situação económica, presente e futura» não se está a referir à capacidade económica de o condenado ter ou não de pagar ao Estado a prestação tributária em dívida e acréscimos legais, já que por força do disposto no nº 1 do art. 14º do RGIT essa suspensão da execução da pena é sempre/obrigatoriamente condicionada ao pagamento da totalidade da quantia em dívida e legais acréscimos à margem da condição económica pessoal do arguido/responsável tributário, sem possibilidade de qualquer graduação ou de uma qualquer redução, mas antes a querer significar que, como se diz no texto do AUJ nº 8/2012, “a margem de liberdade do julgador situa-se no justo ponto e momento em que pode optar pela substituição, mas para o fazer tem de estar na posse do pleno das informações possíveis, de modo a bem fundamentar a opção. Feita a escolha, a adoção da medida de substituição, cessa a liberdade de punição, porque imposta é a subordinação à condição; o juiz fica subordinado, amarrado, ao incontornável passo seguinte, que é impor a subordinação ao pagamento. Mas porque assim é, será nesse primeiro momento, em que é possível o exercício de liberdade, que poderá avaliar do sucesso da medida e mesmo cogitar sobre o regresso ao estádio anterior e pensar sobre a escolha de pena que temporariamente, como mero exercício de raciocínio, não foi tida então em consideração e tomada como boa solução. Por último, o julgador sempre terá uma palavra a dizer sobre o prazo de pagamento, para mais no âmbito de uma norma especial”. V – É, por isso, manifestamente ilegal, a formulação pelo arguido, condenado como autor material de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social p. e p. pelos arts. 107º ex vi do art. 105º nº 1 do RGIT, de qualquer pedido de redução, para montante inferior ao das quantias em dívida à Segurança Social e legais acréscimos, como condicionante da suspensão da execução da pena de prisão aplicada na sentença, por reporte aos seus rendimentos mensais e encargos familiares, por contrariar abertamente o texto da norma especial do nº 1 do art. 14º do RGIT que condiciona essa suspensão “ao pagamento, em prazo a fixar até ao limite de cinco anos subsequentes à condenação, da prestação tributária e acréscimos legais (…)”. | ||
Reclamações: | |||
Decisão Texto Integral: | Processo nº 31/22.0T9VFR.P1
Comarca de Aveiro Juízo Local Criminal de Santa Maria da Feira – Juiz 3
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:
I - RELATÓRIO No âmbito do processo (comum) nº 31/22.0T9VFR que corre termos pelo Juízo Local Criminal de Santa Maria da Feira – Juiz 3 do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, por sentença proferida em 04/05/2023 e depositado na mesma data, foi decidido: “Face ao exposto, julga-se a acusação pública e o pedido de indemnização civil procedentes por provados e, em consequência, o tribunal decide: - condenar a sociedade arguida A..., LDA. pela prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, previsto e punido pelos art. 7.º n.º1 e 105.º n.º 1, ex vi do 107.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 05 de Junho), na pena de 400 (quatrocentos) dias de multa à taxa diária de 8,00€ (oito euros), num total de 3.200,00€ (três mil e duzentos euros); - condenar o arguido AA pela prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, previsto e punido pelos art. 105.º n.º 1, ex vi do 107.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 05 de Junho) na pena de 10 (dez) meses de prisão, suspensa na sua execução por 5 (cinco) anos, com a condição de pagar ao Instituto da Segurança Social a quantia de 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros), comprovando documentalmente nos autos o pagamento anual da quantia de 5.000,00€ (cinco mil euros); - Condenar os arguidos / demandados A..., LDA. e AA no pagamento ao demandante Instituto da Segurança Social, I.P. da quantia de 161.234,88€ (cento e sessenta e um mil duzentos e trinta e quatro euros e oitenta e oito cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos sobre o montante de capital de 138.599,93€ (cento e trinta e oito mil quinhentos e noventa e nove euros e noventa e três cêntimos); - Absolver os arguidos A..., LDA. e AA da condenação no pedido de perda das vantagens do crime deduzido pelo Ministério Público. * Custas pelos arguidos, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC’s, reduzida a metade em face da confissão – cfr. art. 344.º n.º2 alínea c) e 513.º n.º3 do C.P.P. e art. 8.º n.º9 do R.C.P., por referência à Tabela III anexa àquele diploma. Custas na parte cível pelos demandados – cfr. art. 527.º n.º1 e 2 do C.P.C. ex vi art. 523.º do C.P.P.”. * Não se conformando, o arguido AA interpôs recurso da sentença em 05/06/2023, finalizando a motivação com as seguintes conclusões (transcrição): “A) O arguido não está conformado com a pena concreta aplicada, por demasiado penalizadora, atento as circunstâncias socioeconómicas que estes apresentam, bem como, as condições atenuantes que deverão merecer relevo para a determinação da pena, o que em nosso entender não o foram. B) Com todo e o devido respeito – que é muito – a condição de suspensão aplicada ao arguido do pagamento dos 25.000,00€, num prazo de 5 anos, com pagamentos anuais de 5.000,00 € é desproporcional e inadequada. C) O arguido encontra-se reformado e recebe uma quantia mensal de 1.700,00 €, conforme provado no item 13 da matéria de facto. D) Esta quantia da reforma do arguido é o seu único meio de subsistência. E) o art. 51º, nº 2 do C.P. estatui que “Os deveres impostos não podem em caso algum representar para o arguido condenado obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir”. F) Neste sentido, entendemos que, no caso em apreço, a condição aplicada ao arguido, no âmbito da prisão suspensa, não é razoável, uma vez que, o cumprimento daquela condição é de difícil – senão impossível – concretização para o arguido. G) Neste seguimento, a aplicação de pena de 10 meses de prisão suspensa pelo período de 5 anos, sob a condição de pagamento do referenciado valor, poderá estar apenas a diferir, no tempo, a prisão efectiva do arguido por aqueles 10 meses, sendo certo que, não lhe será possível, dadas as suas condições económicas, pagar tal quantia. H) Neste sentido, vide Ac. Do STJ nº 8/2012, para fixação de jurisprudência, que alude o seguinte: “(…) Daí a relevância fundamental da existência de um juízo de prognose da razoabilidade, no âmbito da condição a que fica sujeita a suspensão da execução da pena de prisão. Sob pena de esta (condição) ser absolutamente desprovida de sentido ou alcance, quando a priori resultar perfeitamente inviável, em face das reais e concretas condições económicas e financeiras do arguido, consideradas à data da respectiva condenação.” I) Assim, salvo melhor opinião, e tendo em conta