Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
27481/15.5T8PRT.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: NÉLSON FERNANDES
Descritores: ASSÉDIO
VIOLAÇÃO DO DEVER DE OCUPAÇÃO EFETIVA
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
QUANTUM INDEMNIZATÓRIO
Nº do Documento: RP2024031827481/15.5T8PRT.P2
Data do Acordão: 03/18/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 4. ª SECÇÃO SOCIAL
Área Temática: .
Sumário: I - Sendo o assédio um processo continuado mais ou menos longo, deve ser analisado no seu conjunto e sem segmentá-lo nos momentos que o integram, já que o real sentido e gravidade dos mesmos só pode ser apreendido com essa visão de conjunto.
II - A violação do dever de ocupação efetiva é, em si mesma, suscetível de causar danos não patrimoniais sérios ao trabalhador: danos à sua imagem, danos à sua saúde, designadamente mental, mas e sobretudo danos à sua dignidade como pessoa que trabalha.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação / processo n.º 27481/15.5T8PRT.P2
Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto

Autores: AA e BB

Ré: A..., S.A.


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Nélson Fernandes (relator)

Rita Romeira

Teresa Sá Lopes

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório

1. AA e BB (ainda, CC e DD, em relação aos quais veio a ser homologada por sentença transação, com a consequente extinção da instância) intentaram ação de processo comum contra A..., S.A., pedindo:  a) seja a ré condenada pela prática ilícita e dolosa de acosso e assédio moral infligida aos autores, maxime, pela violação do dever de ocupação efetiva estabelecido no art.º 129.º do Código do Trabalho; b) em consequência da conduta ilícita mencionada na alínea anterior, seja a ré condenada a indemnizar cada um dos autores a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, pela não atribuição de trabalho e assédio, num montante unitário a receber por cada um deles de 100.000€, acrescida do pagamento de juros de mora calculados à taxa legal de 4% desde a citação e até integral pagamento; c) dado que a ré se encontra de forma continuada numa situação de violação do dever de ocupação efetiva dos trabalhadores (art.º 129.º, n.º 1, alínea d) do CT/2009), em qualquer caso, sejam os autores colocados em posto de trabalho a exercer as funções inerentes às suas referidas categorias profissionais; d) seja a ré condenada a pagar à autora AA a quantia de 7.940,10€, pela não atribuição ilícita de IHT por parte da ré, sobre o qual deverão ser calculados juros de mora à taxa legal de 4%, vencidos e vincendos até integral pagamento; e) seja a ré condenada a pagar à autora AA a quantia correspondente a 0,5% do seu salário, desde 01/01/2007, o qual nunca foi pago pela entidade empregadora à trabalhadora, em virtude desta ter-se recusado a subscrever o Acordo de Empresa na sua versão de 2007, cuja liquidação e quantificação concretas, mercê das alterações salariais que se têm verificado desde então a esta parte, fazem com que apenas seja passível de ser apurado em sede do competente incidente de liquidação de sentença; f) seja a ré condenada a colocar, o autor BB na categoria de Técnico Especialista de nível 5, à qual deveria ter automaticamente ascendido, caso tivesse tido uma progressão normal na sua carreira, secundada por todos os inerentes benefícios remuneratórios que a mesma implicaria; e g) ser a ré condenada, nos termos do n.º 1 do art.º 829.º-A do Código Civil (ex-vi art.º 1.º do C.P.T.), ao pagamento de uma sanção pecuniária compulsória unitariamente calculada por cada um dos demandantes de 150€ por cada dia de atraso no cumprimento da observância da obrigação do dever de ocupação efetiva plasmado no art.º 129.º, n.º 1, alínea d) do CT/2009, a computar, desde o dia 31 de março de 2007, ou, se assim não se entender, desde a decisão proferida em 1.ª instância.

Para tanto, alega a Autora AA que: foi admitida, em 1/11/1971, como trabalhadora da empresa TLP, SA, passando a ser trabalhadora da Ré, por força da fusão daquela empresa, auferindo, à data da entrada da pi, a retribuição de 2.384,44€, tendo, no ano de 2004, lhe sido proposto pela Ré que assinasse um contrato de cedência para a sua integração na empresa B..., ao que não acedeu; desde então, tem vindo a ser alvo de assédio moral, consubstanciado em vários comportamentos da Ré, a saber: em face da recusa de assinar o contrato de cedência, deixou de trabalhar no departamento de serviços jurídicos onde estava há 15 anos e foi colocada sozinha numa sala onde permaneceu 7 meses sem nada para fazer, tendo sido pressionada, por várias vezes, para abandonar a Ré; em julho de 2015 foi nomeada chefe para exercer funções de responsável de unidade orgânica do serviço de faturação dos clientes devolvida, o que fez até inícios de 2007, altura em que esse serviço passou para outra empresa, tendo ela Autora passado para o Departamento de Mudança Ativa; enquanto esteve no serviço de faturação dos clientes deveria ter recebido a competente quantia a título de isenção de horário de trabalho (IHT), sendo que porque tal nunca lhe foi pago, recusou ser novamente nomeada para chefiar aquele departamento; desde início de 2007, foi sendo continuamente reduzido o seu serviço até que em 2012, a Ré lhe retirou por completo qualquer tipo de funções, tendo-a apenas, em 2014, encarregue de uma tarefa com a duração de 2 meses e, em 2015, de uma função com a duração de 1 mês; comparativamente com os demais trabalhadores com categoria, carreira e nível semelhante, vê-se prejudicada em 0,5% a menos sobre o montante do seu salário; entre 2005 e 2007, prestou trabalho suplementar que equipara e quantifica ao IHT que lhe deveria ter sido atribuído, que computa no montante global de 7.940,10€; foi alvo de um processo disciplinar sem qualquer fundamento, no qual não foi aplicada qualquer sanção; como consequência do comportamento da Ré sofreu vários danos, tendo recorrido a ajuda psiquiátrica.

Por sua vez, o Autor BB alega que: foi admitido, em 2/07/1973, como trabalhador da empresa Correios e Telecomunicações, passando a ser trabalhador da Ré, auferindo, à data da entrada da pi, a retribuição de 1.248,57€, sendo que, desde 2007, tem vindo a ser alvo de assédio moral, consubstanciado em vários comportamentos da ré, a saber: no 1º trimestre de 2007, foi informado que doravante ficaria inativo, o que aconteceu, pese embora os seus colegas que exerciam as mesmas funções, tenham continuado a exercê-las; passado algum tempo, foi convocado para uma reunião na qual lhe foi proposta a suspensão do seu contrato, que não aceitou, tendo sido colocado no CED sem qualquer função; em finais de 2010, foi convocado para uma ação de formação, que frequentou, não tendo exercido qualquer função relacionada com tal formação; em 2008, foi alvo de várias tentativas da Ré para suspender o contrato ou aceitar a pré-reforma; teve de lançar mão de vários processos judiciais para obstar a dois processos de despedimento que foram judicialmente declarados ilícitos, outros dois por violação da mobilidade geográfica, por inobservância da mobilidade funcional e outro pelo não pagamento de despesas várias ao serviço da empresa, maxime, de anteriores ações de formação, etc., sendo que na sequência do seu despedimento, o autor teve de emigrar, em 2011, para sustentar a família; foi alvo de um processo disciplinar, juntamente com o seu colega EE, pelos mesmos factos, sendo que a sanção que lhe foi aplicada foi o despedimento e ao colega 30 dias de suspensão; após a sua reintegração, em final de 2014, na sequência da ilicitude do despedimento, foi colocado em Braga sem quaisquer funções, o que levou a que tenha apresentado uma denúncia à ACT e, como resposta, foi transferido de Braga para o Porto, onde foi colocado na “sala dos encostados” onde permanece sem fazer nada; por causa do comportamento da Ré, sofreu vários danos, sendo, desde maio de 2015, seguido por um psiquiatra, tendo-lhe sido prescritos diversos fármacos; deveria ter ascendido à categoria de técnico especialista de nível 5, por ter sido o único que não ascendeu, apesar de ser dos mais antigos e qualificados trabalhadores da Ré.

A Ré contestou, invocando, por exceção, o caso julgado quanto à inatividade invocada pelo Autor desde o 1º trimestre de 2007, a falta ou ininteligibilidade da causa de pedir quanto aos pedidos formulados pela Autora em e) e pelo autor em f) e a pendência de causa prejudicial quanto ao pedido do Autor formulado em c). Quanto ao mais: nega que do exercício das funções exercidas pela Autora decorresse a atribuição do subsídio de isenção de horário de trabalho; a autora prestou mais funções do que as que alega, nomeadamente até setembro de 2013 e em 2015; nega que em 2007 tenha pago aos seus trabalhadores o acréscimo de 0,5% de salário e nega ter solicitado à Autora prestação de trabalho suplementar; nega que as circunstâncias constantes nos processos disciplinares invocados pelo autor fossem as mesmas; em fevereiro de 2015 atribuiu funções ao Autor, tendo este tentado sustar a sua transferência para o novo local de trabalho, sendo falso que permaneça sem funções; o autor presta atividade à 2ª e 3ª feira, apresentando baixa no resto da semana, o que não permite à Ré organizar o trabalho e nega que o autor tenha sido o único que não ascendeu a categoria superior.

Os Autores responderam à contestação, em que requereram a condenação da Ré como litigante de má fé.

Por despacho de 28/11/17 foi decidido ser considerada a matéria alegada na resposta quanto aos fundamentos da alteração da categoria do Autor.

Foi proferido despacho saneador no qual: foi julgada improcedente a exceção do caso julgado invocado pela Ré quanto ao Autor BB; foi julgada procedente a exceção da litispendência e, em consequência foi a Ré absolvida da instância relativamente ao pedido formulado pelo Autor BB, relativamente ao pedido formulado sob a al. c) da petição inicial.

Foi de seguida identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

2. Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, de cujo dispositivo consta:

“Pelo exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados e, consequentemente:

a) Condeno a ré a pagar à autora a quantia de 60.000€, a título de indemnização pelos danos morais sofridos na sequência do assédio moral de que foi alvo;

b) Condeno a ré a pagar ao autor a quantia de 80.000€, a título de indemnização pelos danos morais sofridos na sequência do assédio moral de que foi alvo;

c) Julgo extinta a instância quanto ao pedido formulado pela autora na al. c); e

d) no mais absolvo a ré do pedido.

Mais absolvo a ré do pedido de condenação como litigante de má fé.

Custas, na proporção do decaimento, a cargo da ré e dos autores.

Considerando que tal ainda não foi feito, importa fixar o valor da acção, sendo que, tratando-se de pedidos coligados, tal será feito por reporte a cada um dos autores, sendo o mesmo considerado não só para efeitos desta decisão, mas também da sentença homologatória de 31/01/23.

Assim, considerando o peticionado por cada um dos autores, é o seguinte o valor da acção:

- para a autora AA: 107.940,10€;

- para o autor CC: 100.000€;

- para o autor BB: 100.000€;

- para o autor DD: 103.470,09€.

Notifique.

Comunique ao Instituto de Segurança Social (artigo 78º-A do C. Processo Trabalho).”

2.1. Inconformada, apresentou a Ré requerimento de interposição de recurso, apresentando no final das suas alegações as conclusões que de seguida se transcrevem:

“1. A douta decisão em crise, pese embora formalmente válida, clara e abordar todas as questões de direito colocadas, é ainda assim merecedora de objectiva censura, no que concerne ao montante do valor indemnizatório fixado a título de danos morais.

2. Antes de mais, afigura-se, salvo melhor, deverem ser rectificadas algumas incongruências a alguns factos dados como provados, mormente os pontos 22, 26 e 65, 36 e 53.

3. Quanto ao primeiro, é pouco rigoroso que o Tribunal dê como assente uma consequência resultante de um convénio que não se encontra junto aos autos.

4. Motivo pelo qual o Ponto 22 se deverá restringir ao seguinte: 22. No ano de 2004, foi criada a empresa B..., dentro do universo PT, para integração dos trabalhadores da PTC, mediante um contrato de cedência, o qual tinha à data a vigência de cinco anos, e findos os quais, os trabalhadores que tivessem sido cedidos à B... voltariam à PTC.

5.

6. Quanto aos restantes Pontos facilmente se concluirá pela existência de desconformidades entre eles, uma vez que no Ponto 36, se consigna que a Ré fez várias propostas à autora para aceitar a suspensão do contrato, pré-reforma ou rescisão.

7. Mas que contudo no ponto 26 apenas se refere que a Ré instou a autora para que se desvinculasse, omitindo a respectiva forma, pelo que esse facto deverá ser completado com o que se deu como assente no ponto 36, isto é: 26.º A partir daquele momento, a ré instou a autora, por diversas vezes (verbalmente e por escrito), para que abandonasse a empresa, designadamente, para que se desvinculasse da mesma, através da suspensão do seu contrato de trabalho, pré reforma ou rescisão do seu vínculo laboral, ao que a autora nunca acedeu.

8. A mesma ordem de razões, se verifica relativamente aos pontos 53 e 65, dado neste último também se omitir a forma de desvinculação, motivo pelo qual, o ponto 65, deverá ser corrigido para: 65º A actuação da ré tem como intuito que o autor se desvincule da empresa através da suspensão do seu contrato de trabalho ou de pré-reforma.

9. Também o ponto 73, não contempla a prova documental que resulta da certidão judicial junta aos autos, dado se fazer referência que o Autor intentou um procedimento cautelar, mas omite-se o seu desfecho, que no caso se traduziu na sua improcedência.

10. Deverá por isso, em face da certidão judicial junta aos autos, alterar-se o teor desse ponto para: 73 Aquando da transferência referida em 61º, o autor intentou procedimento cautelar autuado sob o nº 1451/15.1T8BRG, pedindo a suspensão daquela ordem, que foi julgado improcedente.

11.Como se não bastasse a Douta Sentença padece ainda de manifesto erro na apreciação da prova produzida e na aplicação do Direito, dado existir inequívoco erro de apreciação da prova testemunhal e não mera divergência relativamente à sua apreciação.

12.E é esta a situação que se verifica no que respeita aos factos insertos nos Pontos 34, 35, 61, 66, 67, por não terem sustento bastante na prova produzida, devendo, ao invés, serem dados como assentes os factos constantes das alíneas f) e k), dos Factos não provados, de acordo com os depoimentos prestados pelas testemunhas FF, GG e das declarações da própria Autora.

13.Resulta desses depoimentos não existir prova cabal e segura da Autora ter ficado totalmente sem funções, assim como desvalorizada a função do cadastro comercial, situação que a testemunha GG também confirmou dando a ideia que a Autora esteve sempre com funções, embora de forma intermitente, embora tivesse sido logo interrompido pelo Mandatário dos Autores.

14.Por fim também a própria Autora veiculou a possibilidade de ter estado afecta a dois projectos ainda no ano de 2011, motivo pelo qual o Tribunal deveria ter aplicado o regime previsto no artigo 414º, do Cód. Proc. Civil, segundo o qual a dúvida sobre a realidade de um facto resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita, o que não se verificou.

15.No que respeita aos equipamentos e materiais, o depoimento da testemunha HH foi inequívoco ao afirmar que dispunham de telefone (até levou o seu) não tendo sequer feito alusão à inexistência de papel de escrita.

