Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00328/23.1BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/22/2024
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Rosário Pais
Descritores:RAC;
SEGURANÇA SOCIAL; REVERSÃO;
PRESCRIÇÃO; FALTA DE CITAÇÃO;
Sumário:
I – Não pode rejeitar-se o recurso se, efetuada a notificação prevista no nº 3 do artigo 639º do Código de Processo Civil, o Recorrente apresentou novas conclusões sintetizadas.

II – Por força do artigo 641º do Código de Processo Civil, o requerimento de interposição de recurso é indeferido quando [cfr. nº 2, alínea b)] «Não contenha ou junte a alegação do recorrente ou quando esta não tenha conclusões.». Verificando-se que, no caso, o recurso foi acompanhado de alegações e conclusões, não havia, nem há, motivo para o rejeitar com este fundamento.

III - Uma vez que os documentos referidos pelo Recorrente não demonstram os factos que pretende acrescentar ao probatório, não é possível atender à sua pretensão nesta parte.

IV - Nos termos da alínea e) do artigo 97º-A, do Código de Procedimento e de Processo Tributário «No contencioso associado à execução fiscal, o valor correspondente ao montante da dívida exequenda ou da parte restante, quando haja anulação parcial, exceto nos casos de compensação, penhora ou venda de bens ou direitos, em que corresponde ao valor dos mesmos, se inferior».

V - O montante da dívida exequenda é o que resulta das certidões de dívida, como se alcança, designadamente, do teor dos artigos 169º, nº 6, 199º, nº 6, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

VI - o cumprimento do nº 2 do artigo 192º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ou seja, a remessa de nova carta de citação contendo a advertência prevista no nº 3, do mesmo artigo, é conditio sine qua non para que opere a presunção de citação do destinatário, nos casos em que também essa carta seja devolvida ao remetente.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


1. RELATÓRIO
1.1. O IGFSS, I.P - Secção de Processo Executivo de ..., exequente nos presentes autos, vem recorrer da sentença proferida em 07-11-2023 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, pela qual foi julgada procedente a reclamação deduzida por «AA» contra a decisão do OEF proferida no âmbito dos PEFs nºs ...99 e apensos (...02, ...58, ...66, ...43, ...51, ...00 e ...18), instaurados originalmente contra a sociedade “[SCom01...] , UNIPESSOAL, LDA”, para cobrança coerciva de dívidas, contra si revertidas, referentes a contribuições e cotizações dos períodos compreendidos entre 03/2009 e 08/2010, no montante total de 18.552,47 €.

1.2. A Recorrente terminou as suas alegações formulando as seguintes conclusões aperfeiçoadas:
«I. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida no Processo n.º 328/23.1BEBRG, que julgou procedente a reclamação apresentada pelo Reclamante/ora Recorrido, «AA», NIF ............, e declarou prescritas as dívidas exequendas dos PEF ...99 e apensos, atribuindo o valor da acção de 18.552,47€
II. Quanto ao valor da acção, o ora Recorrente discorda do valor fixado pelo Tribunal a quo, por considerar que não foi efetuada uma interpretação correta da al) e) do n.º 1 do art 97-A do CPPT, devendo ser fixado o montante da quantia exequenda correspondente a 13.644,08€.
III. Quanto à decisão proferida pelo Tribunal a quo, entende o Recorrente, com o devido respeito que é devido, padece de erro de julgamento ao desconsiderar para a decisão, factos relevantes constantes dos autos, que demonstram e provam que não existiu a (invocada) falta de citação, na qual se traduz na inexistência pura do ato de citação.
IV. Dos factos provados da decisão judicial foi olvidado várias informações contidas na carta de citação (reversão) e no aviso de receção, os quais, com o devido respeito do entendimento sufragado na douta sentença, devem ser aditados para a boa decisão da causa.
V. Atenta à prova produzida nos autos, deve ser aditado novo facto aos já dados como provados, o qual se encontra ínsito no processo de execução fiscal - a existência de uma (outra) II via de citação (reversão) com aviso de receção, para o processo em causa, de 2013-10-03, cuja devolução ao ora Recorrente ocorreu em 2013- 10-15.
VI. Resultando em três tentativas de citação ao ora Recorrido, sendo duas de 2.ª via da citação (reversão), devidamente identificadas, cujos formalismos foram cumpridos.
VII. Assim, ao subsumir tais factos constitutivos ao Direito, a decisão proferida é alterada (Cfr. n.º 1 do art.º 662.º do CPC ex vi al. e) do art 2.º do CPPT), não existindo falta de citação e consequentemente a dívida não se encontra prescrita.
VIII. Destarte, há erro de julgamento sobre a não relevância desses factos, violando assim, o disposto no n.º 2 e 3 do art 192º do CPPT .
IX. E a consequente omissão de pronúncia sobre questões de facto que o Tribunal de primeira instância não apreciou e deveria ter apreciado, o que constitui, também, nulidade da sentença, nos termos do artigo 125.º, n.º 1, do CPPT.
Termos em que, com mui douto suprimento de V.ª Ex.ªs, deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogada a sentença recorrida, com o que se fará a devida e habitual JUSTIÇA.».

