Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00541/23.1BEVIS-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/01/2024
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Paulo Ferreira de Magalhães
Descritores:PROCESSO CAUTELAR; JUÍZO PERFUNCTÓRIO;
TUTELA JURISDICIONAL EFECTIVA;
REQUISITOS DETERMINANTES DO DECRETAMENTO DAS PROVIDÊNCIAS;
Sumário:
1 – Nos termos do artigo 120.º, n.º 1 do CPTA, as providências cautelares são adoptadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente, situação em que, como dispõe o n.º 2 deste normativo, mesmo ainda na eventualidade de terem sido julgados verificados esses requisitos determinantes, sempre a adopção das providências pode ser recusada quando em sede da ponderação dos interesses públicos e privados em presença, for julgado que os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências.

2 - A existência de perigosidade [seja na vertente do receio da constituição de uma situação de facto consumado, seja na vertente da produção de prejuízos de difícil reparação], e da aparência do bom direito [enquanto avaliação sumária da probabilidade de existência do direito invocado] para os interesses que os Requerentes visam assegurar no processo principal, constituem requisitos determinantes para efeitos de ser apreciada a providência requerida, recaindo sempre sobre eles o ónus de fazer a prova sumária desses requisitos.

3 - Para o decretamento de uma providência cautelar têm de ser invocados, e recolhidos pelo Tribunal a quo, em termos de matéria de facto, indícios suficientes da verosimilhança do direito a ver suspensa a eficácia de um acto administrativo que autoriza e licencia uma operação urbanística, pois só perante a existência de tais elementos de prova e pertinente enquadramento será possível ao julgador formular um juízo positivo a respeito da aparência do direito invocado.

4 - O juízo que cabe levar a cabo no artigo 120.º, n.º 1 do CPTA, não pode ser misturado com o juízo que deve ser feito a título principal, visto tratar-se dum juízo perfunctório, sumário, tal como é reclamado pelo legislador em termos cautelares, por constituir um juízo que é formulado sob reserva de se poder chegar a uma conclusão diversa em sede do processo principal.

5 - A lei que o Requerido deve observar, sendo um limite à sua actuação, é sobretudo o fundamento da sua acção.

6 - O princípio da proporcionalidade está necessariamente conexionado com outros princípios, como a legalidade, a igualdade e a justiça, também previstos no artigo 266.º, n.º 2 da CRP, e aponta para o princípio mais abrangente da juridicidade da Administração, sendo que os mesmos só relevam, em princípio, na actividade discricionária da Administração, já que no campo vinculado o que importa ver é se a legalidade foi respeitada.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO


«AA» [devidamente identificados nos autos], Requerente nos autos de Processo cautelar que intentou contra a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, IP [também devidamente identificado nos autos], por via do qual requereu, em suma, o decretamento da providência cautelar de suspensão da eficácia do acto suspendendo praticado pela Presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC), assinado a 28.08.2023 e que lhe foi notificado através do ofício DSA-DLPA 1600/2023, e que lhe seja autorizado a prosseguir com a actividade, inconformado, veio apresentar recurso de Apelação da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, pela qual foi indeferida a providência cautelar por si requerida.

*

No âmbito das Alegações de recurso apresentadas pelo Recorrente, elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:




“[…]
CONCLUSÕES:
I. O tribunal a quo olvida em absoluto e de forma olímpica o artigo 51º, nº 3 do CPTA, isto é, que a impugnação do ato final pode ser feita com fundamento em ilegalidades cometidas durante o procedimento administrativo, conforme foi, aliás, o caso.
II. O Recorrente dividiu os vícios do ato final ora suspendendo em dois grandes grupos, por um lado, os vícios decorrentes do ato administrativo constantes do ofício DSA-DLPA 984/2023, ato administrativo esse prévio e praticado no decurso do processo administrativo que desembocou no ato suspendendo e devidamente identificado no Requerimento Inicial sob o ponto D), e por outro lado, em vícios próprios do ato suspendendo exarado através do ofício DSA-DLPA 1600/2023 e devidamente identificados no ponto E) do Requerimento Inicial.
III. O ato final constante do ofício DSA-DLPA 1600/2023 correspondente ao ato final do processo administrativo, e como tal, correspondente ao ato ora suspendendo, e como tal, é o ato devidamente identificado no artigo 2º do Requerimento Inicial, sendo que ao longo do Requerimento Inicial são alegados e invocados diversos vícios próprios do ato suspendendo, mas também vícios praticados ao longo do procedimento administrativo, como sejam, os vícios constantes do ato exarado através do ofício DSA-DLPA 984/2023, sendo que a isso o tribunal não pode olvidar, tendo a obrigação de se pronunciar sobre os referidos vícios.
IV. O tribunal a quo não podia limitar-se, como erradamente o fez, a analisar o ponto 4 dos vícios constantes do ofício DSA-DLPA 984/2023 do Requerimento Inicial sob a epígrafe “Da existência de questão prejudicial – processo nº 286/23.2BEVIS do TAF de Viseu e vício de forma por falta de fundamentação”, e ainda, o vício constante do ponto 6 referente aos vícios constante do ofício DSA-DLPA 1600/2023, com a epígrafe “Da existência de questões prejudiciais – violação do artigo 38º do CPA” do Requerimento Inicial.
V. O tribunal a quo incorre num erro de apreciação – que alegadamente o ato suspendendo foi o ato final constante do ofício DSA-DLPA 1600/2023 – descurando em absoluto o artigo 51º, nº 3 do CPTA que permite ao Recorrente impugnar o ato final, sem prejuízo da invocação de ilegalidades praticadas no decurso do procedimento administrativo, como foi o caso.
VI. Em face do exposto, a sentença recorrida padece da invocada nulidade por omissão de pronúncia [fundada na violação dos artigos 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC e artigos 95.º e 71.º n.º 1 do CPTA], a qual deve proceder, o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais.
VII. Assim, a decisão recorrida quando argumenta que “E daí que as alegações do Requerente nos artigos 36º a 80º do requerimento inicial – em que imputa diversas ilegalidades ao ato administrativo que indeferiu o seu pedido de suspensão do procedimento administrativo de reexame ao seu estabelecimento industrial – não relevam nem podem ser apreciadas nestes autos, dado que não é esse o ato administrativo impugnado na ação administrativa principal da qual este processo cautelar depende (conforme delimitado expressamente pelo Requerente no artigo 2º do requerimento inicial).” é totalmente desprovida de fundamento, e viola de forma flagrante o disposto no artigo 51º, nº 3 do CPTA.
VIII. Deste modo, o tribunal a quo padece de erro de julgamento por errada e incorreta aplicação do direito, tendo violado o disposto no artigo 51º, nº 3 do CPTA, o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais.
IX. A decisão da CCDRC proceder ao indeferimento do pedido de suspensão da vistoria de reexame, sem em momento algum conferir ao Recorrente o direito de audiência prévia, traduz-se na omissão de uma formalidade essencial cuja consequência é a anulabilidade da decisão.
X. Ainda que se admitisse, por mera hipótese académica a dispensa da realização da audiência de interessados, nos termos do disposto no artigo 124º do CPA, da decisão final de indeferimento do pedido de suspensão da vistoria de reexame, deveria constar de forma fundamentada as razões para a não realização da audiência, o que também não aconteceu.
XI. A omissão do direito de audiência dos interessados e a falta de fundamentação para a sua dispensa conduz a um vício de forma, por preterição de uma formalidade essencial que determina a anulabilidade de ato ora suspendendo, sendo aplicável a regra geral contida no artigo 163.º do CPA, incorrendo a decisão recorrida num erro de julgamento por errada aplicação do direito, o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais.
XII. A decisão recorrida desconsidera em absoluto o vício alegado e de que padecem os atos administrativos constantes dos ofícios DSA-DLPA 984/2023 e DSA-DLPA 1600/2023, designadamente, a total ausência de fundamentação dos atos administrativos para desconsiderar que aquelas ações judiciais não são questões prejudiciais.
XIII. O Recorrente no dia 09.06.2023 formulou junto da CCDRC um pedido de suspensão do procedimento administrativo tendente à realização da vistoria de reexame às instalações por considerar existir uma questão prejudicial nos termos do artigo 38º do CPA.
XIV. Uma coisa será proceder a uma vistoria de reexame por comparação com o Alvará original, objeto de renovação no dia 19.02.2016, e coisa substancialmente distinta será realizar a vistoria de reexame com base numa alteração ao Alvará/TUA que no caso de ter sido aprovada, e não indeferida, garantiria toda e qualquer eventual desconformidade que venha a ser identificada em sede de vistoria de reexame.
XV. Desta forma, dúvidas não podem subsistir que a ação administrativa intentada pelo Recorrente que corre termos no TAF de Viseu, processo nº 286/23.2BEVIS, constituiu uma questão prejudicial e o resultado da mesma é suscetível de influir de forma direta e necessária na vistoria de reexame e nas conclusões daí resultantes e que originaram o ato ora suspendendo.
XVI. O objeto da ação principal que corre termos sob o processo nº 286/23.2BEVIS do TAF de Viseu é precisamente aquilatar da legalidade e validade das razões constantes do ato praticado pela CCDRC que determinou o indeferimento do pedido de alterações ao Alvará do Recorrente.
XVII. Suscitada a questão prejudicial relativa ao indeferimento do pedido de alterações ao Alvará do Recorrente, apenas após a mesma ser resolvida em sede judicial poderia concluir-se se pela manutenção da realização da vistoria de reexame e consequente prática de ato administrativo ora suspendendo, pelo que a CCDRC tinha a obrigação legal de proceder à suspensão do procedimento da marcação da vistoria de reexame em curso até à sua resolução.
XVIII. Trata-se de uma obrigação legal imperativa para a Administração, pois o artigo 38º do CPA fala em “deve” e não em “pode”, pelo que a não suspensão do procedimento que culminou com a prática do ato ora suspendendo padece de um vício de violação da lei por erro nos pressupostos de direito e de facto, o que acarreta a anulabilidade do ato, incorrendo a decisão recorrida num erro de julgamento ao não considerar a existência da referida questão prejudicial, o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais.
XIX. Para além disso, caso se admita que a CCDRC pudesse não suspender o procedimento administrativo em curso, não obstante a existência de uma questão prejudicial, sempre teria a obrigação legal de nos termos do artigo 38º do CPA, recusar a suspensão do procedimento sendo para isso essencial e necessário demostrar que “(…) da não resolução imediata do assunto resultarem graves prejuízos para interesses públicos ou privados.” (negrito e sublinhado nosso)
XX. Do ato suspendendo não resulta qualquer fundamentação relativa aos interesses públicos ou privados em causa que impediam a CCDRC de não decretar a suspensão do procedimento até à resolução do processo nº 286/23.2BEVIS.
XXI. Do ato suspendendo não resulta qualquer justificação de facto ou de direito para não proceder à suspensão do procedimento administrativo em curso até à decisão final do tribunal no processo nº 286/23.2BEVIS, bem como qualquer justificação de facto ou de direito sobre quais os graves prejuízos para os interesses públicos ou privados que impediam a CCDRC de proceder à suspensão do procedimento de realização da vistoria de reexame em curso.
XXII. Consequentemente, existe uma clara omissão dos motivos para a tomada da decisão impugnada, pelo que a falta de fundamentação, omissão e insuficiência da fundamentação, por não esclarecer de modo suficiente e necessário um homem médio quanto à motivação do ato, determinam a anulabilidade do ato suspendendo, verificando-se um erro de julgamento por se verificar falta de fundamentação, devendo a decisão recorrida ser revogada, o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais.
XXIII. Em sede de audiência de interessados por conta do ato ora suspendendo, o Recorrente pugnou pela existência de uma segunda questão prejudicial decorrente da não suspensão da vistoria de reexame, o que não viria a ser deferido pela CCDRC.
XXIV. Nessa sequência, no dia 20.06.2023 foi intentada pelo Recorrente uma ação administrativa de impugnação de ato administrativo e condenação à prática de ato administrativo legalmente devido relativo ao ato praticado pela Exma. Senhora Presidente da CCDRC, através do ofício DSA-DLPA 984/2023.
XXV. No âmbito da referida ação judicial intentada pelo Recorrente, o que se pretende é que seja declarada a nulidade ou anulabilidade do ato praticado pela Presidente da CCDRC, através do ofício DSA-DLPA 984/2023, que mantém a decisão de realização da vistoria de reexame, pela mesma decisão padecer dos vícios melhor identificados na Petição Inicial, e ainda, que a CCDRC seja condenada na prática no ato legalmente devido, isto é, proceder à suspensão do procedimento administrativo de realização da vistoria de reexame até ao trânsito em julgado do processo judicial nº 286/23.2BEVIS que corre termos no TAF de Viseu.
XXVI. Desta forma, a referida ação administrativa em curso supra identificada que corre termos no TAF de Viseu, processo nº 355/23.9BEVIS, constitui uma questão prejudicial nos termos do artigo 38º do CPA, o que não foi julgado verificado pela CCDRC, bem como pela decisão recorrida, entendimento com o qual não se pode concordar.
XXVII. Suscitada a existência de uma questão prejudicial o procedimento administrativo deverá ser suspendo, pois trata-se de uma obrigação legal imperativa para a Administração, já que o artigo 38º do CPA fala em “deve” e não em “pode”, pelo que a não suspensão do procedimento que culminou com a prática do ato ora suspendendo padece de um vício de violação da lei por erro nos pressupostos de direito, o que acarreta a anulabilidade do ato, incorrendo a decisão recorrida num erro de julgamento, o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais.
XXVIII. Para além disso, caso se admita que a CCDRC pudesse não suspender o procedimento administrativo em curso, não obstante a existência de uma questão prejudicial, sempre teria a obrigação legal de nos termos do artigo 38º do CPA, recusar a suspensão do procedimento sendo para isso essencial e necessário demostrar que “(…) da não resolução imediata do assunto resultarem graves prejuízos para interesses públicos ou privados.” (negrito e sublinhado nosso)
XXIX. Do ato ora suspendendo não resulta qualquer fundamentação relativa aos interesses públicos ou privados em causa que impediam a CCDRC de não decretar a suspensão do procedimento até à resolução do processo nº 355/23.9BEVIS.
XXX. Na verdade, o ato suspendendo é totalmente omisso quanto aos graves prejuízos para os interesses públicos ou privados que resultariam em caso de não suspensão do procedimento administrativo em curso.
XXXI. Analisado o conteúdo do ato ora suspendendo, não resulta do mesmo qualquer justificação, de facto ou de direito, para não proceder à suspensão do procedimento administrativo em curso até às decisões finais dos tribunais no âmbito do processos judiciais alegados, bem como qualquer justificação de facto ou de direito sobre quais os graves prejuízos para os interesses públicos ou privados que impediam a CCDRC de proceder à suspensão do procedimento de suspensão do Alvará em curso.
XXXII. Consequentemente, existe uma clara omissão dos motivos para a tomada da decisão impugnada, pelo que a falta de fundamentação, omissão e insuficiência da fundamentação, por não esclarecer de modo suficiente e necessário um homem médio quanto à motivação do ato, determina a anulabilidade do ato suspendendo, incorrendo a decisão recorrida num erro de julgamento, o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais.
XXXIII. O tribunal a quo olvidou verificar a violação do disposto no artigo 73º, nº 5 e 6 do RGGR.
XXXIV. O Auto de Vistoria é manifestamente insuficiente, incompleto e omisso uma vez que se limita a identificar alegadas desconformidades com o projeto aprovado que deu origem ao Alvará da Recorrente de forma manifestamente lacónica e simplista, numa análise estritamente comparativa e matemática, sem lograr concretizar, analisar, e menos ainda, fundamentar ou justificar os motivos pelos quais as alegadas desconformidades não são passíveis de correção num prazo razoável, impondo-se a sua correção, por uma única vez, por forma a ser agendada uma nova vistoria de reexame.
XXXV. O ato suspendendo faz um mero juízo conclusivo e desprovido de factos concretos e objetivos, designadamente dos motivos pelos quais as alegadas desconformidades detetadas não são possíveis de corrigir num prazo razoável, incorrendo a decisão recorrida num erro de julgamento por violação do disposto no artigo 73º, nº 5 e 6 do RGGR, o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais.
XXXVI. De igual forma, o tribunal a quo olvidou verificar na decisão recorrida a violação do disposto no artigo 73º, nº 7 do RGGR.
XXXVII. A CCDRC ao emitir o ato suspendendo de onde consta o Auto de Vistoria mais uma vez não deu resposta integral ao legalmente determinado, ou seja, no Auto de Vistoria constam simplesmente as alegadas desconformidades com o projeto aprovado sendo que em momento algum é mencionado sequer, e menos ainda, de modo fundamentado, os motivos pelos quais as desconformidades assumem relevo suficiente para o indeferimento da vistoria de reexame e suspensão do Alvará do Recorrente.
XXXVIII. Em função do que vem dito, o ato suspendendo ao violar a lei aplicável incorre num vício de violação da lei e comete um erro nos pressupostos de facto e de direito, o que determina a anulabilidade do ato suspendendo, incorrendo a decisão recorrida na violação do disposto no artigo 73º, nº 7 do RGGR, o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais.
XXXIX. Da decisão impugnada não consta qualquer justificação ou fundamentação para o legalmente imposto no artigo 73º, nº 5, 6 e 7 e artigo 74º, nº 4, al. a) do RGGR.
XL. O que se verifica no caso em apreço é que do ato ora suspendendo se fez constar de modo genérico e conclusivo que “(…) face às desconformidades anteriormente identificadas, a qual se entende assumirem relevo suficiente para a não autorização da exploração provisória (n.º 7 do art.º 73.º do RGGR), já que as mesmas não são passíveis de correção em prazo razoável.
XLI. Analisado o conteúdo da decisão ora impugnada não resulta da mesma qualquer justificação de facto ou de direito a) para não permitir a correção das alegadas desconformidades detetadas num prazo razoável, conforme predispõe o nº 5 do artigo 73º do novo RGGR; pelas quais as desconformidades são de tal modo graves que não são passíveis sequer de correção num prazo razoável e a única possibilidade é o indeferimento da vistoria de reexame e suspensão do Alvará do Recorrente, conforme determina o nº 5 e 6 do artigo 73º do novo RGGR; b) do motivo pelo qual o Auto de Vistoria se limita a identificar as alegadas desconformidades, sem que lhes seja atribuído relevo suficiente para o indeferimento da vistoria de reexame e de suspensão do Alvará, conforme impõe o nº 7 do artigo 73º do novo RGGR; c) para ser proferida a decisão de indeferimento da vistoria de reexame e de suspensão do Alvará uma vez o Auto de Vistoria e ato ora suspendendo não atribui qualquer relevo suficiente às desconformidades conforme imposto pela a al. a) do nº 4 do artigo 74º do novo RGGR; o que consubstancia um vício de forma por falta de fundamentação, cuja consequência é a anulabilidade do ato suspendendo.
XLII. A decisão ora impugnada para além de ser totalmente omissa quanto aos motivos para não conferir um prazo razoável para o Recorrente proceder à correção das alegadas desconformidades, bem como de não constar do Auto de Vistoria qualquer referência ao relevo suficiente das mesmas para indeferir a vistoria de reexame e proceder à suspensão do Alvará, é claramente insuficiente, incompleta e obscura por não esclarecer concretamente a motivação do indeferimento da vistoria de reexame e suspensão do Alvará, o que equivale à falta de fundamentação.
XLIII. A omissão e insuficiência da fundamentação, por não esclarecer de modo suficiente e necessário o Recorrente quanto à motivação do ato, equivale à falta de fundamentação nos termos do nº 2 do artigo 153º do CPA, o que determina também por essa via a anulabilidade da decisão ora impugnada, incorrendo a decisão recorrida num erro de julgamento, o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais.
XLIV. A sentença recorrida padece de erro de julgamento na apreciação do requisito do fumus boni iuris imposto pelo artigo 120º, nº 1 do CPTA, por se verificarem vícios que conduzem à anulação do ato suspendendo, bem como dos prejuízos de difícil reparação e mesmo uma situação de facto consumado em resultado do ato suspendendo.
XLV. Desta forma, a sentença recorrida deverá ser revogada e substituída por outra que considere verificado o requisito do fumus boni iuris, bem como os demais requisitos necessários para o decretamento da providência nos exatos termos requerida.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Ex.ª doutamente suprirá, deverá o presente recurso ser julgado procedente, devendo revogar-se a Sentença recorrida e, em consequência, ser deferida a providência cautelar requerida.
[…]”