16.Assim, deverão esses Pontos de Facto ser alterados da forma seguinte: 34.º Nesta sede, desde inícios de 2007 que a autora e os demais colegas que com ela integravam o departamento foram permanecendo a fazer o mesmo serviço, o qual foi sendo continuadamente reduzido.

17.35.º Desde 2012 até 2015, a autora encontra-se sentada a uma secretária tendo a ré encarregado a autora de uma tarefa nos postos públicos, outra no cadastro comercial, outra na triagem na Associação de Cuidados de Saúde (PT ACS) e outras tarefas relacionadas com listas telefónica, cuja duração não foi possível determinar.

18.66º A sala onde os autores foram colocados tinha apenas com um computador limitado na sua utilização para consulta do portal do colaborador; e 67º Naquela sala, o autor tinha acesso a telefone.

19.Devendo ainda ser aditado aos Factos Provados, o seguinte Facto: 75) Entre 2012 e 2013, a autora manteve-se a prestar atividade no âmbito das Operações de Customer Care, traduzidas na atualização dos ficheiros dos clientes análise de faturação até setembro de 2013, data em que a Direção de Operações de Customer Care migrou para a PT Contact.

20.Relativamente aos Factos Provados constantes do Ponto 61 e aos factos Não Provados constantes da alínea k) impõe-se diferente resposta atentos os depoimentos das testemunhas FF e II, bem como dos documentos carreados pelo Autor BB para os autos.

21.A testemunha GG não só confirmou tratarem-se de verdadeiras e necessárias funções, as que foram destinadas ao Autor BB no repartidor da ..., tanto mais que teve que ser a sua esposa a desempenhá-las, em virtude da ausências do Autor.

22.Relativamente às baixas intermitentes por parte desse Autor, o depoimento da testemunha FF foi peremptório, resultando dos documentos identificados sob o nº 133, que esteve de baixa 3 dias, entre 27 e 29 de maio e entre 10 e 12 de junho, e esteve de baixa 12 dias entre 23 de setembro e 4 de outubro.

23.Aliás, o Tribunal não valorou esse facto para este efeito, mas valorou-o para efeitos do cômputo dos danos morais…sublime !

24.Pelos motivos expostos Ponto 61 dos Factos deve ser alterado para a forma seguinte: 61º Em 24/02/2015 foi comunicado ao autor a sua transferência para a Rua ..., no Porto com efeitos a partir de 1/04/2015.

25.E aditado aos Factos Provados, o seguinte: 76) O autor presta atividade à 2ª e 3ª feira e apresenta comprovativos da concessão de baixa para os restantes dias da semana, não permitindo à ré organizar o seu trabalho com um mínimo de estabilidade, dado nunca saber quando é que este autor comparece ou não ao trabalho.

26.Independentemente da procedência do recurso quanto à matéria de facto, afigura-se, sempre com o devido respeito, enfermar a Decisão proferida de uma plêiade de ilogismos, inversões de raciocínio e objectiva parcialidade na apreciação da prova produzida, com evidentes reflexos na aplicação do Direito, dado os montantes arbitrados a título de danos morais estarem a anos luz de distância do respeito pelo principio da equidade, o que se traduz num erro de direito.

27.Como sobejamente ficou demonstrado, foi tendencioso e parcial na apreciação dos factos, desvalorizando tudo aquilo que era “prejudicial” para os Autores e sobrevalorizando tudo o que lhes era “favorável”, como se verificou quanto à Autora AA, em que o Tribunal enfatizou ter estado sete meses sem nada para fazer por um motivo injustificado.

28.Na verdade, como a mesma veio a reconhecer nas declarações que prestou ao Tribunal, se soubesse o que sabe hoje teria assinado o acordo de cedência.

29.Ora, o Tribunal não só ignorou esta confissão, como considerou a ausência de prestação de actividade imputável à Ré, quando decorre do respectivo regime jurídico, que a cedência ocasional não afecta o vinculo e por isso as garantias de emprego do trabalhador.

30.Como aceitar que o Tribunal conclua que a Ré quis rebaixar e afectar a dignidade da Autora quando a convidou para chefiar um grupo de trabalhadores em 2005 (Factos 27 e 28) e em 2007 (Factos 32 e 33) funções de coordenação que se recusou a aceitar.

31.Por ultimo como compreender que se tenha provado um período ininterrupto de inactividade entre 2012 e 2015, quando a Ré lhe atribuiu funções de forma intermitente, ou seja, nunca a abandonou, procurando-a manter ocupada e face às necessidades existentes a cada momento.

32.Relativamente ao Autor BB, o Tribunal agiu da mesma forma, fazendo “vista grossa” de factos que se encontram provados e cobertos pela força do caso julgado formal, como são aqueles que respeitam à sentença proferida no proc. Nº 343/09.8TTBRG, do 2º Juizo do Tribunal do Trabalho de Braga.

33.Onde se deu como assente que em 2008 o Autor desempenhavas as tarefas ali descritas, mas o Tribunal considerou que o mesmo estava sem funções desde 2007!.

34.É inconcebível que o Tribunal tenha interiorizado que a partir de abril de 2015 o Autor foi colocado na ... sem nada para fazer, quando se comprovou que foi o Autor quem obstou ao desempenho das funções no repartidor.

35.De resto, como o havia feito em 200, logo que lhe foram atribuídas funções o Autor tratou de interpor um procedimento cautelar (FACTO 73) com vista a impedir a sua transferência de Braga para o Porto.

36.Mas como esse procedimento também foi, como o de 2008, julgado improcedente, logo arranjou um expediente para obstar ao desempenho das suas tarefas, recorrendo a baixas médicas sistemáticas de 3 dias.

37. Expediente a que o Tribunal deu cobertura, pois não o deu como provado para efeitos de justificação da situação de inocupação, mas considerou-o para efeitos da fixação da indemnização por danos.

38.Constitui também demonstração do Tribunal ter actuado com “dois pesos e dias medidas” por se ter bastado com a simples afirmação do Autor ter tido necessidade de emigrar, sem que tivesse sentido necessidade, como soe, de prova documental.

39.Falta de rigor que atinge o seu cúmulo, em virtude do amigo de infância do Autor – testemunha JJ – ter aludido a factos que terão ocorrido em 2008, quando o Tribunal os valorou como se tivessem tido lugar em 2015.

40.O descrito circunstancialismo, amplamente comprovado, deveria, em obediência ao critério legalmente estabelecido ter sido considerado no montante indemnizatório fixado pelo Tribunal, de modo a que o mesmo fosse equitativo e justo e não desproporcionado, iníquo e por isso injusto.

41.Dado que ambos os Autores, de uma forma ou de outra, concorreram para a sua situação de inocupação, o que reduz, substancialmente, o grau de reprovação ético social da conduta da Ré.

42.Deste modo, o montante indemnizatório que lhes foi reconhecido, deverá ser fixado em 15.000,00, montante aceite pelo Autor DD, que não só se afigura equitativo proporcionado e justo, como corresponde, de alguma forma, ao seu sentimento de justiça, caso contrário não teria por ele sido aceite.

43.Tudo visto, e ao assim decidir, afigura-se manifesto ser a Decisão proferida merecedora de objetiva censura, por ter infringido o disposto no artigo 414º, do Cód. Proc. Civil e no artigo 342º, do Cód. Civil, impondo-se por isso que seja revogada e substituída por outra que dando provimento ao presente recurso, reduza a condenação da Recorrente na indemnização aos Autores em danos morais, para o valor de 15.000,00€, doutro modo, certamente que se não fará correcta e rigorosa aplicação da lei e, como tal, haverá fundadas razões para se clamar não ter sido feita J U S T I Ç A !”

2.2. Contra-alegaram os Autores, concluindo do modo seguinte:

“I - A Recorrente delimitou o objecto das suas alegações ao montante arbitrado a título de danos morais, através da impugnação da matéria de facto (pugnando pela sua redução), mas já não quanto à (in)verificação de assédio moral exercido sobre os trabalhadores, ficando sem se saber, em que medida a almejada modificação da matéria de facto, e porquanto a empregadora o não concretiza, influiria na decisão atinente a tal concreta questão do quantum indemnizatório?!?! tal consubstanciando a inutilidade do presente recurso;

II – Prima facie vem a Apelante impetrar, sejam atendidas rectificações e eliminações respeitantes aos pontos 22, 26, 36, 53, 65 e 73 da factologia dada como assente, (as quais conformam uma encapotada e inatendível impugnação da matéria de facto);

III - Desta sorte e no especificamente tange ao sobredito facto assente sob o ponto 22.º, vem a Recorrente alvitrar que a parte final do mesmo não poderia ter resultado como provado, desde logo porque não foi junto aos autos o clausulado do Acordo de Cedência, e nessa decorrência careceria a redacção do mesmo de rectificação;

IV - Contudo, a tal propósito, consignou-se, acertadamente, em sede da douta sentença o seguinte (sic): “"A matéria constante nos pontos 1º a 24º, 37º, 39º (sendo ainda considerado quanto a este ponto o documento junto à pi sob o nº 47 que não foi impugnado), 40º e 42º resultou do acordo das partes nos articulados." – negrito e sublinhado nossos;

V - Nesta sede cumpre evidenciar que a negligência no cumprimento do ónus processual de impugnação acarreta a aceitação e consolidação no processo de determinados factos suscitados pela parte contrária, mediante a aplicação da figura jurídica da admissão – artigo 574.º, n.º 1, do CPC, como de resto manifestamente sucedeu “in casu”;

VI - Acresce que, vem a própria Apelante confirmar que o aduzido Acordo de Cedência não foi por si junto aos autos, tendo aquela inobservado a regra ínsita no n.º 2 do art.º 342.º do Código Civil, vale dizer, tendo esta tido toda a possibilidade de carrear tal documento para os autos, pretende agora que o Tribunal “a Quo”, num acto de fé, devesse ter ignorado toda a prova produzida e disponível nos autos a este propósito e, recorrendo a um exercício de mera adivinhação relativamente a um documento cujo teor se desconhece por completo, haveria de modificar a redacção do ponto 22 da matéria de facto dada como provada, razão pela qual, nenhuma censura merece os termos em que a 1.ª Instância o fez;

VII – Doutra sorte refere a Recorrente, no que concretamente concerne ao consignado no ponto 26, que a materialidade ali dada como provada, encontrar-se-ia incompleta, devendo, nessa medida, ser rectificado;

VIII - Não se afigura minimamente inteligível que a Recorrente pretenda que tal factologia (v.g. ponto 26) devesse ser complementada com aqueloutra plasmada no ponto 36 da matéria assente, porquanto e por um lado, a Apelante limita-se a propor acrescentar os mecanismos de modificação/extinção contratual efectivamente discriminados neste último ponto;

IX - Acresce que, para além de não se vislumbrar qual a utilidade prática de tal rectificação, ou seja, qual a relevância da matéria estar repartida em dois pontos ao invés de condensada num único, não é menos verdade que se ambos os pontos constam do acervo da facticidade dada como provada, obviamente que os mesmos foram devidamente tidos em conta pelo Tribunal “a Quo”...;

X - Idêntico raciocínio de rectificação complementar vem propugnado pela Apelante relativamente aos pontos 53.º e 65.º da matéria assente, razão pela qual, “mutatis mutandis”, para além das considerações anteriormente arrimadas, pode constatar-se que a materialidade apurada reflecte a prova produzida em audiência de julgamento, independentemente de estar condensada num só ponto ou mais do que um, cuja (ir)relevância é absolutamente manifesta e nessa decorrência, nenhum fundamento assiste à Apelante para que seja considerada qualquer rectificação!;

XI - Ainda neste domínio, insurge-se a Recorrente com a circunstância do ponto 73.º da factologia dada como provada - atinente à instauração de um procedimento cautelar por parte do Recorrido BB - ter omitido qual o respectivo desfecho?!?!;

XII - Com relação a tal facto, não consegue alcançar-se qual a relevância da pretendida rectificação (a Apelante também não o esclarece), quer no contexto do objecto do recurso por si delimitado e, menos ainda, no desfecho da lide, afigurando-se por isso absolutamente, estéril, inócua e inconsequente.;

XIII – Sempre se dirá que é manifesto que, mercê da relação de instrumentalidade entre o procedimento cautelar e a correspectiva acção principal, a decisão proferida naquele procedimento não adquire a natureza de caso julgado material - n.º 4 do artigo 364.º do CPC, nem tampouco configura qualquer prejudicialidade em relação à pretensão deduzida na correspondente acção principal;

XIV - Neste particular, a Recorrente parece esquecer, ou então preferir não lembrar, que a materialidade dada como assente no ponto 63.º, atinente à decisão proferida no âmbito da acção principal do procedimento cautelar vindo de referir-se e tramitada sob o número 23987/16.7T8PRT, determinou a revogação da ordem de transferência do local de trabalho e a condenação da ali Ré, aqui Recorrente, ao pagamento de uma indemnização ao então Autor, aqui Recorrido, por isso, não se vislumbra que também da redacção imprimida ao ponto 73.º da factologia dada como provada, se verifique qualquer necessidade de rectificação;

XV – Já ao nível da empreendida impugnação da matéria de facto, vem insurgir-se a Recorrente contra a decisão do Tribunal “a Quo” relativamente aos pontos 34, 35, 61, 66 e 67 da matéria dada como provada (que pretende ver revertidos enquanto não provados), sendo que na medida inversa, a factologia constante das alíneas f) e k) da matéria dada como NÃO provada deveriam ter sido considerados como assentes, secundado, ainda, pelo aditamento de 2 factos adicionais numerados por aquela sob os pontos 75 e 76;

XVI - Ao invés do alvitrado pela Apelante, atenta a consonância, clareza e consistência quer do depoimento de parte da Recorrida, AA, e bem assim das testemunhas HH, DD, GG, KK, LL e FF, nos termos supra melhor identificados e que se deixaram transcritos no corpo das presentes Contra Alegações, nenhuma outra interpretação poderia fazer-se, que não aquela que foi precisamente perfilhada pelo Tribunal “a Quo” e que conduziu ao apuramento dos factos consignados nos pontos 34 e 35 vindos de referir-se, nos exactos termos tecidos em sede da douta sentença sob sindicância, sendo por isso de rejeitar “in totum” a impetrada modificação da matéria de facto;

XVII - No que especificamente tange ao vertido nos pontos 66º e 67º, veio a Apelante alegar, por intermédio de declarações selectivamente truncadas e adequadamente descontextualizadas, com o único intuito de procurar lançar a dúvida onde ela inexiste, brandir o seguinte (sic): “no que respeita aos equipamentos e materiais de que os Autores dispunham, o depoimento da testemunha HH foi inequívoco ao afirmar que dispunham de telefone – até levou o seu – não tendo sequer feito alusão à inexistência de papel de escrita”;

XVIII - Com relação a esta “estrondosa afirmação” imputada pela Apelante à testemunha HH, identificada na peça recursiva como tendo sido proferida no minuto 10 da gravação, e através da qual pretende “criar um caso”, sucede que, uma vez escutada tal passagem do respectivo registo fonográfico, revela de forma inusitada que tal afirmação é, na verdade, inexistente, devendo este Colendo Tribunal daí extrair as devidas consequências...;