1.3. A Recorrida apresentou contra-alegações que concluiu nos termos seguintes:
«I. O Recorrente interpõe recurso da decisão proferida pelo Tribunal a quo, porquanto não se conforma com a mesma.
II. Porém, a impugnação por si levada a cabo, limita-se, única e exclusivamente à factualidade constante do ponto A) da matéria de facto dada como provada na Sentença proferida pelo Tribunal a quo, e que respeita ao valor da causa.
III. Salvo melhor opinião em sentido divergente, não resulta que o Recorrente tenha impugnado, com o recurso apresentado, os pontos D), G) e K), dos factos dados como provados pela Sentença proferida pelo Tribunal a quo.
IV. Não podemos perder que vista que, com a apresentação de um recurso, tem-se em vista um reexame pelo Tribunal Superior da decisão recorrida, tendo em vista, primordialmente, reparar erros de julgamento.
V. Daí que, as alegações de recurso se possam dividir em 2 (dois) segmentos: por um lado, o corpo das alegações – onde se expõem os fundamentos do recurso –, e por outro lado, as conclusões – as quais deverão condensar, as questões a resolver pelo Tribunal ad quem.
VI. Daí que o recorrente tenha de especificar o quadro que entende ter sido violado, por referência ao artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, isto em sede de impugnação de direito.
VII. Já quanto à impugnação de facto, esta deve conter a indicação dos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados e a decisão que, no entender do recorrente, deva ser proferida sobre eles (cfr. alíneas a) e c), do n.º 1, do artigo640.º, do CPC, assim se definindo as questões a resolver perante o Tribunal ad quem, conforme o disposto no artigo 635.º, n.º 2 a 4, do CPC).
VIII. Ora, aqui chegados, entendemos que as conclusões formuladas em sede recursória pelo Recorrente não cumprem o quadro legal supra citado, mais não sendo do que uma mera repetição do corpo das alegações.
IX. E a mera repetição nas conclusões das alegações de recurso equivale ao vício de falta de conclusões, determinativo, por isso, da imediata rejeição da apelação.
X. Convocando o quadro legal vigente e aplicando-o ao caso sub judice, impõe que seja recusado o recurso apresentado pelo Recorrente (vide artigo 641.º, n.º 2, alínea b), parte final, do CPC).
XI. Tal é o que mui respeitosamente se requer a V.ªs Ex.ª, Exmos.(as) Senhores(as) Juízes Desembargadores.
Sem prescindir e caso assim se não entenda,
XII. Não poderemos deixar de salientar que o Recorrente não cumpriu com o ónus de impugnação especificada, mormente no que concerne às als. D), G) e K), dos factos dados como provados na Sentença pelo Tribunal a quo.
XIII. O Recorrente limitou-se a dar a sua visão de como a prova deveria ter sido apreciada, ponderada e sopesada, o que afronta contra as disposições legais dos artigos 607.º, n.º 5, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, ambos do CPC.
XIV. Veja-se que o artigo 640.º, do CPC é claro no seu n.º 1, als. a), b) e c), quando salienta que o recorrente, quando impugne a decisão sobre e matéria de facto, deva especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considere incorrectamente julgados, os meios probatórios que imponham decisão diversa da recorrida e, bem assim, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
XV. E não cumprindo o Recorrente este ónus – apelidado de ónus primário – impõe-se a rejeição imediata do seu recurso, nos termos do artigo 640.º, n.º 1, proémio, e n.º 2, alínea a), do mesmo artigo, não havendo qualquer convite a hipotético aperfeiçoamento.
XVI. Por tudo isto, e uma vez mais, desde já se requer seja rejeitado o recurso apresentado pelo Recorrente, com as devidas e legais consequências.
XVII. No mais, a Sentença proferida não merece qualquer reparo, uma vez que, além de não ter ocorrido qualquer citação pessoal do Recorrido, não existe qualquer causa que interrompa e/ou suspenda os prazos prescricionais em apreço nos autos, motivo pelo qual as dívidas dos respectivos processos se encontram prescritas, conforme declarado pelo Tribunal a quo.
XVIII. E a ser assim, sem mais, a prescrição declarada foi com base na prova documental junta aos autos, não tendo sido apresenta qualquer outra por parte do Recorrente que permita abalá-la.
XIX. Nestes termos, e atendendo a que a sentença proferida pelo Tribunal a quo é exímia na sua elaboração e na análise de facto e subsunção de direito, deverá a mesma ser mantida na íntegra.
XX. O que se requer a V.ªs Ex.ªs, Mmos.(as) Juízes Desembargadores(as), fazendo assim uma inteira e sã Justiça.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V.ªs Ex.ªs mui doutamente suprirão, deve o recurso interposto da decisão final ser julgado integralmente improcedente, por não provado, mantendo-se e confirmando-se a Sentença proferida pelo Tribunal a quo na sua totalidade,
FAZENDO-SE, ASSIM, A HABITUAL E SÃ JUSTIÇA!».


