Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1712/21.0T8VFX.L1-4
Relator: MANUELA FIALHO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
DISCRIMINAÇÃO
MONTANTE DA INDEMNIZAÇÃO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/24/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1. A enunciação de matéria assente, efetuada em sede de saneador, deve entender-se como meramente preparatória, não traduzindo qualquer decisão final acerca do acervo fático.
2. O ordenamento jurídico nacional veda a prática de tratamento desigual desprovida de justificação razoável e aceitável relativamente a condições de trabalho.
3. A indemnização pelos danos de natureza não patrimonial fundada em práticas discriminatórias deve ser eficaz, proporcional e dissuasiva, traduzindo, por um lado uma compensação e, por outro, uma punição ao comportamento ilícito.
4. É adequado o valor de 25.000,00€ para compensar o trabalhador que se sente destratado pela ré, injustiçado e humilhado no confronto com os seus colegas de trabalho e de equipa que se apercebem e comentam o facto de o mesmo não ter as mesmas condições e benefícios que eles.
(Sumário da autoria da Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Lisboa:

ZZ, S.A., Ré nos autos à margem referenciados, notificada que foi da sentença proferida e não se podendo conformar com a mesma, vem apresentar recurso de apelação.
Pede que a sentença seja declarada nula e, ainda, que seja a mesma revogada, devendo a Recorrente ser absolvida do pedido.
Formulou as seguintes conclusões:
1. Não se podendo conformar com a sentença proferida nos presentes autos, vem a Ré, Recorrente, apresentar as suas alegações de recuso, pelas quais se alega a nulidade da sentença em apreço, requerendo-se, ainda, a reapreciação da matéria de facto provada e não provada, concluindo-se, a final, pela absolvição da Recorrente.
2. A sentença em crise padece de nulidade, nos termos do disposto no artigo 615º, n.º 1, do Código de Processo Civil, por violação do disposto no artigo 609º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
3. Isto porque, o Autor, ora Recorrente, peticionou, entre outros, a condenação da Ré/Recorrente no ressarcimento pelos gastos feitos com a utilização de automóvel próprio nas deslocações de e para o local de trabalho, no montante de €4.800,00, contudo, o douto Tribunal a quo condenou a Recorrente a pagar ao Autor a quantia que, em sede de liquidação de execução de sentença, se venha apurar corresponder ao valor de subsídio de transporte devido desde Julho de 2018.
4. No caso em apreço, não se verifica o instituto excecional de condenação extra vel ultra petitum, porquanto não estamos perante preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, nem perante um caso em que o Autor renunciou ao referido direito.
5. Termos em que, deverá ser declarada a nulidade da sentença recorrida, o que aqui se invoca para os devidos e legais efeitos, nomeadamente para os efeitos previstos no artigo 617º do Código de Processo Civil.
6. A Recorrente não pode, de forma alguma, conformar-se, nem tampouco concordar, com a decisão do douto Tribunal a quo, quando conclui pela existência de prática discriminatória, porquanto, tal como se terá oportunidade de expor, entende a Recorrente que a matéria de facto, provada e não provada, terá, necessariamente, de ser alterada, de acordo com a prova produzida nos autos.
7. A Recorrente pugna pela reapreciação dos factos provados número 22, 33, 34, 37 e dos factos não provados número 7, 8, 9.
8. O facto provado n.º 22, contrariamente ao avançado pelo douto Tribunal a quo, não foi admitido por acordo das partes.
9. O facto provado n.º 22 corresponde ao artigo 61º da douta Petição Inicial, o qual foi expressamente impugnado pela Ré, ora Recorrente, pelo artigo 5º da contestação apresentada.
10. Pelo que, não poderia o douto Tribunal ter julgado, como julgou, provado o facto n.º 22, por acordo das partes, o que aqui se invoca para os devidos e legais efeitos.
11. O facto provado n.º 22 deverá ser alterado, conforme infra se exporá, por força dos depoimentos das testemunhas AA, prestado em sede de audiência de julgamento do dia 14.01.2022, entre as 12h03 e as 12h38 (disponível na plataforma Citius, “Sessões gravadas”), minuto 14:17 a 14:24, BB, prestado em sede de audiência de julgamento do dia 14.01.2022, entre as 10h58 e as 11h30 (disponível na plataforma Citius, “Sessões gravadas”), minutos 07:36 a 08:00, 11:24 a 11:38 e 12:15 a 12:18 e ainda da testemunha CC, prestado em sede de audiência de julgamento do dia 28.02.2022, entre as 09h44 e as 09h56 (disponível na plataforma Citius, “Sessões gravadas”), minutos 09:04 a 09:40 e 10:00 a 10:15.
12. Da prova produzida nos autos, mais concretamente da supra identificada, resulta que apenas uma das testemunhas confirma receber um subsídio de transporte, porquanto deixou de ter acesso aos transportes alternativos colocados à disposição pela Ré, testemunha esta que não tem a mesma categoria profissional que o aqui Autor.
13. Da prova produzida nos autos – seja ela testemunhal, seja documental – não é possível aferir em que circunstâncias é que a Ré/Recorrente atribui o referido subsídio de transporte aos seus trabalhadores, nem tampouco quais são os critérios para a sua atribuição, pelo que não se pode concluir que o mesmo é devido ao Autor.
14. Termos em que se requer a exclusão, do âmbito dos factos provados, do facto n.º 22 (“A trabalhadores que utilizam veículos próprios a ré paga um subsídio de transporte.”), passando este a constar da matéria de facto não provada.
15. Caso assim não se entenda, e apenas por mera cautela de patrocínio, desde já se requer, muito respeitosamente, a alteração do facto provado n.º 22, que deverá passar a ter a redação que ora se propõe:
Facto provado n.º 22: Com base em critérios não concretamente apurados, a Ré atribui, a alguns dos seus trabalhadores, um subsídio de transporte, quando estes utilizem veículos próprios.
16. O facto provado n.º 33, contrariamente ao avançado pelo douto Tribunal a quo, não foi admitido por acordo das partes.
17. O facto provado n.º 33 corresponde ao artigo 46º da douta Petição Inicial, o que foi especificamente impugnado pela Ré no artigo 5º da sua contestação.
18. Razão pela qual, não poderia o douto Tribunal ter julgado, como julgou, provado o facto n.º 33, por acordo das partes, o que aqui se invoca para os devidos e legais efeitos.
19. O facto provado n.º 33 deverá ser alterado, conforme infra se exporá, por força do depoimento da testemunha DD, prestado em sede de audiência de julgamento do dia 28.02.2022, entre as 10h54 e as 11h26 (disponível na plataforma Citius, “Sessões gravadas”), minuto 05:50 a 06:24.
20. Do depoimento da testemunha identificada resulta que, no início de 2020, a realização de exames médicos esteve suspensa, devido à pandemia Covid-19.
21. Resultou, igualmente, do depoimento da testemunha que a única altura em que o Autor/Recorrido não foi submetido a exames médicos foi na altura da sua reintegração (2018) – circunstância que nem sequer foi pelo Autor alegada e, por isso, não poderá ser julgada, o que aqui se alega para os devidos e legais efeitos – , o que apenas se deveu a uma falha da Empresa.
22. Razão pela qual, pugna a Recorrente pela exclusão, do âmbito da factualidade provada, do facto n.º 33 (“O autor foi o único dos trabalhadores da ré que no início de 2020 não foi convocado para exames médicos de rotina.”), passando a constar, consequentemente, da matéria de facto não provada.
23. Caso assim não se entenda, o que apenas por mera hipótese se equaciona, desde já se requer, muito respeitosamente, a alteração do facto provado n.º
33, que deverá passar a ter a seguinte redação:
Facto provado n.º 33: Os trabalhadores da Ré não foram convocados para exames médicos de rotina, no início de 2020.
24. Segundo o douto Tribunal, o facto n.º 34 foi admitido por acordo das partes, o que não corresponde à verdade.
25. Efetivamente, o facto provado n.º 34 corresponde aos artigos 48º a 51º da Petição Inicial, os quais foram especificamente impugnados pela Ré, ora
Recorrente, conforme resulta do artigo 5º da Contestação.
26. Pelo que, não poderia o douto Tribunal ter julgado, como julgou, provado o facto n.º 34, por acordo das partes, o que aqui se invoca para os devidos e legais efeitos.
27. O facto provado n.º 34 deveria ser reapreciado, conforme se indicará, com base no depoimento da testemunha DD, prestado em sede de audiência de julgamento do dia 28.02.2022, entre as 10h54 e as 11h26 (disponível na plataforma Citius, “Sessões gravadas”), minuto 06:25 a 06:57.
28. Do depoimento identificado, resulta claro que foi atribuído seguro de saúde ao Autor, já no ano de 2021.
29. Tal facto resulta igualmente demonstrado pelo documento n.º 2, junto com a Contestação da aqui Ré/Recorrente, consiste no recibo de vencimento do Autor, correspondente ao mês de Janeiro de 2021, do qual consta uma rúbrica denominada “C. Seg. Saúde 20% Emp.”, com desconto de €5.89 e, ainda, pelos recibos de vencimento do Autor juntos aos autos, correspondentes aos meses de Dezembro de 2020 e Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto, Setembro, Outubro e Novembro, todos de 2021, consta igualmente uma rúbrica denominada “C. Seg. Saúde 20% Emp.”, com desconto de €5.89 – vide documentos juntos em audiência, a 14.01.2022, referência Citius n.º 151222018.
30. Termos em que, face à prova testemunhal e documental identificada, pugna a Recorrente pela alteração do facto provado n.º 34, que deverá passar a ter a seguinte redação:
Facto provado n.º 34: Por solicitação do Autor, a Ré atribui-lhe seguro de saúde.
31. O facto provado n.º 37 resultou provado com base nos depoimentos dos colegas de trabalho do Autor, os quais, por sua vez, são baseados em afirmações que o Autor proferiu, constituindo, assim, depoimentos indiretos.
32. O Autor não prestou declarações de parte, não tendo contribuído, minimamente, para o apuramento dos alegados danos morais por si sofridos.
33. Da prova produzida nos autos não resulta demonstrado que o trabalhador andava cabisbaixo, abatido, desanimado ou triste no local de trabalho – não resultou provado que o Autor manifestava quaisquer sentimentos negativos, que se refletissem na sua postura.
34. Motivo pelo qual, requer a Recorrente a exclusão do facto provado n.º 37 da matéria de facto provada e, consequentemente, deverá passar a constar da matéria de facto não provada, com a mesma redação.
35. Os factos não provados n.º 7 e 8 deverão ser reapreciados com base nos depoimentos das testemunhas EE, prestado em sede de audiência de julgamento do dia 14.01.2022, entre as 10h13 e as 10h58 (disponível na plataforma Citius, “Sessões gravadas”), minutos 15:16 a 16:00, 16:29 a 17:18 e 28:22 a 30:26, e FF, prestado em sede de audiência de julgamento do dia 28.02.2022, entre as 10h21 e as 10h54 (disponível na plataforma Citius, “Sessões gravadas”), minuto 02:54 a 03:40.
36. No entendimento da Recorrente, não poderia o douto Tribunal valer-se de declarações como “a dita verba era uma forma de aumentarem o valor que lhes era pago” e “quando passou a receber isenção de horário de trabalho tal sucedeu como forma de lhe aumentarem o ordenado”, proferidas por trabalhadores, para concluir que os valores liquidados pela Entidade Empregadora não correspondiam, na verdade, a retribuição por isenção de horário.
37. Dos depoimentos identificados, conclui-se que o exercício das funções levadas a cabo pela equipa do Autor/Recorrido não se esgota no horário estabelecido, sendo necessário estender tais horários.
