Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
655/21.2T8FND.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: CONTRATO DE EMPREITADA
SUB-EMPREITADA
RESPONSABILIDADE DO EMPREITEIRO
Data do Acordão: 04/23/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO LOCAL CÍVEL DO FUNDÃO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 264.º E 1213.º, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: I – A sub empreitada não implica a transmissão/cessão da posição contratual do empreiteiro, sendo um sub contrato do contrato de empreitada, de mera substituição material, e, ainda que derivado deste contrato principal, dele sendo autónomo.
II – Assim, ao menos por via de regra, o empreiteiro apenas responde perante o dono da obra e o sub empreiteiro perante o empreiteiro, não podendo/devendo o dono da obra responsabilizar o sub empreiteiro, mas apenas o empreiteiro.
Decisão Texto Integral: Relator: Carlos Moreira
Adjuntos: Rui Moura
Luís Cravo



ACORDAM OS JUIZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

1.

AA, intentou contra BB, A... e  B..., SA a presente ação declarativa, de condenação, sob a forma de processo comum.

Pediu:

 A condenação dos réus na restituição da quantia de e 14.600,00, acrescida de juros legais, desde a citação.

Para tanto, alegou, em síntese:

Em 14.04.2020, contratou o 1.º R para execução de trabalhos de canalização, carpintaria, tetos falsos e divisórias, gás, isolamentos e impermeabilizações, pintura, reabilitação, remodelação geral e engenharia civil, na Rua ..., ..., na ....

Em execução deste contrato, entregou ao 1.º e a terceiros (empreiteiros, que o R foi contratando para executar a obra, designadamente a empresa “C..., Lda”), a pedido e com autorização daquele, várias quantias, num total de € 18.202,00.

No entanto, e não tendo as obras contratadas sido executadas, o 1.º R fez cessar o contrato, tendo-se elaborado, em 08.10.2020, Auto de Receção Definitiva da Obra. Nessa altura, A e 1.º R acordaram que, relativamente ao valor entregue, não haviam sido executadas obras no valor de € 14.600,00, como consta deste Auto, valor este que jamais lhe foi restituído.

Demanda a 2.ª R por o Auto de Receção Definitiva da Obra estar redigido em papel timbrado deste e a 3.ª R na qualidade de seguradora do 1.º R.

A ré “B...” contestou, alegando, em síntese:

O 1.º R celebrou contrato de sub-empreitada com a “C..., Lda”, sub-empreiteiro que o A reconheceu como tal, tanto que lhe entregou diretamente quantias em dinheiro, com o que validou a substituição do 1.º R pelo subempreiteiro.

Aplicando-se à substituição o regime da substituição do procurador (art. 264.º do CC), o 1.º R não tem qualquer responsabilidade pelo incumprimento do sub-empreiteiro, nem consequentemente a tem a contestante, tanto mais que é totalmente alheia ao contrato celebrado entre o A, o 1.º R e a sub-empreiteira.

O contrato que celebrou com o 1.º R tem por objeto a responsabilidade civil legal de natureza extracontratual imputável a este, por danos materiais ou corporais causados a terceiros pelo mesmo ou por pessoas ao seu serviço e que tenham origem na execução de trabalhos de construção, manutenção e reparação de imóveis, e não a responsabilidade civil contratual, por incumprimento ou cumprimento defeituoso de um contrato.

Mesmo que assim não fosse, sempre a sua responsabilidade estaria excluída, por o contrato não garantir danos de responsabilidade civil ou profissional do 1.º R, mais acrescentando que o contrato prevê uma franquia de € 250,00.

Termina pedindo a improcedência da ação e a sua absolvição do pedido.

O 1.º réu contestou, alegando, em suma:

Celebrou contrato de subempreitada para a realização da obra com a “C...”, que iniciou a obra, razão pela qual todas das quantias pagas pelo A foram por esta recebidas.

Não fez, pois, suas tais quantias, porquanto o A autorizou a sua substituição pela “C...”, com quem passou a tratar diretamente dos assuntos relacionados com a obra, nomeadamente dando instruções de quais as paredes que queria demolidas, o modo da sua demolição, tudo nos termos dos art.ºs 264.º e 1.213.º do CC.