1.4. O DMMP junto deste TCAN teve vista dos autos e emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso por entender que: «3 – (…) não tendo sido suscitadas questões novas em sede de recurso, e estando apenas em causa a leitura atenta dos documentos respeitantes aos registos efectuados no procedimento tributário e a interpretação das regras relativas ao instituto da prescrição à luz dos factos que daí devem ser extraídos, por entendermos que a posição constante da argumentação do IGFSS I.P. – Seção de Processo Executivo de ..., na sua empenhada alegação de recurso, está mais conforme à legislação aplicável e ainda por concordarmos com o teor do parecer já produzido nos autos pelo Ministério Público em primeira instância, acompanhamos, com a devida vénia, o conteúdo das respectivas fundamentações, e limitamo-nos, por razões de celeridade e de economia processual, a remeter para o respectivo conteúdo e sentido
*
Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 36º, nº 2, do CPTA, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.
*

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR
Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do Recorrente, cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento quanto ao valor do processo e à (falta de) citação do revertido.
Previamente, porém, importa analisar se, como defende o Recorrido nas suas contra-alegações, o recurso deve ser rejeitado, em virtude de as conclusões serem mera repetição das alegações e por não ter sido observado o ónus de impugnação previsto no artigo 640º do Código de Processo Civil quanto à matéria de facto.