38. Resulta igualmente demonstrado que a ultrapassagem desse limite de horário é compensada por retribuição por isenção de horário de trabalho.
39. Pelo que, pugna a Recorrente pela exclusão dos factos não provados n.º 7 e 8 da matéria de facto não provada e, consequentemente, deverão passar a constar da matéria de facto provada, com a mesma redação.
40. No entendimento da Recorrente, o facto não provado n.º 9 deverá ser reapreciado com base nos depoimentos das testemunhas FF, prestado em sede de audiência de julgamento do dia 28.02.2022, entre as 10h21 e as 10h54 (disponível na plataforma Citius, “Sessões gravadas”), minutos 06:30 a 06:53 e 15:51 a 17:16, e DD, prestado em sede de audiência de julgamento do dia 28.02.2022, entre as 10h54 e as 11h26 (disponível na plataforma Citius, “Sessões gravadas”), minuto 04:53 a 05:13.
41. Dos depoimentos em apreço, resulta demonstrado que o Autor não demonstra disponibilidade para prestar trabalho fora dos seus horários, bem como se recusa, reiterada e categoricamente, a prestar o seu trabalho fora dos horários que lhe estão adstritos.
42. Não resultando da prova produzida nos autos que o Autor demonstrou essa disponibilidade, ou que vez alguma permaneceu no local de trabalho, a exercer as suas funções, para lá do seu horário de trabalho.
43. Razão pela qual, se requer a exclusão do facto não provado n.º 9 da matéria de facto não provada e, consequentemente, deverá passar a constar da matéria de facto provada, com a mesma redação.
44. Conforme resulta da sentença, entendeu o Tribunal a quo existir comportamentos discriminatórios relativamente à atribuição de isenção de horário, medicina do trabalho, atribuição de seguro de saúde e transportes.
45. Relativamente ao indício “atribuição de isenção de horário”, diga-se, primeiramente, que em momento algum é referido pela lei que as condições de isenção de horário de trabalho apenas se apliquem quando as mesmas tenham um “carácter regular” ou que sejam prestadas “de forma sistemática”, como refere o douto Tribunal.
46. Ademais, resulta da prova produzida nos autos que o trabalho executado pelos colegas de equipa do Autor encontra-se sujeito a múltiplas variações e alterações de horários e de organização, obrigando, igualmente, a que os trabalhadores extrapolem os seus horários de trabalho.
47. Todos os colegas de equipa do Autor demonstram disponibilidade para extrapolar os seus horários de trabalho, assegurando o trabalho fora do seu horário de trabalho, sempre que tal lhes é solicitado, razão pela qual lhes é atribuída uma remuneração por isenção de horário de trabalho.
48. O Autor não demonstra tal disponibilidade, nunca tendo assegurado a realização das suas tarefas para lá do seu horário de trabalho.
49. O Autor recusa, reiteradamente, prestar trabalho fora do seu horário de trabalho.
50. Termos em que, é possível concluir que, ainda que as tarefas por este executadas pudessem conferir-lhe condições de isenção de horário de trabalho, facto é que o mesmo recusa-se a cumprir tais condições – no caso, trabalhar além do horário estipulado – e, por esse motivo, não lhe pode ser conferida a retribuição por isenção de horário de trabalho.
51. Pelo que, entende a Recorrente não existir qualquer prática discriminatória quanto a este aspeto e, consequentemente, não poderá ser condenada a “pagar ao autor a quantia de (…) a título de prestação mensal correspondente 25,00% da remuneração base, (…) a “pagar ao autor uma prestação mensal correspondente 25,00% da remuneração base (liquidada sob a denominação de isenção de horário de trabalho) (…)”, a “pagar ao autor as diferenças de valor de subsídio de férias, por não inclusão da referida prestação correspondente a 25,00% da remuneração base, (…).”, nem a “pagar ao autor os mesmos 25,00% da remuneração base em cada momento devida em cada subsídio de férias que tenha sido liquidado posteriormente a Maio de 2021”, o que aqui se requer para os devidos e legais efeitos.
52. Sem prescindir, refira-se que as prestações a título de isenção de horário são liquidadas em sede de subsídio de férias, nem resulta provado nos autos que a Ré liquida tais quantias nessa sede, pelo que, ainda que se conclua pela condenação da Ré no pagamento de 25% da remuneração base, sempre se dirá que tal condenação não poderá recair no pagamento do subsídio de férias, o que aqui se requer para os devidos e legais efeitos.
53. Em face da alteração de facto, tal como pugnada no presente recurso, resulta provado que a Ré apenas não assegurou a realização de consultas de medicina do trabalho ao Autor – como também não o fez para os seus colegas – por razões relacionadas com a pandemia de Covid-19, pelo que não se pode considerar, quanto a esta matéria, estarmos perante um comportamento discriminatório, o que aqui se alega para os devidos e legais efeitos.
54. Da factualidade provada, tal como explanada no presente recurso, mostra-se, flagrantemente, provado que a Ré atribuiu ao Autor seguro de saúde, pelo que não se poderá concluir pela existência de prática discriminatória, o que aqui se alega para os devidos e legais efeitos.
55. A Ré/Recorrente apenas não confere ao Autor meios alternativos de transporte porquanto estes têm horários incompatíveis com os horários requeridos pelo Autor.
56. Sendo que, conforme se expôs em sede de reapreciação da matéria de facto, não resultou provado em que termos é que a Ré atribui subsídio de transporte aos seus trabalhadores, não resultando, assim, demonstrado que o Autor teria direito ao mesmo.
57. Pelo que, sendo julgada procedente a alteração da matéria de facto, tal como foi requerida, não se poderá concluir pela existência de prática discriminatória, nomeadamente porquanto não é possível concluir que a Ré atribui subsídio de transporte a trabalhadores em situação comparável à do Autor, o que aqui se alega para os devidos e legais efeitos.
58. Em face de tudo quanto se expôs, requer-se, muito respeitosamente, a v/ Exas. se dignem a julgar procedente o presente recurso e, consequentemente, seja determinada a alteração da matéria de facto provada e não provada, tal como indicado pela Recorrente.
59. Em face da alteração da matéria de facto, deverá, consequentemente, o douto Tribunal julgar procedente o presente recurso e, nessa medida, absolver a Ré, ora Recorrente, de todos os pedidos contra si formulados, porquanto não resulta demonstrado qualquer comportamento discriminatório por parte da Ré Entidade Empregadora.
GG, A. nos autos supra referenciados, notificado do recurso de apelação da sentença, vem responder à alegação da Recorrente e, não se conformando com a sentença na parte em que julgou improcedente a ação, vem interpor recurso subordinado.
Pugna ali pela improcedência e pede aqui a alteração, em conformidade, da sentença recorrida e condenação da Ré a pagar ao Autor as importâncias peticionadas a título de diferenças de remuneração base e prestações denominadas subsídio de refeição, vencidas e vincendas, acrescidas de juros de mora, também vencidos e vincendos até integral pagamento, bem como no pagamento da quantia de 37.500,00€ para ressarcimento dos danos não patrimoniais, com as legais consequências.
No recurso apresentou as seguintes conclusões:
1. O Autor interpõe recurso da parte da douta sentença na parte em que não foram acolhidos alguns dos pedidos formulados na ação, a saber: a prestação denominada cartão de refeição, aumento da remuneração base e o montante da quantia atribuída a título de reparação dos danos não patrimoniais.
2. O facto não provado n.º 2 (cartão de refeição) refere “Todos os trabalhadores da Ré...” e, na verdade, com esta formulação o facto estaria condenado a não ser provado por não corresponder à verdade.
3. A formulação deveria ter sido: "Todos os trabalhadores efetivos da Ré recebem o dito cartão", em consonância com o alegado no artigo 27º da petição inicial.
4. Como resulta do facto provado n.º 30, “O cartão de refeição foi instituído pela Ré em 2012 em virtude da incidência fiscal sobre o subsídio de alimentação…”
5. Dos depoimentos da testemunha HH, acima transcrito e da testemunha DD, referidos na douta sentença, ficou claro que sempre existiu refeitório/cantina na Ré onde os trabalhadores podem tomar as suas refeições sem qualquer pagamento, pelo que terá de entender-se que se trata de uma contrapartida remuneratória, paga desta forma por ser fiscalmente mais favorável.
6. E, como muito bem explicou a testemunha HH essa contrapartida era dada a chefias e não chefias.
7. Embora a Ré tenha deixado de o conceder aos trabalhadores com contrato a termo com uma ou outra exceção, o certo é que, quanto aos efetivos, só o Autor é excluído do seu recebimento.
8. A verdade é que a Ré não demonstrou que tenha ao seu serviço qualquer trabalhar efetivo que não receba esta prestação paga sob a denominação de subsídio de refeição. E competia-lhe fazê-lo porque só assim poderia demonstrar que o Autor não estava a ser objeto de discriminação.
9. Termos em que deve ser dado como provado o supra referido facto n.º 2 com a redação:
Todos os trabalhadores efetivos da Ré recebem uma prestação denominada cartão de refeição.
10. A fixação da matéria de facto, quanto a questão (aumentos salariais), foi inquinada por um erro na data em que ocorreu o aumento de retribuições: a Mma. Juíza considerou a data de Março de 2021 quando deveria ter tido em consideração a data de Março de 2019 e, sendo assim, procedeu em erro à apreciação e valoração da prova quer documental (com especial relevo os recibos de remunerações) quer testemunhal.
11. Deve, pois, ser corrigida a redação dos factos não provados n.ºs 3 e 4, no que respeita às datas neles constantes, ou seja, onde é dito "132021" deve dizer-se (facto não provado 3) e onde é dito "a partir de março de 2021" deve dizer-se "a partir de março de 2019" (facto 4).
12. Os diversos recibos de vencimento referentes a trabalhadores que integram ou integraram a equipa do Autor, foram apresentados pela Ré na sequência dos requerimentos dos Autor e insistências do Tribunal e encontram-se nos autos com a referência citius 151837821.
13. E nos recibos juntos pela Ré que incluem os meses de Fevereiro e Março de 2019, verifica-se que todos os trabalhadores foram aumentados 40,00 euros no seu vencimento mensal, em Março de 2019.
14. Não pode deixar de ser levado em conta que os 11 trabalhadores relativamente aos quais foram somente apresentados recibos de anos posteriores a 2019, todos eles beneficiaram também do aumento anteriormente feito e todos auferiam um vencimento mensal de 840,00€ distribuídos da mesma forma que os demais colegas que se encontravam ao serviço em Março de 2019.
15. A Ré, ao invés de colaborar no esclarecimento destas questões como se impunha e era seu ónus, não o fez. E não o fez apesar de o Tribunal "a quo" a ter designadamente notificado para "juntar aos autos o expediente elaborado para apresentação à Administração com vista à atribuição de tais aumentos e cópia da decisão da Administração, ou não, de aumentos salariais em Março de 2019" (Ata de audiência de Julgamento, ponto 3 do despacho, de 28 de Fevereiro de 2022 referência Citius 151808052 acima referenciada).
16. Tudo parece conjugar-se para que os factos não provados n.ºs 3 e 4 sejam dados como provados, com a correção das datas neles constantes, o que se requer.
17. Caso assim não se entenda, então, face à prova documental e testemunhal e todos os demais elementos constantes nos autos, parece não haver qualquer dúvida que todos os trabalhadores da equipa onde o Autor está integrado, que se encontravam ao serviço em Março de 2019, foram aumentados 40,00€, com a única exceção do Autor e os que foram admitidos posteriormente também beneficiaram desse aumento, pelo que se impõe que sejam aditados à matéria de facto provada 2 pontos contemplando essas duas situações.