*

No âmbito das Alegações de recurso apresentadas pelo Requerido CCDR do Centro, IP, o mesmo elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:

“[…]
CONCLUSÕES
A) O Recorrente recorre da Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, proferida no âmbito do processo cautelar n.º 541/23.1BEVIS-A.
B) O recurso está limitado a questão jurídicas, não estando em causa a matéria de facto.
C) O Recorrente não se conformou com a decisão, repetindo essencialmente o Já alegado no requerimento inicial, exceto quanto ao princípio da proporcionalidade e a um alegado princí8pio da correção de desconformidades, pelo que há que concluir que se conformou o que foi decidido pelo digno Tribunal a quo a esse respeito.
D) Quanto ao alegado erro de julgamento relativo à violação das regras atributivas de competência, à data da prática do ato já não se tratava de matéria delegada e, em qualquer caso, o delegante mantém a competência para a prática de atos.
E) Quanto ao alegado erro de julgamento relativo à violação do direito de audiência prévia, o requerimento inicial e o processo administrativo demonstram à saciedade que o Recorrente foi ouvido variadas vezes e teve oportunidade de ser pronunciar sobre todas as matérias em causa nesta ação.
F) O procedimento que se encontrava em curso era o procedimento de reexame e, nos termos do n.º 1 do artigo 121º do CPA, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, sendo nesta fase que se concentra a audiência de interessados.
G) A vistoria de reexame é um ato oficioso sendo o seu agendamento da competência da entidade licenciadora, sem que haja um dever de audiência prévia quanto à sua realização.
H) Quanto ao alegado erro de julgamento relativo à violação dos artigos 73.º e 74.º e do dever de fundamentação, resulta da matéria dada como provada que não houve nenhuma reclamação, pelo que nada havia a responder.
I) São especificada e detalhadamente identificadas as desconformidades a corrigir, divididas em três conjuntos, e o motivo pelo qual não é suscetí8vel a sua correção em prazo razoável e sem suspensão da laboração.
J) Desde a primeira vistoria, em abril de 2022, que o Recorrente sabe das condições cuja verificação tinha de assegurar e dos respetivos prazos para o fazer – além de que se trata essencialmente do cumprimento de um regime legal de 2017, cujo prazo para conformidade era de 2019.
K) O Recorrente pretende, simultaneamente, estar numa situação em que há quatro anos que não introduz as alterações legalmente exigíveis, e vir invocar agora que são desconformidades menores suscetí8veis de correção em prazo razoável.
L) Quatro anos é um prazo que excede a razoabilidade e demonstra, por si só, que ou o Recorrente não quer operar dentro da legalidade, ou não tem a capacidade para o fazer enquanto labora, sendo necessária a suspensão para que se façam os trabalhos necessários à regularização da instalação.
M) A atividade de gestão de resíduos é uma atividade regulada e o operador tem o dever de conhecer o regime legal aplicável, resultando, da mera leitura do Auto de Vistoria, a compreensão do conjunto de desconformidades resultantes sobretudo da não adaptação ao regime legal aprovado há 4 anos.
N) Quanto ao alegado erro de julgamento relativo à violação do artigo 38.º do CPA, sobre suspensão do procedimento administrativo com fundamento em questões prejudiciais, note-se que o que está em causa não é a fundamentação da não suspensão por motivos de interesse público, mas antes o não preenchimento dos pressupostos legais, o que se explicitou ao Recorrente logo em 2022.
O) Entende-se como questão prejudicial aquela que se suscita num procedimento, que é procedimental e logicamente precedente à tomada de decisão no procedimento, e cuja prática é competência é de outro órgão (cfr. Acórdão Tribunal Central Administrativo Norte proferido a 30 de abril de 2020, no Processo ...71/17.9BÉPNF).
P) A mera propositura de ações contra atos praticados num procedimento e contra atos de procedimentos diversos relativos à mesma instalação não é, obviamente, uma questão prejudicial cuja competência de decisão seja de outro órgão, porque a questão em causa numa ação de impugnação foi já decidida pela administração e, até decisão de um tribunal em sentido contrário – invalidando o ato ou suspendendo a sua eficácia –, vigora e produz efeitos na ordem jurídica, permitindo o prosseguimento do procedimento.
Q) A ser como pretende o Recorrente, seria uma prerrogativa dos particulares suspender todo e qualquer procedimento administrativo, em qualquer fase, bastando-lhe propor ações de impugnação de qualquer ato relativo a uma instalação para obter um efeito paralisador, dispensando até o recurso a providencias cautelares.
TERMOS EM QUE:
Deve ser mantida a sentença recorrida e improceder integralmente o recurso interposto e os pedidos formulados pela Recorrente.
[…]”

*

O Tribunal a quo proferiu despacho pelo qual apreciou a arguida nulidade, assim como determinou a admissão do recurso e a fixação do seu efeito.