3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DE FACTO
3.1.1. Factualidade assente em 1ª instância
A decisão recorrida contém a seguinte fundamentação de facto:
«Com relevo para a decisão a proferir, consideram-se provados os seguintes factos:
A) Corre termos no OEF o PEF nº ...99 e apensos (...02, ...58, ...66, ...43, ...51, ...00 e ...18), instaurado contra a sociedade devedora originária “[SCom01...] , UNIPESSOAL, LDA”, para cobrança coerciva de dívidas, contra si revertidas, referentes a contribuições e cotizações relativas aos períodos compreendidos entre 03/2009 e 08/2010, no montante total exequendo de 18.552,47 (cfr. fls.121/122 do PEF inserto a fls.65/386 SITAF);
B) Em 21-02-2012 foi proferido pelo OEF no âmbito do PEF m.i. em A) documento designado “PROJECTO – REVERSÃO” – (cfr. fls.89/92 do PEF inserto a fls.65/386 SITAF e cujo teor se dá por reproduzido);
C) Em 21-02-2012 o OEF emitiu no âmbito do PEF m.i em A) documento designado “NOTIFICAÇÃO AUDIÇÃO PRÉVIA” dirigido ao Reclamante para a morada “..., ..., ... ..., por via postal registada com aviso de recepção (cfr. fls.82/86 do PEF inserto a fls.65/386 SITAF);
D) O documento referido supra foi devolvido ao OEF com a menção “Objecto não reclamado” (cfr. página 91 do PEF inserto a fls.65/386 SITAF);
E) Em 23-04-2012 o OEF proferiu no âmbito do PEF m.i. em A) “DESPACHO DE REVERSÃO” (cfr. fls.97/101 do PEF inserto a fls.65/386 SITAF e cujo teor se dá por reproduzido);
F) Em 23-04-2012 o OEF emitiu no âmbito do PEF referido em A) documento designado “CITAÇÃO (REVERSÃO)” dirigido ao Reclamante e remetido por via postal registada com aviso de recepção (cfr. fls. 95 a 103v do PEF inserto a fls.65/386 SITAF e cujo teor se dá por reproduzido);
G) Em 30-04-2012, o documento referido supra foi devolvido com a menção “Objecto não reclamado” (cfr. página 231 do documento inserto a fls.65/386 SITAF e cujo teor se dá por reproduzido);
H) Em 05-03-2013 o OEF emitiu no âmbito do PEF referido em A) documento designado “CITAÇÃO (REVERSÃO)” dirigido ao Reclamante para a morada “AP ......... ...” e remetido por via postal registada com aviso de recepção (cfr. fls. 110/111 do PEF inserto a fls.65/386 SITAF e cujo teor se dá por reproduzido);
I) Em 07-03-2013, o documento referido supra foi devolvido com a menção “APARTADO ENCERRADO” (cfr. 273 do documento inserto a fls.65/386 SITAF e cujo teor se dá por reproduzido);
J) Em 28-05-2013 o OEF emitiu no âmbito do PEF referido em A) 2ª via do documento designado “CITAÇÃO (REVERSÃO)” dirigido ao Reclamante para a morada “LUG ... ...” e remetido por via postal registada com aviso de recepção (cfr. fls. 125/131 do PEF inserto a fls.65/386 SITAF e cujo teor se dá por reproduzido);
K) Em 17-06-2013, o documento referido supra foi devolvido com as menções “Não atendeu” e “Objecto não reclamado”, tendo sido deixado aviso pelo distribuidor postal às 10h49 do dia 04-06-2013 (cfr. fls.131 do PEF inserto a fls.65/386 SITAF e cujo teor se dá por reproduzido);
L) Em 16-12-2022 o Reclamante apresentou juntos dos serviços do OEF requerimento por via do qual requereu a declaração de falta de citação e de prescrição do PEF m.i. em A) (cfr. fls.144/147 do PEF inserto a fls.389/482 SITAF e cujo teor se dá por reproduzido);
M) Em 02-01-2023, o OEF remeteu ao Sr. Mandatário do Reclamante, email com o seguinte teor (cfr. fls.157 do PEF inserto a fls.389/482 SITAF e cujo teor se dá por reproduzido): “(…)
[imagem no documento original]
(…)”.
N) Em 12-01-2023 a PI da presente acção foi remetida por correio electrónico ao OEF (cfr. fls.158 do PEF inserto a fls.389/482 SITAF).
Inexistem outros factos provados ou não provados com interesse para a decisão a proferir.
*
Motivação
A decisão da matéria de facto dada como provada foi efectuada com base no exame e análise dos documentos e estudo do PEF incorporado no SITAF.
Foi da análise de toda a prova assim enunciada que, em conjugação com as regras da experiência comum, se sedimentou a convicção do Tribunal quanto aos factos dados como provados e não provados – cfr. artigo 74º LGT, 76º nº 1 LGT e artigo 362º e ss do CC.».

3.2. DE DIREITO
3.2.1. Da rejeição do recurso
Nas suas contra-alegações o Recorrido entende que o recurso deve ser rejeitado quer por as conclusões reproduzirem o teor das alegações, quer por não ser observado o disposto no artigo 640º do Código de Processo Civil no que respeita à impugnação dos factos elencados nos pontos D), G) e K).
De facto, as conclusões apresentadas com as alegações de recurso não observavam o disposto no artigo 639º do Código de Processo Civil, por serem prolixas e reproduzirem o teor das alegações.
Determina o nº 3 do artigo 639º do Código de Processo Civil que «Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afetada.».
E assim foi feito, por despacho de 2.02.2024, tendo o Recorrente apresentado as conclusões sintetizadas que já constam do relatório supra.
Nesta circunstância, já não se verifica o obstáculo ao conhecimento do recurso apontado pelo Recorrido.
Por outro lado, dispõe o artigo 641º que o requerimento de interposição de recurso é indeferido quando [cfr. nº 2, alínea b)] «Não contenha ou junte a alegação do recorrente ou quando esta não tenha conclusões.». Uma vez que, no caso, o recurso foi acompanhado de alegações e conclusões, não havia, nem há, motivo para o rejeitar com este fundamento.