18. Sendo dado como provado, como se espera, que a Ré paga a todos os seus trabalhadores efetivos uma prestação denominada cartão de refeição e não a paga ao Autor, terá de concluir-se que, também neste caso, a prática da Ré ao tratar o Autor de forma diferente sem qualquer critério objetivo que tal justifique – não pode deixar de ser tida por discriminatória.
19. E, dando-se como provado o aumento em 40,00€ das remunerações mensais de, pelo menos, todos os trabalhadores da equipa em que se integra o Autor, é também certo que deveria ter sido atendido na sentença o correspetivo pedido de diferenças salariais.
20. Sublinhe-se que, neste particular, tudo indica que a decisão da M.ma Juíza a quo seria outro caso não tivesse incorrido no lapso que acima ficou assinalado, relativo à data em que aquele aumento mensal se tornou efetivo.
21. Verifica-se também aqui um procedimento discriminatório da Ré em relação ao Autor, que não beneficiou desse aumento sem qualquer motivo atendível e dele ficou privado devido à conduta ilícita da Ré, pelo que deve proceder pedido por si formulado a tal título.
22. O Autor pediu, para ressarcimento dos danos não patrimoniais, a quantia de 37.500,00€.
A douta sentença recorrida reconheceu que estão "verificados, no caso concreto, os pressupostos de indemnização por danos não patrimoniais".
23. E, na verdade, provada a conduta ilícita da Ré, violadora do princípio da igualdade constitucionalmente estabelecido, bem como violadora da pluralidade de preceitos da lei ordinária que proíbem ao empregador praticar discriminações no trabalho, e provada a matéria do artigo 37º. da matéria de facto, o Autor sustenta que deveria ter sido julgado procedente, em toda a linha, o pedido de indemnização por danos não patrimoniais formulado na petição.
24. Desde logo, há uma circunstância de enquadramento subjacente ao comportamento discriminatório da Ré que justifica da parte da ordem jurídica a necessidade de sólida e exemplar repressão: a Ré praticou a sequência de atos discriminatórios ora em causa depois de ter sido condenada na reintegração do Autor, por sentença transitada em julgado.
25. Tratando-se duma empresa integrada num grupo de referência no mundo empresarial do audiovisual, (Media Capital), desde logo deve concluir-se que a indemnização deve ter um conteúdo simultaneamente compensatório dos danos sofridos e suficientemente punitivo da condenável conduta da Ré, pese embora sejam pouco significativos para um orçamento como o da Ré os montantes em apreço.
26. E, depois, a intensidade dos danos morais sofridos pelo Autor é evidente e resulta da própria natureza da conduta ilícita da Ré: um assédio pertinaz, duradouro no tempo, expresso em múltiplas facetas de tratamento laboral deste.
27. Mas, se dúvidas houvesse quanto às inevitáveis consequências destas práticas patronais na pessoa dos trabalhadores que delas hajam sido vítimas, tais dúvidas teriam de ter-se como dissipadas em face do que se consignou na sentença sob o artigo 37.º dos factos provados.
28. No plano social, deve ter-se em consideração a necessidade de prevenção, devendo a Justiça ser um dos instrumentos disso mesmo: os agentes empresariais em vestes patronais têm de interiorizar a enorme gravidade, a inadmissibilidade, destes comportamentos.
29. Ao decidir como decidiu, violou a M.ma Juíza a quo, designadamente o disposto nos artigos 24.º, 25.º e 29.º do Código do Trabalho, bem como o que se mostra estatuído pelos artigos 483.º e 496.º, ambos do Código Civil.
ZZ, S.A., Ré nos autos à margem referenciados, notificada que foi das alegações de recurso subordinado apresentado pelo Autor, vem apresentar as suas CONTRA ALEGAÇÕES debatendo-se pela respetiva improcedência.
O Tribunal recorrido refutou a existência de alguma nulidade da sentença.
O MINISTÉRIO PÚBLICO emitiu parecer no qual conclui pela confirmação integral da sentença.
Respondeu a Apelante sustentando a sua posição apresentada na apelação.
***
Apresentamos, de seguida, um breve resumo dos autos para melhor compreensão da discussão:
GG intentou a presente ação declarativa emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, demandando ZZ, S.A..
Em síntese alega que trabalha sob as ordens direção e fiscalização da ré desde GG tendo esta, em 2016 e por considerar que a relação não configurava um contrato de trabalho, colocado termo a tal prestação. O autor impugnou judicialmente essa decisão na sequência do que veio a ser reconhecida a existência de um contrato de trabalho e a ré condenada a reintegrá-lo, o que sucedeu em 2018. Sucede que, desde então e não obstante ter executado a sua prestação com zelo e dedicação, a ré não concede ao autor as mesmas condições de execução dos seus demais colegas que realizam iguais tarefas, não lhe atribuindo cartão de refeição, não lhe reconhecendo o pagamento de isenção de horário de trabalho, não aumentou o seu vencimento nos mesmos termos e montantes dos seus demais colegas como acordado com o sindicato, proíbe-o de conduzir veículos, sendo o único trabalhador com carta de condução que está sujeito a tal determinação, não convoca o autor para exames médicos de rotina, nem lhe faculta seguro de saúde como aos demais, tal como não lhe faculta transporte para o trabalho ou subsídio de transporte e nunca lhe facultou formação profissional. Esta desigualdade de tratamento, comentada entre os seus colegas, é motivo de frustração e humilhação para autor, configurando um comportamento ilícito, pelo que deve ser ressarcido a título de danos não patrimoniais, bem no pagamento dos valores dos quais tem sido privado e dos gastos efetuados com deslocações.
Formula pedido de condenação da ré a “tratar o A. em igualdade de condições, relativamente aos seus colegas de trabalho, abstendo-se de quaisquer comportamentos discriminatórios em relação ao A., e condenando-se a R. a pagar a este a (…) importância de 54.760,64€, acrescida das prestações que se venham a vencer após 31.5.2021, bem como os juros de mora vencidos e vincendos, com todas as legais consequências.”.
Frustrada a conciliação em sede de audiência de partes veio a ré contestar, concluindo pela improcedência da ação.
Refere ter procedido à reintegração do autor, mas as funções por este desempenhadas não são as que alega, não possuem a especificidade que invoca e não são desempenhadas com a qualidade que o autor alega, como as avaliações de desempenho evidenciam. Não atribui cartão de refeição a todos os seus trabalhadores, não sendo exato que pague isenção de horário de trabalho a todos os seus trabalhadores, sendo certo que o autor tem um horário específico, atribuído em função de necessidades pessoais do mesmo, recusando-se a cumprir funções para além do seu horário de trabalho normal.
Não existe qualquer discriminação desde logo por o autor não desempenhar as mesmas funções e no mesmo tempo de trabalho que os demais colegas, não podendo ser salarialmente equiparado a estes e não sendo exato o valor de remuneração que o mesmo alega auferir.
Procedeu-se à realização de audiência de julgamento vindo a ser proferida sentença que decide julgar a presente ação parcialmente procedente e em consequência:
A) Condenar a ré a tratar o autor em condições de igualdade com os seus demais colegas com a categoria profissional de Técnico Especializado, designadamente, atribuindo-lhe prestação pecuniária mensal correspondente a 25,00% do valor da remuneração base (liquidada sob a denominação de isenção de horário de trabalho), facultar-lhe acesso a serviços de medicina do trabalho nos termos legais, atribuir-lhe seguro de saúde e subsídio de transporte.
B) Condenar a ré a pagar ao autor a quantia de 5.421,25€ (cinco mil, quatrocentos e vinte e um euros e vinte e cinco cêntimos) a título de prestação mensal correspondente 25,00% da remuneração base, sendo a mesma de 150,00€ (cento e cinquenta euros) de Julho de 2018 a Dezembro de 2019, de 157,50€ (cento e cinquenta e sete euros e cinquenta cêntimos) de Janeiro a Dezembro de 2020 e de 166,25€ (cento e sessenta e seis euros e vinte e cinco cêntimos) de Janeiro a Maio de 2021.
C) Condenar a ré a pagar ao autor uma prestação mensal correspondente 25,00% da remuneração base (liquidada sob a denominação de isenção de horário de trabalho) paga nos meses subsequentes a Maio de 2021.
D) Condenar a ré a pagar ao autor as diferenças de valor de subsídio de férias, por não inclusão da referida prestação correspondente a 25,00% da remuneração base, no montante de 473,75€ (quatrocentos e setenta e três euros e setenta e cinco cêntimos), sendo 150,00€ (cento e cinquenta euros) no subsídio de férias de 2018, 150,00€ (cento e cinquenta euros) no subsídio de férias de 2019, 157,50€ (cento e cinquenta e sete euros e cinquenta cêntimos) no subsídio de férias de 2020 e 166,25€ (cento e sessenta e seis euros e vinte e cinco cêntimos) no subsídio de férias de 2021.
E) Condenar a ré a pagar ao autor os mesmos 25,00% da remuneração base em cada momento devida em cada subsídio de férias que tenha sido liquidado posteriormente a Maio de 2021.
F) Condenar a ré a pagar ao autor os juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à taxa anual de 4,00% contabilizados sobre cada montante mensal e sobre cada subsídio de férias (referidos em B a E) e desde a data de vencimento de cada prestação, sempre até efetivo e integral pagamento.
G) Condenar a ré a pagar ao autor a quantia que, em sede de liquidação de execução de sentença, se venha apurar corresponder ao valor de subsídio de transporte devido desde Julho de 2018, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à taxa anual de 4,00% contabilizados desde 11-6-2021 relativamente aos vencidos até esta data e, após sobre cada montante mensal devido e desde a data de vencimento de cada prestação, sempre até efetivo e integral pagamento.
H) Condenar a ré a pagar ao autor a quantia de 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros) a título de reparação por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa anual de 4,00% contabilizados desde 18-9-2023 e até efetivo e integral pagamento.
I) Julgar quanto ao mais peticionado a ação improcedente por não provada, nessa parte absolvendo a ré.
J) Condenar autor e ré nas custas da ação na proporção de, respetivamente, 1/3 e 2/3.
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As conclusões delimitam o objeto do recurso, o que decorre do que vem disposto nos Art.º 608º/2 e 635º/4 do CPC. Apenas se exceciona desta regra a apreciação das questões que sejam de conhecimento oficioso.
Nestes termos, considerando a natureza jurídica da matéria visada, são as seguintes as questões a decidir, extraídas das conclusões:
A. No recurso independente:
1ª – A sentença é nula?
2ª – O Tribunal errou no julgamento da matéria de facto?
3ª – Não existe qualquer prática discriminatória?
4ª – A condenação relativa à isenção de horário de trabalho não poderá recair sobre o subsídio de férias?
B. No recurso subordinado:
1ª – O Tribunal errou no julgamento da matéria de facto?
2ª – Existe procedimento discriminatório por força do não pagamento do cartão refeição e na ausência de aumento salarial?
3ª – A indemnização por danos não patrimoniais deve ser concedida na totalidade?
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FUNDAMENTAÇÃO:
A 1ª questão que cumpre abordar prende-se com a nulidade da sentença.
Tal nulidade assenta em excesso de pronúncia decorrente da circunstância de, o Autor, ter peticionando, entre outros, a condenação da Ré/Recorrente no ressarcimento pelos gastos feitos com a utilização de automóvel próprio nas deslocações de e para o local de trabalho, no montante de €4.800,00, e o Tribunal a quo ter condenado a Recorrente a pagar-lhe a quantia que, em sede de liquidação de execução de sentença, se venha apurar corresponder ao valor de subsídio de transporte devido desde Julho de 2018.