Não pode, por isso, ser responsabilizado pelo não cumprimento integral da empreitada.

Para o caso de assim não se entender, acrescenta que, como resulta do Auto de Receção Definitiva da Obra, o A aceitou que a obra fosse totalmente terminada/ acabada pela empresa “D..., Lda”, desresponsabilizando-o e tendo a obra sido já (ou vindo a ser) totalmente terminada, o recebimento da quantia peticionada traduzir-se-ia num benefício injustificado para o A.

Pede:

A condenação do A como litigante de má fé, por alegar nos autos factos que sabe serem falsos, em indemnização a seu favor nunca inferior a € 2.500,00 e a improcedência da ação, com a sua absolvição do pedido.

O autor apresentou resposta.

Quanto à contestação da R “B...” alega que desconhecia os termos do contrato de celebrado entre os 1.º e 3.º RR, acrescentando que foi o 1.º R que lhe disse para acionar o seguro.

Nega que tenha havido qualquer substituição do 1.º R pela “C...”, esclarecendo que aquele trabalha com mão de obra de outras empresas, razão pela qual colocou em obra várias equipas, as quais sempre atuaram de acordo com as indicações e orientações do 1.º R, bem assim que era a este que ele, A, dirigia todas as reclamações, o qual as aceitava e tentava resolver.

Já quanto à contestação do 1.º R reitera o supra dito quanto à inexistência de qualquer substituição, tanto mais foi o 1.º R que recebeu o preço, emitiu faturas e recibos, solicitou pagamentos e autorizou a sua entrega diretamente às equipas que se encontravam em obra.

Conclui como na p. i.

O autor desistiu do pedido quanto à R B..., SA”, desistência homologada por decisão  transitada.

As partes esclareceram que o contrato objeto destes autos, foi celebrado entre o autor e o réu BB, sendo que do próprio contrato resulta que, este réu também usa de denominação "E...", isto é, na verdade o 1º e 2º réus, identificados na Petição Inicial, são a mesma pessoa, sendo que o 1º réu é um franchisado, da marca identificada, razão pela qual se determinou a eliminação de toda e qualquer menção à “ré” "A..." dos presentes autos.

2.

Prosseguiu o processo os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido:

«Nestes termos, e por tudo quanto se expôs, decido julgar totalmente procedente, por totalmente provada, a presente acção e, em consequência condenar o R BB a pagar ao A AA a quantia de 14.600,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos desde a data da citação até integral pagamento.»

3.

Inconformado recorreu o réu.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1. A douta sentença condenou o réu apelante a pagar ao Autor AA a quantia de € 14.600,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos desde a data da citação até integral pagamento;

2. Entre o réu BB e o Autor foi celebrado um contrato de empreitada;

3. Entre o réu BB e a C... foi celebrado um contrato de subempreitada, tendo o autor reconhecido tal subempreiteiro;

4. Antes de qualquer litigio ou incumprimento prévio, o Autor permitiu e validou a substituição do réu BB pelo referido subempreiteiro C..., tendo efetuado pagamentos à C..., seja diretamente, seja indiretamente;

5. Concretamente, o Autor efetuou pagamentos à C... num total de € 18.202,00 em três tranches (- € 10.702,00€ c/iva; - € 5.000.00€ c/iva; - € 2.500,00€ com iva) sendo a última por transferência bancária feito pelo Autor à C...;

6. O Autor autorizou, pois, a substituição do réu BB pela C...;

7. A autorização de substituição do empreiteiro pelo subempreiteiro foi feita quer de forma expressa, quer de forma tácita pelo Autor;

8. Dispõe ainda o art 264º CCiv., cuja epígrafe é “Substituição do procurador” que: “Sendo autorizada a substituição, o procurador só é responsável para com o representado se tiver agido com culpa na escolha do substituto ou nas instruções que lhe deu.”