3.2.2. Do recurso em matéria de facto
O recurso da decisão em matéria de facto, faz impender sobre o Recorrente a observância de formalidades que não podem ser dispensadas.
Assim, de acordo com o disposto no artigo 640º, nº 1 do CPC, “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.
Como refere Abrantes Geraldes a propósito desta norma (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2018, 5ª edição, a págs.165) sempre que o recurso envolva a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, «a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; b) Deve ainda especificar, na motivação os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão quanto a cada um dos factos; c) Relativamente a pontos da decisão da matéria de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exatidão as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos (…); e) O recorrente deixará expressa a decisão que, em seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem na linha do reforço do ónus de alegação por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente (…)».
Esclarece ainda o mesmo autor (cfr. obra citada, pág. 168 e 169) que a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se em alguma das seguintes situações:
«a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (arts. 635º, nº 4, e 641º nº 2, a. b);
b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art. 640º, nº 1, al. a));
c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escritos, etc);
d) Falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação.».
Isto posto, vejamos se pode atendido o recurso quanto à matéria de facto.

3.2.2.1. Quanto ao valor do processo
Relativamente ao valor do processo, o Recorrente entende que o ponto A) dos factos provados deve ser alterado, por forma a que dele constem discriminados os montantes da dívida revertida e do acrescido, pois o valor da causa deve ser fixado, apenas, no da quantia exequenda. Mais esclarece que esse facto resulta de fls.121/122 do PEF inserto a pág. 65, Doc sitaf nº 006780200, de 20/02/2023.
Compulsado tal documento, constata-se que a fls. 121 consta a certidão de dívida nº ....82/2010, sendo que a página 122 se encontra totalmente em branco.
Assim, uma vez que os documentos referidos pelo Recorrente não demonstram o facto que pretende acrescentar ao ponto A) do probatório, não é possível atender à sua pretensão nesta parte.

3.2.2.2. Quanto à citação
O Recorrente não sustenta que a matéria factual vertida nos pontos D), G) e K) se encontra incorretamente julgada, mas, antes, que «Atenta à prova produzida nos autos, deve ser aditado novo facto aos já dados como provados, o qual se encontra ínsito no processo de execução fiscal - a existência de uma (outra) II via de citação (reversão) com aviso de receção, para o processo em causa, de 2013-10-03, cuja devolução ao ora Recorrente ocorreu em 2013-10-15». Para além disto, na motivação, para prova deste facto, o Recorrente remete para fls. 132 do PEF inserto a fls. 65/386 do SITAF e cujo teor dá por reproduzido.
Assim, entendemos que nas alegações e conclusões do recurso o Recorrente cumpriu o formalismo legalmente exigido para efeito do aditamento que pretende.
Sucede que a fls. 132 do PEF inserto a fls. 65/386 do SITAF nada consta, por se tratar de uma folha em branco. É certo que, perscrutados todos os documentos constantes de pp. 65/386 do sitaf, é possível encontrar a fls. 251/386 uma cópia da carta de citação remetida em 5-03-2013 (devolvida ao destinatário com a informação de que o apartado para onde foi remetida se encontrava encerrado), a fls. 297 e 305/388 um aviso de receção com a identificação alfanumérica RM............33PT, a fls. 299 a frente de um envelope, dirigido ao Recorrido, com a mesma identificação alfanumérica, a fls. 303 o mesmo envelope ostentando um carimbo do Recorrente com a data de 16.10.2013. Mais consta dos autos fotocópia do verso de um envelope que se admite corresponder à indicada frente.
Contudo, não se vislumbra utilidade no aditamento aos factos provados pretendido pelo Recorrente, porquanto em nada poderiam alterar a decisão de direito quanto à possibilidade de se presumir realizada a citação, conforme melhor se verá infra.
Improcede, por isso, o recurso quanto à matéria de facto, por não ser possível proceder ao aditamento pretendido pelo Recorrente.