Compulsada a petição inicial verificamos que, no concernente a esta matéria, o A. reclamou a quantia de 4.800,00€ assim discriminada:
D) Ressarcimento pelos gastos feitos com a utilização de automóvel próprio nas deslocações de e para o local de trabalho
- de 1.7.2018 a 31.5.2021
150,00€ x 32 meses 4.800,00€.
Na sentença recorrida ponderou-se:
Na reparação deste dano o autor considera um valor de custo de deslocação mensal e peticiona a condenação da ré no pagamento do mesmo.
Sem prejuízo de não estar demonstrado o montante do custo mensal suportado pelo autor, entende-se que a reparação deste dano – reconstituição da “situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação” (art.º 562º do Código Civil) – deve ter lugar através de atribuição das mesmas condições que são facultadas aos demais trabalhadores e não através do pagamento dos custos que o mesmo suportou.
Considerando as três modalidades de apoio à deslocação que a ré faculta aos seus trabalhadores – utilização de autocarros com horário fixo ou carrinhas que servem localidades especificas, atribuição de veículos e atribuição de subsidio de transporte para quem utilize veículo próprio – a reparação deve ter lugar através da atribuição de um subsídio de transporte1, atribuição esta de acordo com as regras de cálculo aplicadas para os demais trabalhadores.

Quanto à determinação do montante deste, bem como do montante em dívida desde Julho 2018, os autos não fornecem elementos que permitam a sua quantificação desde logo por desconhecimento do critério ou fórmula de cálculo do dito subsídio que a ré aplica aos demais trabalhadores.
A quantificação da reparação, neste particular, terá de ser relegada para posterior execução de sentença nos termos do art.º 609º nº 2 do Código de Processo Civil.
E, neste pressuposto, fez-se constar do segmento G) do decisório a condenação nos seguintes termos:
G) Condenar a ré a pagar ao autor a quantia que, em sede de liquidação de execução de sentença, se venha apuar corresponder ao valor de subsídio de transporte devido desde Julho de 2018, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à taxa anual de 4,00% contabilizados desde 11-6-2021 relativamente aos vencidos até esta data e, após sobre cada montante mensal devido e desde a data de vencimento de cada prestação, sempre até efetivo e integral pagamento.
Não vemos que exista aqui algum excesso da parte do Tribunal recorrido.
Concede-se, contudo, no esclarecimento de que a condenação se deve conter nos limites do pedido.
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Passamos a enfrentar o erro de julgamento da matéria de facto, erro este suscitado em ambos os recursos e relativamente ao qual o Ministério Público no seu parecer salientou o exaustivo e acertado elenco de factos dados como provados e não provados, acompanhados de judiciosa, crítica, cabal, sistémica e bem fundamentada explicação sobre o sentido da decisão.
Pretende a R. que estão incorretamente julgados os pontos de facto provados número 22, 33, 34, 37 e de facto não provados número 7, 8, 9.
Por sua vez o A. insurge-se contra a resposta de não provado aos pontos 2, 3 e 4.
Centremo-nos na impugnação apresentada pela Apelante.
Discorda a mesma que um conjunto de factos cuja prova se teve como obtida através de admissão por acordo possam ter-se como provados com tal fundamento.
Consta da sentença que “os factos dados como provados sob 1 a 8, 12 a 14, 16, 18 a 22, 26 a 28 e 32 a 35 não foram especificamente impugnados, mostrando-se consensuais desde a fase dos articulados.”
Defende, porém, a Apelante que o facto provado n.º 22, contrariamente ao avançado pelo douto Tribunal a quo, não foi admitido por acordo das partes. Tal facto corresponde ao artigo 61º da Petição Inicial, o qual foi expressamente impugnado pela Ré, ora Recorrente, pelo artigo 5º da contestação apresentada.
Respondeu o Apelado que a Ré mais não fez que uma impugnação vaga e genérica, sem observância do disposto no artigo 574.º nº 1 do Código de Processo Civil, pelo que tal facto se deve ter como admitido por acordo, como decorre do n.º 2 do mesmo artigo.
É o seguinte o teor do ponto 22:
- 22. A trabalhadores que utilizam veículos próprios a ré paga um subsídio de transporte.
Vista a contestação, consta do mencionado Art.º 5º que se impugna especificadamente a matéria factual contida nos artigos 1.º, 9.º a 25.º e 27.º a 92.º da petição inicial que ora se contesta, por ser falsa, inexata, incorreta ou não lhe poder ser atribuído o alcance pretendido pelo Autor. Por sua vez alegou-se no Art.º 61º da PI que outros (trabalhadores) há que utilizam veículos seus e a quem a R. paga um subsídio de transporte.
Não se pode, pois, dizer que esta factualidade esteja admitida por acordo.
A R. definiu, ab initio a sua posição quanto ao concreto ponto de facto, pelo que não há como fundamentar a admissão por acordo no disposto no nº 2 do Art.º 574º do CPC que pressupõe falta de impugnação.
Ocorre, porém, que se decidiu no saneador o seguinte:
A questão a decidir é de facto e de direito não habilitando os autos que se conheça desde já do objeto do litígio.
Com efeito da leitura dos articulados e da posição das partes perante os factos alegados, sua admissão e/ou não impugnação nos termos do art.º 574º do Código de Processo Civil, verifica-se que apenas existe acordo quanto à seguinte factualidade relevante para a decisão da causa:

N. A trabalhadores que utilizam veículos próprios a ré paga um subsídio de transporte.”
Sobre esta decisão não incidiu, conforme alegado pelo Apelado, qualquer reparo.
Dispõe o Art.º 595º/3 do CPC que no caso previsto na alínea a) do nº 1 – conhecimento de exceções dilatórias ou nulidades processuais – o despacho constitui, logo que transite, caso julgado formal quanto às questões concretamente apreciadas e, na hipótese prevista na alínea b) – conhecimento do mérito – fica tendo, para todos os efeitos, o valor de sentença.
Ora, na parte reproduzida, o despacho não traduz qualquer uma destas realidades, sendo meramente indicativo.
Trata-se de “um despacho preparatório, sem caráter intrinsecamente definitivo – donde a ausência de caso julgado formal – podendo ser modificado e acabando por ser integrado na sentença final” (Rui Pinto, Notas ao Código de Processo Civil, Coimbra Editora, 377). Na verdade, na atual configuração processual civil, este não é um despacho sobre matéria de facto. A fixação fática efetua-se apenas e tão só na sentença, conforme decorre do disposto no Art.º 607º/3 do CPC.
Assim, não colhe o argumento segundo o qual a R. não fez qualquer observação à inclusão da matéria no elenco dos factos provados no saneador, porquanto não só não está prevista qualquer consequência para a falta de reclamação à enunciação dos temas da prova, como a própria natureza preparatória do despacho não permite afirmar que foi proferida uma decisão transitada.
Aliás, entende-se mesmo que “o juiz não deve fixar factos assentes”, porque, ao contrário da anterior especificação, “o despacho de delimitação do objeto do litígio não é um despacho sobre matéria de facto” (Ob. cit., 374).
A fixação efetuada nos autos2, deve, pois, entender-se como meramente preparatória, não traduzindo qualquer decisão final acerca do acervo fático.
Propõe a Apelante que o facto provado n.º 22 seja alterado, por força dos depoimentos das testemunhas AA, BB, e CC.
Reconhece o Apelado que a matéria foi objeto de discussão no âmbito do tema probatório 6.
Reapreciados os depoimentos testemunhais apresentados, apenas uma das testemunhas – BB - confirma receber um subsídio de transporte, porquanto deixou de ter acesso aos transportes alternativos colocados à disposição pela Ré. Contudo, e contrariamente ao que esta quer fazer crer a testemunha referiu ainda que os trabalhadores que usavam “aquela carrinha que o senhor usou e ficaram sem carrinha a empresa pagou a ajuda de custo”.
Donde, nenhum reparo merece a resposta em causa, devendo manter-se o ponto 22 do acervo fático provado.
Insurge-se também a Apelante contra o ponto 33, por o mesmo não ter sido admitido por acordo.
Refere que tal facto corresponde ao artigo 46º da douta Petição Inicial, o que foi especificamente impugnado pela Ré no artigo 5º da sua contestação.
O ponto 33 tem a seguinte redação:
33. O autor foi o único dos trabalhadores da ré que no início de 2020 não foi convocado para exames médicos de rotina.
Reiteramos aqui tudo o supra explicitado no concernente quer à não admissão por acordo, quer à inclusão da matéria no saneador (no caso na alínea S).
Propõe a Apelante que tal facto seja alterado por força do depoimento da testemunha DD, depoimento no qual também o Apelado se centra para sustentar o contrário.
Ora, reapreciado este depoimento, resulta do mesmo a assunção pela testemunha – que é chefe do departamento de recurso humanos – que “foi uma falha nossa o GG não fazer exames em 2020”. Não deram indicação para isso. Reconheceu também que em 2018 e em 2019 o A. não fez exames. Explicou que, com exceção do período em que não funcionaram em 2020 ou 2019 houve exames de medicina do trabalho para os quais ele não foi chamado, pelo que se ele não se queixasse não haveria exames.
Em presença deste depoimento, claro e explícito, não se vê razão para modificar a decisão recorrida, pelo que improcede, nesta parte, a reapreciação.
De igual modo o ponto 34 foi alvo de impugnação pela Apelante, sendo os respetivos fundamentos essencialmente os mesmos – desta vez, no que toca à admissão por acordo a circunstância de a matéria corresponder ao que se invocava nos Art.º 48º a 51, impugnada no já referido Art.º 5º da contestação.
O ponto 34 diz o seguinte:
34. A ré, não obstante solicitação do autor e ao contrário do que sucede com os outros trabalhadores que o solicitaram, não atribuiu ao autor seguro de saúde.
No que se reporta aos fundamentos contrapostos pelo Apelado, a argumentação é idêntica à que acima já expusemos.
Aplicam-se nesta matéria exatamente os mesmos considerandos acima expostos (agora também por referência à alínea T do dito saneador).
Pretende a Apelante a reapreciação deste ponto de facto, invocando ainda o depoimento da testemunha DD por dele resultar claro que foi atribuído seguro de saúde ao Autor, já no ano de 2021. Facto que, segundo alega, resulta igualmente demonstrado pelo documento n.º 2, junto com a Contestação - recibo de vencimento do Autor, correspondente ao mês de Janeiro de 2021, do qual consta uma rúbrica denominada “C. Seg. Saúde 20% Emp.”, com desconto de €5.89- e, ainda, pelos recibos de vencimento do Autor juntos aos autos, correspondentes aos meses de Dezembro de 2020 e Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto, Setembro, Outubro e Novembro, todos de 2021, consta igualmente uma rúbrica denominada “C. Seg. Saúde 20% Emp.”, com desconto de €5.89 – vide documentos juntos em audiência, a 14.01.2022, referência Citius n.º 151222018.
Por sua vez o Apelado, ancorando-se no mesmo depoimento, defende o bem fundado do julgamento efetuado porquanto a testemunha diz no seu depoimento que, sendo o Autor um trabalhador do quadro, tinha direito ao seguro de saúde e, só por lapso dos serviços, não lhe foi atribuído. Assim, o seu depoimento não põe em causa a matéria do facto n.º 34 e, pelo contrário, reforça-a por ser um depoimento que corrobora sem qualquer margem de dúvidas que a Ré não atribuiu o seguro de vida ao Autor, quando o faz a todos os demais trabalhadores efetivos. Acrescenta ainda que alegou na sua petição inicial que em Dezembro de 2020 falou com o superior hierárquico sobre a sua intenção de recorrer ao Tribunal se a Ré não alterasse a sua atitude de discriminação e perseguição em relação a si. Acrescentou que, no mês de GG seguinte, lhe foi comunicado pelo mesmo superior que iria ter seguro de saúde. Mas a verdade é que, apesar de o seu “recibo de vencimentos” de Janeiro de 2021, junto aos autos, conter uma rubrica de seguro de saúde, o Autor alegou que não recebeu da Ré qualquer cartão ou documento que lhe permitisse aceder ao seguro e que os seus pedidos de esclarecimento junto dos recursos humanos não tinham obtido resultados até à data da propositura da ação.