o que supra se expôs, sempre será de aplicar ao arguido como condição de suspensão, o pagamento de uma quantia não superior a 20.000,00 €, em cinco anos, com um valor anual de 4.000,00 €, cumprindo os critérios da razoabilidade impostos pelo juízo de prognose que reclama o art. 51º, nº 2 do C.P., o que se pede ao Tribunal “Ad Quem”. J) Ao não respeitar estes princípios, a sentença violou a Constituição da Republica Portuguesa, pelo que a inconstitucionalidade que aqui se argui e deve ser declarada, com a consequente revogação da Sentença recorrida por Acórdão que determine nova condição de suspensão da pena de prisão aplicada ao arguido, por observância dos princípios constitucionais da proporcionalidade, adequação e razoabilidade, decididos no AC. de Fixação de Jurisprudência nº 8/2012. K) Nesta conformidade, deverá o Tribunal Ad Quem alterar a quantia da condição de suspensão para valor nunca superior a 20.000,00 €, e prestação anual aplicada, não devendo a mesma ser superior 4.000,00€, tendo em conta a situação socioeconómica do arguido e os princípios da proporcionalidade, adequação e razoabilidade. Termos em que, deve a Sentença proferida em 1ª instância ser revogada pelos Venerandos Desembargadores, por Acórdão que reduza o valor da condição suspensiva aplicada ao arguido, para valor nunca superior a 20.000,00€, e prestação anual aplicada, não devendo a mesma ser superior 4.000,00€, tendo em conta a situação socioeconómica do arguido e os princípios constitucionais da proporcionalidade, adequação e razoabilidade, Pois só assim se concretizará a integral JUSTIÇA!...”. * O recurso foi admitido em 09/06/2023. * A este recurso respondeu o Ministério Público em 23/06/2023, pronunciando-se pelo não provimento do recurso, concluindo nos seguintes termos (transcrição): “I. O arguido foi condenado pela prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, previsto e punido pelos art.º 105.º n.º 1, ex vi do 107.º do Regime Geral das Infrações Tributárias (Lei n.º 15/2001, de 05 de Junho) na pena de 10 meses de prisão, suspensa na sua execução por 5 anos, com a condição de pagar, ao Instituto da Segurança Social a quantia de 25.000,00€, comprovando documentalmente nos autos o pagamento anual da quantia de 5.000,00€; II. O arguido está reformado, aufere a quantia mensal de 1.700,00€ a título de pensão de reforma; habita com a sua mulher, a qual está reformada e aufere pensão de reforma no valor de 1.300,00 €; habitam em casa própria; tem 2 filhos maiores e como habitações literárias tem o 11.º ano de escolaridade; III. Afetar 21% do seu rendimento anual pessoal ao pagamento da dívida ao Instituto da Segurança Social afigura-se-nos manifestamente justo e razoável, porque facilmente exequível atendendo aos encargos e rendimentos do arguido que resultaram provados em julgamento; IV. Na realidade, o arguido ainda continua a dispor mensalmente de valor superior a 2 salários mínimos nacionais, sendo que não tem encargos relevantes para além de despesas correntes com alimentação, vestuário, água, luz, gás, etc…; V. Essa percentagem ainda diminui substancialmente se atendermos à totalidade dos rendimentos do arguido, englobando o valor da pensão da sua mulher, pois neste caso apenas seria afetado 11,9% do rendimento anual do casal ao pagamento da dívida ao Instituto da Segurança Social; VI. O Tribunal “a quo” não violou o disposto no disposto nos artigos 50º, n.º 2 e 51º, n.º 2 do Código Penal, o AUJ do STJ n.º 2/2012 e os princípios constitucionais da proporcionalidade, adequação e razoabilidade. Termos em que, não deve o recurso interposto pelo ora recorrente merecer provimento, mantendo-se integralmente a sentença proferida “. * Nesta Relação, a Exmª Sra. Procuradora-Geral Adjunta, em 25/11/2023 emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso, referenciando em síntese que: “ Como decorre da leitura da sentença não é verdade que ao decidir da forma supra referida, a Mmª juiz na 1º instancia não tenha atentado na jurisprudência do acórdão do STJ de fixação de jurisprudência nº 8/2012, sendo expressivas as passagens da sentença em que a juiz faz apelo a essa razoabilidade e proporcionalidade. Na verdade, na fixação da condição da suspensão da pena o tribunal a quo teve em atenção o vencimento do arguido e do seu agregado familiar, as suas condições de vida e gastos existentes e, como não poderia deixar de ser o montante global com o qual o arguido e a empresa por si representada se locupletaram à custa da Segurança Social, (138.539,39 €), circunstancias que determinaram a aplicação do computo de 25.000 euros, a pagar em 5 anos, valor que corresponde a cerca de 11% do rendimento anual do arguido e esposa, o que demostra que o arguido se encontra em condições de poder cumprir a obrigação pecuniária, na quantidade e no tempo determinados na sentença. Tal como refere o colega na 1ª instância: “porventura, terá o arguido que alterar alguns aspetos no seu quotidiano que implicarão alguns sacrifícios, mas isso não se afigura irrazoável ou desproporcional… De facto, foi o arguido quem se colocou nessa situação ao ter cometido um crime que teria sempre um reflexo negativo na sua vida, em caso de condenação, O recurso não merece provimento “. * Foi cumprido o disposto no art. 417º nº 2 do CPP, não tendo havido resposta. * Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, foi realizada a conferência. * II - FUNDAMENTAÇÃO Constitui jurisprudência corrente dos tribunais superiores que o âmbito do recurso se afere e se delimita pelas conclusões formuladas na respetiva motivação, sem prejuízo da matéria de conhecimento oficioso. No presente recurso, atendendo às conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação e considerando as questões de conhecimento oficioso, é apenas uma a questão a apreciar e a decidir: - saber se a condição imposta para a suspensão de execução da pena de prisão é desproporcional e inadequada por falta de capacidade económica para proceder ao pagamento da quantia de 5.000,00€ por ano e a redução do valor da condição de suspensão. * A sentença recorrida na parte que aqui releva, tem o seguinte teor (transcrição parcial): “Factos provados Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos com relevância para a decisão a proferir: 1. A arguida A..., Lda tem como objecto indústria de camionagem, exploração de carreiras de serviço público de aluguer ou de excursões e de qualquer outra em que os sócios acordem e o número de contribuinte para a Segurança Social .... 2. Desde a constituição da sociedade arguida, cabia ao arguido AA dirigir e organizar a sociedade arguida, dando ordens e instruções e controlando toda a actividade, chamando a si a iniciativa e a responsabilidade por todas as decisões do giro da empresa, nomeadamente perante trabalhadores, fornecedores, Autoridade Tributária e Segurança Social. 