9. O Autor não alegou nem provou que o réu BB teve culpa na escolha do substituto ou nas instruções que lhe deu, nem tão pouco foi alegada qualquer factualidade por parte do Autor nesse sentido;

10. A C... recebeu do Autor, na íntegra, pelo menos, € 18.202,00, tendo-se aquela empresa enriquecido às custas deste – e não o réu BB – sendo apenas aquela sociedade responsável perante o Autor;

11. Resultou provado que a C... não emitiu os correspondentes recibos dos valores recibos;

12. O autor não alegou, como se disse, e provou os elementos constitutivos do seu direito;

13. Não pode, pois, o réu BB ser responsável pelo ressarcimento do montante peticionado pois não embolsou tal quantia;

14. Por expressa previsão legal, não tem o réu BB essa responsabilidade perante o Autor pelo alegado incumprimento do subempreiteiro C... uma vez que o empreiteiro BB havia sido substituído, por autorização do Autor, pelo subempreiteiro;

15. O Autor tenta, através desta ação, locupletar-se à custa do réu BB do montante de € 14.600,00 quando bem sabe que não se encontra prejudicado pois que um terceiro se obrigou a executar e terminar a empreitada na sua totalidade nos termos do contrato de empreitada em causa ou, pelo menos, nada alegou em contrário;

16. Em consequência, o pedido formulado pelo autor deve improceder;

17. Foram violadas as disposições legais acima;

4.

Sendo que, por via de regra: artºs  635º nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, a questão  essencial decidenda  é  a seguinte:

Irresponsabilidade do réu, por subempreitada aceite pelo autor.

5.

Os factos provados a considerar são os seguintes:

1) em 14.04.2020, A e R celebraram o acordo, denominado “CONTRATO DE EMPREITADA”, junto à petição inicial como documento n.º 1, e cujo teor se dá por integralmente reproduzido, tendo por objecto a executação, por este, de trabalhos de canalização, carpintaria, tetos falsos e divisórias, gás, isolamentos e impermeabilizações, pintura, reabilitação, remodelação geral e engenharia civil, na morada sita na Rua ..., ..., na ... (doravante, a “obra dos autos”);

2) nessa sequência, o R adjudicou a obra dos autos à sociedade “C..., Lda”;

3) em 08.10.2020, foi elaborado e outorgado por A e R o “AUTO DE RECEPÇÃO DEFINITIVA” junto à petição inicial como documento n.º 2, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, do qual consta, nomeadamente que:

“(…) A empreitada foi adjudicada por BB à empresa C... e no dia 20 de abril de 2020 o Sr. BB recebeu do dono de obra a seu pedido o valor de 10.702,00€ c/iva, capital esse que entregou à empresa C....

Mais, no dia 30-Abril-2020 a empresa C... recebeu a quantia de 5.000.00€ c/iva do dono de obra por conta do orçamento inicial feito por BB e entrega esta feita após o seu pedido, conhecimento e autorização. Mais recebeu a empresa C..., Lda, por transferência bancária feita pelo dono de obra, a quantia de 2.500,00€ com iva incluido referente aos valores de orçamento inicial, a pedido e com conhecimento e autorização do Sr. BB.

Até à presente data a empresa C... não passou recibo integral destes valores recebidos e pagos mas BB dá aqui integral quitação deste valor de 18.202,00€ com Iva incluído.

Por incumprimentos de Obra não realizada e face ao pagamento recebido, e por inconformidade em algumas situações menos boas, a Empresa C... Lda saiu de obra no dia 21-Maio-2020 a mando de BB, tendo consigo o valor total de 18.202,00€ c/iva, sendo que só realizou apenas algumas demolições não correspondendo o trabalho efetuado ao valor pago, estimando que o dono de obra encontra-se prejudicado em cerca de 14.600,00€ (catorze mil e seiscentos euros).

A partir do dia 27 Maio de 2020, a obra foi adjudicada pelo Sr. BB e entregue à empresa D..., sendo que à data deste auto de receção a empresa D... se responsabiliza por toda a execução de obra desde o dia da assinatura do contrato até a conclusão dos trabalhos, e dará a garantia após final de obra, não se responsabilizando pelo valor em excesso de 14.600,00€ entregues pelo dono de obra ao Sr. BB e por este entregue à empresa C..., Lda.

A empresa E..., a partir de 27 de Maio de 2020, não tem qualquer responsabilidade sobre a execução da obra, apenas se responsabilizará até ao dia 27-05-2020 (…)”;

4) o R sempre acompanhou a execução da obra, dando orientações;

5) o R recebeu o preço, emitiu facturas e recibos e solicitou pagamentos, autorizando a sua entrega directamente às equipas de execução da obra;

6) o A aceitou que a obra fosse totalmente terminada/acabada pela sociedade “D..., Lda”;

5.