XIX - Ainda neste particular, mercê da prova testemunhal melhor identificada e transcrita no corpo da presente peça processual, andou bem o Tribunal “a Quo” ao ter dado como assentes os factos constantes dos pontos 66 e 67, razão pela qual nenhuma censura merece a apreciação que deles foi feita, devendo manter-se na sua integralidade;

XX - Continuando no âmbito da empreendida impugnação e modificação da matéria de facto, pretende a Apelante que fosse dado como NÃO provado o facto dado como assente no ponto 61 e na medida diametralmente inversa, que deveria ter sido dada como provada a factologia – não assente - constante da alínea k), ancorando-se para tanto numa artificiosa interpretação dos depoimentos das testemunhas FF e GG, secundados pelos documentos carreados para os autos pelo próprio Recorrido BB para os autos, ao passo que desconsiderou a mesma todo o acervo probatório considerado pelo Tribunal “a Quo” para o efeito;

XXI - Não obstante a concludência da prova testemunhal vinda de referir-se, pretende, infundadamente, a Apelante o aditamento dos dois factos numerados sob os n.ºs 75 e 76, os quais, no fundo, seriam o reverso da matéria que foi dada como não provada no âmbito das alíneas f) e K);

XXII – A matéria vertida nos aludidos pontos 75 e 76, até como contraponto com a prova que foi produzida em sentido divergente, terão de ser considerados como matéria não provada e/ou meramente conclusiva, razão pela qual não assiste qualquer razão à Apelante no sentido da sua modificação;

XXIII - Não houve qualquer erro de julgamento, porquanto a convicção formulada pelo Tribunal “a Quo” exprime razoabilidade bastante perante os meios de prova que suportam a sua decisão, em contraponto com a impugnação da matéria de facto vinda de referir-se, que conforma um mero exercício de vontade subjectiva da parte, no sentido de alcançar a sua própria verdade, outrossim e ao invés da Meritíssima Juiz que actuou dentro da margem da formação da sua livre convicção, afigurando-se totalmente adequada a apreciação, no universo da prova integral produzida, não consubstanciando, por isso, em relação ao decidido, fundamento para invocação da previsão da al. c) do n.º 1 do art. 615.° do CPC por parte da Apelante;

XXIV - Por último, não podem os Recorridos sufragar do entendimento propugnado pela Recorrente, de que o direito aplicado não foi aplicado correctamente, dúvidas não subsistindo que neste particular todo o argumentário assenta não no inconformismo dirigido ao reconhecimento da justiça na reparação dos danos causados e reconhecidos pela própria empregadora (não discutindo, sequer, a (in)verificação de assédio moral, maxime, pela inobservância do dever de ocupação efectiva estabelecido na alínea b) do n.º 1 do art.º 129.º do CT), mas tão somente na “injustiça” da medida da reparação, v.g. do quantum indemnizatório arbitrado aos trabalhadores, circunscrevendo-se e entrecortando-se a questão da discussão jurídica a tal sub-aspecto;

XXV - No entanto, este segmento do arrazoado recursivo, configura um exercício torpe, de enraivecidas acusações várias à imparcialidade da Meritíssima Juiz, acusando o Tribunal de valorizar tudo o que beneficiava os Recorridos em detrimento de tudo o que os “prejudicaria”, pontuado por um conjunto desconexo e amalgamado de argumentos de índole factual (uma vez mais recorrendo a uma encapotada impugnação da matéria de facto) e jurídica, que para além de totalmente ininteligível, desembocam na indicação de um infundado montante indemnizatório, conquanto meramente simbólico num montante unitário de 15.000,00€, que não cumpriria nenhuma das funções reparadoras visadas pelo regime jurídico aplicável a estas situações!;

XXVI - Desde logo, não podem os Recorridos concordar, uma vez que entendendo que não apenas não poderá haver lugar a qualquer alteração da matéria de facto que foi impugnada no local adequado nas alegações da Apelante e muito menos, naqueloutra encapotadamente efectuada, já em sede da impugnação da matéria de direito, a qual sendo totalmente indamissível, deverá ser liminarmente rejeitada!;

XXVII - No caso sub judice, encontram-se mais do que preenchidos quer os pressupostos do assédio moral, quer os requisitos que fundamentam o dever da Recorrente indemnizar os Recorridos nos termos gerais, em sede de responsabilidade civil;

XXVIII - Mais havendo de concluir-se que o valor da indemnização fixado é absolutamente adequado, porquanto, os comportamentos (ilícitos) perpetrados pela Apelante, provados e não impugnados por esta, maxime, 3,7 anos e mais de 6 anos de inactividade forçada, tiveram como objectivos os de perturbar, constranger e afectar a dignidade dos trabalhadores, danos esses, igualmente, provados e não impugnados pela Apelante;

XXIX – Destarte, e no respeitante ao montante da indemnização atribuída, considerando que ficou provado, nos presentes autos, a existência de culpa grave da Recorrente que deu causa aos factos donde promanam os danos sofridos pelos Recorridos, andou bem o Tribunal “a Quo” ao ter adequadamente fixado as indemnização de 60.000,00€ (SESSENTA MIL EUROS) para a trabalhadora AA e de 80.000,00€ (OITENTA MIL EUROS) para o trabalhador BB;

XXX - Acerca deste conspecto, sendo a Recorrente “useira e vezeira” em outras situações de assédio moral em tudo semelhantes à do caso em apreço, afigura-se pertinaz trazer aqui à colação, aquilo que se discretou em sede do douto Acórdão proferido pelo Colendo Tribunal da Relação de Guimarães de 14-05-2015, proferido no âmbito do processo n.º 79/13.5TTVCT.G1, relatado pelo Ex.mo Sr. Juiz Desembargador Moisés Silva, sob os descritores: “Sanção Disciplinar”, “Caducidade”, “Ocupação efectiva”, “Assédio Moral”, “Mobbing”, disponível em www.dgsi.pt, que num caso similar condenou a aqui Recorrente, enquanto entidade empregadora, ao pagamento de uma indemnização de 100.000,00€ (CEM MIL EUROS) pelos danos morais causados a um outro trabalhador (a aqui testemunha EE);

XXXI - Por tudo isto, há-de concluir-se, portanto, que tendo sido efectuada uma correcta interpretação/subsunção/aplicação do Direito, pugnando os Apelados pela manutenção do julgado, razão pela qual andou bem o Tribunal “a quo” na subsunção, interpretação e aplicação do Direito em sede da douta sentença recorrida.

TERMOS EM QUE não deve ser concedido provimento ao Recurso interposto pela Recorrente/Apelante, mas outrossim e ao invés deverá ser concedido total provimento às presentes Contra-Alegações, mantendo-se na íntegra, nos exatos termos aqui pugnados, a douta sentença recorrida, fazendo-se desse modo a habitual e costumada JUSTIÇA!”

2.3. O recurso foi admitido em 1.ª instância como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo.

3. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.


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Respeitadas as formalidades legais, cumpre decidir:

II – Questões a resolver

Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil (CPC) – aplicável “ex vi” do artigo 87º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho (CPT) –, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir: (1) matéria de facto; (2) Dizendo de direito: saber se a decisão recorrida errou ao aplicar (ou não aplicou adequadamente) a lei e do direito / questão do quantum indemnizatório pelos danos não patrimoniais.


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III – Fundamentação

A) Fundamentação de facto

O Tribunal recorrido, pronunciando-se sobre a matéria de facto, fez constar o seguinte (transcrição):

“São os seguintes os factos provados:

1.º A ré é uma sociedade comercial por acções que se dedica por conta própria e escopo evidentemente lucrativo: “1- A concepção, a construção, a gestão e a exploração de redes e infra-estruturas de comunicações electrónicas, a prestação de serviços de comunicações electrónicas, dos serviços de transporte e difusão de sinal de telecomunicações de difusão e a actividade de televisão. 2 - A sociedade tem ainda como objecto a prestação de serviços nas áreas de tecnologias de informação, sociedade da informação, multimédia e comunicação, o desenvolvimento e a comercialização de produtos e equipamentos de comunicações electrónicas, tecnologias de informação e comunicação, bem como a realização da actividade de comércio electrónico, incluindo leilões on line, e ainda a prestação de serviços de formação e consultoria nas áreas que integram o seu objecto social. 3 - A sociedade poderá ainda exercer quaisquer actividades que sejam complementares, subsidiárias ou acessórias das referidas nos números anteriores, directamente ou através da constituição ou participação em sociedades. 4 - A sociedade pode, mediante deliberação do Conselho de Administração, adquirir e alienar participações em sociedades com objecto social diferente do descrito nos números anteriores, em sociedades reguladas por leis especiais, em sociedades de responsabilidade limitada ou ilimitada, bem como associar-se com outras pessoas jurídicas para, nomeadamente, formar agrupamentos complementares de empresas, agrupamentos europeus de interesse económico, novas sociedades, consórcios e associações em participação e, bem assim, constituir ou participar em quaisquer outras formas de associação, temporária ou permanente, entre sociedades e ou entidades de direito público ou privado”.

2.º A ré incorporou por fusão a sociedade comercial por acções outrora denominada por C..., S.A., NIPC: ...47, com sede na Rua ..., ... Lisboa, tendo, por isso, assumido todos os direitos e obrigações, maxime de índole laboral para com os trabalhadores.

3.º A autora foi admitida ao serviço da empresa Telefones de Lisboa e Porto, S.A. (T.L.P.) no dia 1/11/1971, mediante contrato de trabalho sem termo, para, sob a orientação, fiscalização e autoridade daquela, lhe prestar a sua atividade profissional de telefonista, sendo que actualmente, ostenta a categoria de técnico superior (de nível 5) de telecomunicações.

4.º As empresas D..., S.A., Telefones de Lisboa e Porto, S.A. (T.L.P.) e a Teledifusora de Portugal, S.A. (T.D.P.), fundiram-se numa só entidade, a E..., SA., que assim foi criada por fusão das citadas sociedades.

5.º Posteriormente, a E..., S.A. foi objeto de reestruturação empresarial, aprovada pelo Decreto-lei 219/2000 de 9 de Setembro, que deu origem à C..., que assumiu todo o conjunto de direitos e obrigações da E..., S.A.

6.º A autora, em consequência da fusão e ulterior reestruturação e redenominação, já referidas, que deram origem à ré, passou a ser trabalhadora desta, mas manteve todos os direitos e obrigações que tinha na sua empresa contratual de origem.

7.º A autora aufere atualmente a retribuição mensal de 2.384,44€, acrescido de 202,72€ de diuturnidades e de um subsídio de alimentação de 8,15€ em cada dia de trabalho com um mínimo de 3 horas de trabalho prestado.

8.º Em 01/08/1978, através de concurso, a autora foi para os escritórios no Porto, onde iniciou a sua nova atividade no sector comercial, Secção de Ordens e Lista de Espera.

9.º Reconhecido o seu desempenho pelos seus superiores hierárquicos, em meados de 1985 a autora foi chamada para integrar a secretaria da Administração e Direção Regional do Porto e a coadjuvar e substituir as secretárias dos Srs. Administrador e Director da Região.

10.º Em 1987 abriu um concurso para TAP - Técnico Administrativo Principal -, a que concorreu tendo então passado a TAP, a 20/04/1987.

11.º Mercê do reconhecimento do seu desempenho, em 01/11/1988 a autora foi nomeada Secretária do então Sr. Diretor Geral no Porto.

12.º Por mor de uma reestruturação sectorial ocorrida na empresa, extinguiu-se o cargo de Director Geral e a autora passou a secretariar o Sr. Director Regional e a Administração no Porto.

13.º Como o quadro retributivo da empresa, para alem das progressões automáticas, previa progressões antecipadas por mérito, a autora foi contemplada com uma antecipação de progressão em 01/01/1989.

14.º Novamente, desta feita em 10/03/1989, em virtude do continuado reconhecimento do seu trabalho, a autora foi proposta pelo Sr. Diretor da região para as funções de coordenação, apenas para a respetiva gratificação mensal de chefias, eletrotécnicos e equiparados.

15.º Em 1990, e porque só existiam serviços jurídicos em Lisboa, mas sendo o Porto um polo agregador de um grande volume de processos e a tornar-se inviável o seu tratamento por Lisboa, foi aberto concurso para chefe da secretaria administrativa jurídica no Porto, lugar esse a que a autora concorreu.

16.º Em 17/08/1990 a autora foi nomeada, em comissão de serviço, chefe de secção para a secretaria, e foi então organizar os processos jurídicos do Porto e dar apoio, com o seu staff, aos advogados que iriam propor as competentes ações judiciais.

17.º Em 04/04/1991, de acordo com as normas, por proposta feita à autora e por ela aceite, passou então definitivamente a chefe de serviço.

18.º Em 02/03/1994, a autora passou à categoria de TSE e assumiu várias outras responsabilidades no departamento.

19.º Decorrido um ano e de acordo com o AE, passou a integrar os níveis da progressão automática da sua nova carreira até atingir o nível de nomeação designado por “n”, nível este que era atribuído apenas por mérito.

20.º E, em 24/02/2000, em consequência de uma nova reestruturação, a autora foi nomeada responsável, com a sigla “SAD1-Suporte Administrativo Zona1.

21.º Em 01/03/2001, a autora foi progredida por nomeação, ao 1º nível de nomeação,” nível 8” da sua carreira/categoria-TSE.

22.º No ano de 2004, foi criada a empresa B..., dentro do universo PT, para integração dos trabalhadores da PTC, mediante um contrato de cedência, o qual tinha à data a vigência de cinco anos, e findos os quais, os trabalhadores que tivessem sido cedidos à B... voltariam à PTC, ou, caso esta já não existisse, ficariam nas empresas para onde tinham sido cedidos, assinando um novo contrato sujeito a novas regras.

23.º Todavia, devido a dúvidas de vária índole que a assaltavam, a autora decidiu não assinar o referido contrato de cedência para “passar a integrar a empresa B...”.

24.º No final do ano de 2004, parte dos serviços jurídicos onde a autora exercia funções, foram integrados na empresa B..., sendo que a aqui ré não permitiu que a Demandante continuasse a trabalhar naquela última “empresa-satélite” sem que assinasse o mencionado contrato de cedência.

25º Face à não assinatura do contrato de cedência a autora não pôde continuar a trabalhar nesse departamento porque a ré não o permitiu, colocou a autora sozinha para uma sala, onde permaneceu durante 7 (SETE) meses sem nada para fazer, porquanto não exerceu qualquer actividade durante o aponto período, tendo sido desapossada dos dois computadores e dos telefones que até então tinha destinados para o exercício das suas funções.

26.º A partir daquele momento, a ré instou a autora, por diversas vezes (verbalmente e por escrito), para que abandonasse a empresa, designadamente, para que se desvinculasse da mesma, ao que a autora nunca acedeu.

27.º Em Julho de 2005, foi proposto à aqui Demandante a nomeação como chefe, para desempenhar o cargo de Responsável de Unidade Orgânica com a sigla PJRPC PROJ REC PROC C RESIDENCIAIS SOHO para o departamento do Porto, (serviço que se designava por Faturação dos Clientes Devolvida pelos CTT) com reporte directo à Direcção DSC (Direcção Satisfação Clientes).