3. No exercício das suas funções, impendia sobre o arguido a obrigação de, em nome da sociedade arguida, reter no acto de pagamento das remunerações mensais aos trabalhadores por sua conta as cotizações legais a entregar à Segurança Social, montantes esses que, bem sabiam, pertenciam à Segurança Social e a ela deveriam ser entregues. 4. Assim, actuando em nome e no interesse da sociedade arguida e nos seus próprios interesses pessoais, o arguido, apesar de ter efectuado as retenções a que alude o artº 42º, nºs 1 e 2 do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Providencial da Segurança Social (Lei nº 110/2009, de 16-09) aos trabalhadores da sociedade arguida e a si próprio, na qualidade de membro do órgão estatutário, não entregou esses montantes nos cofres da Segurança Social, utilizando tais quantias em benefício próprio, como se lhes pertencesse. 5. Com efeito, o arguido, em representação da arguida sociedade, reteve mensalmente do valor das remunerações dos trabalhadores e do membro do órgão estatutário, as respectivas cotizações legais e não as entregou nos cofres da Segurança Social, entre os meses de Maio de 2017 a Fevereiro de 2018, Maio de 2018 a Março de 2020 e Outubro de 2020 a Janeiro de 2021, os montantes que a seguir se discriminam: a. Dos trabalhadores
b. Do arguido/membro de órgão estatutário:
6. Apesar de o arguido ter procedido ao desconto destas quantias nos vencimentos dos trabalhadores, não as entregou à Segurança Social mensalmente, entre o 10º e 20º dia do mês seguinte àquele a que as cotizações respeitavam, nem nos noventa dias seguintes, integrando a totalidade das cotizações retidas aos salários pagos aos trabalhadores e a si próprio, enquanto membro do órgão estatutário da arguida, num montante global de 138.599,93€ no património da sociedade arguida. 7. Os arguidos foram notificados a 07 de Fevereiro de 2022 para, no prazo de 30 dias, procederem ao pagamento da quantia descrita em 6), nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 105.º, n.º 4, alínea b) do R.G.I.T, no entanto, o pagamento da quantia em dívida e seus juros não foi efectuado até ao termo desse prazo. 8. Ao actuar da forma descrita, o arguido agiu de forma livre e consciente, bem sabendo que os montantes que reteve como cotizações obrigatórias eram devidos à Segurança Social e a esta deviam ser entregues, não devendo ser gastos em seu benefício e da sociedade arguida, tal como fez e que, por esse motivo, não podia agir de tal modo. 9. Ao assim proceder não desconhecia o arguido o carácter proibido e criminalmente punido das suas condutas. 10. O arguido actuou da forma descrita em virtude das dificuldades económicas atravessadas no período em causa. 11. O valor referido em 6) permanece por regularizar junto do Instituto da Segurança Social. 12. Os arguidos confessaram integralmente e sem reservas os factos de que vinham acusados. 13. O arguido está reformado, auferindo a quantia mensal de 1700 EUR a título de pensão de reforma; habita com a sua mulher, a qual está reformada e aufere pensão de reforma no valor de 1300 EUR; habitam em casa própria; tem 2 filhos maiores; como habitações literárias tem o 11.º ano de escolaridade. 14. A sociedade arguida encontra-se a laborar, com situação económica estável; tem 25 trabalhadores e 31 viaturas ao seu serviço (as quais se encontram penhoradas); labora em instalações próprias. 15. O arguido sofreu já a seguinte condenação transitada em julgado: a. PCS 201/14.4T9VFR, foi condenado pela prática, em 1/08/2008, de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, por sentença transitada em julgado em 27/10/2016, na pena de 14 meses de prisão suspensa na execução por 5 anos, julgada extinta em 20/03/2022. 16. A sociedade arguida sofreu já a seguinte condenação transitada em julgado: a. PCS 201/14.4T9VFR, foi condenado pela prática, em 1/09/2008, de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, por sentença transitada em julgado em 27/10/2016, na pena de 300 dias de multa, julgada extinta em 8/08/2017. * Factos não provados Com relevância para a decisão da causa, inexistem factos não provados. * Motivação O tribunal valorou a globalidade da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, conjugada com os elementos probatórios já constantes dos autos, tudo ao abrigo do princípio da livre valoração da prova previsto no art. 127.º do C.P.P. Desde logo, o arguido AA prestou declarações, tendo admitido que a sociedade de que era gerente não procedeu à entrega à Segurança Social das cotizações no período em causa, visto que a empresa estava a passar por sérias dificuldades financeiras decorrentes da quebra de facturação, o que foi agravado com a subsequente penhora dos saldos de contas bancárias e de créditos de clientes por parte da Segurança Social. Esclareceu ainda o arguido que, no período em causa nos autos, atenta a necessidade de proceder ao pagamento de salários e a fornecedores, assegurando o funcionamento na empresa, optou por não entregar os valores à Segurança Social, utilizando tais quantias no giro da sociedade. Ademais, esclareceu ainda que, apesar de tais dificuldades financeiras, a sociedade continua a laborar, procurando regularizar a sua situação fiscal. Em suma, o arguido confessou a factualidade na íntegra, não havendo dúvidas que as quantias deduzidas aos salários dos trabalhadores e dos membros dos órgãos estatutários não entregues à Segurança Social acabaram por ser afectas ao pagamento de outras despesas correntes da empresa, o que fez bem sabendo que lesava tal instituto na correspondente quantia, de forma livre, voluntária e consciente das consequências de tais decisões ao nível da tesouraria da sociedade. Já quanto aos valores actualmente em dívida relativamente a tais pagamentos, o arguido sustentou que foram já efectuados diversos pagamentos através das ditas penhoras, mas admitiu que o valor em causa nos autos ainda permaneça por cumprir. Foi ainda valorada a seguinte prova documental: mapa de valores de cotizações deduzidos e não entregues, a fls. 9 e 10; notificações para pagamento a fls. 28 a 37 e 260 a 262; declarações de remunerações e extracto global da declaração de remunerações, a fls. 82 a 105; recibos de vencimentos, a fls. 114 a 186 a) e 190 a 259, e certidão de registo comercial actualizada da sociedade arguida e documentos juntos pelo assistente na fase de julgamento. Em face do exposto, o tribunal deu como provados todos os factos constantes da acusação, nomeadamente a ausência de entrega das quantias em causa à Segurança Social e a utilização de tais valores no giro da sociedade gerida pelo arguido. No que concerne aos concretos valores em causa, o tribunal atendeu aos mapas de valores de fls. 9 e 10, inexistindo qualquer dúvida de que as quantias