Vejamos!
Diz a testemunha que foi um lapso o A. não ter seguro de saúde, lapso que “se não me engano” foi corrigido no ano passado”. Diz ainda que o seguro existe na empresa desde 2004 e à pergunta da Sr.ª Juíza sobre o tal lapso, refere “pode ter acontecido”.
Por outro lado, é certo que dos recibos de vencimento do Autor juntos aos autos, correspondentes aos meses de Dezembro de 2020 e Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto, Setembro, Outubro e Novembro, todos de 2021, consta igualmente uma rúbrica denominada “C. Seg. Saúde 20% Emp.”, com desconto de €5.89.
Ora, como se vê o depoimento da testemunha não é minimamente credível acerca do dito lapso. E, da circunstância de dos mencionados documentos constarem as referências referidas, não se pode extrair a inclusão do A. no seguro. Na verdade, a própria diretora de recursos humanos não dá certezas acerca da respetiva inclusão e teria sido muito fácil juntar documentação emanada da Seguradora, comprovativa da inclusão.
Não merece, pois, qualquer reparo, a decisão recorrida, também nesta parte improcedendo a impugnação.
Prossegue a impugnação, agora por referência ao facto 37, cujo conteúdo é o seguinte:
37. O autor sente-se destratado pela ré, injustiçado e humilhado no confronto com os seus colegas de trabalho e de equipa que se apercebem e comentam o facto de o mesmo não ter as mesmas condições e benefícios que eles.
Afirma a Apelante que esta matéria resultou provada com base nos depoimentos dos colegas de trabalho do Autor, os quais, por sua vez, são baseados em afirmações que o Autor proferiu, constituindo, assim, depoimentos indiretos. Mais afirma que da prova produzida nos autos não resulta demonstrado que o trabalhador andava cabisbaixo, abatido, desanimado ou triste no local de trabalho – não resultou provado que o Autor manifestava quaisquer sentimentos negativos, que se refletissem na sua postura.
Sobre tais fundamentos apenas se nos oferece dizer que nada impede que de depoimentos indiretos se extraiam as devidas ilações probatórias e, por outro lado, que a matéria que integra o ponto 37 não pressupõe os estados acima referidos.
Assim, sem dependência de invocação de alguma prova que contrarie a matéria integrante daquele ponto de facto, improcede, nesta parte, a apelação.
Em causa estão ainda os factos não provados n.º 7 e 8 que, segundo a Apelante deverão ser reapreciados com base nos depoimentos das testemunhas EE e FF.
Pretende uma resposta de provado.
É o seguinte o teor da factualidade em referência:
7. Os trabalhadores da equipa de autor iniciam e terminam, com grande frequência, as suas tarefas antes e depois dos seus horários de trabalho.
8. O que determinou a ré a atribuir, aos mesmos, isenção de horário de trabalho.
Esclareceu-se na sentença, a este propósito, que “A referência feita pela testemunha DD a uma flexibilidade de horário dos trabalhadores que cumprem o horário 08h00/17h00, ou a um horário variável que faz a testemunha FF, como justificação para atribuição de isenção de horário de trabalho não se mostra minimamente convincente.
Desde logo não foi feita qualquer demonstração que os trabalhadores com tal horário tenham de, com a frequência pretendida, mas não especificada quantitativamente, por estas testemunhas, de iniciar a sua prestação laboral antes das 08h00 ou que tenham de a terminar depois das 17h00.
Aliás é consensual que a ré tem uma equipa a fazer o denominado turno da noite.
Depois, sobretudo, os depoimentos prestados pelas demais testemunhas colega de equipa, não corroboram minimamente a versão daquelas duas testemunhas.
A testemunha II refere que a dita verba era uma forma de aumentarem o valor que lhes era pago. No mesmo sentido depôs a testemunha HH – que trabalhou na ré até Junho de 2021 e com as funções de responsável operacional de adereços – a qual expressamente referiu que quando passou a receber isenção de horário de trabalho tal sucedeu como forma de lhe aumentarem o ordenado, decompondo o valor acordado em duas verbas (remuneração base mais isenção de horário de trabalho). Mais referiu que tal sucedeu com todos os elementos da equipa com a qual trabalhava e que depois de atribuído nunca mais lhes foi retirado, não estando sujeito a qualquer condição específica de execução do contrato.
A única limitação pessoal de horário de trabalho do autor que resulta da prova produzida é reportada à hora de entrada – a tal que determinou a ré a colocá-lo num horário com entrada às 09h00 – e não quanto à hora de saída.

Em face de tais depoimentos e na ausência de outras provas, não se logra relacionar a atribuição de isenção de horário de trabalho a uma qualquer disponibilidade diária dos trabalhadores da equipa que o autor integrava, sendo que, como referido, a única indisponibilidade deste apurada se reporta à hora de início da prestação diária.”
Centremo-nos, então, na invocada prova a reapreciar – depoimentos de EE e FF!
Disse o primeiro que a isenção era para pagar “o horário que a gente ficava um pouco mais”. Porém, mais adiante, afirma que quando saía, entrava a equipa da noite para continuar o trabalho, tendo ocorrido “uma vez que eu saí às 11h da noite…”. Já a segunda, veio afirmar que as pessoas que têm horário mais flexível têm isenção de horário.
Estes depoimentos não invertem, por si mesmos, a resposta dada pelo Tribunal recorrido. O primeiro por não se apresentar credível, na medida em que aponta uma única vez em que saiu mais tarde. Acresce o que se disse na sentença, e contrapõe o Apelado, “A afirmação que todos os colegas da equipa que o autor integra recebem uma prestação mensal denominada de isenção de horário de trabalho ….resulta do teor dos recibos que o autor juntou com a sua petição inicial e daqueles outros que a ré juntou e constam da referência citius 151837821”. “Em todos, em absolutamente todos, consta a atribuição aos Técnicos Especializados de uma rubrica por isenção de horário de trabalho e em medida correspondente a 25% do valor da remuneração base neles identificada.” “Aliás, em todos os recibos, consta que o valor da remuneração mensal é o que resulta da soma da remuneração base com a isenção de horário”.
Improcede, assim, a apelação nesta parte.
Por fim, o facto não provado n.º 9 cuja reapreciação é pedida com base nos depoimentos das testemunhas FF e DD.
É o seguinte o teor de tal ponto de facto:
9. O autor recusa trabalhar depois de terminado o seu horário.
Afirma a Apelante que dos depoimentos em apreço, resulta demonstrado que o Autor não demonstra disponibilidade para prestar trabalho fora dos seus horários, bem como se recusa, reiterada e categoricamente, a prestar o seu trabalho fora dos horários que lhe estão adstritos.
Responde o Apelado que os depoimentos das testemunhas transcritos na alegação da Ré não versam sobre esta matéria, mas sim sobre outra realidade distinta que é o trabalho em fins-de-semana e feriados, que aqui não está em causa.
Vistos tais depoimentos confirma-se a resposta do Apelado. Razão pela qual está votada ao insucesso a modificação propugnada.
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Deter-nos-emos seguidamente sobre o recurso subordinado apresentado pelo A.
Pretende o mesmo que estão incorretamente julgados os pontos de facto não provados nº 2 e 3 e 4.
O ponto nº 2 tem a seguinte redação:
2. Todos os trabalhadores da Ré recebem uma prestação denominada cartão de refeição.
Atentemos ainda na fundamentação exarada na sentença a este propósito:
Quanto à atribuição de um cartão de refeição, data em que tal ocorreu, motivação subjacente e facto de nem todos os trabalhadores, designadamente da equipa do autor, terem tal benefício o tribunal considerou os documentos nº 4 e 5 da petição inicial e os recibos de remuneração juntos aos autos.
Destes juntos na referência citius 151837821, resulta que o mesmo apenas se mostra atribuído aos trabalhadores JJ, KK, LL e AA, trabalhadores que a testemunha FF identificou como chefes de turno ou equipa, qualidade que a testemunha AA assumiu.
Os demais trabalhadores constantes do conjunto de recibos juntos têm aposta nos mesmos, uma menção a “Subsídio Refeição Cantina”, a qual não consta dos recibos daqueles outros.
A testemunha DD esclareceu que na ré sempre existiu um refeitório, ao qual os trabalhadores acedem, pelo que o subsídio de refeição, enquanto expressão pecuniária e/ou vantagem equivalente, apenas foi atribuído a algumas funções e dentro de determinados departamentos, não sendo uma prática generalizada na ré.
Daí que se tenha considerado não provado que todos os trabalhadores da ré recebem uma prestação denominada de cartão de refeição.
Alega o Apelante que no artigo 27.º da sua petição inicial diz que, sem prejuízo do direito à refeição, a Ré concede aos seus trabalhadores efetivos – denominados na gíria da empresa por trabalhadores do “quadro” - e, também, a alguns dos trabalhadores a prazo uma prestação chamada de “cartão de refeição”. O certo é que o facto não provado n.º 2 refere “Todos os trabalhadores da Ré...” e, na verdade, com esta formulação o facto estaria condenado a não ser provado por não corresponder à verdade. A formulação deveria dizer "Todos os trabalhadores efetivos da Ré recebem o dito cartão.
Responde a Apelada que estamos em presença de factualidade nova e que resulta cabalmente demonstrado que o cartão de refeição é apenas atribuído a quatro trabalhadores da equipa do Recrte., todos alocados a funções de chefia.
Comecemos pela petição inicial!
27º
Sem prejuízo do direito à refeição referido no artigo anterior, a R. concede a todos os trabalhadores efetivos - denominados na gíria da empresa por trabalhadores “do quadro” - e, também, a alguns dos trabalhadores a prazo, uma prestação chamada de “cartão de refeição”.
É sobre tal matéria que pode incidir a resposta (de provado ou não provado) do Tribunal, dado o princípio do dispositivo consignado no Art.º 5º do CPC.
Ora, tem razão o Apelante quando clama pela desconformidade fática entre o alegado e a resposta do Tribunal.
Vejamos, então, se todos os trabalhadores efetivos da R. recebem o cartão!
Para o efeito alega o Apelante que foram juntos com a petição inicial os documentos com os n.ºs 4 e 5 da autoria do Departamento de Recursos Humanos da Ré, que não foram impugnados. Tais documentos explicam que, nesse ano, alterações legislativas oneraram em termos de impostos (IRS e contribuições para a Segurança Social) o subsídio de refeição até então pago em dinheiro, razão pela qual a Ré decidiu pagar a prestação em causa através de um cartão denominado na empresa por “cartão refeição”. Para esse cartão a Ré passou a transferir o valor do subsídio de refeição, permitindo aos trabalhadores beneficiários adquirir bens nas lojas de produtos alimentares.
Isto confirma-se e consta do ponto 30 do acervo fático.
Aduz também o Apelante que requereu insistentemente – requerimentos que o Tribunal deferiu- que a Ré informasse qual era a natureza dos vínculos contratuais que a ligavam aos trabalhadores que integravam a equipa do Autor, mas tal pretensão nunca foi satisfeita. Porém, na equipa do Autor apenas há 3 efetivos: ele próprio, em virtude da decisão judicial, o AA e o FF, estes dois últimos com funções de chefia.
Consignou-se no ponto 31 do acervo provado que na equipa do autor apenas quatro trabalhadores, os chefes de equipa e os chefes de turno, beneficiam de cartão refeição.