*

O Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional.

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Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.

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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], sendo que, de todo o modo, em caso de procedência da pretensão recursiva, o Tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida pois que, ainda que a declare nula, sempre tem de decidir “… o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito.” [Cfr. artigo 149.º, n.º 1 do CPTA], reunidos que estejam os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

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III - FUNDAMENTOS
IIIi - DE FACTO

No âmbito da factualidade considerada pela Sentença recorrida, foram fixados os seguintes factos:
“[…]
D. FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
I. FACTOS PROVADOS.
Com relevo para a decisão da causa, considero indiciariamente provados os seguintes factos:
1) O Requerente exerce a atividade de gestão de resíduos - especificamente, a receção, despoluição e desmantelamento de veículos em fim de vida – num estabelecimento industrial situado na Zona Industrial ..., concelho ... e distrito ... (admitido por acordo: artigos 6º do requerimento inicial e 7º da oposição e conforme documentação referida no ponto seguinte; atendeu-se igualmente ao ponto “3.1 Atividade desenvolvida” do auto de vistoria referido no ponto 7);
2) No dia 02/02/2011 a Entidade Requerida emitiu o alvará de licença para a realização de operações de gestão de resíduos do estabelecimento do Requerente, a qual foi renovada, em 19/02/2016, por um período de cinco anos até 02/02/2021; no dia 02/12/2021 a Entidade Requerida comunicou ao Requerente que a licença era válida até à decisão final proferida no procedimento de vistoria de reexame que iria ser realizado (conforme alvará de licença, renovação de licença e ofício n.º DSA-DLPA 2405/2021 constantes em PetiçãoInicial(...34)DocumentosdaPI(...06)Pág.1de16/10/202318:32:35, Petição Inicial (...34) Documentos da PI (...07) Pág. 1 de 16/10/2023 18:32:35 e Petição Inicial (...34) Documentos da PI (...08) de 16/10/2023 18:32:35, respetivamente);
3) No dia 07/01/2022 a Entidade Requerida comunicou ao Requerente o início da vistoria de reexame para verificação das condições em que é realizada a exploração e atualização das condições da licença de exploração; a visita ao estabelecimento do Requerente realizou-se no dia 05/04/2022; em 05/05/2022 a Entidade Requerida comunicou ao Requerente que tinha detetado desconformidades na vistoria realizada e era sua intenção indeferir o procedimento de reexame, assim como revogar parcialmente o alvará emitido e para o mesmo exercer o seu direito de audição prévia; em anexo a esse ofício juntou o auto de vistoria elaborado aquando da visita ao estabelecimento do Requerente; após pronúncia do Requerente em 17/05/2022, a Entidade Requerida decidiu em 11/08/2022 manter a sua proposta de decisão e determinou a cessação da atividade e desativação do estabelecimento do Requerente no prazo de 60 dias; no dia 04/10/2022 a Entidade Requerida comunicou ao Requerente que, uma vez que tinha ocorrido a caducidade do procedimento de reexame antes de ter sido proferida a decisão final no mesmo, procedeu à anulação administrativa dessa decisão e que tinha iniciado um novo procedimento de reexame (conforme ofício n.º DSA-DLPA 35/2022 constante em Petição Inicial (...34) Documentos da PI(...09) Pág. 1 de 16/10/2023 18:32:35; conforme e-mail de 15/02/2022 constante em Petição Inicial (...34) Documentos da PI (...10) de 16/10/2023 18:32:35; conforme ofício n.º DSA-DLPA 846/2022 e respetivo auto de vistoria constantes em Requerimento (...35) Documentos da PI (...13) de 16/10/2023 18:35:46; conforme requerimento constante em Requerimento (...35) Documentos da PI (...14) de 16/10/2023 18:35:46; conforme despacho aposto no ofício n.º DSA-DLPA 145/2022 constante em Requerimento (...35) Documentos da PI (...15) Pág. 1 de 16/10/2023 18:35:46; conforme ofício n.º DSA-DLPA n.º 1691/2022 constante em Requerimento (...35) Documentos da PI (...16) de 16/10/2023 18:35:46);
4) No dia 18/11/2022 o Requerente submeteu um pedido de alterações ao seu alvará de licenciamento; no dia 10/01/2023 a Entidade Requerida comunicou-lhe da intenção de indeferir o projeto apresentado pelo mesmo dado que as alterações pretendidas não estavam em conformidade com os requisitos estabelecidos na legislação aplicável e que apresentava desconformidades com o princípio da regulação da gestão de resíduos assim como com o princípio da proteção da saúde humana e do ambiente e para o mesmo exercer o seu direito de audição prévia; após pronúncia do Requerente em 06/02/2023, a Entidade Requerida decidiu em 03/03/2023 indeferir o seu pedido de licenciamento; no dia 01/06/2023 o Requerente impugnou judicialmente essa decisão mediante ação administrativa que intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, a qual foi autuada sob o número de processo 286/23.2BEVIS; no dia 27/11/2023 esta ação encontrava-se a tramitar, sem decisão final proferida (conforme formulário de licenciamento constante em Requerimento (...36) Documentos da PI (...20) de 16/10/2023 18:43:03; conforme ofício DSA-DLPA 2199/2022 e respetiva informação em anexo constantes em Requerimento (...36) Documentos da PI (...22) de 16/10/2023 18:43:03; conforme pronúncia constante em Requerimento (...36) Documentos da PI (...23) de 16/10/2023 18:43:03; conforme ofício n.º DSA-DLPA n.º 381/2023 e despacho aposto na respetiva informação em anexo constante em Requerimento (...36) Documentos da PI (...24) de 16/10/2023 18:43:03; conforme petição inicial e formulário de apresentação da mesma constante em Requerimento (...36) Documentos da PI (...25) de 16/10/2023 18:43:03; o Tribunal consultou via MAGISTRATUS a ação n.º 286/23.2BEVIS a fim de confirmar o número de processo e o respetivo estado processual: artigos 5º, n.º 2, alínea c), segunda parte e 412º, n.º 2 do CPC);
5) No dia 11/01/2023 a Entidade Requerida comunicou ao Requerente a nova data da vistoria de reexame e, após a realização da mesma no dia 07/03/2023 e a notificação ao Requerente a fim de exercer o seu direito de audição prévia, a mesma comunicou lhe que tinha ocorrido a caducidade desse procedimento de reexame antes de ter sido proferida decisão final no mesmo, pelo que tinha iniciado um novo procedimento de reexame e agendado a vistoria para o dia 21/06/2023 (conforme ofício n.º DSA-DLPA n.º 42/2023 constante em Requerimento (...35) Documentos da PI (...17) de 16/10/2023 18:35:46; conforme ofício n.º DSA-DLPA n.º 695/2023 constante em Requerimento (...36) Documentos da PI (...26) de 16/10/2023 18:43:03);
6) No dia 09/06/2023 o Requerente requereu a suspensão do procedimento de reexame com fundamento em a ação administrativa n.º 286/23.2BEVIS constituir uma questão prejudicial nos termos do artigo 38º do CPA, tendo a Entidade Requerida indeferido esse pedido em 13/06/2023; no dia 20/06/2023 o Requerente impugnou judicialmente esta decisão mediante ação administrativa que intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, a qual foi autuada sob o número de processo 355/23.9BEVIS; no dia 27/11/2023 esta ação encontrava-se a tramitar, sem decisão final proferida (conforme requerimento constante em Requerimento (...36) Documentos da PI (...27) de 16/10/2023 18:43:03; conforme ofício DSA-DLPA n.º 984/2023 constante em Requerimento (...36) Documentos da PI (...28) de 16/10/2023 18:43:03; conforme petição inicial e formulário de apresentação da mesma constante em ...) Documentos da PI (...29) de 16/10/2023 18:43:03; o Tribunal consultou via MAGISTRATUS a ação n.º 355/23.9BEVIS a fim de confirmar o número de processo e o respetivo estado processual: artigos 5º, n.º 2, alínea c), segunda parte e 412º, n.º 2 do CPC);
7) No dia 21/06/2023 foi realizada a vistoria ao estabelecimento industrial do Requerente tendo sido constatado, nomeadamente, o seguinte:
No que se refere ao estabelecimento, verificou-se que o mesmo não estava de acordo com o projeto que deu origem ao Alvará de licença n.º ...11.... Da comparação do existente no local, com as peças desenhadas constantes do projeto aprovado que deu àquele Alvará de Licença, que se encontra em procedimento de reexame, verificam-se incoerências, nomeadamente, as que se apresentam:
i. Da comparação do existente no local com a peça desenhada designada como “Planta de Implantação da Instalação”, que também consta no ponto 7 -“Implantação” do Alvará referido, cujo pormenor se apresenta na Figura 1:
Verifica-se o seguinte:
1. Inexistência do parque de estacionamento de clientes e respetiva entrada “entrada 1”, que se assinalada na Figura 1, com o n.º 1. No local, existe uma zona verde não prevista, conforme se observa na Fotografia 1.
2. Existência de parques /zonas de armazenagem de VFV (poluidos e despoluidos) em local não previsto para o efeito, e assinalado na Figura 1 com o n.º 2, conforme observado na Fotografia 2. De acordo com a peça desenhada referida, o armazenamento de VFV no exterior, é apenas junto à vedação do estabelecimento e tem representados 10 lugares para VFV. Conforme se observa nas fotografias, o n.º de VFV armazenados é superior ao n.º de lugares representados.
3. A rede de drenagem assinalada na Figura 1, com o n.º 3, não está de acordo com existente, conforme se observa na Fotografia 3. A rede de drenagem, encontra-se no limite do estabelecimento, junto à vedação.
4. Existência de zonas de armazenagem de residuos e/ou peças e componentes, em local não previsto para o efeito e assinalado na Figura 1, com o n.º 4, conforme se observa nas Fotografias 4 e 5.
5. Existência de zonas de armazenagem de residuos em local não previsto para o efeito e assinalado na Figura 1, com o n.º 5, conforme se observa na Fotografia 6.
6. Parte da zona representada como “zona de vegetação”, que se assinala na Figura 1, com o nº 6, se encontrava pavimentada, conforme se observa na Fotografia 7.
7. Inexistência do passeio previsto ao longo do pavilhão, assinalado na Figura 1, com o n.º 7. Verificou-se no local, que parte da zona onde está representado o passeio, se encontra o separador de hidrocarbonetos, conforme se observa na Fotografia 8, e na outra parte, há apenas uma zona pavimentada junto a duas das portas existentes, conforme se observa nas Fotografias 9 e 10.
8. Existência de coberturas não previstas, conforme se observa nas Fotografias 6 e 8 anteriormente apresentadas.
9. Existência de contentor em local não previsto, que se assinala na Figura 1, com o n.º 8, conforme se observa na Fotografia 11.
10. Existência de estruturas e residuos de paletes, em local não previsto, que se assinalada na Figura 1, com o n.º 9, conforme se observa na Fotografia 13
11. Existência de portão, em local não previsto, que se assinalada na Figura 1, com o n.º 10, conforme se observa na Fotografia 14.
12. Existência de zona não impermeabilizada (Pavê) em local não previsto, assinalado na Figura 1 com o n.º 11, conforme se observa na Fotografia 15.
ii. Da comparação do existente no local, com a peça desenhada designada como “Planta do Rés-do-Chão” que também consta no ponto 8 - “Instalações” do Alvará referido, cujo pormenor se apresenta na Figura 2:
Verifica-se o seguinte:
1. Que as zonas designadas como:
a. “Ante câmara de desmantelamento”
b. “Zona de desmantelamento”,
c. “Grupo de prateleiras 1”
d. “Grupo de prateleiras 2”
representadas na peça desenhada, cujo pormenor se apresenta na Figura 2, não estão de acordo com o existente, conforme se observa nas Fotografias 16, 17 e 18
No local, foi verificado que :
a. A “Ante Câmara de Desmantelamento”, não existe, estando no local diversos recipientes de acondicionamento de residuos, bem como, estantes para armazenagem de peças e componentes, conforme se observa na fotografia 16.