dadas como provadas dizem respeito a salários efectivamente pagos pela sociedade no período em causa. Ademais, valorou-se o depoimento da testemunha BB, técnica superior em exercício de funções na Equipa Corrente da Segurança Social do Centro Distrital ..., a qual demonstrou ter conhecimento directo dos montantes em dívidas e que esclareceu que, à data do julgamento, na conta corrente junto da Segurança Social e quanto às cotizações aqui em causa, o total do montante em dívida permanecia igual, visto que as penhoras e outros pagamentos que tinham sido realizados ao instituto foram imputados noutras dívidas da sociedade, à Segurança Social. Em face do exposto, apurou-se que tal valor mantém-se, actualmente, na quantia de 138.599,93€, a título de cotizações. Para prova das condições sociais, familiares e profissionais do arguido e condições económicas da sociedade arguida, foram consideradas as declarações prestadas em audiência de julgamento, as quais mereceram a credibilidade do tribunal. Por fim, foi ainda valorado o teor do certificado de registo criminal dos arguidos quanto aos seus antecedentes criminais. * III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Enquadramento Jurídico-Penal Do crime de abuso de confiança contra a segurança social. (…). * Escolha e determinação da medida da pena Da pena principal Nos termos do disposto no n.º 1 do art. 40.º do Código Penal, “a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”. Na determinação da pena, o tribunal começa por determinar a moldura penal abstracta e, dentro dessa moldura, determina depois a medida concreta da pena que vai aplicar, para, de seguida, escolher a espécie da pena que efectivamente deve ser cumprida. O crime de abuso de confiança contra a segurança social é punido em alternativa com pena de prisão de 1 (um) mês a 3 (três) anos ou com pena de multa de 10 (dez) a 360 (trezentos e sessenta) dias (cfr. art. 41.º n.º1 e 47.º n.1 do C.P., 105.º n.º1 e 107.º n.º1 do R.G.I.T.). Para a arguida pessoa colectiva encontra-se prevista a pena de multa de 20 (vinte) a 720 (setecentos e vinte) dias (cfr. art. 12.º n.º1 e 3, 105.º n.º1 e 107.º n.º1 do RGIT). No que respeita à escolha da espécie das penas alternativas abstractas previstas para o crime em questão (alternativa da pena de prisão ou da pena de multa) o tribunal apenas pode utilizar o critério da prevenção, como determina o artigo 70.º do C.P. Aí, determina-se claramente que a pena de prisão só deverá ser aplicada quando outra pena, não privativa de liberdade, não consiga realizar, de modo adequado e eficaz, as finalidades da punição. Com efeito, ao momento da escolha da pena alternativa são alheias considerações relativas à culpa. Esta (a culpa) apenas funciona como limite no momento da determinação da medida concreta da pena já escolhida. São finalidades exclusivamente preventivas, de prevenção especial e de prevenção geral, não finalidades de compensação da culpa, que justificam (e impõem) a preferência por uma pena alternativa. A prevenção geral sempre sob a forma de conteúdo mínimo de prevenção de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico, surge como limite à actuação das exigências de prevenção especial de socialização; quer dizer, desde que impostas ou aconselhadas à luz de exigências de socialização, a pena alternativa ou a pena de substituição só não serão aplicadas se a execução de pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postos imediatamente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias (cfr. Figueiredo Dias, “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, Parte Geral - II, p. 331). No que concerne ao caso sub judice, são relevantes as exigências de prevenção geral, porquanto são prementes as necessidades de actuação ao nível do crime na área tributária, seja pelo prejuízo que causa à Segurança Social e, daí, a toda a comunidade, seja porque afecta a confiança que os cidadãos devem sentir na sociedade, entre si e com referência ao Estado. Ademais, considerando o concreto valor do prejuízo apurado nestes autos, as exigências de prevenção geral saem particularmente reforçadas, porquanto o prejuízo causado demanda já, por parte da comunidade, uma reacção criminal. No que diz respeito às exigências de prevenção especial, verifica-se que o arguido se encontra social e familiarmente inserido. No entanto, certo é que sofreu já uma condenação pela prática do mesmo tipo legal de crime, pelo qual foi condenado em pena de prisão suspensa na sua execução, tendo praticado os factos de que ora cuidamos no decurso desse mesmo período da suspensão, o que revela já um reiterado desrespeito pela verdade fiscal. Opta-se, assim, pela aplicação de uma pena de prisão. No que diz respeito à sociedade arguida não se coloca, obviamente, a questão de escolha da pena, uma vez que só a pena de multa é aplicável – cfr. art.12.º n.º 2 do R.G.I.T. Escolhida a natureza da pena a aplicar, importa agora proceder à determinação da medida concreta da pena, para o que relevam a culpa e as exigências de prevenção (cfr. art. 71.º n.º 1 do C.P.). Nos termos do art. 71.º nº 1 e 2 do C.P., a determinação da medida da pena, dentro dos limites fixados na lei, é feita em função da culpa do agente (cfr. art. 40.º n.º2 do C.P.) e das exigências de prevenção, atendendo-se, em cada caso concreto, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a seu favor ou contra ele, devendo atender-se, em tal juízo, aos elementos constantes do art. 71.º n.º 2 do C.P. É esta, em síntese, a posição de Figueiredo Dias, “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, Parte Geral - II, p. 222, que articula as normas referidas nos termos expostos, os quais têm sido, no essencial, aceites e aplicados pelos tribunais – cfr., entre muitos outros, os acórdãos dos Supremo Tribunal de Justiça de 20/11/2008, P.º 08P1783, de 29/05/2008, P.º 08P1001, de 05/03/2008, P.º 08P437, e de 28/05/1997, P.º 97P157 (www.dgsi.pt). Assim, haverá que ter em consideração as seguintes circunstâncias quanto ao arguido AA: - atenuantes: a confissão integral e sem reservas por parte do arguido, demonstrativa de consciência critica para o seu comportamento; a circunstância de ter sido a precária situação económica da sociedade que determinou a conduta do arguido; a integração social e familiar de que beneficia; - agravantes: a intensidade do dolo, uma vez que foram os factos praticados com dolo directo e persistente, quando visto o período em causa; a condenação já sofrida pelo arguido pela prática do mesmo tipo legal de crime, tendo praticado os factos em causa nos autos no decurso do período da suspensão da pena de prisão que ali lhe havia sido aplicada. Assim, atentas as considerações já expendidas quanto às exigências de prevenção geral e especial que o caso em apreço demanda e tendo presente o limite máximo consentido pelo grau de culpa do arguido, o qual é significativo, afigura-se adequada a aplicação ao arguido AA da pena de 10 (dez) meses de prisão. Relativamente à sociedade arguida, sendo a arguida uma pessoa colectiva, da conjugação dos art. 12.