Apreciando.

A Julgadora  decidiu aduzindo o seguinte, sinótico e essencial, discurso argumentativo:

«…demonstrado ficou que entre A e R foi celebrado o acordo, denominado “CONTRATO DE EMPREITADA”, …

 E, como também resulta da factualidade apurada, pode, igualmente, ter-se por assente que, de facto, o R não cumpriu integralmente...

Na verdade, provado ficou que, tendo o R adjudicado a obra dos autos à sociedade “C..., Lda”, em 08.10.2020, foi elaborado e outorgado por A e R o “AUTO DE RECEPÇÃO DEFINITIVA” junto à petição inicial como documento n.º 2, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, resultando do seu teor que o R decidiu mandar a “C...” embora da obra em 21.05.2020, isto numa altura em que apenas tinham sido realizados alguns trabalhos de demolição, cujo valor não correspondia à quantia de € 18.2020,00 que já havia recebido, tendo-se então estimado que o A se encontrava prejudicado em cerca de € 14.600,00, valor correspondente a obra não executada.

Mais resulta desse documento que a partir de 27.05.2020, a obra foi adjudicada pelo R à “D...” e que a partir desta data aquele não teria qualquer responsabilidade sobre a execução da obra.

Temos, portanto, que o R celebrou com a “C...” um contrato de subempreitada, nos termos definidos no art.º 1213.º do Código Civil (CC).

E, segundo o disposto no n.º 2 do supra mencionado art.º 1.213.º.

“(…) é aplicável à subempreitada, assim como ao concurso de auxiliares na execução da empreitada, o disposto no art.º 264.º do CC, com as necessárias adaptações. A subempreitada é subcontrato, um contrato subordinado a um negócio precedente, a empreitada, e com ela conexo.

O empreiteiro é o devedor que responde perante o comitente ou dono da obra. Pelo que se pode por a questão de saber se pode o empreiteiro ser substituído pelo subempreiteiro.

E se a substituição depende de consentimento do dono da obra. Na cessão da posição contratual esse consentimento é exigido conforme resulta do disposto no Artigo 424 do Código Civil.

No caso de subempreitada a substituição do empreiteiro na execução da obra ou de parte dela por um subempreiteiro, só exigirá o consentimento do dono da obra se as qualidades pessoais do empreiteiro interessam ao dono da obra afastando desde logo a possibilidade de subempreitada.

…como também se concluiu no Ac. RC, de 14.10.2014, proc. n.º 241/13.0TBTMR.C1, disponível no mesmo site, “(…) I. Pese embora a identidade dos contratos de empreitada e subempreitada, do que resulta ser aplicável a ambos o regime jurídico consagrado na lei para o primeiro, trata-se, ainda assim, de vínculos contratuais distintos, e se o subempreiteiro substitui o empreiteiro na execução da obra, não se vincula perante o dono da obra, nem este perante o subempreiteiro. (…)”.

E isto porque “(…) VI - Pelo contrato de subempreitada não se verifica a substituição do empreiteiro perante o dono da obra, continuando aquele responsável perante este, apesar de haver acção de regresso do empreiteiro contra o subempreiteiro por, entre a empreitada e a subempreitada, existir uma relação de dependência de que derivam relações conexas. (…)” (sublinhado nosso) – cfr. Ac. RP, de 13.03.2003, proc. n.º 0232298, disponível no mesmo site.

Veja-se ainda, no mesmo sentido, Ac. RL, de 02.07.2009, proc. n.º 705/08-6, disponível no mesmo site, onde se concluiu, ainda que a respeito do direito do dono da obra à eliminação de defeitos da obra, que “(…) I - No contrato de subempreitada não existe relação directa entre o dono da obra e o subempreiteiro; se a obra apresentar defeitos, por culpa deste, o dono da obra deve exercer os direitos que a lei lhe confere, nomeadamente o de eliminação dos defeitos, perante o empreiteiro, não sendo lícito a este eximir-se às responsabilidades alegando ter dado a obra de subempreitada; (…)”.