28.º Nesta sede, a autora tinha como tarefas, para além de coordenar o serviço em si mesmo considerado, de igual sorte coordenava e avaliava também todos os seus colegas trabalhadores afectos ao departamento, elaborava estatísticas diárias e semanais.

29.º Este serviço foi chefiado pela autora até ao principio de 2007, momento em que houve uma reestruturação na empresa e esse serviço passou para outra empresa do grupo, “in casu” a B..., bem assim para uma outra chefia.

30.º A ré, acto contínuo, colocou a autora no denominado GMA (Gestão de Mudança Activa), departamento que integra a Direcção de Recursos Humanos, onde de há vários anos a esta parte são colocados todos os trabalhadores que por motivos alheios à sua vontade são retirados das funções quotidianamente exercidas nos departamentos a que até esse momento se encontravam afectos, no qual ficam sem quaisquer funções atribuídas.

31.º O GMA é internamente apodado pelos trabalhadores da ré, como “Guantanamo”, ou “sala dos indesejados/emprateleirados e de gente mal amada”.

32.º Apesar da nova chefia a quem foi atribuído o serviço da autora a ter convidado, nos inícios do ano de 2007, para voltar a ser nomeada responsável pelo departamento, a autora não o aceitou porquanto, enquanto que aquela havia desempenhado tal cargo antes da reestruturação entretanto ocorrida, a ré nunca lhe atribuiu qualquer quantia a título de Isenção de Horário de Trabalho (IHT).

33.º Como a autora não aceitou ser novamente nomeada para chefiar o departamento, a ré colocou-a a exercer as mesmas funções conjuntamente com os demais colegas que até então tinha comandado, ao mesmo tempo que indigitou outra pessoa para liderar o departamento, passando a autora a ser sua subordinada.

34.º Nesta sede, desde inícios de 2007 que a autora e os demais colegas que com ela integravam o departamento foram permanecendo a fazer o mesmo serviço, o qual foi sendo continuadamente reduzido até que em 2012 a ré retirou-lhes por completo quaisquer tipo de funções

35.º Desde 2012, a autora encontra-se sentada a uma secretária sem nada para fazer com as seguintes excepções: nos anos de 2014 e 2015, a ré encarregou a autora de uma tarefa nos postos públicos, com a duração de cerca de 15 dias, uma tarefa com a duração de cerca de dois meses na triagem na Associação de Cuidados de Saúde (PT ACS) e, durante de cerca de um mês, tarefas relacionadas com listas telefónicas.

36º Foram feitas várias propostas à autora para subscrever um contrato de cedência ocasional para passar a exercer as respectivas funções no seio da B... S.A., ou, em alternativa, a suspender o seu contrato de trabalho ou então a aceitar a pré-reforma ou rescisão do seu vínculo laboral, propostas que a autora não aceitou.

37º A ré não atribuiu à autora, no período entre junho de 2005 e inícios e 2007, qualquer acréscimo remuneratório a título de IHT.

38º No ano de 2012 a autora esteve de baixa durante cerca de mês e meio.

39º Em 9 de Abril de 2014, a ré moveu até um processo disciplinar sobre a autora, com os fundamentos constantes na decisão junta à petição inicial como documento nº 47 cujo conteúdo se dá aqui como integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

40º Tal processo culminou com a decisão de aplicação a título de sanção disciplinar de uma suspensão do trabalho pelo período de três dias com perda de retribuição, nunca tendo a ré cumprido tal decisão.

41º A necessidade das cedências de trabalhadores acima referidas resultou da migração de áreas de atividade de apoio e suporte para outras empresas do Grupo PT, de modo a racionalizar os recursos existentes.

42º O autor é trabalhador da ré, tendo sido admitido através de contrato verbal de trabalho em 02/07/1973, ao serviço da então “Correios e Telecomunicações de Portugal”, como trabalhador assalariado do escalão II, com a categoria de “TRE043”, auferindo, à data da entrada da pi, um salário base de 1.248,57€, tendo o seguinte horário de trabalho: das 09h00m às 12h30m e das 14h00m às 17h40.

43º No ano de 2007, o autor desenvolvia a sua actividade no seio da ré., integrado no departamento de I.O.P. (Instalação, Operação e Programação) sedeado em Braga, consistindo as suas funções na instalação, programação e reparação das centrais telefónicas de gama zero, instalação e manutenção de linhas RDIS e respectivos acessos básicos, e instalação e manutenção de linhas ADSL, tendo como ferramentas de trabalho, entre outros, o ensaiador AURORA para RDIS, um PC portátil para fazer a programação e testes nas aludidas centrais de gama zero, verbi gratia, as centrais Varix, entre outras.

44º Conjuntamente com o autor trabalhavam sob a mesma chefia, dois colegas, a saber, o Sr. MM, com a categoria profissional de ETP, e o Sr. NN, que ostentava a categoria profissional de TTL, os quais, tal como aquele, exerciam as mesmas supra descritas funções.

45º Por volta do 1.º trimestre do ano de 2007, o autor foi informado pela sua chefia, Sr. OO, que por determinação do superior hierárquico deste, Eng.º PP, doravante ficaria inactivo, porquanto, havia aquele decidido que todas as funções por si até então desempenhadas, lhe haviam sido retiradas.

46º Não se verificou a introdução de quaisquer equipamentos inovadores e/ou o surgimento de novas aplicações de software, a utilizar no exercício das funções até então levadas a cabo pelo autor, continuando os seus dois colegas de departamento a exercer as mesmas funções, obedecendo aos mesmos procedimentos e através dos mesmos equipamentos que até aí vinham utilizando.

47º O serviço que o autor executava foi externamente adjudicado à empresa F....

48º Passado algum tempo, o autor foi convocado para uma “reunião de trabalho” que viria a ter lugar nas instalações da sua entidade empregadora sitas na Rua ... na cidade do Porto, com o Eng.º PP e a D.ª QQ do departamento de Recursos Humanos da ré, na qual foi-lhe transmitido que caso não aceitasse a suspensão do seu contrato de trabalho seria “transferido por conveniência de serviço” para um departamento situado na Póvoa de Varzim, local onde “ficaria o dia inteiro a olhar para uma parede branca”.

49º Tendo o autor recusado, foi imediatamente dispensado pelo referido Eng.º PP do departamento a que se encontrava afecto, para passar a integrar o CED, departamento esse apelidado internamente pelos trabalhadores da ré como “Guantánamo”, ou “dos encostados”, pois que ali são colocados trabalhadores sem nada fazer, sendo de quando em vez solicitados a aceitar a suspensão do respectivo contrato de trabalho, ou, em alternativa, a aceitarem ir para a pré-reforma.

50º Em finais de 2010, integrando o autor já nesse momento o CED, foi convocado pela ré para frequentar uma acção de formação em A... fibra, ministrada por elementos da sua própria estrutura interna.

51º Tendo o autor frequentado tal acção de formação com aproveitamento, jamais foi recrutado para exercer quaisquer funções correlacionadas com a predita formação.

52º O autor, por iniciativa própria, inscreveu-se num concurso interno para a ascensão à categoria de Técnico, no âmbito do qual obteve aproveitamento, devidamente certificado através da atribuição do respectivo diploma de reconhecimento de mérito, conferido pelo Director dos Recursos Humanos, Dr. RR.

53º O autor foi alvo de várias tentativas da ré para suspender o seu contrato de trabalho ou então a aceitar a pré-reforma, tendo sido interlocutores o Eng.º PP e D.ª QQ, o Dr. LL e Dr.ª SS e o Dr. TT, sendo esta última numa reunião plenária onde estiveram vários trabalhadores a quem que foram ameaçados de irem parar “à ...”, na cidade do Porto caso não aceitassem ir para a suspensão/pré-reforma.

54º O autor intentou vários processos judiciais contra a ré: dois processos de despedimento; outros dois por violação da mobilidade geográfica; um por inobservância da mobilidade funcional e um pelo não pagamento de despesas várias ao serviço da empresa, maxime, de anteriores acções de formação, etc.

55º O autor foi despedido em 5/12/11, tendo estado suspenso preventivamente desde 8/07/2011, tendo intentado a impugnação do despedimento, que correu termos sob o n.º 1351/11.1TTBRG-A no 2.º Juízo do Tribunal do Trabalho de Braga, onde foi julgado ilícito o despedimento e determinada a reintegração definitiva, com data de 10/11/2014.

56º O autor era o único sustentáculo económico de todo um agregado familiar composto pela esposa daquele (desempregada de longa duração), duas filhas que se encontravam igualmente, uma desempregada e a outra ainda a estudar, bem assim a mãe idosa daquele – com 82 anos - que se encontrava a cargo daquele.

57º Após o despedimento, o autor viu-se compelido a emigrar para os EUA, onde trabalhou em sectores tão diversos como a construção, o fabril, etc., em ordem a poder sustentar-se a si e aos seus, bem assim a honrar com todos os seus compromissos financeiros.

58º O autor, à data da instauração do processo disciplinar de despedimento, agiu conjuntamente com um seu colega da empresa, Eng.º EE (de Viana do Castelo), porquanto, foram levantados processos disciplinares a ambos pelos mesmos factos, a saber a não comparência a uma acção de formação,

59º Ao contrário do autor que foi despedido, ao referido colega foi aplicada uma sanção disciplinar de suspensão por 30 dias com perda de retribuição.

60º Logo após ter sido reintegrado na sequência do processo referido em 55º, o autor foi recolocado em Braga a uma secretária sem quaisquer funções atribuídas, tendo, por isso, apresentado uma denúncia junto da Delegação de Braga do ACT

61º Em 24/02/2015 foi comunicado ao autor a sua transferência para a Rua ..., no Porto com efeitos a partir de 1/04/2015, tendo sido colocado na “sala dos encostados, onde não lhe foi dado nada para fazer, o que se manteve até à entrada da pi em juízo.

62º O autor intentou uma acção contra a ré que correu termos neste tribunal, sob o nº 23987/16.7T8PRT, na qual pediu a condenação da ré a ver declarada a revogação da ordem de transferência de local de trabalho dada ao autor referida em 61º, a pagar a este todas as despesas ocasionadas com a apontada transferência, bem como uma indemnização por danos morais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, até efetivo e integral pagamento, alegando, para tanto e em suma, que foi transferido, sem o seu acordo, de local de trabalho, de Braga para o Porto, o que lhe causou prejuízos sérios.

63º Por sentença, cuja decisão foi confirmada por Acórdão de 7/01/2019, foi decidido:

a) Revogo a ordem de transferência de local de trabalho dada pela R., A..., S.A., ao A., BB, e, em consequência, determino que este seja recolocado no local de trabalho que ocupava anteriormente àquela;

b) Condeno a R. a pagar ao A. o montante que se vier a apurar em sede de liquidação de sentença e relativo aos encargos suportados pelo segundo com a referida ordem de transferência;

c) Mais condeno a R. a pagar ao A., a título de indemnização por danos morais, a quantia de € 5 000 (cinco mil euros), à qual deverão acrescer juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação, até efetivo e integral pagamento;

d) Por cada dia de atraso no cumprimento do determinado em a) condeno a R. a pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia diária de € 200 (duzentos euros)”.

64º Por um curto hiato temporal, o autor foi colocado a recolher entulho das centrais.

65º A actuação da ré tem como intuito que o autor se desvincule da empresa.

66º A sala onde os autores foram colocados não tinha folhas de papel disponibilizadas pela entidade empregadora e apenas com um computador limitado na sua utilização para consulta do portal do colaborador.

67º Naquela sala, o autor não tinha acesso a telefone.

68º A ré ao deliberadamente os manter na descrita situação de inactividade, bem sabia que desse modo rebaixava os autores perante os colegas e ofendia a sua dignidade própria.

69º Neste interim, o autor tem-se sentido agastado e afectado psicologicamente, razão pela qual, desde Maio de 2015 a esta parte tem estado a ser seguido pelo psiquiatra o Dr. UU, que atento o seu estado de saúde mental, lhe emitiu atestados médicos de baixa psiquiátrica entre 27 a 29/05/15, de 10 a 12/06/15 e de 23/09 a 10/04/15 e que tem ainda prescrito o consumo de vários fármacos de molde a controlar e/ou minorar os efeitos nefastos de nível psíquico que toda esta situação tem acarretado para o autor.

70º A actuação da ré causou nos autores um estado permanente de desgosto, de ansiedade, de frustração e de revolta, o qual se agudiza a cada dia que passa.

71º Em consequência da inactividade laboral a que a ré votou os autores, sentiram-se estes profundamente humilhados, vexados, frustrados, perseguidos, desconsiderados, desesperados, sofrendo de forte ansiedade, indignados, cismáticos, perturbados, transtornados, irritando-se com facilidade.

72º No período referido em 55º, o autor auferiu 25.164,00€ a titulo de subsídio de desemprego.

73º Aquando da transferência referida em 61º, o autor intentou procedimento cautelar autuado sob o nº 1451/15.1T8BRG, pedindo a suspensão daquela ordem.

74º A autora está actualmente reformada por velhice.


*

Factos não provados com relevância para a causa:

a) A entrada diária de facturas devolvidas no departamento referido em 33) que a autora chefiava era em tão grandes quantidades face ao número de trabalhadores que ali prestavam serviço, que obrigava a autora a trabalhar até bem mais tarde (sem horário definido), por razões de maior produtividade, desde que chegava até ao momento em que saía, sempre de pé, porque o elevado volume de serviço assim o exigia, de forma ininterrupta, sem qualquer pausa e/ou paragem para almoço.

b) Na senda da delineada estratégia protagonizada pela ré sobre a autora, esta recebe menos 0,5% sobre o montante bruto do seu salário, comparativamente com todos os demais trabalhadores que possuem carreira, categoria e nível semelhante ao daquela.

c) A ré, como “trade off” da atribuição dos sobreditos 0,5% do vencimento, pretendeu impor à autora, que nunca aceitou, a subscrição do Acordo de Empresa de 2007, convénio que sistematicamente tem eliminado as progressões automáticas e forma de progredir na carreira, bem assim benefícios de outra índole, que ocorriam nos TLP.

d) Enquanto desempenhou as funções referidas em 27), no período compreendido entre Julho de 2005 e inícios de 2007, atento o grau de responsabilidade e envolvência de tais funções, determinaram com que a autora tivesse necessitado de uma dedicação para além do horário de trabalho.

e) Desde o dia 01/03/2007 e até 2012 a ré pouco dava que fazer à autora.

f) Entre 2012 e 2013, a autora manteve-se a prestar atividade no âmbito das Operações de Customer Care, traduzidas na atualização dos ficheiros dos clientes e análise de faturação até setembro de 2013, data em que a Direção de Operações de Customer Care migrou para a PT Contact.

g) O que esteve subjacente à instauração do processo disciplinar referido em 39º foi tão-somente procurar amedrontar a autora, dentro da estratégia que tem vindo a ser prosseguida pela ré.

h) Consequência do ambiente criado pela ré a autora teve de fazer várias consultas médicas psiquiátricas, sendo a baixa referida em 38º uma baixa psiquiátrica.

i) A denúncia referida em 60º teve como “resposta” da ré a transferência do autor de Braga para o Porto, referida em 61º.

j) A ré por ocasião das alterações introduzidas pelo ACT de 2011, fez desaparecer a categoria de "TÉCNICO DE APOIO" (existente no ACT de 2007) e acrescentou mais duas no topo: a de "CONSULTOR e a de CONSULTOR JÚNIOR", sendo os trabalhadores anteriormente colocados – por ocasião da entrada em vigor do AE de 2011 - na categoria de "TÉCNICO DE APOIO", foram promovidos para aqueloutra imediatamente seguinte – superior -, então denominada por "TÉCNICO", ao passo que os à época denominados como "TÉCNICO" foram promovidos a "TÉCNICO ESPECIALISTA", o que aconteceu com todos os trabalhadores da ré, excepto com o autor.

k) O autor presta atividade à 2ª e 3ª feira e apresenta comprovativos da concessão de baixa para os restantes dias da semana, não permitindo à ré organizar o seu trabalho com um mínimo de estabilidade, dado nunca saber quando é que este autor comparece ou não ao trabalho.”