3.2.3. Do erro de julgamento quanto ao valor do processo
O Recorrente aponta erro de julgamento à sentença no que respeita ao valor do processo, que entende dever ser fixado em 13.644,08€, correspondente ao valor que o Recorrido foi citado para pagar.
Não é controverso que, nos termos da alínea e) do artigo 97º-A, do Código de Procedimento e de Processo Tributário «No contencioso associado à execução fiscal, o valor correspondente ao montante da dívida exequenda ou da parte restante, quando haja anulação parcial, exceto nos casos de compensação, penhora ou venda de bens ou direitos, em que corresponde ao valor dos mesmos, se inferior. ».
O montante da dívida exequenda é o que resulta das certidões de dívida, como se alcança, designadamente, do teor dos artigos 169º, nº 6, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que, para efeito de prestação de garantia, refere que, no portal das finanças ou através do OEF, é prestada informação relativa aos montantes da dívida exequenda e acrescido, e 199º, nº 6, do mesmo código, segundo o qual «A garantia é prestada pelo valor da dívida exequenda, juros de mora contados até ao termo do prazo de pagamento voluntário ou à data do pedido, quando posterior, com o limite de cinco anos, e custas na totalidade, acrescida de 25 /prct. da soma daqueles valores, exceto no caso dos planos prestacionais onde a garantia é prestada pelo valor da dívida exequenda, juros de mora contados até ao termo do prazo do plano de pagamento concedido e custas na totalidade, sem prejuízo do disposto no n.º 14 do artigo 169.º .».
Ora, no caso vertente, o montante total das dívidas exequendas nos processos de execução fiscal revertidos contra o Recorrido ascende a 12.063,59€, conforme resulta da discriminação constante da informação prestada pelo OEF nos termos do artigo 208º do Código de Procedimento e de Processo Tributário de fls. 3 e 4 de pag. 48 e seguintes do sitaf.
Assim, é neste montante que deve ser fixado valor do processo, devendo o recurso proceder parcialmente nesta parte.