b. A “Zona de desmantelamento”, não possui os recipientes para armazenagem dos resíduos indicados na peça desenhada, conforme se observa na fotografia 18, estando estes na “Ante câmara de desmantelamento” conforme se se observa na fotografia 16.
c. Os “Grupo de Prateleiras 1” e “Grupo de Prateleiras 2”, não existem, conforme se observa na Fotografia 17.
d. A existência de prateleiras para diversos utensílios na “Zona de Desmantelamento” não representadas em peça desenhada, conforme se observa na Fotografia 18.
iii. Da comparação do existente no local com a peça desenhada, designada como “Planta da Cave” (que apesar de não constar no Alvará de Licença, consta no projeto que foi apresentado pelo requerente, que foi aprovado e que lhe deu origem), que se apresenta na Figura 3:.
Verifica-se, a inexistência de “Garagem”, “Gabinetes” e “Gabinete médico” conforme representado. Importa referir, também, que a memória descritiva do projeto aprovado, refere o seguinte: “A semi-Cave vai ser compartimentada com uma Zona de garagem, refeitório/cozinha, Zona de gabinete administrativo, gabinete médico e instalações sanitárias”. No entanto, nestes locais, existem diversas estantes para armazenagem de peças e componentes, conforme se observa na fotografias 19 e 20.
(conforme auto de vistoria n.º DSA-DLPA n.º 42/2023 constante em Petição Inicial (...34) Documentos da PI (...05) Pág. 15 de 16/10/2023 18:32:35 e cujo conteúdo aqui se dá como integralmente reproduzido);
8) A Entidade Requerida, no dia 30/06/2023, comunicou ao Requerente o auto de vistoria referido no ponto anterior e das desconformidades detetadas, concedendo-lhe um prazo de dez dias a fim de o mesmo exercer o seu direito de audição prévia à intenção de emitir decisão desfavorável no âmbito do procedimento de reexame e de suspender o alvará de licença pelo prazo de um ano, tendo o Requerente apresentado a sua pronúncia em 14/07/2023 (conforme ofício DSA-DLPA n.º 1144/2023 constante em Requerimento (...36) Documentos da PI (...30) de 16/10/2023 18:43:03; conforme requerimento constante em Requerimento (...36) Documentos da PI (...31) de 16/10/2023 18:43:03);
9) No dia 28/08/2023 a Entidade Requerida decidiu emitir decisão desfavorável ao procedimento de reexame e de suspender o alvará de licença emitido em nome do Requerente pelo prazo de um ano (conforme ofício DSA-DLPA n.º 1600/2023 constante em Petição Inicial (...34) Documentos da PI (...05) Pág. 1 de 16/10/2023 18:32:35);
10) Os fundamentos para essas decisões foram os seguintes:
Assim, não tendo as alegações apresentadas, em sede de audiência prévia de interessados, alterado o projeto de decisão, cumpre informar o seguinte:
1 - Da emissão da decisão desfavorável no âmbito do procedimento de reexame, por não estarem cumpridas as condições necessárias para o efeito, face às desconformidades anteriormente identificadas, a qual se entende assumirem relevo suficiente para a não autorização da exploração provisória (n.º 7 do art.º 73.º do RGGR), já que as mesmas não são passíveis de correção em prazo razoável. Entende-se que, as desconformidades não são passíveis de correção em prazo razoável para que possa ser emitido uma autorização de laboração provisória, nomeadamente porque se verificou:
I – Incumprimento dos requisitos mínimos para a armazenagem e tratamento de VFV constantes do Anexo XIX do DL 152-D/2017, de 11 de dezembro, na sua atual redação, bem como, Requisitos Mínimos de Qualidade a cumprir pelos operadores de tratamento de resíduos no contexto do fluxo especifico dos VFV, estabelecidos pela APA, IP, conforme acima referido, nomeadamente:
i) Armazenagem de componentes e materiais retirados, bem como, a armazenagem de pneus, para além de estar em zona não autorizada (na “cave semi-enterrada”) , a mesma não se encontra dotada e equipada com sistema de recolha e tratamento de águas de limpeza e de derramamentos, dotado de decantadores e separadores de óleos e gorduras, que permita cumprir a legislação nacional relativa a descarga de águas residuais, conforme referido no ponto 4.3 do presente Auto de Vistoria;
ii) Inexistência de área exterior (estacionamento do VFV enquanto o seu proprietário/detentor cumpre os procedimentos de entrega) associada à receção de VFV, conforme referido no ponto 4.3 do presente Auto de Vistoria; De referir que, o DL n.º 152-D/20217, de 11/12, para além de estabelecer os Requisitos Mínimos para Armazenagem e Tratamento de VFV (no Anexo XIX), estabelece também no art.º 100º, que os operadores de tratamento de resíduos que, à data da entrada em vigor daquele decreto-lei, estivessem a operar no âmbito de um fluxo específico de resíduos, eram obrigados, no prazo de 12 meses a contar da definição por parte da Agência Portuguesa do Ambiente I. P. (APA., IP), dos requisitos de qualificação a que se refere o artigo 8.º daquele diploma, ao cumprimento dos mesmos. Os requisitos de qualificação relativos ao fluxo dos VFV foram estabelecidos pela APA, IP em 16 de abril de 2018, pelo que os operadores de tratamento de resíduos no contexto deste fluxo de resíduos, eram obrigados, até 16 de abril de 2019, ao cumprimento dos mesmos. Estes requisitos são designados pela APA, IP, como “ Requisitos Mínimos de Qualidade a cumprir pelos operadores de tratamento de resíduos no contexto do fluxo especifico dos VFV”.
II – Alteração da rede de drenagem que consta do Alvará de Licença nº ...11....
III- Armazenagem de resíduos e de peças e componentes em zona não dotada e equipada com sistema de recolha e tratamento de águas de limpeza e de derramamentos, dotado de decantadores e separadores de óleos e gorduras, e circulação de resíduos e de peças e componentes, por zona não impermeabilizada o que poderá provocar a contaminação de solos e águas subterrâneas.
Note-se que, para dar cumprimento aos requisitos referidos, V. Exas terá que licenciar obras junto da CM de ... (com apresentação de, projeto de arquitetura e respetiva aprovação, projetos de especialidades, respetiva aprovação, execução da obra e posterior pedido de licença de utilização e respetiva obtenção), bem como, licenciar junto da CCDRC, o que não é possível ser efetuado em tempo que se considera razoável.
2. Da suspensão total do Alvará nº ...11..., pelo prazo de 1 ano, nos termos das alíneas. d) e e) do n.º 2 do art.º 81º do RGGR, que se transcrevem:
“d) Desconformidade do estabelecimento ou da instalação com o projeto objeto de licenciamento;”
“e) Incumprimento das condições definidas na licença de exploração ou parecer vinculativo.”
A suspensão de laboração deverá manter-se enquanto o estabelecimento não estiver conforme com os termos em que foi titulado e/ou corrigidas as desconformidades identificadas (n.º 3 do art.º 81º), sem prejuízo da obrigatoriedade de cumprimento de toda a legislação aplicável (nomeadamente, cumprimento dos requisitos de qualificação de fluxos específicos estabelecidos para os VFV no DL 152-D/2017, na sua atual redação). Caso o cumprimento de toda a legislação aplicável pressuponha a alteração do projeto que originou a licença de exploração existente, deverá ser apresentado o correspondente pedido de alteração ou novo pedido de licenciamento, conforme aplicável (nos termos do art.º 79º do RGGR).
Findo o prazo de 1 ano sem que tenha sido solicitada a realização de nova vistoria (ou, sendo, não tenham sido corrigidas todas as desconformidades identificadas), após reposição da instalação nos termos em que foi licenciada ou obtenção de aprovação do projeto de alterações (caso este seja necessário), será iniciado o procedimento de revogação parcial da licença, ao abrigo do artigo 81.º, n.º 4, alínea f) do RGGR, determinando-se, então, as condições a observar para o encerramento do estabelecimento, a serem verificadas em vistoria de conformidade a realizar, nos termos do artigo 64.º do RGGR”.
(conforme ofício referido no ponto anterior e respetiva informação n.º DSA-DLPA n.º 486/2023 e parecer do Chefe de Divisão da DLPA em anexo constantes em Petição Inicial (...34) Documentos da PI (...05) Pág. 4 e 13, respetivamente, de 16/10/2023 18:32:35 e cujo conteúdo aqui se dá como integralmente reproduzido);
II. FACTOS NÃO PROVADOS:
Não se provou, com interesse para a presente decisão, que:
1) O Requerente apresentou alguma reclamação durante a vistoria realizada ao seu estabelecimento industrial no dia 21/06/2023 (no artigo 87º do requerimento inicial o Requerente alega que no auto de vistoria “não existe qualquer menção à posição sobre a procedência ou improcedência de reclamações apresentadas na vistoria, ou sequer se não foram apresentadas reclamações pela ora Requerente em sede de vistoria”, a fim de fundamentar o vício de falta de fundamentação que invoca; ora, perscrutando o auto de vistoria – referido no ponto 7 do probatório - constata-se que o Requerente e «BB» acompanharam a vistoria realizada [ponto 2.1.a.] e que nesse auto não existe qualquer referência a alguma reclamação apresentada durante a sua realização; acresce que o Requerente não requereu que a inquirição das testemunhas que arrolou incidisse sobre este facto [tendo delimitado a inquirição aos artigos 18º a 24º e 169º a 185º do requerimento inicial – conforme Requerimento (...81) Requerimento (...63) Pág. 3 de 21/11/2023 19:30:30]; pelo que, não constando de nenhum elemento dos autos o alegado de modo genérico pelo Requerente, o Tribunal não firmou qualquer convicção sobre o mesmo);
2) As alterações exigidas no estabelecimento do Requerente a fim de ser deferida a vistoria de reexame são insignificantes e de rápida resolução (o Requerente alegou esta circunstância no artigo 20º do requerimento inicial e juntou aos autos um pedido de alterações que efetuou na plataforma SILIAMB ao alvará de licença de que é detentor, tendo referido que da simulação efetuada resultou uma alteração não fundamental; ora, esta simulação nada prova quanto ao alegado porque, por um lado, o Requerente não demonstra nem que os dados introduzidos nessa simulação correspondem à realidade do seu estabelecimento, nem que são os necessários, nem que estão completos – ou seja, não demonstra que houve um controlo posterior por parte da entidade competente relativamente à veracidade, pertinência e completude desses dados – e, por outro lado, o Requerente não estabelece qualquer correspondência entre esses dados que introduziu e as desconformidades detetadas na vistoria realizada, o que impossibilita qualquer convicção com base na simulação efetuada e, daí, o facto não provado);
III. MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DEFACTO:
A convicção do Tribunal baseou-se na posição assumida pelas Partes nos articulados e nos documentos constantes dos autos, conforme referido a propósito de cada ponto do probatório.
[…]”





**
IIIii - DE DIREITO

Está em causa a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, pela qual, com referência ao pedido formulado a final do Requerimento inicial pelo Requerente no sentido do decretamento da providência cautelar de suspensão da eficácia do acto suspendendo praticado pela Presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC), assinado a 28.08.2023 e que lhe foi notificado através do ofício DSA-DLPA 1600/2023, e que lhe seja autorizado a prosseguir com a actividade], veio a julgar pelo indeferimento da providência cautelar requerida, decisão com a qual o mesmo, ora Recorrente, não se conforma.

Para alcançar esse desiderato, o Tribunal a quo apreciou e decidiu, em suma, que não estava verificado o requisito do fumus iuris, isto é, de que as invalidades apontadas pelo Recorrente pudessem ser determinantes da provável procedência da acção principal, e que o pedido formulado pelo Requerente tinha de ser julgado improcedente, encontrando-se assim prejudicado o conhecimento dos demais requisitos inerentes ao decretamento das providências [o periculum in mora e a ponderação dos interesses em presença].