***

B) Discussão

1. Matéria de facto

1.1. Impugnação da matéria de facto / apreciação

Para além da matéria que expressamente inclui no recurso que dirige à impugnação da matéria de facto, a que alude nas conclusões 11.ª e seguintes – assim dirigida expressamente aos pontos 34.º, 35.º, 61.º, 66.º, 67.º da factualidade provada e alíneas f) e k) da factualidade não provada (pretendendo o aditamento de dois novos pontos à factualidade provada –, muito embora utilizando outras expressões como “retificados”, “desconformidades”, “complementados”, “omitir” ou “não contempla”, extrai-se que a Recorrente pretende também impugnar, ao que dirige as conclusões 2.ª a 10.ª, outros pontos da factualidade provada, assim, os pontos 22.º, 26.º, 36.º, 53.º e 65.º, 73.º.

Vistas as contra-alegações, quanto a estes últimos pontos, muito embora avançando que se trata de “uma encapotada e inatendível impugnação da matéria de facto”, consideração que, diga-se, não acompanhamos, em particular quando se refere que seja inatendível por essa razão – pois que, admitindo que a Recorrente devesse, em bom rigor, integrar expressamente as suas antes referidas invocações na impugnação da matéria de facto, ainda assim, salvo o devido respeito, percebe-se claramente que a sua intenção é também a de dirigir o recurso a tais pontos de facto –, não deixam de se pronunciar nesse âmbito, ou seja, enquanto impugnação da matéria de facto, avançando com as razões por que não deve ser atendida.

Do mesmo modo, acrescente-se, quando aludem que à inutilidade do recurso – com o argumento de que, tendo esse sido delimitado “ao montante arbitrado a título de danos morais, através da impugnação da matéria de facto (pugnando pela sua redução), mas já não quanto à (in)verificação de assédio moral exercido sobre os trabalhadores, ficar-se-ia sem se saber, em que medida a almejada modificação da matéria de facto, e porquanto a empregadora o não concretiza, influiria na decisão atinente a tal concreta questão do quantum indemnizatório –, pois que, afinal, a questão dessa invocada inutilidade não se levanta neste momento, da pronúncia em sede de matéria de facto, em que não nos encontramos, pois, no âmbito da aplicação do direito.

Deste modo, de seguida procederemos à apreciação.

Ponto 22.º da factualidade provada:

“22.º No ano de 2004, foi criada a empresa B..., dentro do universo PT, para integração dos trabalhadores da PTC, mediante um contrato de cedência, o qual tinha à data a vigência de cinco anos, e findos os quais, os trabalhadores que tivessem sido cedidos à B... voltariam à PTC, ou, caso esta já não existisse, ficariam nas empresas para onde tinham sido cedidos, assinando um novo contrato sujeito a novas regras.”

Sustenta a Recorrente que “é pouco rigoroso que o Tribunal dê como assente uma consequência resultante de um convénio que não se encontra junto aos autos”, motivo pelo qual, diz, esse ponto se deverá “restringir ao seguinte: 22. No ano de 2004, foi criada a empresa B..., dentro do universo PT, para integração dos trabalhadores da PTC, mediante um contrato de cedência, o qual tinha à data a vigência de cinco anos, e findos os quais, os trabalhadores que tivessem sido cedidos à B... voltariam à PTC”.

Nas contra-alegações invocam os Apelados que se trata, como resulta da motivação constante da sentença, de facto não impugnado (ou seja, que sobre o mesmo existiu acordo nos articulados) – lembrando que “a negligência no cumprimento do ónus processual de impugnação acarreta a aceitação e consolidação no processo de determinados factos suscitados pela parte contrária, mediante a aplicação da figura jurídica da admissão – artigo 574.º, n.º 1, do CPC, como de resto manifestamente sucedeu “in casu” –, a que acresce, dizem, que a própria Recorrente vem confirmar que o aduzido Acordo de Cedência não foi por si junto aos autos.

Apreciando, desde já diremos que assiste razão aos Apelados, pois que, tendo a matéria agora apreciada sido alegada no artigo 28.º da petição inicial, a Ré no artigo 30.º da contestação refere que aceita (para além dos demais que aí indica) este facto, sendo que, acrescente-se, tal como mais uma vez aqueles o invocam, em face dessa aceitação, carece de sentido pretender fazer apelo ao que porventura possa constar ou não de documento que sequer juntou aos autos.

Desde modo, sem necessidade de outras considerações, improcede o recurso quanto a este ponto de facto.

Pontos 26.º e 36.º da factualidade provada, com a redação seguinte:

- “26.º A partir daquele momento, a ré instou a autora, por diversas vezes (verbalmente e por escrito), para que abandonasse a empresa, designadamente, para que se desvinculasse da mesma, ao que a autora nunca acedeu.”

- “36º Foram feitas várias propostas à autora para subscrever um contrato de cedência ocasional para passar a exercer as respectivas funções no seio da B... S.A., ou, em alternativa, a suspender o seu contrato de trabalho ou então a aceitar a pré-reforma ou rescisão do seu vínculo laboral, propostas que a autora não aceitou.”

Refere a Recorrente que “facilmente se concluirá pela existência de desconformidades entre eles, uma vez que no Ponto 36, se consigna que a Ré fez várias propostas à autora para aceitar a suspensão do contrato, pré-reforma ou rescisão”, mas “que contudo no ponto 26 apenas se refere que a Ré instou a autora para que se desvinculasse, omitindo a respectiva forma, pelo que esse facto deverá ser completado com o que se deu como assente no ponto 36, isto é: 26.º A partir daquele momento, a ré instou a autora, por diversas vezes (verbalmente e por escrito), para que abandonasse a empresa, designadamente, para que se desvinculasse da mesma, através da suspensão do seu contrato de trabalho, pré reforma ou rescisão do seu vínculo laboral, ao que a autora nunca acedeu”.

Por sua vez, referem os Apelados não “se afigura minimamente inteligível que a Recorrente pretenda que tal factologia (v.g. ponto 26) devesse ser complementada com aqueloutra plasmada no ponto 36 da matéria assente, porquanto e por um lado”, “limita-se a propor acrescentar os mecanismos de modificação/extinção contratual efectivamente discriminados neste último ponto”, a que acresce que, para além de não se vislumbrar qual a utilidade / relevância prática de tal retificação, não é menos verdade que se ambos os pontos constam do acervo da facticidade dada como provada, obviamente que os mesmos foram devidamente tidos em conta pelo Tribunal.

Têm mais uma vez razão os Apelados, avance-se desde já.

Na verdade, para além de entendermos que não existe propriamente relação necessariamente direta e nomeadamente excludente entre o que se fez constar de cada uma dos analisados pontos – no primeiro está em causa o ter a Ré instado a Autora (verbalmente e por escrito), para que abandonasse a empresa, designadamente, para que se desvinculasse da mesma, ao que a última nunca acedeu, e no segundo, por sua fez, que foram feitas várias propostas à Autora para subscrever um contrato de cedência ocasional para passar a exercer as respetivas funções no seio da B... S.A., ou, em alternativa, a suspender o seu contrato de trabalho ou então a aceitar a pré-reforma ou rescisão do seu vínculo laboral, propostas que não aceitou –, nada impede que os factos em causa possam constar de pontos diversos da factualidade provada, como constam, pois que, ainda assim, não será dessa circunstância que decorrerá uma qualquer inadequada consideração de qualquer deles, melhor dizendo, de ambos.

Carece, pois, de fundamento a analisada pretensão da Recorrente.

Pontos 53.º e 65.º da factualidade provada, com a redação seguinte:

“- 53º O autor foi alvo de várias tentativas da ré para suspender o seu contrato de trabalho ou então a aceitar a pré-reforma, tendo sido interlocutores o Eng.º PP e D.ª QQ, o Dr. LL e Dr.ª SS e o Dr. TT, sendo esta última numa reunião plenária onde estiveram vários trabalhadores a quem que foram ameaçados de irem parar “à ...”, na cidade do Porto caso não aceitassem ir para a suspensão/pré-reforma.”

- “65º A actuação da ré tem como intuito que o autor se desvincule da empresa.”

Defende a Recorrente, o que levou à sua conclusão 8.ª, que quanto a estes  pontos se verifica o mesmo que ocorreria com os pontos 26.º e 36.º, pois que, diz, no último também se omite a forma de desvinculação, motivo pelo qual “deverá ser corrigido para: 65º A actuação da ré tem como intuito que o autor se desvincule da empresa através da suspensão do seu contrato de trabalho ou de pré-reforma”.

Respondendo, os Apelados, para além das considerações que antes fizeram sobre os pontos 26.º e 36.º, sustentam que a materialidade apurada reflete “a prova produzida em audiência de julgamento, independentemente de estar condensada num só ponto ou mais do que um, cuja (ir)relevância é absolutamente manifesta e nessa decorrência, nenhum fundamento assiste à Apelante para que seja considerada qualquer retificação”.

Assim o entendemos também, valendo as razões que fizemos constar anteriormente quanto aos pontos 26.º e 36.º, do que decorre, pois, sem necessidade de outras considerações, que também nesta parte não assiste razão à Recorrente.

Ponto 73.º da factualidade provada:

“73º Aquando da transferência referida em 61º, o autor intentou procedimento cautelar autuado sob o nº 1451/15.1T8BRG, pedindo a suspensão daquela ordem.”

Invoca a Apelante, o que levou às conclusões 9.ª e 10.ª, que o citado ponto “não contempla a prova documental que resulta da certidão judicial junta aos autos, dado se fazer referência que o Autor intentou um procedimento cautelar, mas omite-se o seu desfecho, que no caso se traduziu na sua improcedência” e que “deverá por isso, em face da certidão judicial junta aos autos, alterar-se o teor desse ponto para: 73 Aquando da transferência referida em 61º, o autor intentou procedimento cautelar autuado sob o nº 1451/15.1T8BRG, pedindo a suspensão daquela ordem, que foi julgado improcedente”.

Por sua vez, sustentam os Apelados: que não se consegue alcançar qual a relevância da pretendida retificação (a Apelante também não o esclarece), quer no contexto do objeto do recurso por si delimitado e, menos ainda, no desfecho da lide, afigurando-se por isso absolutamente, estéril, inócua e inconsequente; que é manifesto que, mercê da relação de instrumentalidade entre o procedimento cautelar e a correspetiva ação principal, a decisão proferida naquele procedimento não adquire a natureza de caso julgado material - n.º 4 do artigo 364.º do CPC, nem tampouco configura qualquer prejudicialidade em relação à pretensão deduzida na correspondente ação principal, sendo que, neste particular, a Recorrente parece esquecer, ou então preferir não lembrar, que a materialidade dada como assente no ponto 63.º, atinente à decisão proferida no âmbito da ação principal do procedimento cautelar vindo de referir-se e tramitada sob o número 23987/16.7T8PRT, determinou a revogação da ordem de transferência do local de trabalho e a condenação da ali Ré, aqui Recorrente, ao pagamento de uma indemnização ao então Autor, aqui Recorrido, por isso, não se vislumbra que também da redação imprimida ao ponto 73.º da factologia dada como provada, se verifique qualquer necessidade de retificação.

Apreciando, desde já diremos que também não atingimos, salvo o devido respeito, qual será a relevância da alteração que se pretende, tanto mais que, como os Apelados o indicam, sequer a Recorrente tal esclarece, a que acresce, como mais uma vez aqueles o mencionam, que consta dos pontos 62.º e 63.º da factualidade provada, não impugnados, o que resultou da ação judicial proposta pelo Autor, assim a condenação, transitada em julgado, que consta do último desses pontos.

Deste modo, carece de fundamento a alteração defendida pela Recorrente ao analisado ponto.

Pontos 34.º, 35.º, 66.º e 67.º, da factualidade provada:

Tais pontos têm a redação seguinte:

- “34.º Nesta sede, desde inícios de 2007 que a autora e os demais colegas que com ela integravam o departamento foram permanecendo a fazer o mesmo serviço, o qual foi sendo continuadamente reduzido até que em 2012 a ré retirou-lhes por completo quaisquer tipo de funções”

- “35.º Desde 2012, a autora encontra-se sentada a uma secretária sem nada para fazer com as seguintes excepções: nos anos de 2014 e 2015, a ré encarregou a autora de uma tarefa nos postos públicos, com a duração de cerca de 15 dias, uma tarefa com a duração de cerca de dois meses na triagem na Associação de Cuidados de Saúde (PT ACS) e, durante de cerca de um mês, tarefas relacionadas com listas telefónicas.”

- “66º A sala onde os autores foram colocados não tinha folhas de papel disponibilizadas pela entidade empregadora e apenas com um computador limitado na sua utilização para consulta do portal do colaborador.”

- “67º Naquela sala, o autor não tinha acesso a telefone.”

Sustenta a Recorrente que ocorre inequívoco erro de apreciação da prova testemunhal – e não mera divergência relativamente à sua apreciação – quanto aos referidos pontos dados como provados, devendo, ao invés, serem dados como assentes os factos constantes das alíneas f) e k), dos factos não provados, de acordo com os depoimentos prestados por testemunhas que indica e das declarações da Autora, sendo que, socorrendo-nos do corpo das alegações, fez constar o que refere serem passagens, que localiza no registos de gravação, dos depoimentos das testemunhas FF, GG e HH, bem como da Autora, dizendo ainda que, “perante o teor destes depoimentos o Tribunal, ao invés de aplicar o regime previsto no artigo 414º, do Cód. Proc. Civil, segundo o qual A dúvida sobre a realidade de um facto resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita, decidiu dar esses factos como provados.”

Conclui que “deverão esses Pontos de Facto ser alterados da forma seguinte:

34.º Nesta sede, desde inícios de 2007 que a autora e os demais colegas que com ela integravam o departamento foram permanecendo a fazer o mesmo serviço, o qual foi sendo continuadamente reduzido.

35.º Desde 2012 até 2015, a autora encontra-se sentada a uma secretária tendo a ré encarregado a autora de uma tarefa nos postos públicos, outra no cadastro comercial, outra na triagem na Associação de Cuidados de Saúde (PT ACS) e outras tarefas relacionadas com listas telefónica, cuja duração não foi possível determinar.