Indica o Apelante o depoimento de HH, do qual decorre que não obstante ter direito a comer lá sem custos (na empresa), tinha subsídio de refeição ou cartão de refeição. Tal cartão era pago às chefias e não chefias, sendo ela uma das pessoas que não sendo chefia teve direito ao cartão.
Não resulta, porém, da prova apresentada, que quanto aos efetivos, só o Autor é excluído do recebimento do cartão refeição. Ora, recordemo-lo, o que se impunha provar era que a R. concede a todos os trabalhadores efetivos uma prestação chamada de “cartão de refeição”. Donde, a impugnação falece.
Tem, pois, razão a Recrdª quando afirma que o Recorrente não alegou qualquer meio de prova suscetível de fazer reverter a decisão proferida pelo Tribunal a quo quanto a esta matéria.
Não obstante, retifica-se a resposta constante do mencionado ponto fático nos seguintes termos:
-Não provado que a R. concede a todos os trabalhadores efetivos e, também, a alguns dos trabalhadores a prazo, uma prestação chamada de “cartão de refeição”.
Atentemos agora nos pontos 3 e 4 (não provado):
3. Em 1/3/2021 a ré e outras empresas do Grupo Económico acordaram num aumento de 40,00€ para todos os trabalhadores com remuneração mensal inferior a 1.000,00€.
4. a ré, a partir de Março de 2021, aumentou em 40,00€ mensais todos os trabalhadores com remuneração inferior a 1.000,00€.
Pretende o Apelante que a Mma. Juíza considerou a data de Março de 2021 quando deveria ter tido em consideração a data de Março de 2019 e à luz desta última data proceder à apreciação e valoração da prova, quer documental (recibos), quer testemunhal. Afirma que tal erro decorreu de errada alegação na PI, que, porém, foi corrigida por requerimento que foi deferido, conforme emerge da Ata de 28/02/2022.
Compulsados os autos verificamos que em 29/12/2021 foi deferido requerimento apresentado pelo A. para que a R. juntasse “recibos de remuneração do A. dos meses de Março de 2020 até ao presente (…) cópias dos recibos de remuneração de todos os colegas da equipa do A., relativos aos seguintes meses: Julho e Agosto de 2018, GG, Fevereiro e Março dos anos de 2019, 2020 e 2021, e indicar o tipo de contrato que os vincula à R., nomeadamente, se têm contrato de trabalho a termo incerto ou certo”.
Com data de entrada de 24/01/2022 consta o requerimento a pedir a retificação do lapso constante do Art.º 39º da PI.
Seguiu-se uma sessão de julgamento e, sem que houvesse despacho explícito acerca daquele requerimento, consignou-se ali um despacho em que, entre outros, se decidiu:
“3 – Determinar a notificação da Ré para juntar aos autos o expediente elaborado para apresentação à Administração com vista à atribuição de tais aumentos e cópia da decisão da Administração que conduziu à atribuição, ou não, de aumentos salariais em Março de 2019;”
Consideramos, pois, tacitamente deferido o requerimento retificativo.
O que nos permite avançar na reapreciação tendo por referência o ano 2019.
No concernente a provas apresentadas, as mesmas são documentais. Assim:
Diz o Apelante que os diversos recibos de vencimento referentes a trabalhadores que integram ou integraram a equipa do Autor, foram apresentados pela Ré na sequência dos requerimentos do Autor e insistências do Tribunal e encontram-se nos autos com a referência citius 151837821. Desses recibos de remunerações verifica-se o seguinte:
- Foram juntos recibos de 1 trabalhador (EE) que não inclui o recibo do mês de Março de 2019 porque o seu contrato de trabalho cessou em Fevereiro desse mesmo ano;
- Foram juntos recibos de 11 trabalhadores mas apenas de anos posteriores a 2019, provavelmente por terem sido admitidos mais tarde.
- Foram juntos recibos de 13 trabalhadores que incluem os meses de Fevereiro e Março de 2019.
Ou seja, nos recibos juntos pela Ré que incluem os meses de Fevereiro e Março de 2019, verifica-se que todos foram aumentados 40,00 euros no seu vencimento mensal em Março de 2019. E, com exceção do AA, todos auferiam em Fevereiro de 2019 um "vencimento mensal" de 800,00€ e, no mês de Março seguinte, passaram a auferir 840,00€. Esse aumento distribui-se entre as duas rubricas "vencimento base" e "isenção de horário". No caso do AA, que também foi aumentado 40€, passou do vencimento mensal de 900,00€ para 940,00€, aumento que se distribui também pelas duas rubricas "vencimento base" e "isenção de horário". Não pode deixar de ser levado em conta que os 11 trabalhadores relativamente aos quais foram somente apresentados recibos de anos posteriores a 2019, todos eles beneficiaram também do aumento anteriormente feito e todos auferiam um vencimento mensal de 840,00€ distribuídos da mesma forma que os demais colegas que se encontravam ao serviço em Março de 2019.
Para além desta alegação, o recurso faz referências à fundamentação da sentença sem que, contudo, indique quaisquer passagens de depoimentos.
A Recrdª contrapõe que a prova é insuficiente, indicando passagens de depoimentos testemunhais.
Ora, aqui chegados, cumpre que nos recentremos na impugnação que, lembremo-lo, incide sobre a resposta de não provado constante dos pontos 3 e 4. Poderá a mesma ser invertida?
A resposta é negativa porquanto, tal como alegado pelo Apelante os documentos juntos apenas revelam que 13 trabalhadores foram aumentados em Março de 2019 o que é substancialmente distinto da factualidade relativa àqueles pontos de facto, ainda que com referência ao ano 2019.
Improcede, nesta parte, o recurso subordinado.
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OS FACTOS:
Estão provados os seguintes factos:
1. A ré é uma empresa produtora de audiovisual, pertencente ao “Grupo Media Capital” que se dedica à atividade de produção de vídeo e filme e à organização de espetáculos.
2. O autor foi contratado pela ré em princípio de Novembro de 2015 para desempenhar funções de montagem e colocação de adereços nos estúdios de gravação desta.
3. Em finais de Agosto de 2016 a ré colocou termo à relação que havia estabelecido com o autor.
4. Este intentou ação judicial impugnando tal decisão, a qual correu termos no Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira – J2, sob o nº 2705/17.8T8VFX, que veio a transitar em julgado, e na qual foi, para além do mais, reconhecida a existência de um contrato de trabalho e condenada a ré a reintegrar o autor no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade.
5. Em Julho de 2018 o autor foi reintegrado pela ré.
6. O autor integra a equipa de trabalho denominada Equipa de Montagem e Adereços.
7. O autor e os seus colegas de equipa têm atribuída a categoria profissional de Técnico Especializado.
8. O autor e os seus colegas de equipa desempenham funções de montagem e desmontagem de adereços e cenários nos estúdios e locais de gravação em que decorrem as filmagens, em momentos anteriores e posteriores à realização das gravações.
9. Também dão assistência durante as gravações procedendo a ajustamentos, acertos e mudanças de painéis amovíveis sempre que necessário.
10. Após a reintegração o autor foi elogiado pela sua chefia.
11. Em 2021 o autor foi designado para proceder, juntamente com outros colegas, à inventariação de todo o material do armazém.
12. As instalações da ré, onde o autor e seus colegas trabalham, situam-se na Quinta dos Melos, em Bucelas e em local não servido por transportes públicos.
13. A equipa que o autor integra possuiu cerca de 21 elementos, distribuídos por 2 turnos: 15 pessoas no turno de dia e, as restantes, no turno da noite.
14. O autor integra o turno de dia.
15. Anteriormente à sua reintegração o autor cumpria um horário igual ao dos demais colegas da sua equipa (dia) das 8h00 às 17h00.
16. Desde Julho de 2018 o autor cumpre o seguinte horário: das 9h00 às 18h00 de segunda a sexta-feira, com um intervalo para a refeição do almoço.
17. Horário que foi estabelecido para permitir ao autor conciliar a necessidade de levar a filha à escola.
18. A ré estabeleceu um sistema de transporte, com autocarros, para os seus trabalhadores se deslocarem para o local de trabalho: um autocarro sai do Cais do Sodré, em Lisboa, pelas 7h40 com paragem às 8h00 no Campo Grande e, no fim do dia, com partida às 17h40 das instalações da ré, efetua o percurso inverso.
19. O sector de montagem e desmontagem de cenários dispõe de 3 carrinhas que vão buscar e levar as pessoas da equipa do autor que residem na zona de Alverca, Póvoa de Santa Iria e Bucelas.
20. Para zonas não cobertas por esse transporte, a ré tem sistemas alternativos de transporte.
21. Noutros casos a ré distribuiu veículos automóveis da empresa a trabalhadores que os utilizam no seu transporte e eventualmente no transporte de mais algum colega.
22. A trabalhadores que utilizam veículos próprios a ré paga um subsídio de transporte.
23. O autor não utiliza o serviço de transporte para o local de trabalho, não tem viatura atribuída para tal e não recebe qualquer prestação pecuniária com referência a custos de deslocação para as instalações da ré.
24. Deslocando-se para e do local de trabalho em viatura própria a partir ou com destino à sua residência em Póvoa de Santa Iria.
25. Em Abril de 2021 teve de alugar um veículo durante vinte dias por 112,67€.
26. O autor auferiu os seguintes valores de remuneração mensal: 600,00€ desde a reintegração, 635,00€ desde 1-1-2020 e 665,00€ desde 1-1-2021.
27. Para além da remuneração, o autor beneficia, tal como todos os trabalhadores e colaboradores da ré e das empresas do grupo, da refeição do almoço no refeitório da ré.
28. O autor não aufere qualquer prestação denominada de isenção de horário de trabalho (correspondente a 25% da remuneração base), não lhe foi atribuído em 1-3-2021 qualquer aumento de 40,00€ mensais, não tem cartão de refeição (6,41€/dia).
29. Todos os trabalhadores da equipa que o autor integra recebem uma prestação mensal denominada de isenção de horário de trabalho correspondente a 25,00% do valor da remuneração base.
30. O cartão de refeição foi instituído pela ré em 2012 em virtude da incidência fiscal sobre o subsídio de alimentação, correspondendo a um valor diário de 6,41€.
31. Na equipa do autor apenas quatro trabalhadores, os chefes de equipa e os chefes de turno, beneficiam de cartão refeição.
32. O autor é, desde a sua reintegração, o único trabalhador com carta de condução que a ré não coloca a exercer a condução de veículos automóveis.
33. O autor foi o único dos trabalhadores da ré que no início de 2020 não foi convocado para exames médicos de rotina.
34. A ré, não obstante solicitação do autor e ao contrário do que sucede com os outros trabalhadores que o solicitaram, não atribuiu ao autor seguro de saúde.
35. A ré não prestou qualquer formação profissional ao autor.
36. O autor queixou-se junto da sua chefia por considerar que é tratado de forma distinta dos seus colegas de equipa aos quais era atribuído seguro de saúde.
37. O autor sente-se destratado pela ré, injustiçado e humilhado no confronto com os seus colegas de trabalho e de equipa que se apercebem e comentam o facto de o mesmo não ter as mesmas condições e benefícios que eles.
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O DIREITO:
Centrar-nos-emos de seguida na apelação apresentada pela R., abordando, nesta sede, a 3ª questão que ali elencámos – a inexistência de prática discriminatória.
Emerge das conclusões 44 e seguintes que a Apelante assenta esta questão na propugnada, mas inalcançada, modificação fática.
Tanto basta para que fiquem prejudicados quaisquer considerandos suplementares.
Não deixaremos, contudo, e cautelarmente, de fazer o enquadramento da situação à luz do direito.