É precisamente porque entre o dono da obra e o subempreiteiro não se estabelece qualquer relação / vínculo que “(…) Numa acção em que o dono da obra vem pedir a condenação do empreiteiro na reparação de defeitos denunciados e alegando o empreiteiro que essa parte dos trabalhos fora executada por subempreiteiros, estes últimos não podem intervir como associados do Réu uma vez que não contrataram com a dona da obra e não respondem perante ela. (…)”.

Aqui chegados, temos que, muito embora, no caso dos autos, se tenha verificado uma substituição do empreiteiro – o R - pelo subempreiteiro – a “C...” - no que toca à execução da obra, não se verifica substituição daquele perante o dono da obra (o A).

Consequentemente, pelos trabalhos pagos pelo A e não executados responderá o R, na qualidade de empreiteiro incumpridor (e sem prejuízo do seu direito de regresso sobre o subempreiteiro), sendo que, no caso, tal incumprimento e a respetiva expressão económica se mostra refletido no “AUTO DE RECEPÇÃO DEFINITIVA” junto à petição inicial como documento n.º 2, outorgado por A e R - € 14.600,00, quantia correspondente aos trabalhos não realizados até àquela data.

O R, não cumpriu, pois, o contrato celebrado com o A, nessa medida.

Segundo o disposto no art.º 406.º, n.º 1 do Código Civil, os contratos devem ser pontualmente cumpridos, devendo pois a prestação debitória ser realizada de acordo com o estipulado, abrangendo assim o tempo, o lugar e o modo da prestação (A. Varela, Dto. Das Obrigações, 2.º ed., 2.º-13; Castro Mendes, Dto Civil, Teoria Geral, 1979, 3.º-54), ideia reforçada pelo disposto no art.º 762.º, n.º 1 do mesmo Diploma.

E incumbe ao devedor alegar e provar que o incumprimento ou o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua - art.º 799.º do C. Civil – o que, no caso, o R não logrou fazer.

Tendo o R incumprido a obrigação a que estava adstrito por força do contrato de empreitada dos autos, tornou-se responsável pelo prejuízo que causou ao A - art.º 798.º do Código Civil -, o qual ascende à quantia de € 14.600,00, acrescido de juros de mora, no caso, desde a data da citação, data a partir da qual se mostram peticionados, e até integral pagamento (art.º art.º 805.º do CC).

Nestes termos, e por tudo quanto se expôs, deverá a presente acção ser julgada apenas totalmente procedente, por totalmente provada.»

Esta argumentação apresenta-se, desde logo em tese, curial, e, para o caso concreto e atentos os seus contornos fáctico-circunstanciais, vislumbra-se adequada.

Em seu abono e algo pleonasticamente mais se reitera o seguinte.

Estatui o artº 1213.º do CC.

Artigo 1213º

(Subempreitada)

1. Subempreitada é o contrato pelo qual um terceiro se obriga para com o empreiteiro a realizar a obra a que este se encontra vinculado, ou uma parte dela.

2. É aplicável à subempreitada, assim como ao concurso de auxiliares na execução da empreitada, o disposto no artigo 264.º, com as necessárias adaptações.

E prescreve o artº 264º do mesmo diploma:

Artigo 264.º

(Substituição do procurador)

1. O procurador só pode fazer-se substituir por outrem se o representado o permitir ou se a faculdade de substituição resultar do conteúdo da procuração ou da relação jurídica que a determina.

2. A substituição não envolve exclusão do procurador primitivo, salvo declaração em contrário.

3. Sendo autorizada a substituição, o procurador só é responsável para com o representado se tiver agido com culpa na escolha do substituto ou nas instruções que lhe deu.

4. O procurador pode servir-se de auxiliares na execução da procuração, se outra coisa não resultar do negócio ou da natureza do acto que haja de praticar.

Ora o regime deste preceito aplica-se ao contrato de subempreitada não total e incondicionadamente, como parece entender o recorrente, mas antes, como dimana do  nº2 do artº 1213º, com as necessárias adaptações, ou seja, considerando o jaez e natureza do contrato de empreitada e sub empreitada e as relações jurídicas e responsabilidades que emergem de tais contratos.