3.2.4 Do erro de julgamento quanto à falta de citação
Na perspetiva do Recorrente, estando demonstrado que, após a devolução da primeira carta para citação do Recorrente ao remetente, foi remetida uma segunda carta para o mesmo efeito, tem de considerar-se verificada a citação deste e, por isso, a ocorrência de uma causa interruptiva da prescrição.
Vejamos a fundamentação jurídica da sentença nesta parte:
«Dispunha o art. 191º nº 3 do CPPT com a redacção em vigor à data dos factos que nos casos de efectivação de responsabilidade subsidiária ou quando houver necessidade de proceder à venda de bens, a citação é pessoal e, nos termos do art. 192º nº1 do CPPT, que as citações pessoais são efectuadas nos termos do Código de Processo Civil.
Porém, o CPPT regula especificamente e com carácter especial alguns aspectos e vicissitudes da citação pessoal.
Com efeito, referem os nºs 2 e 3 do art. 192º do CPPT que no caso de a citação pessoal ser efectuada mediante carta registada com aviso de recepção e este vier devolvido ou não vier assinado o respectivo aviso por o destinatário ter recusado a sua assinatura ou não ter procedido, no prazo legal, ao levantamento da carta no estabelecimento postal e não se comprovar que o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio ou sede fiscal, nos termos do artigo 43.º, é repetida a citação, enviando-se nova carta registada com aviso de recepção ao citando, advertindo-o de que a citação considera-se efectuada, na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados, sem prejuízo de fazer prova da impossibilidade de comunicação da alteração do seu domicílio ou sede.
Ou seja, a pedra de toque do regime é que no caso de devolução da carta remetida por o destinatário não ter procedido ao levantamento da mesma (se avisado naturalmente), o OEF remete uma segunda via da mesma com a advertência de que a citação “considera-se efectuada, na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data”.
Isto posto, resulta das alíneas H) a K) do probatório, que foram remetidas pelo OEF ao Reclamante duas citações através de carta registada com aviso de recepção, pelo que aparentemente o regime legal supra referido se mostra cumprido pelo OEF.
Porém, existem dois factos que impedem que se considere efectuada a citação pessoal:
1º-não existe comprovativo de que aquando da tentativa da primeira citação por carta registada com aviso de recepção, tenha sido deixado aviso de levantamento na caixa postal do Reclamante, o que deveria constar na carta devolvida (e não consta nem está demonstrado);
2º-a segunda carta remetida ao Reclamante, notoriamente, não deu cumprimento ao disposto no nº3 do art. 192º do CPPT pois não menciona a advertência de que a citação considera-se efectuada, na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data.
Assim sendo, como é, a citação alegadamente efectuada em 17-06-2013, não obedeceu ao disposto nos arts. 191º nº3 e 192º nºs 2 e 3 do CPPT, não se mostrando a mesma concretizada no PEF e, assim sendo, ocorre falta de citação no âmbito do PEF m.i. em A), o que consubstancia nulidade insanável do PEF nos termos do art. 165º nº1 a) do CPPT, procedendo a presente reclamação quanto a este fundamento. ».
Não nos merece qualquer reparo o assim julgado, sendo de realçar que o cumprimento do nº 2 do artigo 192º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ou seja, a remessa de nova carta de citação contendo a advertência prevista no nº 3, do mesmo artigo, é conditio sine qua non para que opere a presunção de citação do destinatário, nos casos em que também essa carta seja devolvida ao remetente.
Omitida tal advertência na 2ª carta remetida para citação e não tendo esta sido recebida pelo seu destinatário, não pode considerar-se verificada a citação do aqui Recorrido, pelo que mais não resta do que confirmar a sentença recorrida nesta parte.
Uma vez que o julgamento quanto à prescrição apenas é criticado por não se ter considerado o efeito interruptivo derivado da citação do revertido, não resultando provado nem se podendo presumir que esta efetivamente ocorreu, fica prejudicado o conhecimento desta questão, por indemonstrado o pressuposto fáctico em que assenta, sendo certo que não se nos afigura que a sentença recorrida enferme de qualquer erro nesta parte.

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Assim, preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I – Não pode rejeitar-se o recurso se, efetuada a notificação prevista no nº 3 do artigo 639º do Código de Processo Civil, o Recorrente apresentou novas conclusões sintetizadas.
II – Por força do artigo 641º do Código de Processo Civil, o requerimento de interposição de recurso é indeferido quando [cfr. nº 2, alínea b)] «Não contenha ou junte a alegação do recorrente ou quando esta não tenha conclusões.». Verificando-se que, no caso, o recurso foi acompanhado de alegações e conclusões, não havia, nem há, motivo para o rejeitar com este fundamento.
III - Uma vez que os documentos referidos pelo Recorrente não demonstram os factos que pretende acrescentar ao probatório, não é possível atender à sua pretensão nesta parte.
IV - Nos termos da alínea e) do artigo 97º-A, do Código de Procedimento e de Processo Tributário «No contencioso associado à execução fiscal, o valor correspondente ao montante da dívida exequenda ou da parte restante, quando haja anulação parcial, exceto nos casos de compensação, penhora ou venda de bens ou direitos, em que corresponde ao valor dos mesmos, se inferior».
V - O montante da dívida exequenda é o que resulta das certidões de dívida, como se alcança, designadamente, do teor dos artigos 169º, nº 6, 199º, nº 6, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
VI - o cumprimento do nº 2 do artigo 192º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ou seja, a remessa de nova carta de citação contendo a advertência prevista no nº 3, do mesmo artigo, é conditio sine qua non para que opere a presunção de citação do destinatário, nos casos em que também essa carta seja devolvida ao remetente.

5. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder parcial provimento ao recurso, na parte referente ao valor do processo, e negar-lhe provimento quanto ao demais.

Custas a cargo do Recorrente e do Recorrido, que aqui saem vencidos, nos termos do artigo 527º, nº 1 e 2, do Código de Processo Civil, fixando-se o decaimento em 95% para o Recorrente e 5% para o Recorrido.


Porto, 22 de fevereiro de 2024

Maria do Rosário Pais – Relatora
Ana Cristina Gomes Marques Goinhas Patrocínio – 1ª Adjunta
Cláudia Almeida – 2ª Adjunta