No que é atinente às providências peticionadas pelo Requerente ora Recorrente [uma de natureza conservatória e outra de natureza antecipatória], as mesmas têm subjacente, em suma, a invocação por parte do Requerente de que o acto que lhe foi notificado padece de invalidades determinantes da sua anulabilidade, e em suma, que inexistem fundamentos para que no procedimento de reexame ao Alvará de licença n.º ...11... fosse emitida decisão final desfavorável, assim como, determinada a suspensão da laboração pelo prazo de 1 [um] ano.

Constituindo os recursos jurisdicionais os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, por via dos quais os recorrentes pretendem alterar as sentenças recorridas, nas concretas matérias que os afectem e que sejam alvo da sua sindicância, é necessário e imprescindível que no âmbito das alegações de recurso os recorrentes prossigam de forma clara e objectiva as premissas do silogismo judiciário em que se apoiou a decisão recorrida, por forma a evidenciar os erros em que a mesma incorreu.

Vejamos então.

Em face das Alegações de recurso apresentadas pelo Recorrente, e atentas as respectivas conclusões, vem sustentada a ocorrência da nulidade da Sentença, assim como a ocorrência de vários erros de julgamento em matéria de direito.

Ou seja, não constitui objecto deste recurso jurisdicional a apreciação de qualquer erro de julgamento em matéria de facto, no que se traduz, a final, como assim julgamos, que o Recorrente se conformou com o julgamento prosseguido pelo Tribunal a quo nesse domínio, como assim vazado no probatório da Sentença recorrida, em torno dos factos dados como provados, e não provados.

O Recorrido apresentou Contra alegações, pelas quais, em suma e a final, contrariou, in totum, os argumentos esgrimidos pelo Recorrente, requerendo que o recurso seja julgado improcedente.

Tanto quanto conseguimos apreender, o Recorrente sustenta nas conclusões das suas Alegações de recurso, a ocorrência:

(i) da nulidade da Sentença, por omissão de pronúncia, tendo subjacente o disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC.
(ii) de erro de julgamento em matéria de interpretação e aplicação do direito:
iia) por violação do disposto no artigo 51.º, n.º 3 do CPTA;
iib) por violação do direito de audiência prévia e falta de fundamentação;
iic) por violação do disposto no artigo 73.º, n.ºs 5, 6 e 7 do RGGR.
iid) por se verificarem os requisitos determinantes do decretamento das providências cautelares [o fumus iuris, o periculum in mora, e a ponderação dos interesses], em seu favor.

Neste patamar.

Cumpre então e desde já, apreciar da eventual ocorrência da invocada nulidade da Sentença recorrida, como assim sustentado pelo Recorrente, a que se reporta a alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.

Enquanto Tribunal de recurso e tendo subjacente o disposto no artigo 627.º, n.º 1 do CPC, este TCA Norte conhece dos recursos jurisdicionais interpostos onde devem ser evidenciadas as irregularidades de que a Sentença pode enfermar [que se reportam a nulidades que afectam a Sentença do ponto de vista formal e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade], assim como os erros de julgamento de facto e/ou de direito, que por si são resultantes de desacerto tomado pelo Tribunal na formação da sua convicção em torno da realidade factual, ou da interpretação e aplicação do direito, em termos tais que o decidido não está em correspondência com a realidade fáctica ou normativa.

E por reporte à nulidade imputada à Sentença recorrida, cumpre para aqui extrair o artigo 615.º do CPC, como segue:

Artigo 615.º
Causas de nulidade da sentença
1 - É nula a sentença quando: [sublinhado da autoria deste TCA Norte]
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; [sublinhado da autoria deste TCA Norte]
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; [sublinhado da autoria deste TCA Norte]
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
[…]
4 - As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.”

Visando a apreciação da nulidade imputada pelo Recorrente à Sentença recorrida, no dia 23 de janeiro de 2024, o Mm.º Juíz do Tribunal a quo proferiu o despacho a que se reporta o artigo 617.º, n.º 1 do CPC, nos termos que para aqui se extraem como segue:

Início da transcrição
“[…]
Ora, o Tribunal assumiu expressamente o seu entendimento para não se pronunciar
sobre o alegado pelo Requerente nos artigos 36º a 80º do requerimento inicial (como, aliás, refere o Recorrente no artigo 5º das suas alegações), pelo que, afigura-se que esta situação poderá eventualmente relevar em sede de erro de julgamento (a ser apreciado pelo Tribunal Superior), mas não configurará a omissão de pronúncia prevista no artigo 615º, n.º 1, alínea d), primeira parte do CPC.
“[…]
Fim da transcrição

Neste patamar.

Em sede das questões que lhe cumpria resolver [Cfr. artigos 607.º, n.º 2 e 608.º, ambos do CPC], julgou o Tribunal a quo que tal consistia “… em apreciar se se encontram preenchidos os requisitos para a suspensão da eficácia das decisões proferidas pela Entidade Requerida.”.

Tratando os autos de um processo cautelar, que se caracteriza pela sumariedade da sua instrução, e estando assim em causa a apreciação da tutela cautelar requerida pelo Requerente ora Recorrente, o que importava ser prosseguido, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 120.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA, era saber a final se estavam ou não verificados todos os requisitos, que são de verificação cumulativa, tendentes à adopção das providências cautelares por parte do Tribunal.

E tal foi efectuado, como assim julgamos, no âmbito do julgamento prosseguido pelo Tribunal a quo, nos estritos termos em que o mesmo veio a fundamentar a sua decisão, e é por via dessa fundamentação, de facto e de direito colhida pelo Tribunal a quo, que será apreciado por este Tribunal de recurso sobre se incorreu o mesmo em algum erro de julgamento.

O Recorrente sustenta a ocorrência da invocada nulidade por omissão de pronúncia, alegando tanto que o Tribunal a quo tinha o dever de se pronunciar sobre todas as invalidades por si invocadas no Requerimento inicial, que por si foram apontadas às várias decisões tomadas pelo Recorrido ao longo do procedimento, e não apenas em torno da decisão final corporizada no ofício n.º DAS-DLPA 1600/2023, tendo salientado que o Tribunal a quo “descurou” o disposto no artigo 51.º, n.º 3 do CPTA, e dessa feita que incorreu assim na sustentada nulidade.

Mas como assim julgamos, por aqui não assiste razão alguma ao Recorrente.

Vejamos.

Para além de o Tribunal a quo se ter pronunciado, concretamente sobre o que veio arguido pelo Requerente sob os pontos 36.º a 80.º do seu Requerimento inicial, e no sentido de que as invalidades aí apontadas não relevavam para efeitos da apreciação do mérito dos presentes autos, o julgamento daí tirado não pode então enfermar de nulidade, antes quando muito, de eventual erro de julgamento, o que contende, a final, com consequência de uma ordem processual diversa.

Efectivamente, e como assim sublinhou o próprio Recorrente sob os pontos 5.º, 9.º, 10.º das suas Alegações de recurso, e assim também sob as respectivas conclusões I a VIII, se o Tribunal julgou erradamente e se incorreu num erro de apreciação, não há qualquer omissão de pronúncia.

Portanto, vindo sustentado pelo Recorrente a actuação em erro por parte do Tribunal a quo, tal é substancialmente diferente de uma omissão de pronúncia.

Como assim foi julgado por este TCA Norte, por seu Acórdão datado de 17 de janeiro de 2016, proferido no processo 02279/11.5BEPRT, “[…] Determina o artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 1.º do CPTA, que a nulidade por omissão de pronúncia ocorre “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Este preceito relaciona-se com o comando ínsito na primeira parte do n.º 2 do artigo 608.º do mesmo diploma, segundo o qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, e não todos e cada um dos argumentos/fundamentos apresentados pelas partes, e excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras – cfr. Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão); e os acórdãos, entre outros, do STA de 03.07.2007, rec. 043/07, de 11.9.2007, recurso 059/07, de 10.09.2008, recurso 0812/07, de 28.01.2009, recurso 0667/08, e de 28.10.2009, recurso 098/09 de 17/03/2010, rec. 0964/09).[…]”

Conforme assim tem julgado o Supremo Tribunal Administrativo, e de forma reiterada, só se verifica omissão de pronúncia quando o Tribunal, pura e simplesmente, não chegue a tomar posição sobre qualquer questão que devesse conhecer, inclusivamente, não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento – neste sentido, Cfr. Acórdão datado de 19 de fevereiro de 2014, proferido no recurso 126/14, Acórdão datado de 09 de abril de 2008, proferido no recurso 756/07, e Acórdão datado de 23 de abril de 2008, proferido no recurso 964/06.

O que importa é que o Tribunal a quo decida a questão colocada, e não, que tenha que apreciar todos os fundamentos ou razões que foram invocados para suporte dessa pretensão.

E em torno da questão colocada pelo Tribunal a quo e assim vertida na Sentença recorrida [que pudesse obstar ao conhecimento do mérito do pedido cautelar, e neste domínio, saber se no caso em apreço os requisitos consignados no artigo 120.º, n.ºs 1 e 2, se encontram (ou não) preenchidos, com vista ao decretamento da providência cautelar requerida], tal efectivamente sucedeu.

De maneira que, como assim julgamos, a Sentença recorrida não padece da assacada nulidade, por omissão de pronúncia, fundada na violação do artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC].

Falece assim a invocação da ocorrência da nulidade imputada à Sentença.

Cumpre agora apreciar e decidir sobre a ocorrência dos invocados erros de julgamento em matéria de direito.

Para efeitos do disposto no artigo 112.º, n.º 2 do CPTA, o pedido de providências cautelares e a sua adopção rege-se pela tramitação e segundo os critérios enunciados no Título IV do CPTA, que compreende os artigos 112.º a 134.º deste Código, sendo que sob o artigo 120.º vêm dispostos os critérios para a concessão de tutela cautelar.

E aí se dispõe sob o n.º 1 desse normativo, que as providências cautelares são adoptadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente, situação em que, como dispõe o n.º 2 do mesmo normativo, mesmo ainda na eventualidade de terem sido julgados verificados esses requisitos determinantes, sempre a adopção da providência ou das providências pode ser recusada quando em sede da ponderação dos interesses públicos e privados em presença, for julgado que os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências.

É fundamento para a concessão de tutela cautelar, por via da adopção da/s providência/s requerida/s, que o Tribunal aprecie da ocorrência de periculum in mora [numa das suas duas vertentes], e que indague da aparência do bom direito invocado pelo Requerente, no sentido de aferir sobre se é provável que a pretensão por si formulada, que é causa/fundamento do processo principal, venha a ser julgada procedente, requisitos estes que são de verificação cumulativa, e neste sentido, sendo julgado não verificado um deles, fica prejudicado o conhecimento do outro.

O Tribunal a quo veio a julgar não verificado o requisito do fumus iuris e dada a previsão normativa da sua necessária cumulação, a julgar prejudicada a apreciação dos demais requisitos.

Atenta a natureza das providências cautelares requeridas, e por regra, o Tribunal deve levar a cabo uma apreciação sumária da prova apresentada, sendo que esta tem de ter relevância para a questão decidenda, considerando a violação das normas invocadas e a posição do Requerente, e o confronto entre os seus interesses e os interesses públicos, avaliada em função das circunstâncias de facto concretas alegadas de parte a parte.

Neste patamar.