Ora o contrato de sub empreitada assume-se como um subcontrato relativamente ao contrato de empreitada, isto é, um negócio jurídico bilateral, pelo qual um dos sujeitos, parte em outro contrato, o de empreitada, sem deste se desvincular e com base na posição jurídica que daí lhe advém, estipula com terceiro a execução, total ou parcial, de prestações a que está adstrito.

Trata-se assim de um contrato derivado e dependente  da empreitada,  sendo que o empreiteiro, em vez de executar pessoalmente as obrigações assumidas para com o dono da obra, decide contratar com um terceiro a realização das tais prestações para com ele assumidas.

Relativamente ao contrato principal, o subcontrato, embora seja celebrado na sequência daquele, é autónomo relativamente a esse contrato principal, embora com ele tenha pontos comuns quer no plano subjetivo, quer no objetivo.

No plano subjetivo, porque um dos contratantes no contrato principal – o contratante/empreiteiro – é igualmente parte no subcontrato, é o subcontratante; no plano objetivo, porque o objeto do subcontrato é unicamente constituído pela totalidade ou por uma parte das prestações que constituem o objeto do contrato principal.

Por vezes caracteriza-se o subcontrato como um expediente jurídico através do qual o co-contratante do contrato principal transfere para um terceiro obrigações que assumiu com o outro contratante.

Importa, no entanto, precisar que não se trata de uma transmissão jurídica, já que, perante o contraente do contrato base/dono da obra, o subcontratante continua a ser o exclusivo responsável pelo cumprimento das obrigações assumidas com a outorga desse contrato.

Para o contraente do contrato principal trata-se apenas de uma substituição na execução. No subcontrato não ocorre uma cessão da posição contratual (…)

Trata-se de dois contratos distintos, que, não obstante um ter a sua génese determinada pela ocorrência da celebração do outro, terem partes comuns no respetivo objeto e um dos sujeitos ser comum a ambos, mantém cada um a sua autonomia, cada um se regulando pelas suas cláusulas próprias.

No entanto, a natureza subordinada de um – o subcontrato – relativamente à disciplina que rege ou outro – o contrato principal – estabelece entre ambos uma relação de influência quanto ao respetivo objeto.

Esta relação é unilateral, pois a dita influência faz-se apenas num sentido, no do contrato principal sobre o contrato subordinado: só as vicissitudes daquele se repercutem neste e não o inverso.

Ou seja, no contrato de subempreitada, o subempreiteiro é um “empreiteiro do empreiteiro”.

Isto significa que, tal como para o empreiteiro, ao subempreiteiro cabe o exclusivo da execução do objeto do contrato e a correspondente responsabilidade.

Mas isso também significa que, dentro dos limites, termos e condições estabelecidos nos elementos que integram o contrato principal, o subempreiteiro gere a execução da parte da obra que lhe foi subadjudicada com a mesma autonomia técnica de que goza o empreiteiro principal relativamente ao dono da obra.

Em contrapartida, está submetido ao poder do empreiteiro principal de proceder ao controlo e fiscalização da execução do contrato de subempreitada nos mesmos termos que, segundo o contrato principal, o dono da obra pode exercer sobre o empreiteiro/subcontratante.

Neste sentido cfr. entre outros, o  Ac. RL de 19.12.2023, p. 1034/20.4T8CSC.L1-7,o qual, com as respetivas citações, se seguiu de perto,  e o Ac do STJ de 24.02.2022, p. 13988/19.9T8PRT.P1 .S1., ambos in dgsi.pt.

No mesmo sentido e muito clara e incisivamente vejam-se os seguintes arestos no mesmo sítio:

Ac. RE de 09.07.2009, p. 4036/03.1TBSTB.E1

«I - A subempreitada é um contrato subordinado a outro que lhe é prévio, um subcontrato, em que o subempreiteiro se apresenta como empreiteiro de outro empreiteiro, e este como se fosse dono da obra, em qualquer caso em tema de obrigação de resultado.

II - Na subempreitada, que entra na categoria geral de subcontrato, não existe qualquer vínculo directo entre o dono da obra e o subempreiteiro, pelo que só criadas relações obrigacionais novas entre o empreiteiro e o subempreiteiro, as originárias, derivadas do contrato primitivo, entre o dono da obra e o empreiteiro respectivo se mantêm.»