º n.º 2 e 3 e 105.º n.º1 do R.G.I.T., resulta aplicável uma moldura entre 20 (vinte) e 720 (setecentos e vinte) dias de multa. Assim, tendo em conta os montantes globais envolvidos, o benefício que ilicitamente a pessoa colectiva conseguiu com a conduta ilícita do seu gerente e o prejuízo causado ao Estado e ainda a condenação anteriormente sofrida pela sociedade pela prática do mesmo tipo legal de crime, julga-se adequada a aplicação à sociedade arguida de uma pena de 400 (quatrocentos) dias de multa. O quantitativo diário segundo o art. 15.º n.º1 do R.G.I.T. oscilará, para as pessoas colectivas, entre 5,00€ e 5.000,00€. No que toca aos elementos para a determinação do quantitativo diário, apurou-se que a arguida sociedade atravessava à data dos factos fortes dificuldades financeiras, mas encontra-se a laborar, com activo próprio significativo e com alguma estabilidade de meios. Assim, julga-se adequado fixar o quantitativo diário no valor de 8,00€ (oito euros). * Da pena de substituição Impõe-se, agora, determinar se é caso de optar por pena de substituição da pena de prisão aplicada ao arguido AA. É tendo em vista a ideia de prevenção especial (finalidade de socialização), aliado à expectativa razoável de que a pena de substituição ainda pode ser eficaz relativamente ao comportamento futuro do arguido, que se justifica a sua escolha, uma vez que a mesma ainda se mostra suficiente não só para evitar que o arguido reincida (dissuadir o agente da prática de novos crimes), como também para satisfazer aquele limiar mínimo da prevenção geral da defesa do ordenamento jurídico. Pressuposto básico da aplicação de uma pena de substituição é a existência de factos que permitam um juízo de prognose favorável em relação ao comportamento futuro do arguido, sendo necessário que o tribunal esteja convicto de que a censura expressa na condenação e a simples ameaça de execução da pena de prisão aplicada sejam suficientes para afastar o arguido de uma opção desvaliosa em termos criminais e para o futuro. São unicamente critérios de prevenção, maxime de prevenção especial, que presidem à escolha entre a prisão e uma pena de substituição, não devendo aqui ser levadas em conta considerações relativas à culpa, cuja valoração teve já lugar no momento anterior da escolha e determinação da medida da pena principal. Nos termos do disposto no art. 43.º n.º 1 do C.P., “a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes.”. Por outro lado, dispõe o art. 58.º n.º1 do C.P., que “se ao agente dever ser aplicada pena de prisão não superior a dois anos, o tribunal substitui-a por prestação de trabalho a favor da comunidade sempre que concluir, nomeadamente em razão da idade do condenado, que se realizam, por este meio, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição”. Desde logo, em face dos antecedentes criminais do arguido e das considerações acima tecidas quanto às exigências de prevenção geral, consideramos que a substituição da pena por multa ou por prestação de trabalho a favor da comunidade não se mostra adequada e proporcional às finalidades da punição. Cumpre agora aferir se a pena concretamente aplicada pode ficar suspensa na sua execução. Dispõe o art. 50.º n.º 1 do C.P. que “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”. Este preceito consagra um poder-dever, ou seja um poder vinculado do julgador, que terá que decretar a suspensão da execução da pena, na modalidade que se afigurar mais conveniente para a realização daquelas finalidades, sempre que se verifiquem os necessários pressupostos. Para este efeito, é necessário que o julgador, reportando-se ao momento da decisão e não ao da prática do crime, possa fazer um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do arguido, no sentido de que a ameaça da pena serão paliativos suficientes para o afastar provavelmente da prática de novos crimes, mediante um processo de renovação de um projecto de vida compatível com o respeito, que é seu dever, pelos valores cuja ofensa integra crimes, e com a possibilidade, como é seu interesse, de uma realização pessoal e comunitária positiva. Este juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido pode assentar numa expectativa razoável (imbuída de um risco prudente) de que a simples ameaça da pena de prisão será suficiente para realizar as finalidades da punição e consequentemente a ressocialização (em liberdade) do arguido, ou dito de outro modo, a suspensão da execução da pena “deverá ter na sua base uma prognose social favorável ao réu, a esperança de que o réu sentirá a sua condenação como uma advertência e que não cometerá no futuro nenhum crime” – cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25/05/2001, P.º 01P1092 (www.dgsi.pt). No caso em apreço, ao arguido não foi aplicada pena concreta superior a 5 anos de prisão. Por outro lado, pese embora os seus antecedentes criminais, pela prática do mesmo crime, importa ter presente que tal condenação se reporta já a factos que remontam ao ano de 2008, beneficiando o arguido de relevante integração social e familiar. Entendemos, assim, poder ainda formular um juízo de prognose favorável ao arguido, no sentido de que a simples censura dos factos e, por conseguinte, a vivência sob a ameaça de pena de prisão, são suficientes para assegurar a protecção dos bens jurídicos violados e a reintegração deste na sociedade, pelo que se determina a suspensão da pena aplicada. Assim, o tribunal decide suspender na sua execução a pena de prisão aplicada. Dispõe o art. 14.º n.º 1 do Regime Geral das Infracções Tributárias “A suspensão da execução da pena de prisão aplicada é sempre condicionada ao pagamento, em prazo a fixar até ao limite de cinco anos subsequentes à condenação, da prestação tributária e acréscimos legais, do montante dos benefícios indevidamente obtidos e, caso o juiz o entenda ao pagamento de quantia até ao limite máximo estabelecido para a pena de multa”. Porém, impõe-se considerar o Acórdão de Fixação de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 8/2012, segundo o qual no processo de determinação da pena por crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido no artigo 105.º, n.º1 do RGIT, a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos do artigo 50.º n.º1 do C.P, obrigatoriamente condicionada, de acordo com o artigo 14.º n.º1 do RGIT, ao pagamento ao Estado da prestação tributária e legais acréscimos, reclama um juízo de prognose de razoabilidade acerca da satisfação dessa condição legal por parte do condenado tendo em conta a sua concreta situação económica presente e futura. Ora, segundo se afirma no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 20/04/2016, P.