Tendo enunciado o regime jurídico que julgou ser convocável para efeitos da decisão a proferir, a saber, a apreciação e decisão da requerida tutela cautelar tendo por base a verificação dos requisitos a que se reporta o artigo 120.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA, em face do discurso fundamentador que o Tribunal a quo veio a aportar na Sentença recorrida, decidiu conforme para aqui se extracta o que segue:

Início da transcrição
“[...]
Deste modo, a Entidade Requerida deu início a um terceiro procedimento de reexame, no âmbito do qual procedeu à vistoria do estabelecimento industrial do Requerente no dia 21/06/2023 e, com base nas constatações que observou e enquadramento jurídico que efetuou, decidiu emitir decisão desfavorável ao procedimento de reexame e suspender o alvará de licença emitido em nome do Requerente pelo prazo de um ano.
São estas decisões que o Requerente impugnou na ação administrativa principal e que, neste processo cautelar, pugna pela suspensão da respetiva eficácia de modo a poder prosseguir com a atividade de gestão de resíduos até à decisão proferida nos autos principais.
Vejamos então as ilegalidades apontadas pelo Requerente a essas decisões a fim de aferir da verificação ou não do requisito sob análise.
Assim, em primeiro lugar, o Requerente alega que existem questões prejudiciais nos termos do artigo 38º do CPA que impunham a suspensão da vistoria de reexame até à resolução das mesmas.
[…]
Assim sendo, conclui-se que a pendência das ações administrativas n.º 286/23.2BEVIS e n.º 355/23.9BEVIS não constituem, por um lado, questões prejudiciais para efeitos deste processo cautelar nem, por outro lado, têm relevância quanto à apreciação do requisito sob análise.
E daí que as alegações do Requerente nos artigos 36º a 80º do requerimento inicial – em que imputa diversas ilegalidades ao ato administrativo que indeferiu o seu pedido de suspensão do procedimento administrativo de reexame ao seu estabelecimento industrial – não relevam nem podem ser apreciadas nestes autos, dado que não é esse o ato administrativo impugnado na ação administrativa principal da qual este processo cautelar depende (conforme delimitado expressamente pelo Requerente no artigo 2º do requerimento inicial).
Deste modo – e ultrapassada a questão precedente - cumpre apreciar a questão de falta de fundamentação alegada pelo Requerente.
Em primeiro lugar, o Requerente alega que o auto de vistoria elaborado na sequência da vistoria de reexame realizada não menciona eventuais reclamações apresentadas pelo Requerente.
Ora, o Tribunal deu como não provado que o Requerente tenha apresentado qualquer reclamação durante a vistoria realizada ao seu estabelecimento industrial no dia 21/06/2023, pelo que, recaindo sobre o mesmo o ónus da prova quanto à verificação dos pressupostos da presente providência cautelar (conforme artigo 342º, n.º 1 do Código Civil – doravante CC), essa falta de prova contra o mesmo deve ser valorada e, daí, essa alegação não é suscetível de sustentar um juízo de provável procedência da ação administrativa principal, dado que, não se dando como provado que tenha existido alguma reclamação, nenhuma pronúncia se impunha à Entidade Requerida.
Em segundo lugar, o Requerente alega que o auto de vistoria, por um lado, não identifica as desconformidades que necessitam de correção ou se as mesmas são passíveis de correção e, por outro lado, não fundamenta os motivos pelos quais as desconformidades assumem relevo suficiente para o indeferimento da vistoria de reexame e suspensão do alvará do Requerente.
[…]
Ora, perscrutando a decisão final que foi notificada ao Requerente em conjugação com o auto de vistoria elaborado aquando da visita ao estabelecimento industrial do mesmo (e parcialmente transcritas nos pontos 10 e 7 do probatório, respetivamente), julga-se – de um modo sumário - que a Entidade Requerida referiu de modo claro, expresso e suficiente as razões que a levaram a decidir como decidiu, explicitando todos os elementos mencionados na norma citada.
Assim, a Entidade Requerida referiu expressamente que a “emissão da decisão desfavorável no âmbito do procedimento de reexame” se devia à circunstância de “não estarem cumpridas as condições necessárias para o efeito, face às desconformidades anteriormente identificadas”, e que entendia que essas desconformidades assumiam “relevo suficiente para a não autorização da exploração provisória (…), já que as mesmas não são passíveis de correção em prazo razoável”.
E em seguida, a Entidade Requerida elencou todas “as desconformidades [que] não são passíveis de correção em prazo razoável para que possa ser emitido uma autorização de laboração provisória”, tendo invocado, nomeadamente, o incumprimento dos requisitos mínimos para a armazenagem e tratamento de veículos em fim de vida, assim como requisitos mínimos de qualidade, a alteração da rede de drenagem, o armazenamento indevido de resíduos e de peças e componentes, entre outras.
E todas estas desconformidades encontram-se devidamente sustentadas no auto de vistoria, o qual esmiuçou as incoerências que foram constatadas no estabelecimento industrial do Requerente com o projeto apresentado pelo mesmo e que suportou a emissão do alvará de licença: assim, no auto de vistoria constam diversas plantas especificando as diversas incoerências detetadas, assim como fotografias a cores a comprovar as constatações observadas.
Acresce que igualmente na decisão notificada ao Requerente a Entidade Requerida referiu expressamente que “para dar cumprimento aos requisitos referidos, V. Exas terá que licenciar obras junto da CM de ... (com apresentação de, projeto de arquitetura e respetiva aprovação, projetos de especialidades, respetiva aprovação, execução da obra e posterior pedido de licença de utilização e respetiva obtenção), bem como, licenciar junto da CCDRC, o que não é possível ser efetuado em tempo que se considera razoável”.
Ou seja, além de se comprovar que a Entidade Requerida identificou de forma exaustiva as desconformidades que detetou no estabelecimento industrial do Requerente, as conclusões que daí retirou – no sentido de que não eram suscetíveis de correção em prazo razoável e que assumiam relevo suficiente a fim de não ser viável uma autorização de laboração provisória - assentam na situação objetiva constatada pela mesma, o que se afigura idóneo e suficiente em termos de ponderação e exteriorização do percurso cognoscitivo e valorativo efetuado pela Entidade Requerida e para o Requerente ter conhecimento e compreender porque é que a mesma decidiu como decidiu, possibilitando-o, dessa forma, pôr em causa essas desconformidades e as conclusões retiradas pela Entidade Requerida.
E relativamente a este último aspeto, o Requerente limitou-se a juntar aos autos um pedido de alterações que efetuou na plataforma SILIAMB ao alvará de licença de que é titular, tendo referido que da simulação efetuada resultou uma alteração não fundamental, pelo que – alegou-as alterações no seu estabelecimento seriam insignificantes e de rápida resolução e, daí, suscetíveis de serem corrigidas em prazo razoável.
Ora, o Tribunal deu como não provado essa alegação do Requerente (conforme motivação do facto não provado 2), porque – em suma – dessa simulação nenhuma convicção segura se podia retirar quanto ao alegado pelo mesmo.
De facto, o que relevava era o Requerente alegar e provar – ainda que de modo perfuntório -, que as desconformidades elencadas no auto de vistoria não se verificavam ou eram de rápida resolução com eventuais alterações no estabelecimento industrial do Requerente e, neste aspeto, nada alegou (além da referida simulação que, em termos probatórios, se mostrou irrelevante), pelo que não pôs em causa o juízo efetuado pela Entidade Requerida, não se verificando assim, qualquer erro nos pressupostos de facto ou de direito assumidos pela mesma.
Acresce que o Requerente já submeteu um pedido de alterações ao seu alvará de licenciamento, tendo a Entidade Requerida indeferido o projeto apresentado pelo mesmo dado que as alterações pretendidas não estavam em conformidade com os requisitos estabelecidos na legislação aplicável e que apresentava desconformidades com o princípio da regulação da gestão de resíduos assim como com o princípio da proteção da saúde humana e do ambiente.
Pelo que, apesar desta última decisão ter sido impugnada judicialmente pelo Requerente e ainda não haver decisão final proferida na ação administrativa n.º 286/23.2BEVIS, a existência de litígio quanto às alterações exigidas indicia que as mesmas não serão insignificantes e de fácil resolução.
Improcede, assim, o vício de falta de fundamentação alegado pelo Requerente.
Por último, o Requerente alega que a decisão da Entidade Requerida viola o princípio da proporcionalidade, assim como o princípio implícito da correção das desconformidades que – segundo alega – decorre do NRGR, questões estas que serão apreciadas conjuntamente em virtude da similitude e complementaridade dos argumentos convocáveis para o efeito.
[…]
Ou seja, desde 01/01/2018, que o Requerente já tinha conhecimento e consciência – ou devia ter - que a atividade de tratamento de VFV se encontrava sujeita a novos ou adicionais requisitos e, de acordo com os prazos definidos legalmente, tinha até 16/04/2019 de efetuar as alterações necessárias no seu estabelecimento industrial de modo a adaptar o mesmo aos requisitos de qualificação que foram definidos pela entidade competente para o efeito.
Acresce que já no dia 05/04/2022 foi efetuada uma vistoria de reexame ao seu estabelecimento industrial, no âmbito da qual foram detetadas desconformidades, tendo sido comunicado ao Requerente o respetivo auto de vistoria elaborado para o efeito, o qual identificava e discriminava as mesmas.
Ora, apesar de o Tribunal não ter conhecimento da consagração legal ou criação doutrinal ou jurisprudencial do princípio implícito da correção das desconformidades invocado pelo Requerente (não citando o mesmo, aliás, nenhuma doutrina ou jurisprudência em abono desse seu entendimento), o que nesse âmbito importa realçar é que na data em que foi efetuada a vistoria em causa nestes autos – em 21/06/2023 – já tinham decorrido mais de quatro anos desde a data limite para o Requerente efetuar as alterações exigidas no seu estabelecimento industrial e mais de um ano após desde a especificação das desconformidades em causa pela Entidade Requerida (constantes do auto de vistoria elaborado no dia 05/04/2022).
Pelo que, não é de considerar que haja qualquer violação do direito subjetivo do Requerente em poder corrigir as desconformidades detetadas pela Entidade Requerida, tendo-lhe sido facultadas, atempadamente, as oportunidades necessárias e suficientes para o efeito.
E daí que o Tribunal igualmente não vislumbra qualquer violação do princípio da proporcionalidade nas decisões tomadas pela Entidade Requerida.
[…]
Assim, por um lado, a decisão que indeferiu a vistoria de reexame mostra-se adequada e apropriada face às constatações que foram apuradas na vistoria realizada ao estabelecimento industrial do Requerente, sendo que nestes autos – como se viu – o Requerente não logrou alegar nenhuma circunstância concreta que fosse de molde a pôr em causa as desconformidades detetadas.
Por outro lado, a decisão de não autorizar o Requerente a explorar provisoriamente o seu estabelecimento industrial não se mostra excessiva dado que é necessária para evitar que as desconformidades detetadas não ponham em causa os princípios da proteção da saúde humana e do ambiente previstos, especialmente, nos artigos 4º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 152-D/2017 e 6º do NRGR, estatuindo este último artigo que “Constitui objetivo prioritário da política de resíduos evitar e reduzir os riscos para a saúde humana e para o ambiente, garantindo que a gestão de resíduos seja realizada recorrendo a processos ou métodos que não sejam suscetíveis de gerar efeitos adversos sobre o ambiente, nomeadamente poluição da água, do ar, do solo, afetação da fauna ou da flora, ruído ou odores ou danos em quaisquer locais de interesse e na paisagem”.
Por último, a decisão de suspender o alvará de licença desse estabelecimento pelo prazo de um ano é razoável, no sentido de possibilitar – e se assegurar - que o Requerente efetue as alterações que se impõem no seu estabelecimento industrial de modo que a sua atividade seja exercida de acordo com as normas legais circunstancialmente aplicáveis.
De facto, as decisões proferidas pela Entidade Requerida encontram-se em consonância com o enquadramento jurídico que norteia o exercício da atividade do Requerente, atendendo que o artigo 61º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa consagra que “A iniciativa económica privada exerce-se livremente nos quadros definidos pela Constituição e pela lei e tendo em conta o interesse geral”.
[…]
Deste modo, e com base num juízo perfuntório e sumário e independentemente do que vier a ser decidido na ação administrativa principal (artigo 364º, n.º 4 do CPC), constata-se que não é provável que as ilegalidades apontadas pelo Requerente às decisões em causa nestes autos irão ser de molde à procedência da ação administrativa principal, pelo que o Tribunal dá como não verificado o requisito sob presença.
[...]“
Fim da transcrição

Desde já adiantamos que o que assim foi julgado pelo Tribunal a quo, é para manter, na sua integralidade, pois que não é merecedor da censura jurídica que lhe vem apontada pelo Recorrente.