Na verdade, tal como dito na apelação, resulta da sentença que existem comportamentos discriminatórios relativamente à atribuição de isenção de horário, medicina do trabalho, atribuição de seguro de saúde e transportes.
Sobre o tratamento diferenciado dispensado ao A. nestes conspectos ponderou-se na sentença, para além do enquadramento legal, que “Perante um tal quadro fáctico e sendo o autor único da equipa que não aufere a dita prestação mensal correspondente a 25,00% da remuneração base, não colhendo minimamente a argumentação da diferença de horário (de apenas uma hora) ou de necessidade de disponibilidade permanente, não se pode deixar de afirmar a prática de um conduta da ré que, por ausência de um critério objetivo que a sustente, não pode deixar de ser considerada discriminatória ao tratar, no plano remuneratório, o autor de forma distinta daquela que trata os demais trabalhadores que exercem as mesmas funções.” E, mais adiante, que “A realidade de facto alegada pelo autor mostra-se provada sendo o autor o único dos trabalhadores da ré que, designadamente no início de 2020, não foi convocado para tais exames, ou seja, o único em relação ao qual a ré não assegurou a sua obrigação de promoção e vigilância da saúde, isto sem que tenha sequer sido invocada justificação para que tal não sucedesse na altura indicada.” “O comportamento da ré constitui uma prática discriminatória – prática esta que inclusive constitui ilícito contraordenacional – colocando o autor, em relação aos demais colegas e na medida em que privado de tal serviço, numa situação de desvantagem no acesso à saúde e segurança no trabalho.” No respeitante ao seguro de saúde, consignou-se ali que “A realidade de facto alegada pelo autor mostra-se provada, pelo que também quanto a este comportamento da ré importa afirmar verificação de prática discriminatória ao privá-lo da vantagem em que objetivamente se materializa a atribuição de um seguro de saúde.” Prossegue a sentença ponderando que “não se vislumbra fundamento de facto ou critério objetivo que justifique ao autor não seja ou atribuída viatura ou compensação de deslocação através de prestação pecuniária. A situação de facto apurada configura uma prática discriminatória perante o autor, colocando-o em objetiva desvantagem em relação aos demais membros da sua equipa, que não pode deixar de ser afirmada.
Afirma a Apelante que em momento algum é referido pela lei que as condições de isenção de horário de trabalho apenas se apliquem quando as mesmas tenham um “carácter regular” ou que sejam prestadas “de forma sistemática”, como refere o Tribunal. Porém, conforme a mesma bem entendeu3, não está em causa atribuir isenção de horário de trabalho, mas sim que os valores liquidados pela Ré/Recorrente a título de isenção de horário configuram remuneração do trabalho prestado, tendo-se considerado existir prática discriminatória na não atribuição de tais verbas ao Autor.
Diz a Recrte. que é possível concluir que, ainda que as tarefas executadas pelo A. pudessem conferir-lhe condições de isenção de horário de trabalho, facto é que o mesmo recusa-se a cumprir tais condições – no caso, trabalhar além do horário estipulado – e, por esse motivo, não lhe pode ser conferida a retribuição por isenção de horário de trabalho.
Como se viu esta argumentação não tem sustentação fática, ficando por explicar a razão de o A. ser o único da equipa a não ter o benefício do complemento salarial denominado isenção de horário.
No concernente à não realização de consultas de medicina do trabalho ao Autor ficou por provar a argumentação sustentada na conclusão 53, o mesmo ocorrendo relativamente à atribuição do seguro de saúde (conclusão 54), matéria não sustentada na prova. De igual modo, a não concessão de meios alternativos de transporte a que se reporta a conclusão 55 não ficou justificada.
Atentando no acervo fático verificamos que em finais de Agosto de 2016 a ré colocou termo à relação que havia estabelecido com o autor no ano anterior. E, na sequência de ação judicial, foi reconhecida a existência de um contrato de trabalho e condenada a ré a reintegrar o autor no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade. Em Julho de 2018 o autor foi reintegrado pela ré, integrando a equipa de trabalho denominada Equipa de Montagem e Adereços. O autor e os seus colegas de equipa – 21 elementos- têm atribuída a categoria profissional de Técnico Especializado. Contudo, ao A. vem sendo dispensado distinto tratamento nos aspetos supra mencionados e sem que se percecione alguma justificação para o efeito.
Como é sabido, quer a Constituição da República Portuguesa, quer mais especialmente na matéria que ora nos ocupa o Código do Trabalho, protegem a igualdade de tratamento relativamente às condições de trabalho. Ali na estatuição ínsita no Art.º 13º, aqui no âmbito das disposições gerais sobre igualdade e não discriminação.
Tal proteção resulta especialmente consagrada no Art.º 24º/1 do CT que dispõe que o trabalhador ou candidato a emprego tem direito a igualdade de oportunidades e de tratamento no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção ou carreira profissionais e às condições de trabalho, não podendo ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão, nomeadamente, de ascendência, idade, sexo, orientação sexual, identidade de género, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical, devendo o Estado promover a igualdade de acesso a tais direitos.
O TC vem decidindo que “a Constituição não proíbe todo e qualquer tratamento diferenciado. Proíbe, isso sim, as discriminações negativas atentatórias da (igual) dignidade da pessoa humana e as diferenças de tratamento sem uma qualquer razão justificativa e, como tal, arbitrárias. Nesse sentido, afirmou-se no Acórdão n.º 39/88:
'A igualdade não é, porém, igualitarismo. É, antes, igualdade proporcional. Exige que se tratem por igual as situações substancialmente iguais e que, a situações substancialmente desiguais, se dê tratamento desigual, mas proporcionado: a justiça, como princípio objetivo, "reconduz-se, na sua essência, a uma ideia de igualdade, no sentido de proporcionalidade" - acentua Rui de Alarcão (Introdução ao Estudo do Direito, Coimbra, lições policopiadas de 1972, p. 29).
O princípio da igualdade não proíbe, pois, que a lei estabeleça distinções. Proíbe, isso sim, o arbítrio; ou seja: proíbe as diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer justificação razoável, segundo critérios de valor objetivo, constitucionalmente relevantes. Proíbe também que se tratem por igual situações essencialmente desiguais. E proíbe ainda a discriminação, ou seja, as diferenciações de tratamento fundadas em categorias meramente subjetivas, como são as indicadas, exemplificativamente, no n.º 2 do artigo 13.º.
Na Doutrina, Maria do Rosário Palma Ramalho, salienta que o dever de não discriminação que impende sobre o empregador limita a sua liberdade negocial, decorrendo quer da própria CRP, quer dos princípios comunitários em matéria de igualdade, princípios esses desenvolvidos pela jurisprudência e múltiplas diretivas europeias e, internamente, por um conjunto de diplomas legais publicados desde há largos anos, encontrando expressão no Código do Trabalho. E, se por um lado, a lei delimita o conceito de discriminação através da enunciação de um conjunto de fatores discriminatórios (Art.º 24º/1), também procede a uma delimitação negativa do conceito de discriminação (Art.º 25º/2). Adverte que “deverá ter-se sempre em conta que o princípio da igualdade corresponde a um direito fundamental, pelo que as restrições que lhe sejam impostas devem ser reduzidas ao mínimo”, justificando-se “uma interpretação restritiva desta norma e dos critérios que estabelece para a delimitação negativa do conceito de discriminação” (Tratado de Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 7ª Ed., Almedina, 176 e ss.).
Conforme bem enunciado na sentença, e acima já explicitado, do princípio da igualdade - princípio constitucional informador de toda a ordem jurídica e impondo, no plano das relações privadas, a proibição de discriminação - resulta a proibição do arbítrio, da discriminação e a obrigação de diferenciação. “Da proibição de arbítrio resulta a inadmissibilidade de tratamentos diferenciados sem justificação razoável e fundada em critérios objetivos. Da proibição de discriminação resulta a inadmissibilidade de tratamento diferenciado fundado ou determinado por aspetos subjetivos, designadamente os mencionados no nº 2 do preceito.
A obrigação de diferenciação, particularmente dirigida ao poder público, pressupõe a eliminação ou atenuação de situações desiguais de natureza social, económica e cultural.”
Decorre de quanto se dispõe no Art.º 25º/1 que o empregador não pode praticar qualquer discriminação, direta ou indireta, em razão nomeadamente dos fatores referidos no nº 1 do Art.º 24º.
Cumprirá lembrar, como também dito na sentença, que “ao trabalhador caberá alegar e provar o comportamento indesejado face a outro ou outros trabalhadores e a verificação de fator de discriminação típico. Ao empregador caberá demonstrar que o comportamento não é assediante, que não teve qualquer propósito de afetação psicológica ou que não há atuação dirigida a um fim ilícito ou reprovável.
Ora, perante o conjunto normativo e os princípios supra referenciados não vemos como não sufragar a sentença nas suas conclusões, porquanto é patente o tratamento diferenciado na relação da R. Empregadora para com o A. Trabalhador. Tratamento para o qual a R. não logrou fornecer uma cabal explicação, tudo apontando para retaliação pela definição contratual e subsequente reintegração.
Improcede, assim, a questão em apreciação.
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Passamos à 4ª questãoA condenação relativa à isenção de horário de trabalho não poderá recair sobre o subsídio de férias?
Esta questão não vem minimamente desenvolvida nas alegações, ficando por explicar a razão de a Apelante a sustentar nas conclusões.
Ao equacionar as consequências patrimoniais da conduta da Apelante em matéria de isenção de horário ponderou-se na sentença:
Quanto à impropriamente denominada isenção de horário de trabalho não pode a ré deixar de ser condenada a pagar ao autor 25,00% do valor da sua retribuição base em cada momento auferida, desde Julho de 2018.
Em sede da peticionada reparação, a questão que se coloca é a da qualificação desta prestação no quadro da estrutura remuneratória – ser aditada ao valor da remuneração base, que passaria a ser de mais 25,00%, ou manter a sua autonomia como prestação no quadro remuneratório.
Com assinalável frequência o desenho das contrapartidas remuneratórias a cargo da empregadora, para além da fixada remuneração base, exprime uma proliferação de atribuições pecuniárias, ou não, ligadas, mais ou menos diretamente, à prestação do trabalhador que se traduzem em evidentes vantagens económicas para este, as quais se entende que não podem deixar de ser vistas como corretivas do valor global da sua prestação de trabalho – sobre a proliferação de atribuições patrimoniais e suas possíveis motivações vd Monteiro Fernandes in Direito do Trabalho, pág. 314 e ss da 18ª ed.
Resulta do disposto no art.º 258º do Código do Trabalho que “1 – Considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho. 2 – A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie. 3 - Presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador. 4 - À prestação qualificada como retribuição é aplicável o correspondente regime de garantias previsto neste Código.”.
À luz desta norma e para efeitos do art.º 258º a dita prestação, denominada de isenção de horário de trabalho, ou com outra denominação, mas correspondente a 25,00% da remuneração base, integra a estrutura remuneratória dos trabalhadores da equipa do autor, consequentemente terá, atenta a ausência de fundamento para tratamento diferenciado, de integrar a do autor, seja quanto a prestações vencidas, seja quanto a prestações vincendas.
A mesma é, como referido, devida desde Julho de 2018.

O autor, não relevando a autonomização da prestação, reclama o pagamento de tal prestação nos subsídios de férias e de natal.
Relativamente ao primeiro e atento o disposto no art.º 264º nº 2 do Código do Trabalho segundo o qual “(…) o trabalhador tem direito a subsídio de férias, compreendendo a retribuição base e outras prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho, correspondentes à duração mínima das férias”, entende-se que tal prestação deve ser considerada no valor dos subsídios de férias vencidos e dos vincendos.