º 21/14.6IDAVR.P1 (www.dgsi.pt), “O acórdão de fixação de jurisprudência n.º 8/2012, do Supremo Tribunal de Justiça, não obriga, nem poderia obrigar, sob pena de violação do princípio da igualdade, a que não tendo o condenado condições para pagar a prestação tributária, mas reunindo os demais requisitos para a suspensão de execução da pena, a mesma não seja suspensa.” Acrescenta-se ainda no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18/02/2016, P.º 949/14.3IDLSB.L1-9 (www.dgsi.pt), que “O que tal AUJ obriga é que se faça, em sede de decisão, um juízo de prognose de razoabilidade acerca da satisfação dessa condição legal por parte do condenado, tendo em conta a sua concreta situação económica, pelo que a falta desse juízo implica nulidade da sentença por omissão de pronúncia, isto é, o julgador tem de aquilatar se o condenado está em condições de proceder ao pagamento da prestação tributária, durante o período da suspensão de execução da pena, e, estando, condicionar tal suspensão a esse pagamento. O acórdão não obriga, nem poderia obrigar, sob pena de violação do princípio da igualdade, a que, não tendo o condenado condições para pagar a prestação tributária, mas reunindo os demais requisitos para a suspensão de execução da pena, a mesma não seja suspensa. Seria uma verdadeira “prisão por dívidas ao Estado”. Por fim, de referir o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 25/02/2019, P.º 64/15.2T9VNC.G1 (www.dgsi.pt), no qual se afirma que “Em vez de se estabelecer uma correspondência automática entre o montante da quantia em dívida e o montante da quantia a pagar como condição de suspensão da execução da pena de prisão, a interpretação conjugada do citado art. 14 com o disposto no art. 51º,nº2, do C.Penal, de acordo com o qual “os deveres impostos não podem em caso algum representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir”, permite que o dever de pagamento como condição de suspensão da pena de prisão só seja imposto quando do juízo de prognose realizado resultar que existem condições para que essa obrigação possa ser cumprida. Tal dever de pagamento também não tem de ser na totalidade do devido, podendo ser objecto de graduação/redução. Ora, a formulação do juízo de prognose acerca das possibilidades do recorrente proceder ao pagamento da condição, passa pela consideração do montante da dívida em causa (…) e pela ponderação dos seus rendimentos mensais e respectivos encargos”. No caso em apreço, apurou-se que, em consequência da conduta dos arguidos, a sociedade arguida obteve um beneficio no valor global de 138.599,93€. Nessa medida, consideramos que a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido só poderia ficar condicionada ao pagamento desta quantia. Porém, no caso em apreço, em face do apurado quanto às condições económicas do arguido, não se mostra viável condicionar a suspensão da execução da pena ao pagamento da aludida quantia, sendo manifesto que o arguido não dispõe de rendimentos que lhe permita o cumprimento de tal condição. Antes se afigura razoável que a suspensão fique condicionada ao pagamento do valor de 25.000,00€, no prazo máximo da suspensão (5 anos – cfr. art. 50.º n.º5 do C.P.), para o que terá o arguido de afectar uma quantia mensal de cerca de 400,00€ para perfazer o montante, o que se afigura justo, adequado e razoável. Pelo exposto, determina-se a suspensão da execução da pena de prisão aplicada, por um período que se fixa em 5 (cinco) anos, subordinada à obrigação de o arguido pagar ao Instituto da Segurança Social, nesse mesmo prazo, a quantia de 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros), comprovando documentalmente nos autos o pagamento anual, a contar do trânsito em julgado da sentença, da quantia de 5.000,00€ (cinco mil euros). * IV. DO PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL FORMULADO PELO INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. (…)”. * Análise do mérito do recurso Questão única: de saber se a condição imposta para a suspensão de execução da pena de prisão é desproporcional e inadequada por não ter o arguido capacidade económica para proceder ao pagamento anual da quantia de 5.000,00€ e a redução do valor da condição de suspensão. O recorrente alega que a condição imposta para a suspensão da execução da pena de prisão aplicada, de pagamento do montante de € 25.000,00 num prazo de 5 anos, com pagamentos anuais de € 5.000,00, é desproporcional e inadequada, por se encontrar reformado e a quantia mensal de reforma que recebe, no valor de € 1.700,00, é o seu único meio de subsistência. Em seu entender, a aplicação da referida condição de suspensão porá em causa a subsistência do arguido em face dos seus rendimentos e das despesas do agregado familiar e poderá estar apenas a diferir, no tempo, a prisão efetiva do arguido por 10 meses, por não lhe ser possível pagar tal quantia. Em face disso, entende que a sentença violou o decidido no Ac. de Fixação de Jurisprudência do STJ nº 8/2012, o disposto no art. 51º nº 2 do Cód. Penal e os princípios constitucionais da proporcionalidade, adequação e razoabilidade. Requer que a condição de suspensão seja reduzida para o valor de € 20.000,00, a concretizar em cinco anos, mediante o pagamento anual de € 4.000,00, por só assim se cumprirem os critérios de razoabilidade impostos pelo juízo de prognose que reclama o art. 51º nº 2 do Cód. Penal. Apreciando. O recorrente vem condenado pela autoria material de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social p. e p. pelos arts. 7º nº 1 e 105º nº 1 ex vi do art. 107º do RGIT, na pena de 10 (dez) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de cinco anos, subordinada à condição de pagar ao Instituto de Segurança Social I.P., a quantia de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), comprovando documentalmente nos autos o pagamento anual da quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros). O recorrente não coloca em causa a matéria de facto provada, a sua qualificação jurídica ou a natureza e medida concreta da pena principal, nem a suspensão da execução da pena de prisão ou a sua duração. O que o recorrente contesta é a fixação do montante concreto do condicionamento da suspensão da execução da pena, ao pagamento do montante de € 25.000,00, no prazo de 05 anos, a concretizar em parcelas anuais de € 5.000,00 cada uma, por entender que os seus rendimentos mensais, dos quais há a descontar as despesas familiares, não lhe permitirem cumprir tal condição. O art. 14º do RGIT estabelece no seu nº 1 que “A suspensão da execução da pena de prisão aplicada é sempre condicionada ao pagamento, em prazo a fixar até ao limite de cinco anos