Ac. RC de 22.03.2011, p. 157240/09.1YIPRT.C1

«1. No contrato de subempreitada o empreiteiro torna-se dono da obra em relação ao subempreiteiro, pelo que, nas relações entre empreiteiro e subempreiteiro, em tudo o que não esteja expressamente previsto, aplicar-se-á o regime legal do vínculo entre o dono da obra e o empreiteiro.»

Ac. RC de 14.03.2023, p. 217/21.4T8MGL.C1

«I – No âmbito do contrato de subempreitada, não ocorre, como regra, qualquer relação contratual entre o dono da obra e o subempreiteiro, continuando aquele contratualmente ligado ao empreiteiro e vice-versa, pelo que só a demonstração de qualquer fator/circunstância relevante poderá, nesse horizonte, afastar a regra da relatividade dos contratos.

II – Assim, por regra, é de afastar a ação direta do subempreiteiro contra o dono da obra para pagamento do preço da subempreitada.»

(sublinhado nosso)

Ou seja, pelo menos por via de regra, de que o presente caso não constitui exceção, e considerando a aludida autonomia dos contratos, o sub empreiteiro responde apenas perante o empreiteiro, e este responde apenas perante o dono da obra.

E inexistindo qualquer relação obrigacional, e, assim, responsabilidade, entre o dono da obra e o sub empreiteiro.

Assim sendo, no caso de incumprimento, o dono da obra apenas tem de responsabilizar o empreiteiro, único responsável perante si e não já o sub empreiteiro.

Se a culpa do incumprimento ou do cumprimento defeituoso impender sobre o sub empreiteiro, o empreiteiro apenas pode ser ressarcido por este em exercício de direito de regresso; mas deve assumir a responsabilidade perante o dono da obra se e quando este a exigir.

No caso sub judice, verifica-se que efetivamente o recorrente entregou a execução da obra a terceiros.

Pode, pois, lato sensu, considerar-se que nos encontramos perante um contrato de sub empreitada.

Assim sendo, e considerando o supra exposto, ele não pode eximir-se da sua responsabilidade perante o autor, dono da obra.

E considerando que se provou terem ficado trabalhos por executar,  cujo valor ascende ao peticionado na ação, é este valor que tem de solver ao dono da obra perante o qual, repete-se, ele é único responsável.

A expressão «lato sensu» supra mencionada, baseia-se no facto de o caso presente indiciar que a sub empreitada não enforma todas as caraterísticas prototípicas da mesma,  como seja uma certa autonomia prática/técnica do subempreiteiro na execução dos trabalhos da sub empreitada, tal como acontece com o empreiteiro relativamente ao dono da obra.

Efetivamente, provou-se que não obstante a execução dos trabalhos estar a cargo da C..., as obras foram por esta executadas sob a orientação e até algum controlo do réu, até porque as verbas para as mesmas, ou eram por ele entregues diretamente aquela empresa, ou eram pelo autor, mas com o conhecimento e anuência do recorrente.

A assim ser, como entendemos que é, a responsabilidade do réu perante o autor é ainda mais frisante e direta, pois que, bem vistas as coisas, a empresa era mera executora material das obras atinentes à empreitada, sem autonomia na execução, nunca o réu se tendo delas desligado ou delas tendo perdido o controlo ou superintendência.

Finalmente, o facto de se ter provado que o A aceitou que a obra fosse totalmente terminada/acabada pela sociedade “D..., Lda”, é irrelevante para o recurso.

Primus porque no auto de aceitação da obra ficou adrede consignado que tal empresa não se responsabilizaria pelo valor em excesso de 14.600,00€ entregues pelo dono de obra ao Sr. BB e por este entregue à empresa C..., Lda.

Secundus porque, afinal, não se sabe se as obras foram ou não foram, efetivadas por esta última empresa, sendo que a prova da sua efetivação, competia,  na economia do recurso, como facto excetivo, ao réu recorrente – artº 342º nº2 do CC.

Improcede o recurso.

(…)

7.

Deliberação.

Termos em que se acorda julgar o recurso improcedente, e, consequentemente, confirmar a sentença.

Custas pelo recorrente.

Coimbra, 2024.04.23.