Depois de fixar a factualidade que entendeu por relevante e com referência aos elementos de prova que a suportam, o Tribunal a quo enunciou as razões que conduziram à improcedência dos pedidos formulados, tendo estribando juridicamente a sua posição, especificando os fundamentos de facto e de direito que de acordo com a sua convicção justificam a decisão, dando assim cumprimento ao disposto no artigo 607.º, n.º 3 do CPC, sendo que, nesse domínio, o Tribunal a quo apreciou e decidiu sobre os termos e pressupostos pelos quais julgou não verificado o fumus iuris, e dessa feita prejudicada a apreciação dos demais requisitos, vindo assim a negar provimento à pretensão deduzida pelo Requerente.

Atentemos pois.

Pelo Decreto-Lei n.º 102-D/2020 de 10 de dezembro [que transpôs para a ordem jurídica nacional a Directiva 2008/98/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de novembro de 2008, relativa aos resíduos, alterada pelo Regulamento (UE) n.º 1357/2014, da Comissão, de 18 de dezembro de 2014, pelo Regulamento (CE) n.º 2017/997, do Conselho, de 8 de junho de 2017, pela Directiva (UE) 2015/1127, da Comissão, de 10 de julho de 2015 e pela Directiva (UE) 2018/851, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2018], foi entre o mais aí disciplinado, aprovado [sob o Anexo I] o novo regime geral da gestão de resíduos, pelo qual foram estabelecidas, designadamente, as medidas de proteção do ambiente e da saúde humana, necessárias para prevenir ou reduzir a produção de resíduos e os impactes adversos decorrentes da produção e gestão de resíduos, tendo em vista a diminuição dos impactes globais da utilização dos recursos e para a melhoria da eficiência dessa utilização.

Em sede dos elencados “Princípios gerais de gestão de resíduos”, o legislador dispôs, entre os mais, sobre o princípio da proteção da saúde humana e do ambiente [Cfr. artigo 6.º], no sentido de que constitui “… objetivo prioritário da política de resíduos evitar e reduzir os riscos para a saúde humana e para o ambiente, garantindo que a gestão de resíduos seja realizada recorrendo a processos ou métodos que não sejam suscetíveis de gerar efeitos adversos sobre o ambiente, nomeadamente poluição da água, do ar, do solo, afetação da fauna ou da flora, ruído ou odores ou danos em quaisquer locais de interesse e na paisagem.”

Ora, como assim resulta do probatório, o Requerente exerce a actividade de gestão de resíduos, para cujo estabelecimento o Requerido emitiu em 02 de fevereiro de 2011 o respectivo Alvará de licença n.º ...11..., a qual foi renovada em 19 de fevereiro de 2016, por um período de cinco anos até 02 de fevereiro de 2021, sendo que no dia 02 de dezembro de 2021, veio a comunicar ao Requerente que a licença era válida até à decisão final proferida no procedimento de vistoria de reexame que iria ser realizado.

Esse procedimento de vistoria de reexame vem regulado no artigo 65.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 102-D/2020, de 10 de dezembro, sendo que em 07 de janeiro de 2022, o Requerido comunicou ao Requerente o início desse procedimento.

Dispõe o artigo 65.º do referido diploma legal, entre o mais, que os estabelecimentos ou instalações de tratamento de resíduos estão sujeitos a reexame global das respetivas condições de exploração após terem decorrido sete anos contados a partir da data de emissão da licença de exploração ou da data de realização da última vistoria de reexame ou de vistoria realizada em sede de atualização da licença de exploração, vistoria essa que deve ter lugar com a antecedência mínima de 60 dias relativamente ao termo do prazo de validade da licença em vigor, e que esse reexame das condições de exploração do estabelecimento ou instalação é efetuado por vistoria cuja data deve ser comunicada pela entidade licenciadora, com a antecedência mínima de 30 dias, ao requerente, ao município territorialmente competente e a todas as entidades públicas que, nos termos da lei, se devem pronunciar sobre as condições de exploração do estabelecimento ou instalação em causa, sendo aplicável o regime das vistorias prévias previsto no artigo 73.º, com as devidas adaptações.

Ou seja, o procedimento de reexame é iniciado oficiosamente, por impulso da Administração, que in casu é a CCDR do Centro.

Como assim também resulta do probatório, esse procedimento de reexame foi iniciado mais do que uma vez, devido ao facto de não ter sido cumprido o prazo de 120 dias, tendo sido declarada, oficiosamente, a caducidade do procedimento, mais do que uma vez.

De todo o modo, na sequência da notificação efectuada ao Requerente em janeiro de 2022, no sentido de que ía ser dado início a esse procedimento, foi efectuada vistoria nos dias 05 de abril de 2022 e 05 de maio de 2022, tendo já então sido detectadas desconformidades no estabelecimento, e decidida a cessação da actividade, do que foi notificado o Requerente, quer em sede de audiência prévia, quer da decisão final tomada, sendo que o Requerido veio posteriormente a notificar o Requerente da anulação dessa decisão, em 04 de outubro de 2022, por ocorrência da caducidade do procedimento, mas de que já tinha sido iniciado novo procedimento, tendo o Requerente, nesse interim, em 18 de novembro de 2022, vindo a submeter ao Requerido um pedido de alterações, na plataforma electrónica, que veio a ser indeferido em 03 de março de 2023, precedendo a audiência prévia do Requerente, e dessa decisão veio o Requerente a interpor acção judicial, que corre termos sob o Processo n.º 286/23.2BEVIS.

Foram corridos termos, e no âmbito do procedimento administrativo iniciado [reiniciado], veio a ser agendada vistoria para o dia 21 de junho de 2023, do que foi notificado o Requerente, tendo em 09 de junho de 2023 vindo a requerer a suspensão do procedimento, invocando para o efeito, face ao disposto no artigo 38.º do CPA, a existência de questão prejudicial, pedido que foi indeferido em 13 de junho de 2023, e quanto ao que o Requerente veio a proceder à sua impugnação judicial, acção que que corre termos sob o Processo n.º 355/23.9BEVIS.

No dia 21 de junho de 2023 foi realizada a vistoria a que se reporta o artigo 65.º, e com observância do disposto no artigo 73.º, ambos do Decreto-Lei n.º 102-D/2020, de 10 de dezembro, tendo os resultados sido registados em auto, designadamente a identificação das desconformidades do estabelecimento detido pelo Requerente, quer com condições legais e regulamentares, quer com o projecto aprovado, sem que o Requerente, presente na vistoria, nada tenha alegado e /ou requerido [Cfr. ponto 1 dos factos não provados e em especial a sua fundamentação], após o que, efectuada a sua audiência prévia em face da perspectivada intenção de ser emitida decisão desfavorável e de ser suspenso o alvará de licença, veio a ser proferida decisão nesse sentido, que está sob impugnação, datada de 28 de agosto de 2023, do que foi notificado o Requerente.

Como assim foi apreciado pelo Requerido no procedimento, porque as verificadas condições do funcionamento do estabelecimento não estavam em conformidade com o projecto objecto de licenciamento, e porque não estavam cumpridas condições definidas na licença [nomeadamente, foi constatado: (i) o incumprimento dos requisitos mínimos para a armazenagem e tratamento de VFV constantes do Anexo XIX do Decreto-Lei n.º 152-D/2017, de 11 de dezembro; (ii) o incumprimento dos requisitos mínimos de qualidade a cumprir pelos operadores de tratamento de resíduos no contexto do fluxo especifico dos VFV, estabelecidos pela APA, IP; (iii) a alteração da rede de drenagem que consta do Alvará de Licença nº ...11...; (iv) a armazenagem de resíduos e de peças e componentes em zona não dotada e equipada com sistema de recolha e tratamento de águas de limpeza e de derramamentos, dotado de decantadores e separadores de óleos e gorduras, e circulação de resíduos e de peças e componentes, por zona não impermeabilizada], e dada a sua monta, tendo sido apreciado que não era possível a sua execução em prazo razoável [Cfr., neste conspecto, o ponto 2 dos factos não provados e em especial a sua fundamentação], o Requerido convocou o disposto no artigo 73.º, n.º 7 do Decreto-Lei n.º 102-D/2020 de 10 de dezembro, apresentando como argumento major, o facto de que para ser dado cumprimento aos requisitos enunciados, que o Requerente tem de iniciar procedimentos junto do Município ..., em sede do regime jurídico do urbanismo e da edificação, que terão de ser aprovados e executada obra em conformidade, assim como o licenciamento junto da própria CCDRC, tendo assim sido determinada a suspensão da licença, nos termos do artigo 81.º do mesmo diploma legal.

O Recorrente vem a patentear sob a conclusão XLIV, conclusivamente, que “A sentença recorrida padece de erro de julgamento na apreciação do requisito do fumus boni iuris imposto pelo artigo 120º, nº 1 do CPTA, por se verificarem vícios que conduzem à anulação do ato suspendendo, […]”.

Tendo subjacente o disposto no artigo 113.º, n.ºs 1, 2 e 3 do CPTA, isto é, de que o processo cautelar depende da causa que tem por objecto a decisão sobre o mérito, e que pode ser intentado como preliminar ou como incidente do processo respectivo, tendo tramitação autónoma em relação ao processo principal, e que a ele será apensado quando a adopção de providências seja requerida antes de proposta a causa principal, é manifesto que em face dessa ordenação processual não pode assistir razão ao Recorrente, sendo certo que, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 120.º, n.º 1 do CPTA, o Tribunal a quo sempre tinha de tomar posição em torno da verificação sumária do requisito atinente ao fumus iuris, que sempre será de todo o modo, matéria a apreciar em sede do mérito da acção principal.

Como assim julgamos, a questão nuclear que incumbia ao Tribunal a quo apreciar nos termos e para efeitos da decisão a proferir, passava pela verificação ou não dos pressupostos determinantes do decretamento das providências cautelares, e para conhecimento do fumus iuris, ou seja, sobre se a decisão suspendenda padecia das invocadas invalidades, o que foi prosseguido pelo Tribunal a quo em termos claros e suficientes.
É de salientar que a matéria em causa requer uma análise factual e jurídica aprofundada, que sempre não cabe levar a cabo num processo cautelar, dada a sumariedade da sua tramitação, principalmente quando no julgamento prosseguido por este TCA Norte, o que importa apreciar e decidir é se ocorre fundamento, como sustentado pelo Recorrente, para dar como verificado, desde logo, o fumus iuris, sem que para tanto seja relevante e/ou se imponha a quantidade de erros de julgamento que nesse domínio e para esse efeito, possam vir sindicados pelo Recorrente.

Em face do que que assim resulta da Sentença proferida, apreciou e decidiu assim o Tribunal a quo, em suma, que o acto suspendendo se afigura indiciariamente legal e válido.

Em torno de ser provável ou não que a acção principal venha a ser julgada procedente, no que consubstancia a apreciação do fumus iuris no âmbito do processo cautelar, tal passava pela apreciação, em sumaria cognitio por parte do Tribunal a quo [tendo subjacente os pressupostos da instrumentalidade, provisoriedade e sumariedade], dos requisitos de tanto determinantes, o que julgamos assim ter sido prosseguido.

Feita a produção de prova, e como assim levado ao probatório, e que não mereceu da parte do Recorrente qualquer reparo, com o que deparamos na Sentença recorrida é que o Tribunal a quo formou uma convicção assente em pressupostos determinantes da formação de uma convicção no sentido do seu indeferimento, e em suma, por ter actuado o Recorrido dentro dos parâmetros de ordem legal a que está vinculado na sua observância.

Ora, em torno da assacada violação do artigo 51.º, n.º 3 do CPTA [que para além de o Recorrente invocar para efeitos da nulidade da Sentença, também o invoca, pelos mesmos pressupostos, em sede de erro de julgamento], a mesma não ocorre, como bem apreciou e decidiu o Tribunal a quo, pois que tendo o Requerente ora Recorrente identificado no Requerimento inicial qual o acto suspendendo por si visado para efeitos do pedido de adopção da tutela cautelar requerida, e sendo esse o acto sob impugnação na acção principal, de que os autos de processo cautelar constituem preliminar/incidente, é patente que para efeitos da apreciação do mérito do pedido cautelar formulado, o que releva é a invocação de factos que sejam determinantes do preenchimento dos requisitos para efeitos do decretamento cautelar, relativamente aos quais, aplicado o direito que ao caso seja convocável, possa ser julgado como provável que o pedido formulado na acção principal venha a ser julgado procedente.