subsequentes à condenação, da prestação tributária e acréscimos legais, do montante dos benefícios indevidamente obtidos e, caso o juiz o entenda, ao pagamento de quantia até ao limite máximo estabelecido para a pena de multa “. Trata-se de lex specialis relativamente às normas dos arts. 51º a 54º do Cód. Penal, que prevê uma especial e única modalidade de suspensão da execução da pena de prisão para as infrações fiscais. Na presente situação, em consequência da conduta dos arguidos, a sociedade comercial arguida integrou no seu património, o montante global de € 138.599,93 referente ao somatório das cotizações legais retidas mensalmente do valor das remunerações dos trabalhadores e do membro do órgão estatutário em vez de as entregar mensalmente à Segurança Social entre o 10º e 20º dia do mês seguinte àquele a que as cotizações respeitavam e, tal, valor, permanece por regularizar junto do Instituto da Segurança Social, I.P. (factos provados nºs 6 e 11). Do elenco dos factos provados consta ainda o que se retirou das declarações prestadas em audiência de julgamento (que mereceram a credibilidade do Tribunal) sobre a situação socioeconómica do recorrente AA, do seguinte teor: “13. O arguido está reformado, auferindo a quantia mensal de 1700 EUR a título de pensão de reforma; habita com a sua mulher, a qual está reformada e aufere pensão de reforma no valor de 1300 EUR; habitam em casa própria; tem 2 filhos maiores; como habitações literárias tem o 11.º ano de escolaridade “. O art. 51º do Cód. Penal sob a epígrafe «Deveres», dispõe que: “1 - A suspensão da execução da pena de prisão pode ser subordinada ao cumprimento de deveres impostos ao condenado e destinados a reparar o mal do crime, nomeadamente: c) Entregar a instituições, públicas ou privadas, de solidariedade social ou ao Estado, uma contribuição monetária ou prestação de valor equivalente. 2 - Os deveres impostos não podem em caso algum representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir” – destacado e sublinhado da nossa autoria. Na subordinação da suspensão da execução da pena ao cumprimento de deveres (por serem apenas estes que relevam para o caso destes autos) é fundamental que não sejam desrazoáveis (“não podem em caso algum representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir”) – arts. 51º nº 2 e 52º nº 4 do Cód. Penal. Conforme ensina Conceição Cunha([1]), “Esta proibição é, na verdade, imposta constitucionalmente, quer tendo em conta o princípio da dignidade da pessoa humana e o direito ao desenvolvimento da personalidade (arts. 1º e 26º), quer o princípio da proporcionalidade e mínima restrição de direitos (art. 18º nº 2) (…). São, assim, proibidos, (…) obrigações pecuniárias que pusessem em causa o mínimo necessário a uma subsistência digna”. Todavia o disposto nas normas dos arts. 51º nº 2 e 52º nº 4 do Cód. Penal vigoram apenas para os delitos do direito penal clássico ou «mala in se», sendo o direito penal fiscal direito especial relativamente ao direito penal de justiça e, portanto, é ao que se prescreve na norma do nº 1 do art. 14º do RGIT que deverá atender-se, só sendo legítimo recorrer ao disposto nas normas do Código Penal naquilo que não vier especificamente regulado no RGIT (cfr. arts. 1º d) e 3º a) do RGIT), não sendo o caso da situação dos presentes autos. O AUJ do STJ nº 8/2012 de 12 de setembro de 2012 publicado no D.R. 1ª Série, nº 206, de 24/10/2012 veio dar um contributo para a interpretação do disposto no art. 14º do RGIT nas situações em que o tribunal, em face da opção entre a alternativa punitiva da pena de multa ou da pena de prisão, se decidiu pela aplicação da pena de prisão e, restando-lhe ainda decidir sobre a sua modalidade, equacionar a aplicação da pena substitutiva da suspensão da execução da pena de prisão, para o que deverá dispor das informações sobre as condições pessoais, económicas e financeiras do condenado (mas não com o objetivo de apurar se ele tem, ou não, capacidade económica para pagar as quantias que ficaram por entregar ao Estado, seu titular, e legais acréscimos), fixando a seguinte jurisprudência: “No processo de determinação da pena por crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. no artigo 105º nº 1 do RGIT, a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos do artigo 50º nº 1, do Código Penal, obrigatoriamente condicionada, de acordo com o artigo 14º nº 1 do RGIT, ao pagamento ao Estado da prestação tributária e legais acréscimos, reclama um juízo de prognose de razoabilidade acerca da satisfação dessa condição legal por parte do condenado, tendo em conta a sua concreta situação económica, presente e futura, pelo que a falta desse juízo implica nulidade da sentença por omissão de pronúncia” – destacado e sublinhado da nossa autoria. E ao contrário do alegado pelo recorrente (e do entendimento seguido na sentença recorrida), o AUJ do STJ nº 8/2012 de 12 de setembro de 2012, ao estabelecer a necessidade do «juízo de prognose de razoabilidade acerca da satisfação dessa condição legal por parte do condenado, tendo em conta a sua concreta situação económica, presente e futura» não se está a referir à capacidade económica de o condenado ter ou não de pagar ao Estado a prestação tributária em dívida e acréscimos legais, já que por força do disposto no nº 1 do art. 14º do RGIT essa suspensão da execução da pena é sempre/obrigatoriamente condicionada ao pagamento da totalidade da quantia em dívida e legais acréscimos à margem da condição económica pessoal do arguido/responsável tributário, sem possibilidade de qualquer graduação ou de uma qualquer redução, mas antes a querer significar que, como se diz no texto do AUJ nº 8/2012, “a margem de liberdade do julgador situa-se no justo ponto e momento em que pode optar pela substituição, mas para o fazer tem de estar na posse do pleno das informações possíveis, de modo a bem fundamentar a opção. Feita a escolha, a adoção da medida de substituição, cessa a liberdade de punição, porque imposta é a subordinação à condição; o juiz fica subordinado, amarrado, ao incontornável passo seguinte, que é impor a subordinação ao pagamento. Mas porque assim é, será nesse primeiro momento, em que é possível o exercício de liberdade, que poderá avaliar do sucesso da medida e mesmo cogitar sobre o regresso ao estádio anterior e pensar sobre a escolha de pena que temporariamente, como mero exercício de raciocínio, não foi tida então em consideração e tomada como boa solução. Por último, o julgador sempre terá uma palavra a dizer sobre o prazo de pagamento, para mais no âmbito de uma norma especial”. Sobre a «Condição Pecuniária» da «Suspensão da execução da pena de Prisão», escreveu-se no § 21. do Ac. desta Relação do Porto de 28/04/2021, proc. nº 406/18.9IDPRT.P1, vindo do Juiz 9 do Juízo Central Criminal de