66º A sala onde os autores foram colocados tinha apenas com um computador limitado na sua utilização para consulta do portal do colaborador.

67º Naquela sala, o autor tinha acesso a telefone”

E que deve, ainda, ser aditado aos Factos Provados, o seguinte Facto:

75) Entre 2012 e 2013, a autora manteve-se a prestar atividade no âmbito das Operações de Customer Care, traduzidas na atualização dos ficheiros dos clientes análise de faturação até setembro de 2013, data em que a Direção de Operações de Customer Care migrou para a PT Contact.”

Defendem os Apelados, por sua vez, a manutenção do julgado, indicando como prova o que dizem resultar dos respetivos depoimentos de parte, bem como de depoimentos que indicam – designadamente testemunhas HH, DD, GG, KK, LL e FF – transcrevendo e localizando o que dizem ser passagens dos depoimentos.

Da motivação constante da sentença fez-se constar designadamente o seguinte:

No que respeita aos pontos 25º a 36º, 38º e 66º a convicção do tribunal assentou nas declarações de parte prestadas pela autora, que foram corroboradas pelo depoimento das testemunhas, pelos documentos juntos a fls. 148, 186 e 187.

A respeito das declarações de parte diga-se que as mesmas são livremente apreciadas pelo tribunal – artigo 466.º, n.º 3 do CPC – devendo ser valoradas com algum cuidado, já que são declarações interessadas, parciais e não isentas, sendo que quem as produz tem um óbvio e manifesto interesse na acção.

(…)

Tendo já considerando uma relevância muito mais restrita deste meio de prova, a verdade é que, melhor vista a questão, afigura-se-me que nada obstará à consideração das declarações de parte per se, desde que as mesmas se revelem credíveis, importando aqui chamar à colação o facto de que casos há – como o dos autos – em que as declarações de parte podem ser a mais importante prova, senão a única.

Ora, a autora prestou as suas declarações de forma segura e coerente, tendo sido corroboradas, no essencial, pelas testemunhas inquiridas, sendo também conformes às regras da experiência comum.

 Assim, as testemunhas HH, DD, KK, todos antigos trabalhadores da ré, confirmaram o relato da autora quanto ao que se passava na Rua ..., no Porto, sala onde também estiveram, nas mesmas condições da autora, relatando de forma segura o que acontecia na sala, quem lá estava e o ambiente que se vivia na mesma.

A testemunha HH relatou as funções que juntamente com a autora exerceu, inicialmente sob chefia desta, em 2005, 2006 e 2007, relato que se mostrou, no essencial, coincidente com o da autora.

Foi ainda considerado o depoimento da testemunha GG, antigo funcionário da ré, que se reformou em 2011 e que asseverou que a autora esteve durante algum tempo na sala da ..., sem qualquer função, juntamente com a sua mulher e o seu filho, dando também conta do clima de conflito e de desânimo que ali se vivia.

Foi também tido em conta o depoimento da testemunha FF, gestora de recursos humanos da ré, que confirmou que a autora foi colocada no CED, que era uma bolsa de mobilidade para colocar trabalhadores noutras funções, admitindo que a autora possa ter estado sem exercer funções por alguns períodos de tempo e que confirmou que a autora exerceu as funções que vêm descritas em 35º, não sabendo, porém, quanto tem as exerceu.

Também a testemunha LL, que trabalhou nos recursos humanos da ré entre 1983 e 2017, admitiu que a autora possa ter estado sem funções durante algum tempo, sem precisar quanto.

Esta testemunha confirmou também ter falado com a autora para esta sair da empresa, no âmbito de um programa de cessação de contratos vigente na ré, actuação que é corroborada pelo documento 21 junto à pi e, bem assim, pelo depoimento de FF, que apesar de não ter contactado a autora, admitiu que várias pessoas o foram.

Finalmente, também a testemunha VV, gestor do grupo G..., também confirmou que de 2007 a 2015 houve períodos em que a autora esteve sem funções atribuídas.

(…)

Quanto aos factos que vêm elencados em 43º a 54º, 56º a 61º, 64º, 66º e 67º e 69º, a convicção do tribunal assentou nas declarações de parte prestadas pelo autor que forma prestadas de forma coerente e segura e que encontraram arrimo nos documentos juntos a fls. 404, 406, 485, 443, 455 a 457 e 461 e, bem assim, nos depoimentos das já referidas testemunhas HH, DD, KK e HH - que, tal como acima se referiu a respeito da autora, confirmaram que o autor também foi colocado na sala da Rua ..., sem qualquer função atribuída, tendo apenas uma mesa, secretária e um computador limitado na sua utilização para consulta do portal do colaborador - e FF – que confirmou que a única proposta de tarefas feita ao autor foi a ocorrida em 2015, estando o autor sem funções desde a data da reintegração até abril de 2015.

As declarações do autor foram também corroboradas pelo depoimento das testemunhas JJ, amigo do autor – que confirmou o agregado familiar do autor e o facto deste ser o único sustento da casa e que emprestou dinheiro ao autor no período após este ter sido despedido e que o autor teve de emigrar -, EE, antigo funcionário da ré – que confirmou a situação referida em 48º que também aconteceu consigo, e bem assim, as razões pelas quais lhes foi movido o processo disciplinar referido em 58º e o seu desfecho - e WW, inspectora da ACT - que, em 2015, se deslocou a Braga ao local de trabalho do autor e que confirmou que este estava numa sala numa secretária com um computador, mas sem qualquer função atribuída, tendo advertido a ré de que tinham de acabar com aquela situação.

Importa, ainda, referir a este respeito que o depoimento da testemunha PP, antigo superior hierárquico do autor, não foi minimamente valorado, uma vez que o seu depoimento não foi prestado de forma espontânea, mas sim comprometida, começando logo por afirmar desconhecer as funções que o autor exercia, mas que era um péssimo trabalhador e, pese embora, claramente se recordar da vida do autor na ré, estranhamente, não se recordava das conversas que com o mesmo teve, nem dos departamentos onde o autor foi inserido desde 2007.

De igual forma, a testemunha VV, sem que tal lhe fosse sequer perguntado, apressou-se a dizer que os autores sempre tiveram uma ocupação efectiva, acrescentando que o autor era uma pessoa muito difícil e que obstaculizava as colocações, admitindo já no final do seu depoimento que, afinal, o autor este em alguns períodos sem qualquer função atribuída (como acima se referiu).

Cumprindo-nos apreciar, consignando-se que se procedeu à audição dos registos de gravação no que à prova referenciada diz respeito, ressalta desde logo à evidência que a Recorrente pretende infirmar a convicção firmada pelo Tribunal recorrido no sentido de ver essa substituída por aquela que defende no presente recurso, com base numa análise meramente parcial e sequer devidamente analisada criticamente da prova produzida e que foi, como claramente resulta da transcrição antes realizada, atendida e expressamente mencionada, como ainda conjugada, pelo Tribunal, em termos de se justificar por que razão a convicção foi a que se fez constar e não outra. Ou seja, sequer a Recorrente teve em devida consideração, na impugnação que faz, toda a prova produzida e que, como se disse, foi considerada pelo Tribunal recorrido, quando, como o temos entendido, na impugnação da decisão sobre matéria de facto com fundamento em erro de julgamento se torna necessário que se indiquem elementos de prova que não tenham sido tomados em conta pelo tribunal recorrido quando se imporia o tivessem sido, ou que o fossem atendidos meios de prova que o não deveriam ter sido (por haver designadamente eventual proibição legal), ou, ainda, sendo esse o caso, que se apresentem argumentos tendentes a colocar em causa a avaliação da prova que foi feita pelo tribunal da prova, evidenciando designadamente deficiências ou incongruências de raciocínio que conduziram a conclusões erradas, ou, ainda, porventura, assinalando a insuficiência dos elementos que foram considerados para as conclusões que foram retiradas.

Sendo assim, importando relembrar que, como é consabido, no âmbito da formação da convicção a respeito da verificação ou não dos factos impera o princípio da livre apreciação da prova, que significa que o julgador deve decidir sobre a matéria de facto da causa segundo a sua íntima convicção, formada no confronto com os vários meios de prova”[1][2], na sua aplicação ao caso, da circunstância de sequer se ter atendido na impugnação a toda a prova produzida e que expressamente foi atendida pelo Tribunal resulta, tanto mais que os elementos parciais que foram indicados não são bastantes para o efeito, que não se encontram afinal razões, devidamente fundadas e evidenciadas, para considerarmos que a decisão recorrida não tenha motivado e analisado, de forma ponderada, a prova produzida, toda ela pois – e não apenas em parte –, não resultando designadamente evidenciado que padeça de desconformidade com os elementos probatórios disponíveis – tanto mais que não resulta sequer infirmada tal decisão, na alegação da Recorrente. 

É que, neste âmbito, tendo por base o regime legal aplicável, importa ter também presente que a reapreciação da matéria de facto por parte do tribunal da relação, tendo de ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância – pois que só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição[3] –, muito embora não se trate de um segundo julgamento e sim de uma reponderação, não se basta com a mera alegação de que não se concorda com a decisão proferida em 1.ª instância, exigindo antes da parte processual, que pretende usar dessa faculdade, a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos – sem limitar, porém, o segundo grau, ou seja o tribunal de recurso, de sobre tais desconformidades, previamente apontadas pelas partes, se pronunciar, enunciando a sua própria convicção (não estando, assim, limitada por aquela primeira abordagem, pois que, como já o dissemos, no processo civil impera o princípio da livre apreciação da prova – artigo 607.º, n.º 5, do CPC[4]). O que se referiu visa salientar que o legislador impõe à parte recorrente, que pretenda impugnar a decisão de facto, um efetivo ónus de impugnação, devendo expor os argumentos que, extraídos de uma apreciação crítica dos meios de prova, determinem / justificam o seu entendimento de que o resultado deveria ser diverso do decidido pelo tribunal recorrido.

Estamos, pois, diversamente do que a Recorrente o diz, perante uma mera divergência da sua parte a respeito da convicção que deverá ser extraída da prova, com a particularidade, que assume relevância decisiva em termos de infirmação da base da convicção que defende que deveria afirmar-se, de ser baseada numa análise meramente parcial da prova e que sequer não foi devidamente conjugada com toda a restante prova, assim a que foi expressamente indicada pelo Tribunal e que, assim o entendemos, bastando para o efeito ter presentes as passagens dos registos de gravação que são indicadas pelos Apelados, dá adequado suporte à convicção que esse Tribunal firmou – sem que, diga-se, precisamente em face dessa prova produzida e atendida, diversamente do que o invoca (mas não demonstra) a Recorrente, se justifique a aplicação do regime previsto no artigo 414.º, do CPC, pois que esse pressupõe que exista dúvida fundada sobre a realidade de um facto (em que essa se resolve contra a parte a quem o facto aproveita), o que não se pode dizer que seja esse o caso.

Deste modo, sem necessidade de outras considerações, carece de adequado fundamento a pretensão da Recorrente no sentido da alteração que pretende, com a consequente improcedência do recurso nesta parte.

Ponto 61.º, da factualidade provada, a alíneas f) e k), não provadas, com a redação seguinte:

- “61º Em 24/02/2015 foi comunicado ao autor a sua transferência para a Rua ..., no Porto com efeitos a partir de 1/04/2015, tendo sido colocado na “sala dos encostados”, onde não lhe foi dado nada para fazer, o que se manteve até à entrada da pi em juízo.”

- “f) Entre 2012 e 2013, a autora manteve-se a prestar atividade no âmbito das Operações de Customer Care, traduzidas na atualização dos ficheiros dos clientes e análise de faturação até setembro de 2013, data em que a Direção de Operações de Customer Care migrou para a PT Contact.”

- “k) O autor presta atividade à 2ª e 3ª feira e apresenta comprovativos da concessão de baixa para os restantes dias da semana, não permitindo à ré organizar o seu trabalho com um mínimo de estabilidade, dado nunca saber quando é que este autor comparece ou não ao trabalho.”

Defende a Recorrente que deve ser dada diferente resposta, atentos os depoimentos das testemunhas FF e II – socorrendo-nos do corpo das alegações, transcreve e localiza o que diz serem passagens dos depoimentos –, bem como dos documentos carreados pelo Autor BB para os autos – nas alegações refere: “infere-se dos documentos a que alude o artigo 182 da pi., identificados com o nº 133, que o Autor esteve de baixa 3 dias, entre 27 e 29 de maio e entre 10 e 12 de junho, e esteve de baixa 12 dias entre 23 de setembro e 4 de outubro”.

Conclui que:

- “o Ponto 61 dos Factos deve ser alterado para a forma seguinte: 61º Em 24/02/2015 foi comunicado ao autor a sua transferência para a Rua ..., no Porto com efeitos a partir de 1/04/2015.”

- por seu turno, “deverá ser aditado o seguinte Facto aos Factos Provados: 76) O autor presta atividade à 2ª e 3ª feira e apresenta comprovativos da concessão de baixa para os restantes dias da semana, não permitindo à ré organizar o seu trabalho com um mínimo de estabilidade, dado nunca saber quando é que este autor comparece ou não ao trabalho.”.

Defendem mais uma vez os Apelados a adequação do julgado, indicando como prova o que dizem resultar de depoimentos, cujas passagens transcrevem e localizam, no corpo das alegações – DD, KK, EE, GG.

Para além do que já transcrevemos aquando da anáilise dos pontos anteriores, que é aplicável ao ponto 61.º agora analisado, fez-se ainda constar da motivação constante da sentença o seguinte:

“(…) O ponto f) não foi confirmado por nenhuma testemunha ou documento, não tendo sido, nomeadamente, confirmada pela testemunha FF que explicou, como acima se referiu, quais as funções que a autora exerceu.

(…)

Por último, a propósito do ponto k), apenas foram juntos aos autos os certificados de incapacidade temporária de fls. 455 a 457 de onde constam dois períodos de baixa de 3 dias e um de 12 dias.

É certo que as testemunhas LL e FF aludiram a essa prática do autor, mas a verdade é que a ré facilmente poderia ter junto documentos que a atestasse, o que não fez, razão pela qual se entendeu dar como não provada aquela matéria.”

Apreciando, desde já diremos que valem aqui todas as considerações que fizemos anteriormente (aquando da apreciação dos pontos 34.º, 35.º, 66.º e 67.º, da factualidade provada) a respeito de se estar perante impugnação baseada apenas numa análise parcial da prova que foi produzida quando, como o dissemos, em face dos princípios vigentes neste âmbito, importaria que a Recorrente se tivesse preocupado, o que claramente não fez, em tentar evidenciar, em face de toda a prova efetivamente produzida e que foi atendida expressamente pelo Tribunal recorrido, que ocorria erro na apreciação dessa prova, toda ela, pois. Aliás, bastando para o efeito ter ainda presente a pronúncia do Tribunal recorrido sobre outros factos, assim, para além do mais, os pontos 45.º a 65.º, sobre os quais aliás não incidiu a impugnação (apenas o dirigiu à redação dos pontos 53.º e 65.º mas não propriamente ao respetivo conteúdo, o que já foi objeto supra da nossa apreciação), para melhor se perceberem as razões e fundamentos que serviram de base à convicção que foi firmada em 1.ª instância, sendo que é indicada e explicitada a prova a que se  atendeu (documental, por declarações e testemunhal), sendo que, no referido contexto, admitindo-se naturalmente como legítimo que a Recorrente possa discordar, no entanto, porém, essa discordância, tanto mais que baseada apenas em parte da prova produzida, não se confunde com efetiva demostração, que no caso claramente não ocorreu – bastando mais uma vez atender às passagens dos depoimentos que são indicadas nas alegações e contra-alegações, que dão afinal suporte à convicção que veio a ser criada –, perante este Tribunal de recurso, que se esteja perante  uma qualquer inadequada, muito menos errada, apreciação da prova.