Quanto aos subsídios de 2018 e 2019 está em causa um valor de 150,00€,
num total de 300,00€, no subsídio de férias de 2020 o valor é de 157,50€ e no de 2021 é de 166,25€.
Totaliza o valor devido e a considerar em subsídios de férias vencidos de 2018 a 2021 a quantia de 473,75€, acrescendo ainda os mesmos 25,00% da remuneração base considerada em cada subsídio de férias que tenha sido liquidado posteriormente a Maio de 2021.
Não tendo a Apelante apresentado qualquer argumentação capaz de sustentar uma tese oposta, improcede a questão em apreciação.
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Deter-nos-emos de seguida no recurso subordinado, para analisar a 2ª questão ali elencada – Existe procedimento discriminatório por força do não pagamento do cartão refeição e na ausência de aumento salarial?
A questão enforma as conclusões 18. e 19., dali emergindo claramente que sendo dado como provado que a Ré paga a todos os seus trabalhadores efetivos uma prestação denominada cartão de refeição e não a paga ao Autor, terá de concluir-se que, também neste caso, a prática da Ré ao tratar o Autor de forma diferente sem qualquer critério objetivo que tal justifique é discriminatória. E que, dando-se como provado o aumento em 40,00€ das remunerações mensais de, pelo menos, todos os trabalhadores da equipa em que se integra o Autor, é também certo que deveria ter sido atendido na sentença o correspetivo pedido de diferenças salariais.
Ora, relativamente a estas matérias o Apelante não logrou vencimento na reapreciação fática.
Razão pela qual ficam prejudicados quaisquer outros considerandos.
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Resta a 3ª questãoA indemnização por danos não patrimoniais deve ser concedida na totalidade?
Alega o Apelante que pediu, para ressarcimento dos danos não patrimoniais, a quantia de 37.500,00€, valor que considera modesto, vindo a ser-lhe atribuída apenas a de 25.000,00€. Porém, a Ré praticou a sequência de atos discriminatórios ora em causa depois de ter sido condenada na reintegração do Autor, por sentença transitada em julgado. Tratando-se duma empresa integrada num grupo de referência no mundo empresarial do audiovisual, (Media Capital), desde logo deve concluir-se que a indemnização deve ter um conteúdo simultaneamente compensatório dos danos sofridos e suficientemente punitivo da condenável conduta da Ré. E, a intensidade dos danos morais sofridos pelo Autor é evidente e resulta da própria natureza da conduta ilícita da Ré: um assédio pertinaz, duradouro no tempo, expresso em múltiplas facetas do tratamento laboral a que este foi sujeito. Por outro lado, é consabido que – independentemente de qualquer tipo de prova feita neste processo em concreto este tipo de conduta duradoura discriminatória no território laboral perturba gravemente a pessoa do trabalhador, que fica sujeito a onerosas consequências psicológicas e até fisiológicas, como já acima foi sublinhado. No plano social, deve ter-se em consideração a necessidade de prevenção, devendo a Justiça ser um dos instrumentos disso mesmo: os agentes empresariais em vestes patronais têm de interiorizar a enorme gravidade e a inadmissibilidade, destes comportamentos.
Contrapõe a Apelada que o Recorrente incorre em erro quanto à génese dos danos não patrimoniais, porquanto, se reconhecesse que o valor determinado pelos Tribunais, em matéria de danos não patrimoniais, se destina ao ressarcimento da lesão que fora criada na esfera da parte lesada, nunca diria que o valor em que a Recorrente foi condenada não se mostra suficiente, não podendo esperar que a indemnização constitua uma punição do seu comportamento.
A sentença fundamentou as suas conclusões acerca do montante indemnizatório nos seguintes termos:
O montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais deve ser calculado em qualquer caso (haja dolo ou mera culpa do lesante) segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e ás do lesado e do titular da indemnização, às flutuações de valor da moeda, etc. E deve ser proporcional à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida” – P de Lima e A Varela in Código Civil anotado, vol. I, pág. 499 a 501 da 4ª ed.
Tal reparação não prescinde da demonstração dos pressupostos da obrigação de indemnizar designadamente da verificação de danos e da sua imputação a conduta da demandada tal como previsto nos art.ºs 483º e 563º do Código Civil.
A ilicitude da conduta da ré ao não atribuir ao autor prestação denominada de isenção de horário de trabalho, ao não lhe facultar acesso a serviços de medicina do trabalho, ao não lhe atribuir seguro de saúde e não lhe reconhecer prestação compensatória pela deslocação em veículo próprio, a mesma resulta da sua contrariedade com os preceitos legais acima assinalados.
No âmbito da execução contratual em que a violação das normas teve lugar, a ré não logrou afastar a sua culpa, que resulta do art.º 799º do Código Civil, tal como não logrou demonstrar que, para as identificadas práticas, existe uma razão objetiva para o tratamento diferenciado do autor.
O tratamento diferenciado do autor é comentado entre os seus colegas de trabalho, sujeitos com os quais convive diariamente e durante quase um terço de cada dia de trabalho.
O mesmo determina um sentimento de injustiça no autor que se sente humilhado e destratado no confronto com os demais colegas.
Não obstante o autor se queixar junto da sua chefia sobre tal situação o mesmo teve de recorrer a juízo para solicitar a cessação do tratamento diferenciado.
O dano não patrimonial ao nível da sua dignidade enquanto trabalhador – cfr art.º 127º nº 1 al a) do Código do Trabalho – é incontornável, não sendo minimamente exigível a um qualquer trabalhador que suporte injustificadamente condições de desigualdade de tratamento como as impostas ao autor nos segmentos referentes a prestação denominada de isenção de horário de trabalho, acesso a serviços de medicina do trabalho, seguro de saúde e transportes.
Por todo o exposto entende o tribunal estarem verificados, no caso concreto, os pressupostos de indemnização por danos não patrimoniais.

A indemnização, por impossibilidade de reconstituição natural – cfr art.º 566º do Código Civil – é fixada em dinheiro e assume-se mais como uma compensação que como uma verdadeira indemnização, um ressarcimento dos danos já que estes, pela sua natureza são, em alguns casos, dificilmente ressarcíveis – vd. A Varela in Das Obrigações …, pág. 530 da 4ª ed. e A Costa in Direito das Obrigações, pág. 520 da 7ª ed.
Na determinação do montante da indemnização, ponderados os critérios acima referidos, ponderado o facto de se tratar de um comportamento reiterado da ré, comportamento este com início na retoma de execução de um contrato de trabalho por determinação judicial – contrato que a ré não reconhecia como tal e ao qual colocara unilateralmente termo -- e ao seu impacto no trabalhador entende-se que o montante de 25.000,00€ se mostra adequado e bastante para ressarcimento dos danos não patrimoniais relacionados com a discriminação que o mesmo é objeto na execução do contrato de trabalho desde a sua reintegração.
Afigura-se-nos que a ponderação assim efetuada é adequada ao ressarcimento do dano sofrido.
A indemnização pelo dano de natureza não patrimonial não tem como efeito eliminar o dano sofrido. Antes, de alguma forma compensa o sofrimento, sancionando o lesante e permitindo ao lesado aceder a bens de ordem material e espiritual que o confortem.
Decorrendo da lei que a indemnização pelos danos não patrimoniais é fixada equitativamente, “tomando em consideração não apenas a extensão dos danos causados, mas também o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e a do lesado e as demais circunstâncias do caso (Art.º 496º/4, 1ª parte e 494º) ” podemos afirmar que a indemnização não reveste natureza exclusivamente ressarcitória, tendo também cariz punitivo, “assumindo-se como uma pena privada, estabelecida no interesse da vítima, por forma a desagravá-la do comportamento do lesante” (Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, 11ª Ed., Almedina, 303).
O quantum indemnizatório há-de, pois, refletir adequada compensação capaz de satisfazer tais objetivos, tendo presentes as circunstâncias concretas e, bem assim, o grau de culpa do agente.
A Jurisprudência dos Tribunais superiores, designadamente a do STJ, vem sublinhando a necessidade de se abandonarem indemnizações irrisórias, entendendo nós que a indemnização pelo dano moral deve ser eficaz, proporcional e dissuasiva.
Por outro lado, entende-se que a tutela é dispensada ao dano que sai da mediania, que ultrapassa as fronteiras da banalidade, que espelha a intensidade de uma dor, de uma angústia, de um desgosto, de um sofrimento moral que, em presença das regras da experiência, torna inexigível que a pessoa se resigne.
Retornando à petição inicial, verificamos que ali se alegava que os factos enformadores do comportamento discriminatório têm causado ao longo destes quase 3 anos ao A. grande pressão psicológica, enorme humilhação perante os seus colegas de trabalho, grande indignação e forte sentimento de injustiça. Com efeito, a repetida e persistente conduta da R. conseguiu fomentar no A. o sentimento de ser diferente e de ser inferior aos seus colegas de trabalho e de que, por muito que se esforce, continua a ser pessoa indesejável e que não merece qualquer consideração. E, por muito que procure convencer-se de que é um bom profissional, a verdade é que a sua autoestima se encontra muito abalada e tem momentos de enorme desânimo e angústia. A sua situação é comentada no seu local de trabalho por colegas e colaboradores das empresas do Grupo Empresarial a que pertence a R.. O que para o A. constitui mais um motivo de frustração, humilhação e vergonha. Acresce que o desigual tratamento remuneratório que lhe tem sido dado pela R. implica uma quebra significativa nos seus rendimentos, que tem vindo a afetar a sua qualidade de vida e a do seu agregado familiar, do qual faz parte uma filha, atualmente de quase 4 anos de idade. E o facto de os seus problemas laborais afetarem a sua vida e ambiente familiares constitui um sofrimento acrescido para o A..
Deste elenco factual veio a provar-se que o autor sente-se destratado pela ré, injustiçado e humilhado no confronto com os seus colegas de trabalho e de equipa que se apercebem e comentam o facto de o mesmo não ter as mesmas condições e benefícios que eles. Sentimentos de injustiça e humilhação assentes na violação clara do princípio da igualdade de tratamento, um princípio basilar do Estado de Direito.
Os danos cuja prova se obteve, sofridos pelo Apelante, espelhados na fundamentação da decisão recorrida, mostram-se concretizados e merecem, pois, a tutela do direito, revelando a gravidade pressuposta na norma supra mencionada. Contudo, os danos em equação são menores do que aqueles que inicialmente haviam sido invocados. Isso impõe-nos que se encontre o desejável equilíbrio entre as tendências jurisprudenciais referidas e os concretos danos sofridos.
Deste modo, o valor indemnizatório arbitrado revela-se adequado ao sofrimento decorrente da conduta ilícita perpetrada pela R. ao longo de cerca de três anos, nenhuma censura merecendo o juízo efetuado em 1ª instância.
Termos em que improcede a questão em apreciação.
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Considerando que ambas as apelações improcederam, as custas de cada uma delas serão suportadas pelos respetivos Apelantes, conforme Art.º 527º do CPC.
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Em conformidade com o exposto, acorda-se em julgar:
A. A apelação interposta pela R. improcedente e, em consequência, confirmar a sentença.
Custas pela Apelante.
B. A apelação interposta pelo A. improcedente e, em consequência, confirmar a sentença, alterando-se a resposta ao ponto 2 do acervo não provado.
Custas pelo Apelante.

Lisboa, 24/04/2023
MANUELA FALHO
SÉRGIO ALMEIDA
ALDA MARTINS
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1. Sublinhado nosso
2. Podendo, em geral, revestir-se de grande utilidade
3. Porque assim o afirma no início da argumentação relativa a esta matéria
4. Da autoria da Relatora