Vila do Conde, relatado por Castela Rio, o seguinte (suporte digital gentilmente disponibilizado pelo ali Relator, aqui II Adjunto. No caso sub judice dispensa-se, como usualmente, a reprodução das notas de rodapé originais 1 a 24): “Segundo o art 14-1 do RGIT – vigente desde 05-7-2011 ut art 14-II do articulado da Lei 15/ 2001 de 5/6 - «A suspensão da execução da pena de prisão aplicada é sempre condicionada ao pagamento, em prazo a fixar até ao limite de cinco anos subsequentes à condenação, da prestação tributária e acréscimos legais, do montante dos benefícios indevidamente obtidos e, caso o juiz o entenda, ao pagamento de quantia até ao limite máximo estabelecido para a pena de multa» que é 1 200 dias ut art 104-1 do RGIT «… a uma quantia entre € 1 e € 500, tratando-se de pessoas singulares, … que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos» ut art 15-1-I-III do RGIT. Todavia, não tendo sido interposto recurso pelo MºPº quanto a esta parte, também este Tribunal de recurso não poderá repor a legalidade sob pena de violação da proibição da reformatio in pejus consagrada no art. 409º nº 1 do CPP. De qualquer forma, sempre se dirá que perante o que ficou consignado na sentença não pode dizer-se que a Sra. Juiz a quo não teve em conta as condições socioeconómicas do recorrente ao estabelecer um prazo de 5 anos (idêntico ao período de duração da suspensão da execução da pena) para permitir-lhe proceder ao pagamento do montante fixado de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros) por conta das quotizações em dívida à Segurança Social I.P. (que na realidade ascende a € 138.599,33), montante que representa, como bem refere o MºPº na resposta, cerca de 1/5 da totalidade do seu valor, a concretizar em tranches anuais de € 5.000,00 cada uma, equivalendo, feitas as contas, à retirada da quantia mensal de € 416,00 do valor mensal da pensão de reforma auferida pelo arguido, no montante de € 1.700,00. No plano dos rendimentos auferidos pelo recorrente a título pessoal, sobressai um rendimento anual de € 23.800,00 (€ 1.700,00 x 14 meses). Ao recorrente restará ainda a quantia de € 1.284,00 para se sustentar e contribuir para as despesas do seu agregado familiar (composto por 2 filhos maiores de idade e pela esposa do arguido), para as quais também contribui a pensão de reforma auferida pela esposa, no montante de € 1.300,00 mensais. Além disso, como habita em casa própria, não haverá que deduzir daquele remanescente de € 1.284,00, qualquer outra quantia com a habitação/alojamento do arguido e seu agregado familiar. É certo, que na presente situação estamos perante um condenado com 69 anos de idade (por reporte à data da condenação), que se encontra reformado e que, portanto, não poderá almejar aumentar os rendimentos provenientes do seu trabalho. Porém, por habitar em casa própria, as despesas do recorrente confinam-se às decorrentes do dia-a-dia (alimentação, vestuário, eletricidade, água, gás, medicação, etc.). Conforme realça o MºPº na resposta e por reporte à quantia de € 25.000,00 fixada na sentença (e já não à que resultaria da devida aplicação do disposto no nº 1 do art. 14º do RGIT), “em termos comparativos, e sempre com as devidas cautelas tendo em conta os domínios em causa (mas pertinente no que toca à salvaguarda do valor mínimo existencial), para uma pessoa singular que é declarada insolvente (e, portanto, não cometeu nenhum crime) os Tribunais aquando a exoneração do passivo restante acautelam ao insolvente um salário mínimo nacional por entenderem que é o mínimo necessário para assegurar a sua sobrevivência. Ora, no caso em apreço, considerando apenas o rendimento do arguido, este fica na sua esfera de disponibilidade com um rendimento líquido mensal superior a dois salários mínimos nacionais (23.800,00€ - 5.000,00€ (valor anual fixado na sentença) = 18.800,00€ : 12 meses = 1.566,66€). Porventura, terá o arguido que alterar alguns aspetos no seu quotidiano que implicarão alguns sacrifícios, mas isso não se afigura irrazoável ou desproporcional. De facto, foi o arguido quem se colocou nessa situação ao ter cometido um crime que teria sempre um reflexo negativo na sua vida, em caso de condenação, como foi o caso “. No Ac. da R.G. de 17/12/2013([2]) citado pelo MºPº, “I- Sendo o valor do salário mínimo nacional aquele que o próprio legislador considera como sendo o necessário para assegurar a subsistência do trabalhador com o mínimo de dignidade - permitindo um nível de vida decente - exigível , deve também ser ele o utilizado como critério para efeitos do artº 239º, nº 3, alínea a), do CIRE. II - Em razão do referido em I, o rendimento disponível que o devedor fica obrigado a ceder aos credores através de um fiduciário não deve em circunstância alguma coarctar a possibilidade de o devedor continuar a dispor de um rendimento de valor igual a pelo menos um salário mínimo nacional “. De tudo o que vem de dizer-se é obvio que terá de concluir-se como manifestamente ilegal a requerida redução para o montante de € 20.000,00, da condição para a suspensão da execução da pena de prisão cominada ao recorrente (equivalente à retirada da quantia mensal de € 333,00 ao valor que recebe a título de reforma - € 1.700,00 que daria o seguinte resultado: €23.800,00 - € 4.000,00 = € 19.800,00:12 meses = € 1.650,00, superior a dois salários mínimos nacionais, cfr. D.L. nº 107/2023 de 17 de novembro), por contrariar abertamente o texto da norma especial do nº 1 do art. 14º do RGIT que condiciona essa suspensão “ao pagamento, em prazo a fixar até ao limite de cinco anos subsequentes à condenação, da prestação tributária e acréscimos legais (…)”. Por último, também não assiste razão ao recorrente quando afirma que “a condição imposta pelo Tribunal a quo poderá estar apenas a diferir, no tempo, a prisão efetiva do arguido por 10 meses, por lhe ser impossível pagar quantia tão avultada”. Esta questão vem abordada e tratada no texto do AUJ nº 8/2012 para o qual se remete, onde se conclui pela sem razão de tal entendimento. Na verdade, a falta de pagamento das importâncias referidas no nº 1 do art. 14º do RGIT tem as consequências enumeradas no seu nº 2, por ser norma especial relativamente ao disposto no art. 55º do Cód. Penal([3]), daí derivando que não é automática a revogação da suspensão da execução da pena aplicada. Improcede, assim, o recurso interposto. * III – DECISÃO Pelo exposto o Tribunal da Relação do Porto decide negar provimento ao recurso interposto pelo arguido e, em consequência, manter a sentença recorrida, mas apenas para não violar a proibição da reformatio in pejus. Custas pelo recorrente fixando-se em 4 UC a taxa de justiça– cfr. arts. 513º nº 1 do CPP e 8º nº 9 do RCP, com referência à Tabela III anexa ao referido diploma legal. Notifique – cfr. art. 425º nº 6 do CPP. |