Não obstante o que referimos anteriormente, oficiosamente, a propósito do ponto 61.º, no que se refere à menção “sala dos encostados”, entendemos que se justifica esclarecer, como aliás se fez constar do ponto 49.º quanto à sala que aí se refere, que se trata de sala assim apelidada internamente pelos trabalhadores da Ré.

Pelo exposto, improcedendo o recurso, altera-se, porém, oficiosamente, o ponto 61.º, o qual passa a ter a redação seguinte:

“61º Em 24/02/2015 foi comunicado ao autor a sua transferência para a Rua ..., no Porto, com efeitos a partir de 1/04/2015, tendo sido colocado na sala apelidada internamente pelos trabalhadores da Ré como “dos encostados”, onde não lhe foi dado nada para fazer, o que se manteve até à entrada da pi em juízo.”

1.2. Em face do decidido anteriormente, a base factual a atender, no âmbito da aplicação do direito, é aquela que foi considerada na sentença, apenas com a alteração antes determinada quanto ao ponto 61.º da factualidade provada.

2. O Direito do caso

Em face do que resulta das conclusões apresentadas pela Recorrente, que como o dissemos já, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, delimitam o âmbito do nosso conhecimento, excluindo aquelas em que se fazem meras considerações sobre o que teria resultado ou não de prova que indica mas a respeito do modo como foi aplicado o direito e não, pois, caso fosse essa a intenção, com a necessária referência a pontos de facto caso a intenção tivesse sido a de, nessa parte, esses impugnar, constata-se que avança designadamente com os argumentos seguintes:

- não aceita que o Tribunal conclua que a Ré quis rebaixar e afetar a dignidade da Autora quando a convidou para chefiar um grupo de trabalhadores em 2005 (Factos 27 e 28) e em 2007 (Factos 32 e 33) funções de coordenação que se recusou a aceitar, nem compreende que se tenha provado um período ininterrupto de inatividade entre 2012 e 2015, quando a Ré lhe atribuiu funções de forma intermitente, ou seja, nunca a abandonou, procurando-a manter ocupada e face às necessidades existentes a cada momento;

- todo o circunstancialismo, amplamente comprovado, em obediência ao critério legalmente estabelecido, deveria ter sido considerado no montante indemnizatório fixado pelo Tribunal, de modo a que o mesmo fosse equitativo e justo e não desproporcionado, iníquo e por isso injusto, dado que ambos os Autores, de uma forma ou de outra, concorreram para a sua situação de inocupação, o que reduz, substancialmente, o grau de reprovação ético social da conduta da Ré, razão pela qual, diz, o montante indemnizatório que lhes foi reconhecido deverá ser fixado em €15.000,00, montante aceite pelo Autor DD, que não só se afigura equitativo proporcionado e justo, como corresponde, de alguma forma, ao seu sentimento de justiça, caso contrário não teria por ele sido aceite;

Conclui que a sentença deve ser revogada e substituída por outra que, dando provimento ao recurso, reduza a condenação da Recorrente na indemnização aos Autores em danos morais, para o valor de 15.000,00€.

Por sua vez, referem nomeadamente os Apelados:

- Dizendo que a Recorrente delimitou o objeto das suas alegações ao montante arbitrado a título de danos morais, sustentam que se encontram no caso preenchidos quer os pressupostos do assédio moral, quer os requisitos que fundamentam o dever de indemnizar, em sede de responsabilidade civil;

- os comportamentos (ilícitos) perpetrados pela Apelante, provados e não impugnados por esta, maxime, 3,7 anos e mais de 6 anos de inatividade forçada (com existência de culpa grave da Recorrente que deu causa aos factos donde promanam os danos sofridos pelos Recorridos), tiveram como objetivos os de perturbar, constranger e afetar a dignidade dos trabalhadores, danos esses, igualmente, provados e não impugnados pela Apelante, pelo que o valor da indemnização fixado, de  respetivamente, €60.000,00 e € 80.000,00, é absolutamente adequado;

Concluem pela improcedência do recurso.

Pronunciando-se o Ministério Público, junto desta Relação, no parecer emitido, no sentido da adequação do julgado, cumprindo-se pronúncia, importa desde já esclarecer que, não logrando sequer a Recorrente obter provimento na parte do recurso que dirigiu à matéria de facto, mantendo-se assim inalterada a factualidade a atender, não logram então obter fundamento quaisquer argumentos que tivessem como pressuposto aquela alteração da matéria de facto.

De resto, a respeito dos argumentos que são invocados nas conclusões, excluídos aqueles que contendem com a referida alteração da matéria de facto e, ainda, as referências que faz também ao que porventura tivesse resultado de depoimentos prestados – pois que estes só assumem relevância no âmbito do recurso dirigido à matéria de facto –, em boa verdade o que se extrai é apenas uma divergência, esta manifesta, no que se refere ao montante indemnizatório que foi arbitrado pelo Tribunal de 1.ª instância e já não, também, à parte da sentença em que, no âmbito da aplicação do direito, concluiu que estamos perante comportamentos que se reconduzem a considerar que os Autores foram vítimas de assédio moral – assim: quanto à Autora que o comportamento da Ré, manifestamente indesejado, teve como objetivo claro criar um ambiente intimidativo, hostil e humilhante e constranger aquela a fazer cessar o contrato, o que, aliás, lhe propôs diversas vezes (atuação aquela que perdurou, num primeiro momento, por cerca de 7 meses, e posteriormente, durante mais de 3 anos); quanto ao Autor, que o comportamento da Ré, também claramente indesejado, teve como objetivo criar um ambiente intimidativo, hostil e humilhante e constranger o autor a fazer cessar o contrato, o que, aliás, lhe propôs diversas vezes, chegando, inclusivamente, a despedi-lo (atuação que se referiu ter-se iniciado no 1º trimestre de 2007 e que se manteve até à entrada da petição inicial, tendo o Autor estado sem exercer funções durante cerca de 5 anos – de 2007 até à data do despedimento, 5/12/2011 – e, posteriormente, cerca de 1 ano – desde a data em que foi reintegrado até à data de entrada da petição inicial) –, para de seguida, então sim, depois de fazer apelo ao disposto no artigo 28.º do Código do Trabalho (CT), partir para a apreciação e análise da questão da indemnização a arbitrar.

O que se referiu anteriormente visa evidenciar, salvo o devido respeito, visto o teor da sentença, que não cuidou a Recorrente, nomeadamente para o caso de não lograr alcançar a alteração da matéria de facto por que pugnou, de dirigir àquela sentença, nessa eventualidade, no âmbito da aplicação do direito, quando nessa se considerou que estamos perante comportamentos integrados em assédio moral, qualquer efetivo argumento jurídico tendente a infirmar essa conclusão, no âmbito, pois, da referida aplicação do direito, assim nomeadamente erro na interpretação ou aplicação da lei, no sentido de explicar a razão por que a decisão deveria ter sido outra – no caso aquela que menciona na supra mencionada conclusão, quando, como é comummente afirmado, impende sobre o recorrente, em sede de recurso, o ónus de invocar, também no domínio da aplicação da lei, os argumentos (jurídicos) que na sua ótica justificam o afastamento dos fundamentos constantes da decisão recorrida para sustentar o modo como interpretou e/ou aplicou a lei, de tal modo que o tribunal superior os possa apreciar, no sentido de lhes dar ou não sustentação – versando o recurso sobre matéria de direito, deve o Recorrente, para além de indicar nas conclusões as normas jurídicas violadas, referir também o sentido que, no seu entender, as normas que constituem o fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas (artigo 639.º, n.º 2, do CPC).

Avançando-se então para a apreciação da única questão, a que consideramos que efetivamente é dirigido o recurso, assim quanto a saber se é ou não adequado o quantum indemnizatório arbitrado, fez-se constar da sentença recorrida, depois de diversas considerações a respeito do enquadramento teórico da questão (com recurso a Doutrina e Jurisprudência), o seguinte (transcrição):

“(…) Dispõe o artigo 28º do C. Trabalho (“ex vi” artigo 29º, nº 3) “a prática de acto discriminatório lesivo de trabalhador ou candidato a emprego confere-lhe o direito a indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, nos termos gerais de direito”.

Pese embora os autores reclamarem umas indemnização prelos danos patrimoniais e não patrimoniais, a verdade é que apenas alegam ter sofrido danos não patrimoniais.

Nos termos do artigo 496.º, n.º 1 do Código Civil, apenas serão ressarcíveis os danos não patrimoniais que face à sua gravidade mereçam a tutela do direito. Esta gravidade “há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos” (Antunes Varela e Pires de Lima, Código Civil anotado, I, 4.ª edição, pág. 501).

Citando o mesmo autor, “os simples incómodos ou contrariedades não justificam a indemnização por danos não patrimoniais”.

Como se lê no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15/12/2011, disponível em www.dgsi.pt, “… em direito laboral para haver direito à indemnização com fundamento em danos não patrimoniais, terá o trabalhador que provar que houve violação culposa dos seus direitos, causadora de danos que, pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, o que se verificará, em termos gerais, naqueles casos em que a culpa do empregador seja manifesta, os danos sofridos pelo trabalhador se configurem como objectivamente graves e o nexo de causalidade não mereça discussão razoável”.

Assim, o trabalhador terá direito a ser indemnizado nestes moldes, quando demonstre ter sofrido danos não patrimoniais graves em virtude do assédio de que foi vítima.

A este respeito temos que como vem dado como provado que:

- a actuação da ré causou nos autores um estado permanente de desgosto, de ansiedade, de frustração e de revolta, o qual se agudiza a cada dia que passa;

- em consequência da inactividade laboral a que a ré votou os autores, sentiram-se estes profundamente humilhados, vexados, frustrados, perseguidos, desconsiderados, desesperados, sofrendo de forte ansiedade, indignados, cismáticos, perturbados, transtornados, irritando-se com facilidade; e

- o autor tem-se sentido agastado e afectado psicologicamente, razão pela qual, desde Maio de 2015 a esta parte tem estado a ser seguido pelo psiquiatra o Dr. UU, que atento o seu estado de saúde mental, lhe emitiu atestados médicos de baixa psiquiátrica entre 27 a 29/05/15, de 10 a 12/06/15 e de 23/09 a 10/04/15 e que tem ainda prescrito o consumo de vários fármacos de molde a controlar e/ou minorar os efeitos nefastos de nível psíquico que toda esta situação tem acarretado para o autor.

Ora, afigura-se-me, de forma clara que estes danos são objectivamente graves e lesivos da integridade psicológica dos autores, enquanto pessoas e enquanto trabalhadores, ultrapassando, em muito, os simples incómodos ou contrariedades.

São merecedores da tutela do direito, pela gravidade que assumem e, como tal, não podem deixar de ser indemnizáveis, por força do preceituado nos artigos 483.º e 496.º do CC.

Estes danos são imputáveis à conduta da ré que, com o seu comportamento, violou as garantias legais e convencionais dos autores, designadamente o dever de proporcionar ao autor boas condições de trabalho, do ponto de vista físico e moral - cfr. artigo 127.º, n.º 1, al. c) - e a proibição do empregador de obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho – artigo 129.º, n.º 1, al. b) – e as que proíbem o assédio moral definido no artigo 29.º, todos do C. Trabalho.

Tenho, assim, como merecedores de tutela os danos sofridos pelos autores.

Estabelece o artigo 496.º do Código Civil que:

“1 - Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

4 - O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º”.

Como é sabido, nesta espécie de danos não se trata de uma indemnização “stricto sensu”, mas antes de uma reparação, ou seja, da atribuição de uma quantia que se julga adequada a compensar dores e sofrimentos através de um certo número de satisfações que as minorem ou façam esquecer.

Como ensina Antunes Varela, tal reparação deve ser proporcional à gravidade do dano, devendo ter-se em conta, na sua fixação, todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida. E a reparação há-de ser fixadas segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do lesante, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização, etc. (in “Código Civil Anotado, I, 4.ª edição, pág. 501).

Na fixação da indemnização a título de danos não patrimoniais, releva sobretudo a gravidade do dano causado, o grau de culpa do agente e as demais circunstâncias do caso. É necessário considerar, desde logo, que estes elementos têm, no seu todo, uma dupla finalidade: a da reparação dos danos causados e o da sanção ou reprovação do agente.

Por outro lado, a indemnização a fixar não deve ser simbólica, miserabilista, ou arbitrária, mas nortear-se por critérios de equidade, tendo em atenção as circunstâncias referidas no artigo 494.º do CC.

Pese embora nada constar nos factos provados quanto à situação económica da ré, esta, como é consabido, faz parte de um grupo económico de relevo em Portugal (e não só), sendo uma das grandes operadoras de telecomunicações no nosso país.

Vejamos, então, qual a indemnização a fixar a cada um dos autores.

Quanto à autora, para além do estado e sentimentos acima referidos, não logrou a autora provar que, consequência do ambiente criado pela ré, teve de fazer várias consultas médicas psiquiátricas, sendo a baixa referida em 38º uma baixa psiquiátrica.

A situação de inactividade perdurou no ano de 2004, durante 7 meses e, posteriormente mais de 3 anos (de 2012 a 2015).

O grau de ilicitude e de culpa da ré é muito elevado, afigurando-se-me inqualificável que uma empresa trate os seus funcionários como objectos obsoletos, que descarta após muitos anos de serviço prestados à empresa.

Compreende-se que para a ré, em face da evolução tecnológica e das várias reestruturações que optou por fazer, possam existir funcionários que, como a autora, não tenham lugar na empresa, mas se assim for, terá, obviamente, de actuar de outra forma que respeite a dignidade dos seus trabalhadores.

Em face do agora exposto e tendo em conta a natureza e intensidade dos danos não patrimoniais em causa, afigura-se-me justo e adequado fixar a indemnização a atribuir à autora por força do artigo 496.º, n.º 4 do Código Civil em 60.000€.

A respeito do autor, a situação de inactividade perdurou durante cerca de 5 anos e, posteriormente mais 1 ano. Em rigor, o autor, desde o 1.º trimestre do ano de 2007 até à entrada da petição inicial em juízo, 13/11/2015, praticamente que nada faz por ordem da ré, seja porque esta não atribui funções, seja porque a ré o (ilicitamente) despediu. Mais transferiu (também ilicitamente) o autor de Braga – onde estava esvaziado de funções - para o Porto, onde foi colocado sem quaisquer funções.

O grau de ilicitude e de culpa da ré em relação ao autor é, assim, extremamente elevado, assumindo a ré uma postura permanente de “castigo” ao autor por não querer fazer cessar o seu contrato, tratando-o como um objecto sem qualquer utilidade.