Seja em torno dos factos dados como provados, seja dos factos dados como não provados, não tendo o ora Recorrente colocado em causa esse julgamento, e atento o teor dessa factualidade, e tomando e base o ónus de prova que impendia sobre si [enquanto Requerente], não podemos deixar de referir que o julgamento que foi alcançado pelo Tribunal a quo se encontra devidamente estruturado e com a correcta aplicação dos dispositivos legais que na situação presente são passíveis de ser convocados, nele não detectando qualquer dos imputados erros de julgamento em matéria de direito.

Como assim apreciou e decidiu o Tribunal a quo, o processo cautelar ora em apreço é dependente da causa que tem por objecto a decisão sobre o bem fundado da pretensão – Cfr. artigo 113.º, n.º 1 do CPTA.

Se no âmbito da relação jurídica administrativa que o Requerente tem e mantém com o Recorrido foram sendo proferidas decisões que são/podem ser passíveis de lesar os seus direitos e interesses, e se nessa base, o Requerente deduziu a sua impugnação judicial tendo em vista a obtenção de tutela jurisdicional, caso fosse do seu entendimento dever ser acautelado o efeito útil das decisões judiciais que venham/viessem a ser proferidas nessas acções principais intentadas, estava no livre arbítrio do Requerente, e na sua disponibilidade, atento o pressuposto da sua legitimidade, deitar mão do disposto no artigo 112.º do CPTA, solicitando a adopção da providência ou das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrassem adequadas a assegurar a utilidade das sentenças a proferir nesses processos. Estamos a referir-nos às acções judiciais intentadas pelo Requerente para impugnação de actos que antecederam, no tempo e no procedimento administrativo, o acto suspendendo ora sob apreciação, datado de 28 de agosto de 2023, como assim veio identificado no Requerimento inicial [Cfr. ponto 2.º e doc. ... junto com esse articulado].

E na base do que assim dispõe o artigo 113.º, n.ºs 1 e 4 do CPTA, estando o processo cautelar dependente da causa principal, caso o Requerente se tivesse autodeterminado por requerer a adopção de providência cautelar visando o primeiro dos actos por si impugnados, e que os tem como “questões prejudiciais”, sempre poderia em momento ulterior, proceder à substituição ou ampliação do pedido, com fundamento em alteração superveniente dos pressupostos de facto ou de direito, com oferecimento de novos meios de prova, de modo a que nesse tempo, o juiz atendesse à evolução ocorrida para conceder a providência adequada à situação existente no momento em que se pronuncia.

Se bem que o Recorrente sustenta a ocorrência de erros de julgamento em matéria de direito, a alegação que vem a ser por si empreendida e como assim vertida nas respectivas conclusões, designadamente em torno da omissão e falta de fundamentação do acto administrativo, não chega a final a ter compaginação alguma com o que está patenteado na Sentença recorrida.

Como assim resulta da instrução dos autos, o Requerente não peticionou a adopção de tutela cautelar visando os actos praticados pelo Requerido e que são objecto de acções judiciais próprias e com tramitação autónoma, sendo que, se no momento em que decide requerê-la [é do que tratam estes autos] e após apreciação do mérito por parte do Tribunal a quo, este vem a julgar pela inverificação do critério da aparência do direito, e não padecendo esse julgamento de qualquer erro que seja identificável por este Tribunal de recurso, na base do que vem sustentado, tem de ser mantido o assim julgado, pois que com acerto.

O facto de o Requerente ora Recorrente ter considerado existirem invalidades nos actos administrativos previamente praticados pelo Requerido ora Recorrido, e que desembocaram no acto final sob impugnação nos autos, essas invalidades são para ser conhecidas no tempo, modo e processos próprios, não podendo ter-se como questões prejudiciais para efeitos do disposto no artigo 38.º do CPA, pois que o que aqui está em causa apreciar é sobre se existe ou não fundamento para lhe ser concedida tutela cautelar, face a uma decisão proferida pela entidade administrativa para o efeito competente [a Presidente do Requerido CCDRC, que quanto à sua competência para a prática do acto e conforme assim alegado sob o ponto 78.º da Contestação, nada referiu o Recorrente em torno da publicação do Despacho n.º 4243/2023, na 2.ª série do DR, n.º 68], num concreto procedimento disciplinado pelo legislador como de impulso necessário por parte da Administração.

A tutela cautelar que fosse devida pedir e eventualmente ser-lhe concedida por força dos designados actos administrativos prévios tem o seu tempo de pedido, e haveria de visar o acautelamento do efeito útil da Sentença a proferir nos autos a que dissessem respeito.

Com efeito, não estamos assim colocados perante uma questão que tenha sido suscitada no procedimento e que, sem estar decidida a sua resolução, tal prejudique ou impeça que seja proferida a decisão final no procedimento.

Em conformidade com o que apreciou e decidiu este TCA Norte, por seu Acórdão datado de 19 de dezembro de 2014, proferido no Processo n.º 0555/10.1BECBR, “[…] A possibilidade de manter em funcionamento um estabelecimento comercial, sustando a ordem de encerramento, pela circunstância de se ter pedido o licenciamento seria a subversão do imperativo legal do licenciamento, a imposição de uma situação de facto consumado imposta por parte do particular e em prejuízo do interesse público subjacente à necessidade de licenciamento.
Sobretudo quando, como é o caso, o interesse público em causa se prende com a salvaguarda da saúde e segurança das pessoas.
[…]”

Acompanhando a fundamentação vertida naquele Acórdão deste TCA Norte e cujo trecho aqui tem plena aplicação, como assim decorre do acto suspendendo, o funcionamento do espaço licenciado pelo Alvará n.º 04/2011/CCDRC, está à margem da lei, numa área sensível como é o ambiente, não tendo condições para se manter em funcionamento, tendo sido apreciado e decidido pelo Requerido como assim vertido na acta da vistoria realizada em 21 de junho de 2023, quais os termos e os pressupostos que são determinantes quer da decisão desfavorável proferida em sede do procedimento de reexame, quer da suspensão do funcionamento que era permitida pelo Alvará em causa, o que tudo foi prosseguido nos termos e para efeitos, entre o mais, do disposto nos artigos 65.º, 73.º e 81.º, todos do RGGR.

A invocação por parte do Recorrente, em suma, de que o pedido de alteração que introduziu no sistema, sendo deferido, iria condicionar toda a ulterior actuação do Requerido no âmbito e para efeitos da vistoria final a realizar não pode merecer qualquer acolhimento da nossa parte, desde logo porque sobre essa temática se pronunciou o Tribunal a quo, como assim vertido sob o ponto 2 dos factos não provados, julgamento esse que não vem posto em causa pelo Recorrente.

Como assim fundamentou o Tribunal a quo, julgamento que acompanhamos, o pedido apresentado pelo Requerente na plataforma SILIAMB, nada prova em torno de que as alterações a efectuar no estabelecimento fossem de pequena monta, insignificantes e de rápida resolução, e mais ainda, o Requerente não demonstra nem que os dados introduzidos nessa simulação correspondam à realidade do seu estabelecimento, nem que sejam os necessários, ou que estão completos, nem estabelece qualquer correspondência entre esses dados que introduziu e as desconformidades detectadas na vistoria realizada em 21 de junho de 2023, aliás, nas vistorias que haviam sido realizadas nos doas 05 de abril e 05 de maio de 2022 [Cfr. ponto 3 do probatório].

Aliás, como assim resulta do probatório [Cfr. ponto 4 do probatório – factos provados], esse pedido foi indeferido pelo Requerido, com fundamentação que julgamos ser clara, congruente e suficiente, e do que foi legal e regularmente notificado o Requerente, e ainda que fosse entendido dever ser observado o direito de audiência prévia do Requerente naquele domínio, não dilucidamos como e por que termos e pressupostos é que outra haveria de ser a decisão do Requerido, que não de indeferimento.

Não pode traduzir pretensão do Recorrente, que a entidade Requerida ora Recorrida se desvie do campo de actuação vinculado que para si decorre do disposto no RGGR, nomeadamente em sede da realização do procedimento de reexame a que se reporta o seu artigo 65.º.

Como assim vem sustentado pelo Recorrido, é certo que em sede da pretensão recursiva deduzida, o que vem a fazer o Recorrente, em suma, é a reiterar, agora nesta instância de recurso, os argumentos que já havia deixado expendido aquando da apresentação do Requerimento inicial, o que foi cabalmente apreciado pelo Tribunal a quo, em termos que aqui confirmamos.

A lei e as normas regulamentares que o Requerido [assim como o Recorrente] deve observar, sendo um limite à sua actuação, são sobretudo o fundamento da sua acção.

O princípio da proporcionalidade está necessariamente conexionado com outros princípios, como a legalidade, a igualdade e a justiça, também previstos no artigo 266.º, n.º 2 da CRP, e aponta para o princípio mais abrangente da juridicidade da Administração, sendo que os mesmos só relevam, em princípio, na actividade discricionária da Administração, já que no campo vinculado o que importa ver é se a legalidade foi respeitada.

Em suma, apreciou e decidiu o Tribunal a quo, em termos que não merecem qualquer reparo por este Tribunal de recurso

Em conformidade com o que assim apreciou e decidiu o Tribunal a quo, o acto suspendendo está devidamente fundamentado, em termos de matéria de facto e de direito, o que possibilitou/possibilitava ao Requerente ora Recorrente, enquanto seu imediato destinatário, saber e conhecer qual o itinerário cognoscitivo prosseguido pela autora do acto administrativo que vem a emitir decisão final desfavorável e a suspender o Alvará n.º 04/2011/CCDRC.

De maneira que, tem assim de improceder a pretensão recursiva do Recorrente, e de ser confirmada a Sentença recorrida.

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E assim formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Processo cautelar; Juízo perfunctório; Tutela jurisdicional efectiva; Requisitos determinantes do decretamento das providências.

1 – Nos termos do artigo 120.º, n.º 1 do CPTA, as providências cautelares são adoptadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente, situação em que, como dispõe o n.º 2 deste normativo, mesmo ainda na eventualidade de terem sido julgados verificados esses requisitos determinantes, sempre a adopção das providências pode ser recusada quando em sede da ponderação dos interesses públicos e privados em presença, for julgado que os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências.

2 - A existência de perigosidade [seja na vertente do receio da constituição de uma situação de facto consumado, seja na vertente da produção de prejuízos de difícil reparação], e da aparência do bom direito [enquanto avaliação sumária da probabilidade de existência do direito invocado] para os interesses que os Requerentes visam assegurar no processo principal, constituem requisitos determinantes para efeitos de ser apreciada a providência requerida, recaindo sempre sobre eles o ónus de fazer a prova sumária desses requisitos.

3 - Para o decretamento de uma providência cautelar têm de ser invocados, e recolhidos pelo Tribunal a quo, em termos de matéria de facto, indícios suficientes da verosimilhança do direito a ver suspensa a eficácia de um acto administrativo que autoriza e licencia uma operação urbanística, pois só perante a existência de tais elementos de prova e pertinente enquadramento será possível ao julgador formular um juízo positivo a respeito da aparência do direito invocado.

4 - O juízo que cabe levar a cabo no artigo 120.º, n.º 1 do CPTA, não pode ser misturado com o juízo que deve ser feito a título principal, visto tratar-se dum juízo perfunctório, sumário, tal como é reclamado pelo legislador em termos cautelares, por constituir um juízo que é formulado sob reserva de se poder chegar a uma conclusão diversa em sede do processo principal.

5 - A lei que o Requerido deve observar, sendo um limite à sua actuação, é sobretudo o fundamento da sua acção.

6 - O princípio da proporcionalidade está necessariamente conexionado com outros princípios, como a legalidade, a igualdade e a justiça, também previstos no artigo 266.º, n.º 2 da CRP, e aponta para o princípio mais abrangente da juridicidade da Administração, sendo que os mesmos só relevam, em princípio, na actividade discricionária da Administração, já que no campo vinculado o que importa ver é se a legalidade foi respeitada.


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IV – DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Subsecção Administrativa Comum da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, Acordam em conferência em NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto pelo Recorrente «AA», mantendo a Sentença recorrida.




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Custas a cargo do Recorrente – Cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.

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Notifique.
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Porto, 01 de março de 2024.


Paulo Ferreira de Magalhães, relator
Celestina Caeiro Castanheira
Luís Migueis Garcia