Para além dos sentimentos acima referidos que o autor vivenciou por causa da conduta da ré, o autor tem-se sentido agastado e afectado psicologicamente, sendo seguindo por um psiquiatra, desde maio de 2015, tomando fármacos para minorar a sua situação.

Assim, em face do exposto, afigura-se-me justo e adequado fixar a indemnização a atribuir ao autor por força do artigo 496.º, n.º 4 do Código Civil em 80.000€ (…)”.

Cumprindo-nos apreciar, como abordagem inicial, não temos razões para não consideramos, acompanhando-se assim nesta parte o Tribunal recorrido, quando considerou que os comportamentos provados permitem ter por preenchidos nomeadamente os pressupostos contidos no artigo 29.º do Código do Trabalho – não obstante a Recorrente sequer dirigir propriamente o recurso a essa questão, como antes o referimos –, a que se alude, entre outros, no Acórdão desta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto de 30 de Outubro de 2023[5][6]–, como ainda, também, aqueles que resultam da lei  em sede de responsabilidade, a que mais uma vez se alude na sentença recorrida, sendo que, afinal, apesar de em qualquer desses referidos âmbitos a Recorrente o pôr em causa no presente recurso, como antes o dissemos, sempre relembraremos, ainda assim, por um lado, que resulta do disposto no artigo  483.º, n.º 1, do CC que “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação», sendo que, agora por decorrência do n.º 1 do artigo 496.º do mesmo Código, “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”, estabelecendo depois o seu n.º 3 que a indemnização por danos não patrimoniais será fixada equitativamente, devendo o tribunal atender, em qualquer caso, às circunstâncias referidas no artigo 294.º, o qual determina, por seu turno, que na fixação do montante da indemnização se deve ter em conta “o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso”. Como ainda, por outro lado, que também consideramos, nas concretas situações que resultam da factualidade provada, de resto quanto a ambos os Autores / recorridos, que estamos inegavelmente perante danos relevantes para os efeitos previstos no artigo 496.º do CC, “por contenderem com a profissionalidade como valor inerente à realização da pessoa humana e à sua intrínseca dignidade”[7], pois que causam evidente abalo a quem deles sofre, incluindo na saúde, como ocorreu afinal no caso, sendo por essa razão devida, porque fundada, a atribuição a ambos de indemnização que, na medida do possível, compense esses danos.

Avançando-se então para a questão expressamente colocada pela Recorrente, centrando-se a análise, está em causa saber se a fixação do montante indemnizatório se apresenta como adequada, pois que é nesta parte que aquela diverge expressamente do decidido em 1.ª instância, defendendo que o quantum deve ser fixado em €15.000,00, quando os Apelados, por sua vez, sustentam a adequação do julgado.

Já então neste âmbito, e desde logo, como primeira nota, importa esclarecer que, no caso, ao contrário do que alega a Recorrente, entendemos que não resulta da factualidade provada adequado suporte para que se possa considerar que os Autores tenham contribuído, muito menos decisivamente como o diz, para a situação de não exercerem normalmente as suas funções, pois que, salvo o devido respeito, não se pode dizer que as recusas que manifestaram quanto a propostas ou atuações da Ré – assim, designadamente, a Autora para que abandonasse a empresa (pontos 26.º) ou depois as propostas a que se alude no ponto 36.º provado e quanto ao Autor as propostas a que se alude nos pontos 48.º, 49.º e 53.º – não fossem legítimas, assim em termos de não se poder extrair uma qualquer conclusão no sentido de que tivessem de algum modo contribuído para a situação que vivenciaram.

Ora, como é aliás reiterado desde há muito pela Doutrina e secundado pela Jurisprudência, os danos não patrimoniais são comummente definidos como prejuízos insuscetíveis de avaliação pecuniária – essa não visa reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o facto danoso, mas sim compensar de alguma forma o lesado pelas dores físicas ou morais sofridas e também sancionar a conduta do lesante.

Por sua vez, a respeito do apelo à equidade, para que remete a norma legal, como resulta do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de julho de 2007[8], essa traduz-se na observância das regras de boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas, da criteriosa ponderação das realidades da vida, dos parâmetros de justiça relativa e dos critérios de obtenção de resultados uniformes, sendo que, socorrendo-nos agora, também, mais recentemente, do Acórdão do mesmo Tribunal de 10 de dezembro de 2019[9]: “A equidade destina-se a encontrar a solução mais justa para o caso. Pretende-se encontrar somente aquilo que, no caso concreto, pode ser a solução mais justa. Como se referiu, citando o Prof. Castanheira Neves, “… a equidade está assim limitada sempre pelos imperativos da justiça real, a justiça ajustada às circunstâncias, em oposição à justiça meramente formal. Por isso se entende que a equidade é sempre uma forma de justiça. A equidade, exactamente entendida, não traduz uma intenção distinta da intenção jurídica, é antes um elemento essencial da juridicidade. (...) A equidade é, pois, a expressão da justiça num dado caso concreto”.

Não se trata, importa dizê-lo, precisamente pela natureza dos referidos danos e critérios a atender para a fixação da indemnização, de tarefa propriamente fácil, pois que, partindo de critérios que em parte não se apresentam propriamente como objetivos, ou que só dificilmente podem ser objetivados, apelando por essa razão também à sensibilidade do próprio julgador, deve este, porém, na medida do possível, abstrair-se das suas convicções pessoais que não encontrem adequado respaldo, dentro do quadro civilizacional vigente, no sentimento e justa medida das coisas (do que é adequado e justo) da comunidade em geral.

Entendendo-se que um dos elementos que pode (e entendemos mesmo que deve) ser atendido, para o efeito, será, nomeadamente, o que, para situações semelhantes ou que apresentem razões que justifiquem tratamento de algum modo análogo, considerou a jurisprudência dos nossos tribunais, então, apenas a título meramente exemplificativo, aqui referiremos as seguintes pronúncias:

- do Supremo Tribunal de Justiça, os Acórdãos: de 8 de fevereiro de 2024[10], no qual se fixou “a indemnização no montante de 25.000,00€ (cfr., em situações com alguma similitude, os acórdãos do STJ de 07-09-2017, proc. n.º 412/2000.L1.S1, de 01-03-2018, proc. n.º 606/13.8TTMTS.P1.S2, e de 14-07-2021, proc. n.º 19035/17.8T8PRT.P1.S1.”; de 28 de janeiro de 2016[11], em que se fez constar: “Reportando-nos ao caso dos autos, face à gravidade das condutas assumidas pela R., que se prolongaram por mais de dois anos, e atendendo às suas consequências na esfera jurídica do A., ao nível da sua saúde física e psicológica, sufragamos o Acórdão recorrido quanto à fixação da indemnização por danos não patrimoniais, no valor de € 20.000,00, montante que entendemos ser o adequado e equitativo”; no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de abril de 2016[12], foi fixado o valor da indemnização (por violação do dever de ocupação do trabalhador e o assédio por parte da entidade empregadora, durante pelo menos 6 anos consecutivos) em €50.000,00; no Acórdão de 14 de julho de 2021[13], foi fixado o valor de €20.000,00;

- deste Tribunal da Relação e Secção, para além de outros – assim o Acórdão, relatado também pelo aqui relator, de 29 de abril de 2019, em que se considerou ajustado o montante fixado em 1.ª instância de €40.000,00 –, o Acórdão de 3 de dezembro de 2020[14], constando do respetivo sumário: “I- Constitui violação do direito à ocupação efectiva a inactividade de trabalhador, sem qualquer tarefa atribuída, durante dois anos e seis meses. II - Tal inactividade, juridicamente inexplicável, é ilícita, justificando a fixação do valor de €35.000,00 a título de danos não patrimoniais”;

- do Tribunal da Relação de Lisboa, o Acórdão de 24 de julho de 2020[15], constando do respetivo sumário: “V– Mostra-se ajustada uma indemnização por danos não patrimoniais de €10.000,00 pela angústia causada a um trabalhador “emprateleirado” por dez meses”;

- do Tribunal da Relação de Guimarães, o Acórdão de 24 de outubro de 2019[16], constando do respetivo sumário: “II - É adequado o montante indemnizatório de € 30.000 por danos não patrimoniais causados pelo assédio consistente em manter o trabalhador inactivo, colocando-o durante largo período de tempo numa sala especificamente destinada a trabalhadores na mesma situação, por ter recusado a colocação definitiva em funções não correspondentes à sua categoria profissional, tendo ficado afectado por força da situação de “perturbação depressiva major” – ainda, o Acórdão de 14 de maio de 2015[17], a que aludem os Apelados na conclusão XXX, em que se fixou o valor da indemnização (por violação do dever de ocupação do trabalhador e o assédio por parte da entidade empregadora, durante pelo menos 6 anos consecutivos) em €100.000, mas que, importa esclarecê-lo, em recurso de revista, assim pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de abril de 2016 a que antes já aludimos[18], foi depois fixado em €50.000,00;

Na consideração de tudo o que antes referimos, incluindo as referidas pronúncias, tendo por necessária referência o que resultou no caso provado, reconhecendo-se, como antes o dissemos, a relevância dos danos aqui em apreciação, de resto integrados numa questão com evidente atualidade e que aliás tem merecido, bastando para o efeito relembrar as alterações legislativas que no seu âmbito têm ocorrido nas últimas décadas, especial preocupação e cuidados – o que bem se percebe, na medida em que, como aliás antes o dissemos, a profissionalidade se assume como valor inerente à realização da pessoa humana e à sua intrínseca dignidade, causando tais danos evidente abalo a quem deles sofre, incluindo na saúde –, entendemos, porém, numa visão do assédio enquanto processo continuado mais ou menos longo, devendo assim ser analisado no seu conjunto e sem segmentá-lo nos momentos que o integram – já que o real sentido e gravidade dos mesmos só pode ser apreendido com essa visão de conjunto[19] –, tendo ainda por referência outras pronúncias Jurisprudenciais e em particular quando incidiram sobre situações com alguma similitude com aquela que aqui está em causa, que o quantum indemnizatório, fixado em 1.ª instância, se nos apresenta, com salvaguarda do respeito devido por diverso entendimento, como excessivo, de resto quanto a ambos os Autores, sendo que, noutros termos, afigura-se-nos como mais adequado, com o necessário recurso à equidade – na consideração ainda que a factualidade provada justifica, no que ao Autor diz respeito, por se evidenciar uma situação de maior gravidade desde logo pelo maior período em que foi privado do normal exercício das suas funções, que o montante a arbitrar seja superior por comparação com a Autora –, fixar a indemnização, respetivamente, em €35.000,00, para a Autora e em €45.000,00 para o Autor.

Em face do exposto, procede parcialmente o recurso quanto à analisada questão, do que decorre a consequente alteração da sentença recorrida, assim o que se fez constar das alíneas a) e b) do seu dispositivo, em conformidade.

No que se refere a responsabilidade pelas custas, da ação e do presente recurso, as mesmas impendem sobre Autores e Ré na proporção de vencimento / decaimento (artigo 527.º do CPC).


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Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do CPC, segue-se o sumário do presente acórdão, da responsabilidade exclusiva do relator:

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IV – DECISÃO:

Acordam os juízes que integram a Secção Social do Tribunal da Relação do Porto, com alteração oficiosa do ponto 61.º da factualidade provada, em declarar improcedente o recurso na parte dirigida à impugnação da matéria de facto e parcialmente procedente no âmbito da aplicação do direito, com a alteração, no presente acórdão, mantendo-se essa no mais, da sentença recorrida no que se refere às condenações constantes das alíneas a) e b) do seu dispositivo, passando essas condenações a ser as seguintes:

a) Condena-se a Ré a pagar à Autora a quantia de €35.000, a título de indemnização pelos danos morais sofridos na sequência do assédio moral de que foi alvo;

b) Condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de €45.000,00, a título de indemnização pelos danos morais sofridos na sequência do assédio moral de que foi alvo;

Custas, da ação e do presente recurso, por Autores e Ré, na proporção de vencimento/decaimento.


Porto, 18 de março de 2024

(acórdão assinado digitalmente)

Nélson Fernandes
Rira Romeira
Teresa Sá Lopes
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[1] Lebre de Freitas, em “Introdução ao Processo Civil, 3.ª edição, p. 196
[2] Citando o mesmo Autor: “Compreende-se como este princípio se situa na linha lógica dos anteriores: é porque há imediação, oralidade e concentração que ao julgador cabe, depois da prova produzida, tirar as suas conclusões, em conformidade com as impressões recém colhidas e com a convicção que através delas se foi gerando no seu espírito, de acordo com as máximas da experiência que forem aplicáveis”
[3] cf. neste sentido o Ac. STJ de 24/09/2013, in www.dgsi.pt
[4] cf. Ac. STJ de 28 de Maio de 2009, in www.dgsi.pt
[5] processo 17592/19.3T8PRT.P1, acessível em www.dgsi.pt Relatora Desembargadora Paula Leal de Carvalho.
[6] Relembre-se designadamente que é proibido ao empregador obstar injustificadamente à prestação efetiva de trabalho, como decorre do disposto nos artºs 122º, al. b), do CT/2003, e 129º, nº 1, b), do CT/2009.
[7] Utilizando-se a mesma expressão do Acórdão desta Relação e Secção de 8 de Abril de 2013, disponível em www.dgsi.pt, do qual consta, na nota de rodapé 48, o apelo aos ensinamentos de Gomes Canotilho e Vital Moreira, quando “realçam o valor próprio e a dimensão normativa específicos da “dignidade da pessoa humana” e perspectivam-na, além do mais, como “um valor (bem) autónomo e específico que exige respeito e protecção” e que “pressupõe relações de reconhecimento intersubjectivo, pois a dignidade de cada pessoa deve ser compreendida e respeitada em termos de reciprocidade de uns com os outros”.
[8] acessível em www.dgsi.pt
[9] processo nº 1087/14.4T8CHV.G1.S1, também acessível em www.dgsi.pt
[10] Processo n.º 1868/21.2T8CTB.C1.S1, Conselheiro Ramalho Pinto, in www.dgsi.pt.
[11] Processo n.º 579/11.1TTCSC.L1.S1, Relatora Conselheira Ana Luísa Geraldes, in www.dgsi.pt.
[12] Relatora Conselheira Ana Luísa Geraldes, in www.dgsi.pt.
[13] Processo n.º 19035/17.8T8PRT.P1.S1, Relator Conselheiro Júlio Manuel Vieira Gomes, in www.dgsi.pt.
[14] Processo n.º 14236/18.4T8PRT.P1, Relator então Desembargador (e atualmente Conselheiro) Domingos Morais, in www.dgsi.pt.
[15] Processo n.º 1606/16.1T8BRR.L1-4, Relator Desembargador Leopoldo Soares, in www.dgsi.pt.
[16] Processo n.º 37/18.8T8VCT.G1, Relator Desembargador Antero Veiga, in www.dgsi.pt.
[17] Processo n.º 79/13.5TTVCT.G1, Relator Desembargador Moisés Silva, in www.dgsi.pt.
[18] Relatora Conselheira Ana Luísa Geraldes, in www.dgsi.pt.
[19] Como referido no Ac. STJ de 14 de julho de 2021, antes já identificado e mencionado.